Acórdão nº 3080/17.6T8BCL-I.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 28-06-2023

Data de Julgamento28 Junho 2023
Case OutcomeNÃO CONHECIMENTO DO OBJECTO DO RECURSO.
Classe processualREVISTA
Número Acordão3080/17.6T8BCL-I.G1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça



Processo n.º 3080/17.6T8BCL-I.G1.S1
Revista – Tribunal recorrido: Relação de Guimarães, ... Secção Cível


Acordam em Conferência na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça


I. RELATÓRIO


A) Neste processo de inventário para partilha dos bens comuns do ex-casal, figurando como Requerente AA e cabeça-de casal BB, este apresentou Relação de Bens junto do Cartório Notarial ....

B) O casamento celebrado entre AA e BB foi dissolvido por sentença transitada em julgado, proferida a .../.../2019, no âmbito do processo de divórcio por mútuo consentimento (com fixação do valor da causa em € 30.000,01) a que estes autos vão apensos (“E”), tendo sido o casamento celebrado no regime de comunhão geral de bens.

C) A Requerente AA deduziu Reclamação contra a Relação de Bens, alegando, em especial, a impugnação de verbas e valores atribuídos, a omissão de bens (automóveis, máquinas e outros bens móveis) e de benfeitorias nos imóveis relacionados, e requerendo que fosse ordenado o aditamento e a rectificação em conformidade.
O cabeça-de-casal apresentou Resposta, alegando em particular que os automóveis e as máquinas pertencem à sociedade «S..., Lda.».

D) Após realização de audiência prévia, o Notário proferiu despacho (17/6/2020) de remessa definitiva do processo para o Tribunal competente, nos termos do art. 12º, 3, da Lei 117/2019, de 13 de Setembro, o que se cumpriu em face do Juízo de Família e Menores ... do Tribunal Judicial da Comarca de Braga.

E) Tramitada a instância, com nova audiência prévia, e produzidas as diligências probatórias, o Juiz ... do Juízo de Família e Menores ... proferiu decisão final do incidente (12/7/2022: arts. 1091º, 1, 295º, CPC), com o seguinte dispositivo (sublinhado nosso):
- julgar improcedente a reclamação apresentada no que tange às verbas n.os 1 e 5 e à alegada omissão de bens móveis, com exceção dos relacionados e os aceites pelo cabeça-de-casal na resposta à reclamação da relação de bens;
- determinar que os bens propriedade da sociedade constituem parte das quotas sociais e assim devem ser relacionados;
- determinar que o valor dos bens móveis constantes das verbas 6 a 18 é [a] que resulta da avaliação efetuada;
- determinar, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 1092.º e 1093.º ambos do Código de Processo Civil, a remessa das partes para os meios comuns a fim de ser apreciada a questão relativa às benfeitorias e respectivo valor.

Para o segundo e quarto dos anteriores segmentos decisórios, sustentou-se em termos argumentativos:

Sustentou,ainda,areclamantequeocabeçadecasalnãorelacionouosseguintes veículos:veículoautomóveldemarcaFord,modeloTransit,doanode1996,matrícula..-..-HPeveículoautomóvel,marcaCitroen,modeloBerlingo,doanode2001,matrícula..-..-RQeosdemaisbensmóveis.
Vejamosentão.
Apropósitodosidentificadosbensconstata-sequenadoutadecisãosingularproferidapeloVenerandoTribunaldaRelaçãodeGuimarães,noâmbitodorecursoinstauradodaprovidênciacautelardearrolamentodecretada,quecorreuporapensoaosautosprincipaisrefere-seentreomais: “O arrolamento instaurado como preliminar ou incidente da acção de divórcio só pode incidir sobre os bens comuns do casal ou sobre os bens próprios que estejam sob a administração do outro cônjuge, nunca sobre bens de terceiros. Não é o facto de Requerente e Requerido serem os únicos sócios da sociedade “S..., Lda”, que transforma o património da sociedade em bens comuns do casal. Como bem refere a própria recorrida os bens são da sociedade. E a sociedade é, efectivamente, um terceiro, pois que tem personalidade jurídica própria, autónoma. A personalidade jurídica é concedida a todas as pessoas singulares (art. 66º, do Código Civil) e também às pessoas colectivas, nos termos do art. 158º, do Código Civil, bem como às sociedades comerciais, como é o caso – cfr. art. 5º, do Código das Sociedades Comerciais. A sociedade, de que as partes são sócios, possui personalidade jurídica, possui património social distinto do dos respectivos sócios, conferindo-lhe a lei autonomia em relação ao património pessoal destes, não podendo ser arrolados bens da mesma, que não são bens comuns do casal. O património individual, pessoal, do sócio (de que faz parte a quota social) não se confunde com o património autónomo da sociedade”.
NoseguimentodosfundamentosexpostosfoijulgadaprocedenteaapelaçãoerevogadaadecisãorecorridanoquediziarespeitoaoarrolamentodosbensdasociedadeS...,Lda.
Ora, in casu,apurou-sequepartedosbensconstantesdarelaçãodebenssãopartedoselencadosnopontoF)dorequerimentoinicialdaprovidênciacautelarqueforamconsideradosbensdaditasociedade.
Sesãobensdasociedadeintegramoacervopertencenteàrespectivaquotadasociedade,sendocertoqueconformeacimasereferiunoregimedecomunhãogeraltodososbensdoscônjugesadquiridosantesoudepoisdacelebraçãodocasamentointegramacomunhãoconjugal,ouseja:sãobenscomunsdocasal(art.1732.ºdoCC).Peloque,nesteregime,apósacelebraçãodocasamento,oscônjugesdeixamdeterbensepatrimóniosprópriosseparadosdosbensepatrimónioprópriosdooutrocônjuge.
Logoresultacomclarezaquetodososbensarroladosdesdequeadquiridosporumdoscônjugessãobenscomunsdocasal.
Comefeito,aplenacomunhãodevidaaqueauniãomatrimonialaspiralevaaqueageneralidadedasrelaçõesobrigacionaisereaisdoscônjugessejamdisciplinadas,nosistemajurídicoportuguês,porregraslegaisparticulares,enunciadasnoCapítuloIX,TítuloII,doLivroIV,doCódigoCivil.
Noentanto,osbensconstantesdarelaçãodebensquesejambensdasociedadeestãocontidosnasquotassociais.Logo,apesarderelacionadosautonomamente,anossovertemdesertidosemconsideraçãocomoconstituindopartedasquotassociaiseassimrelacionados.
Noquetangeàsbenfeitoriasnafaltadeconsensonãosetornapossívelemsededeincidentedeinventárioaquilatarasuaextensãoparaefeitosdeavaliação.
Comefeitoosdepoimentosdastestemunhasinquiridasforamvagoseimprecisossobreaseventuaisobrasrealizadasnosimóveisconstantesdasverbas24e27.
Nãoforamjuntosdocumentosquepermitissemarrimarasrespectivaspretensõesdaspartesnoquetangeàsmencionadasbenfeitorias.
TalcolideimpressivamentecomoapuramentodopassivoconstantedaalíneaF)dareclamaçãoapresentada.
Quid Iuris?
Dispõeoart. 1092.ºdoCódigodeProcessoCivil(CPC)que:(…).
Ocitadoart.consagraaregrasegundoaqualasuspensãodainstânciadoprocessodeinventáriotemlugarnoscasosemqueestejapendenteumacausaprejudicial,ouseja,suscitadaalgumaquestãocomrelevânciaparaaadmissibilidadedoprocessoouparaadefiniçãodedireitosdeinteressadosdirectosnapartilha.Poroutrolado,atítuloexcepcional,oart.1093.ºdoCPCprevêigualmenteapossibilidadede,oficiosamenteouarequerimento,oprocessodeinventáriosersuspensocomaconsequenteremessadosinteressadosparaosmeioscomuns–,naeventualidadedeseverificaralgumaquestãoquenãodigarespeitoàadmissibilidadedoprocessoouàdefiniçãodedireitosdeinteressadosdirectosnapartilha,mascujacomplexidadedamatériadefactotorneinconvenientequeamesmasejaapreciadanoprocessodeinventário,porimplicarreduçãodasgarantiasdaspartes,eojuizentendaqueessaquestãoésusceptíveldeafectar,deformasignificativa,autilidadepráticadapartilha.
Ora,nocasoconcreto,asquestõessuscitadasapropósitodasbenfeitoriasalegadamenterealizadosnosreferidosbensimóveis,tornamanossover,inconveniente,faceàsuacomplexidade,sobpenadereduçãodasgarantiasdasparteseaoabrigodoprincípiodagestãoprocessualedaadequaçãoformalquetalquestãosejadecididaatítuloincidentalemsededeinventário.
Portal,afigura-se-nosconvenientearemessadosinteressadosparaosmeioscomunsquantoaessamatéria”.

F) Inconformado, o cabeça-de-casal BB interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, uma vez identificadas as questões decidendas nos segundo e quarto segmentos impugnados do dispositivo da decisão recorrida – saber “a) se os bens propriedade da sociedade devem ser relacionados neste inventário; b) se foi correcta a decisão de remeter a questão das benfeitorias para os meios comuns” –, conduziu a ser proferido acórdão (9/2/2023) que julgou o recurso totalmente procedente, revogando a decisão recorrida e determinando que:
a) os bens propriedade da sociedade S..., Lda não devem ser relacionados nestes autos;
b) a questão relativa às benfeitorias e respectivo valor não deve ser remetida para os meios comuns, antes será apreciada nos presentes autos de inventário.”

G) Agora inconformada, a Requerente AA interpôs recurso de revista para o STJ, finalizando as suas alegações com as seguintes Conclusões:

“1. O douto despacho de admissão do recurso de apelação violou as normas dos artigos 644.º e 1123.º do CPC.
2. A decisão apelada não é recorrível na presente fase ou momento processual, sendo apenas recorrível nos termos do n.º 3 do art. 644.º do CPC e/ou do n.º 4 do art. 1123.º do CPC, se vier a ser proferido recurso de uma das quaisquer decisões previstas na alínea b) do n.º 2, do citado artigo 1123.º.
3. Sendo o escopo ou função do processo de inventário permitir a realização de uma partilha ou divisão de bens justa e equitativa (cfr. art. 1082.º e seguintes do CPC), a Meritissima Senhora Juiz apelada ao decidir no sentido do cabeça de casal fazer constar sob as verbas onde relaciona as quotas relativas á sociedade “S...,Lda.”, a relação dos bens que pertenciam, integravam ou faziam parte da referida sociedade à data da instauração da ação de divórcio (cfr. art. 1789.º/1 do CPC), julgou
...

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