Acórdão nº 302/24.0BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 28-08-2024

Data de Julgamento28 Agosto 2024
Número Acordão302/24.0BELRA
Ano2024
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I Relatório
J......., com os sinais nos autos, tendo apresentado Providencia Cautelar contra a Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC), tendente à suspensão do acórdão n.° ............/24, de 21 de fevereiro de 2024 que deliberou aplicar ao Autor a pena disciplinar de suspensão, pelo período de 3 anos, inconformado com a decisão proferida no TAF de Leiria que, em 17 de maio de 2024, julgou improcedente a presente Providência Cautelar, veio recorrer para esta instancia, aí concluindo:
“1. O ora RECORRENTE requereu a suspensão da eficácia da decisão disciplinar correspondente ao Acórdão n.° ............/24, de 21 de fevereiro de 2024, do Conselho de Jurisdição da ora RECORRIDA, que deliberou, por unanimidade, aplicar ao ora RECORRENTE a pena disciplinar de suspensão, pelo período de 3 (três) anos, no âmbito do processo disciplinar n.° ....../19.
2. A sentença recorrida julgou improcedente o presente processo cautelar e, em consequência, recusou a requerida providência cautelar de suspensão de eficácia de ato.
3. O Tribunal a quo considerou verificado o requisito correspondente ao "periculum in mora", mas entendeu não se verificar o requisito do "fumus bonis iuris", o que, per se, obstava ao decretamento da providência.
4. O RECORRENTE entende que o Tribunal a quo preconizou um entendimento errado, já que o ato suspendendo padece de vícios que o invalidam, designadamente, como supra amplamente se demonstrou, de falta de fundamentação (cfr. artigo 268.°, n.° 3 da CRP) e de violação dos princípios da proporcionalidade (artigo 7.°, n.° 2 do CPA e artigo 266.°, n.° 2 da CRP) e da adequação.
5. Efetivamente, no que diz respeito ao requisito do fumus boni iuris, caracterizando-se o processo cautelar pela provisoriedade e urgência, o requisito relativo à aparência do bom direito implica um juízo de probabilidade de procedência da ação principal sumário e perfunctório, ou seja, a apreciação de procedência do(s) vicio(s) imputado(s) ao atos suspendendo não é compatível com uma exaustiva análise da situação, sob pena de se esgotar nesta apreciação o mérito da ação principal, bastando para o efeito que tal procedência se mostre plausível.
6. O RECORRENTE entende que a decisão suspendenda não cumpre, de forma evidente, o dever de fundamentação; que a fundamentação é sucinta, insuficiente e obscura e que se limita a transcrever, na integra, o teor da decisão judicial proferida no âmbito do processo crime n.° .../18........PSR, sem que tenha formulado qualquer tipo de apreciação critica ou minimamente fundamentada quanto à prova produzida nos autos disciplinares, ao arrepio das mais elementares regras, em matéria de dever de fundamentação.
7. Na decisão suspendenda não é valorada a prova, testemunhal e documental, produzida por iniciativa do ora RECORRENTE, não se ponderando as concretas circunstâncias do caso, nem se efetuando qualquer apreciação, concreta e fundamentada, sobre a ilicitude, a culpa, a personalidade do arguido, a sua conduta anterior e posterior às infrações sub judice e demais critérios em que se suportou, ou teria que suportar, a escolha da sanção e a determinação da sua medida.
8. Pelo que padece a decisão suspendenda, manifestamente, do vício de falta de fundamentação (cfr. artigos 114.°, n.° 2, alínea a) e 153.° do CPA e artigo 268.°, n.° 3 da CRP) verificando-se, por conseguinte, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, o exigido “fumus boni iuris”.
9. Entende, ainda, o ora RECORRENTE que a sanção aplicada é desadequada e desproporcionada tanto na modalidade da sanção escolhida, como na sua medida.
10. Efetivamente, no que respeita à escolha e medida da pena disciplinar, o relatório, para o qual a decisão suspendenda remete, limita-se afirmar de forma vaga e conclusiva, sem articulação com a factualidade provada, que: “os autos evidenciam claramente um comportamento culposo e consciente, com um grau de culpa muito elevado, consubstanciado num dolo direto, pelo elevado juízo de censurabilidade que em igual grau nos merece o comportamento do arguido, pois demonstrou um claro desrespeito das normas legais quer estatutárias e deontológicas, reguladoras do exercício da profissão quer do Código Penal”.
11. Ora, tal não corresponde a uma ponderação critica de todas as circunstâncias relevantes e da avaliação da culpa do agente, esta, a culpa, medida última da sanção a aplicar.
12.O Conselho Jurisdicional devia, ainda, por se tratar de um poder-dever atenta às especialíssimas circunstâncias que resultam dos factos provados, ter ponderado, em concreto, a possibilidade da suspensão dos efeitos da execução da sanção disciplinar punitiva, designadamente tendo em conta as exigência (no caso, a sua falta) de prevenção especial que o caso concreto reclama, o que de igual modo não logrou fazer, optando, em sede disciplinar, por não se reter sequer na ponderação dos seguintes factos que deu como provados:
- Que os factos foram praticados no período de 2014 a 2018, sendo que o ora RECORRENTE desde então até à presente data, ao longo de quase 10 anos exerceu as funções de contabilista certificado sem violação de qualquer norma deontológica;
- Que antes dos factos praticados e configuram uma infração disciplinar, foi, durante 26 anos contabilista certificado sem ter praticado qualquer infração disciplinar;
- Que confessou os factos que integram as infrações disciplinares;
- Que se tratou de um ato isolado na sua vida profissional;
- Que interiorizou a censura da sua ação e se mostrou arrependido;
13. Factos que a terem sido devidamente ponderados determinariam a aplicação de uma sanção menos severa, ou, pelo menos, a suspensão da execução da sanção aplicada.
14. Ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, entende-se que órgão do poder disciplinar não fica restringido nos seus poderes de cognição aos factos dados como provados em sede de processo criminal, antes se lhe impondo que proceda à sua própria valoração em sede disciplinar, designadamente aplicando os critérios legais que presidem à aplicação de uma sanção disciplinar.
15. Sendo que na decisão suspendenda não se ponderou de forma critica e fundamentada: a ilicitude, o grau de culpa e a personalidade do arguido bem como as consequências da infração e todas as circunstâncias agravantes e atenuantes, ainda que, quanto a esta últimas, se refira, sem mais, que tenham sido equacionadas.
16. Assim e em suma, face aos factos imputados ao RECORRENTE e dados como provados no processo disciplinar mostra-se desadequada e desproporcional a sanção disciplinar de suspensão pelo período de 3 anos, sanção que, como é facto notório, o privará do exercício da sua profissão.
17. Pelo que se verifica a violação dos princípios da proporcionalidade e adequação concluindo-se que se mostra preenchido o requisito do fumus boni iuris, previsto no artigo 120.°, n.° 1., do CPTA.
18. Por outro lado, ainda que na ação principal a decisão a proferir venha a ser desfavorável ao RECORRENTE, o que não se admite, nem se concede, a suspensão da eficácia do ato administrativo não implica qualquer dano para o interesse público.
19. Sendo manifesto que o risco de lesão do interesse público que comporta a não adoção da requerida providência cautelar é superior ao que pode decorrer da suspensão da eficácia do ato administrativo em apreciação.
20. Inexistindo qualquer ofensa do interesse público, tanto mais que, em sede disciplinar, aquando da prolação do despacho de acusação, nunca a requerida, ora RECORRIDA, viu quer qualquer necessidade de suspender preventivamente o RECORRENTE dessas funções, nos termos do artigo 102.°, número 1.°, do Estatuto da Ordem, justamente por considerar, atentas as premissas da norma em apreço, que não se verificava a possibilidade da prática de novas infrações disciplinares ou a tentativa de perturbar o andamento da instrução do processo.
21. A sentença recorrida violou manifestamente, na interpretação que fez, o disposto no artigo 268.°, n.° 3 da CRP, o artigo 7.°, n.° 2 do CPA e artigo 266.°, n.° 2 da CRP.
22. Por tudo acima exposto, deve o presente recurso ser julgado procedente e a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue a providência cautelar de suspensão de eficácia totalmente procedente, com as legais consequências daí advenientes.
Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida e substituída por outra que julgue o procedimento cautelar totalmente procedente e decrete a providência de suspensão da eficácia requerida.


A Entidade Recorrida/Ordem dos Contabilistas veio apresentar as suas Contra-alegações de recurso em 26 de junho de 2024, aí tendo concluído:
“a) O Tribunal a quo julgou, e bem, improcedente o processo cautelar e, em consequência, recusou a requerida providência cautelar de suspensão de eficácia de ato, condenando o Requerente, aqui Recorrente, pelas custas.
b) O Recorrente veio interpor recurso da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo por não se conformar com a mesma, requerendo que o mesmo tenha efeito suspensivo.
c) A sentença proferida pelo Tribunal a quo apenas merece censura por dado como verificado o pressuposto do periculum in mora, o que na verdade não se encontra verificado.
Da ampliação do Pedido
d) Os rendimentos do Recorrente não resultam da sua qualidade de contabilista certificado, mas sim como gerente ou Diretor de serviços;
e) O agregado familiar o Recorrente, conta com a esposa do mesmo, a qual também aufere de rendimentos, de valor equivale aos do Recorrente como gerente;
f) O Recorrente, muito antes de ter dado entrada da providência cautelar sob sindicância já não suportava o encargo mensal de €500 respeitante ao contrato de leasing, despesa essa que invocou para fundamentar o alegado...

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