Acórdão nº 311/10.7TTPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22-11-2012
Data de Julgamento | 22 Novembro 2012 |
Número Acordão | 311/10.7TTPTM.E1 |
Ano | 2012 |
Órgão | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I. Relatório
Á…, actualmente residente na Rua…, intentou, no Tribunal do Trabalho de Portimão, a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra:
1. O…, Lda. com sede no Hotel … Albufeira;
2. S…, S.A., com sede no Hotel… Albufeira,
pedindo a condenação solidária das Rés:
a) ao reconhecimento da justa causa de resolução do contrato de trabalho promovida por iniciativa do trabalhador, ora Autor;
b) ao pagamento ao Autor de uma indemnização equivalente a 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade, em montante a calcular a final;
c) ao pagamento ao Autor de uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 7.500,00;
d) ao pagamento ao Autor da quantia de € 80.657,40 a título de retribuição de férias não gozadas, a que acrescem juros de mora;
e) ao pagamento da quantia de € 10.138,50 a título de retribuições vencidas respeitantes aos meses de Julho, Agosto e Setembro de 2009 e respectivos duodécimos de subsídio de férias e de Natal.
Alegou para o efeito, muito em síntese, o seguinte:
- encontrava-se ao serviço das Rés, no âmbito de um contrato de trabalho sem prazo, desde 1 de Outubro de 1976;
- inicialmente tinha as funções de “Chefe de Contabilidade”, e durante pelo menos os últimos 15 anos de duração do contrato de “Director Administrativo e Financeiro”;
- as Rés mantêm entre si uma relação societária de participações recíprocas de domínio ou de grupo, mantendo uma estrutura organizativa comum, com partilha do mesmo espaço e equipamentos, sendo que em todas as sociedades o detentor do capital social era primeiramente F… e a sua ex-mulher M… e, posteriormente, assumindo as respectivas participações sociais desta, a filha de ambos, M…;
- auferia ultimamente a retribuição ilíquida de € 3.379,50, onde se incluía o subsídio de alimentação, 1/12 do subsídio de férias e 1/12 do subsídio de Natal, sendo € 2.109,50 pagos pela 1.ª Ré e € 1.270,00 pela 2.ª Ré;
- para além desta retribuição o Autor tinha o uso exclusivo, para fins profissionais e particulares, sem quaisquer restrições, de um telemóvel cuja facturação era suportada pela 1.ª Ré, a que atribui o valor mensal de € 100,00;
- tinha ainda uma viatura atribuída, para fins particulares ou profissionais, sem quaisquer restrições, com o pagamento de todas as despesas inerentes à mesma suportadas pelas Rés, cujo valor computa em € 450,00 mensais;
- a partir do 18-06-2009, as Rés, ao contrário do que sucedia até aí, através do seu gerente de facto, deixaram de atribuir quaisquer funções ao Autor e os restantes trabalhadores daquelas, ou de outras empresas do grupo, foram impedidos de se dirigirem ao gabinete do Autor, de contactarem ou de tratarem qualquer assunto referente às mesmas com o Autor;
- e a partir de Julho de 2009 as Rés deixaram de pagar a retribuição ao Autor;
- em razão da descrita situação, resolveu o contrato de trabalho com invocação de justa causa;
- o comportamento das Rés, ao impedirem o Autor de exercer as suas funções e ao não lhe pagarem as retribuições no tempo e forma estabelecida, privaram-no dos meios de subsistência e provocaram-lhe instabilidade emocional e sofrimento psicológico, que justificam reparação;
- ao serviço das Rés não gozou 751 dias de férias, cujo pagamento reclama.
Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestaram as Rés, por excepção e por impugnação: (i) por excepção, sustentando a ininteligibilidade dos pedidos e consequente ineptidão da petição inicial, uma vez que o Autor no pedido não identifica, nem distingue, de entre tudo o que peticiona, aquilo que se refere a uma Ré ou à outra; (ii) por impugnação, negando, em suma, a prática dos factos que o Autor lhes imputa.
Pedem, por consequência, a nulidade de todo o processo, ou, se assim se não entender, a improcedência da acção.
O Autor respondeu à excepção de ineptidão da petição inicial, a pugnar pela improcedência da mesma, uma vez que as Rés, enquanto empregadoras, partilhavam a posição jurídica de credoras da prestação do trabalho.
Seguidamente, em sede de despacho saneador foi fixado valor à causa (€ 98.295,90), julgada improcedente a excepção dilatória de ineptidão da petição inicial e dispensada a selecção da matéria de facto assente, bem como da base instrutória.
A Ré S…, S.A., não se conformando com o despacho saneador, na parte em que julgou improcedente a invocada excepção de ineptidão da petição inicial, dele veio interpor recurso.
Para o efeito, nas alegações que apresentou formulou as conclusões que se transcrevem:
«I. O despacho recorrido indeferiu a arguida ineptidão da Petição Inicial por considerar que a mesma “os pedidos são, pois, perfeitamente inteligíveis…não se pode julgar procedente a arguição da ineptidão da petição inicial”.
II. Foi efectuado um único e mesmo pedido para todas as sociedades Rés, entre as quais a ora Recorrente, não identificando ou distinguindo qualitativamente, nem quantitativamente, o quê e o quanto se imputa a cada uma daquelas sociedades.
II. à luz da lei a responsabilidade solidária só existe quando estamos perante uma relação de domínio total, cfr. artigo 491.º do Código das Sociedades Comerciais, o que não sucedeu in casu.
IV. A petição inicial fundamenta a relação de reciprocidade, domínio e/ou grupo na circunstância de uma pessoa singular única ser detentora do capital social das três Rés.
V. Qualquer um dos conceitos “participações recíprocas”, “de domínio”, ou “de grupo” tem um denominador comum – relações entre sociedades, enquanto sócias umas das outras, logo, respeita a pessoas colectivas e não a pessoas singulares!
VI. Em termos processuais aplica-se o regime jurídico da coligação e quanto a este a lei é clara e exige que sejam efectuados pedidos diferentes, o que não sucedeu, desconhecendo-se por isso em quê e quanto é a ora Recorrente demandada individualmente, sendo certo que este é um requisito essencial.
VII. É obrigatório que se peticione uma quantia certa a cada Ré na acção, de modo a que cada uma delas, neste caso a ora Recorrente, possa estruturar a sua defesa.
VIII. Face ao exposto, o pedido é ininteligível e consubstancia necessariamente, com base no disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 193.º do CPC, aplicável nesta matéria, a ineptidão da petição inicial».
E a terminar as conclusões pede que seja julgado procedente o recurso e, em consequência, anulado o despacho saneador na parte em que indeferiu a arguição da ineptidão da petição inicial.
O recurso foi admitido na 1.ª instância, como de apelação, com subida em separado e efeito meramente devolutivo.
Entretanto, os autos prosseguiram os seus termos, tendo no decurso da audiência de discussão e julgamento de 01-02-2011 sido, entre outros, proferido o seguinte despacho (fls. 305):
«As Rés não juntaram aos autos os documentos em causa alegando que não os tem em seu poder, porque os não encontrou. Não existe, pois, uma recusa de não cooperação mas apenas uma impossibilidade.
Porém, no que se refere ao ónus da prova, o direito ao gozo de férias nasce com a celebração com o contrato de trabalho, pelo que, ao autor cabe alegar que as não gozou cabendo à entidade empregadora provar que o mesmo as gozou.
Apenas quando está em causa a violação do direito ao gozo de férias é que o ónus da prova incumbe ao autor. Assim sendo, o Autor alegou pelo que incumbe à Ré fazer prova que o mesmo as gozou».
Do referido despacho, interpôs recurso a Ré S…, S.A..
Finda a audiência de discussão e julgamento respondeu-se à matéria de facto, após o que foi proferida sentença (por juiz diferente do que havia realizado o julgamento), que julgou a acção parcialmente procedente, sendo a parte decisória do seguinte teor:
«Nos termos que se deixam exposto, concluindo sem mais amplas considerações e com a procedência parcial da acção:
I – Condeno solidariamente as rés, O…, Lda, e S…, S.A., a reconhecer a justa causa da resolução do contrato de trabalho pelo autor, Á….
II – Condeno as rés solidariamente a pagar ao autor uma indemnização equivalente a 30 dias de retribuição por cada ano completo ou fracção de antiguidade, a liquidar em execução de sentença.
III – Condeno as rés a pagar ao autor a quantia total de 86.554,12 euros, a título de férias não gozadas e retribuições vencidas referentes aos meses de Julho Agosto e Setembro de 2009, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal (actualmente 4% ao ano), desde a data da citação e até integral pagamento.
IV – Absolvo as rés do mais pedido pelo autor na acção».
Inconformada com a sentença, a Ré S…, S.A., dela interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:
«I) O presente recurso vem interposto da sentença proferida a fls. do processo número 311/10.7 TTPTM que correu termos no Tribunal de Trabalho de Portimão e que condenou solidariamente a Recorrente a reconhecer a justa causa da resolução do contrato de trabalho pelo ali autor, Á…, no pagamento ao autor de uma indemnização equivalente a 30 dias de retribuição por cada ano completo ou fracção de antiguidade, a liquidar em execução de sentença e no pagamento ao autor da quantia total de € 86.554,12 euros, a título de férias não gozadas e retribuições vencidas referentes aos meses de Julho Agosto e Setembro de 2009, acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal (actualmente de 4% ao ano), desde a data de citação e até integral pagamento.
II) Salvo melhor opinião, a sentença ora recorrida padece de vício de insuficiência da matéria de facto, procedeu a uma incorrecta apreciação da matéria de facto e de direito, devendo, por conseguinte, ser revogada e substituída por outra decisão que determine a absolvição da Apelante.
III) O Mmo. Juiz de Julgamento, Dr. Joaquim...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO