Acórdão nº 302/16.4T8PRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05-11-2020

Data de Julgamento05 Novembro 2020
Número Acordão302/16.4T8PRG.G1
Ano2020
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: “X – SERVIÇOS LINGUISTICOS, LDA”.
Recorrido: O. M..
Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real – Juízo Local Cível de Peso da Régua.

O. M., divorciada, NIF ………, residente na Av. … no Porto, intentou acção declarativa com processo comum contra:
1ª - “X – SERVIÇOS LINGUISTICOS, LDA”, pessoa colectiva nº ………, com sede na Av. …, em Peso da Régua, cuja representante legal é L. S., NIF ........., a citar na sede da pessoa colectiva.
- L. S., NIF ........., a citar na sede da pessoa colectiva e que intervém na qualidade de fiadora da primeira demandada E
- D. S., titular do cartão de cidadão nº …… e NIF ………, residente na Rua … em Lisboa e que também intervém na qualidade de fiador da primeira demandada.

A autora formula os seguintes pedidos:
a) Pede que seja decretada a resolução do contrato de arrendamento e a condenação dos demandados a despejar e entregar o prédio livre de pessoas e bens.
b) Pede a condenação dos demandados a pagarem à Demandante as rendas já vencidas no valor de € 1.896,54 e as que se vencerem e não forem pagas na pendência da presente acção até efectivo despejo, nos termos do artigo 557.º do C.P.C., acrescidas de respectivos juros de mora à taxa legal, conforme o Artº 806º do Código Civil, calculados desde a data de vencimento de cada uma delas, bem como o dobro desse quantitativo se houver mora em restituir o locado nos termos do artigo 1045.º do Código Civil.

Fundamenta tais pretensões na circunstância de a locatária ter incorrido em mora no pagamento de rendas – a de Dezembro de 2016, paga apenas parcialmente, e a de Janeiro de 2017, não paga, ambas após o prazo contratualmente previsto.

Por seu turno, a sociedade ré apresentou contestação em que pugnou pela improcedência dos pedidos, com os seguintes argumentos:
- Na data em que a acção foi proposta o período de mora era inferior a dois meses, como impõe o artigo 1083.º, n.º 3, do Código Civil.
- A partir de Novembro de 2016, a ré passou a descontar € 200,00 à renda mensal, com o acordo da autora, porque esta, não obstante interpelada a fazê-lo, não entregou à ré a licença de utilização para a finalidade do contrato de arrendamento, não resolveu o problema dos maus cheiros, infiltrações e humidades no piso térreo, porque a autora não substituiu as persianas e as caixilharias do locado e porque a autora não limpou as sujidades da fachada exterior.
- A ré recusou o pagamento da renda de Janeiro de 2017 por aqueles problemas ainda não terrem sido resolvidos pela autora.

Com a contestação, a ré juntou comprovativo de depósito em 14.2.2017 a favor da autora de € 5.757,22, quantia correspondente às rendas peticionadas pela autora acrescidas de 50%, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 1041.º, n.º 1, 1042.º, e 1048.º, n.º 1, do Código Civil, e 17.º, 18.º e 19.º do NRAU, com vista a operar a caducidade do direito de resolução do contrato, para o caso de não ser atendida a invocada excepção de não cumprimento do contrato.
A ré apresentou pedido reconvencional contra a autora, alegando que a falta de resolução pela autora de alguns dos problemas que motivaram a redução da renda, em particular, as infiltrações de humidade e maus cheiros no piso térreo, lhe causaram prejuízos que pretende ver ressarcidos, traduzidos em despesas com obras e danos não patrimoniais de € 3.000,00.

Pediu ainda a devolução do depósito liberatório condicional que efectuou e do montante de € 200,00 de cada renda depositada.
Por fim, pediu a condenação da autora na alteração da licença de utilização e na realização das obras que identifica no locado.
A autora, por seu turno, em articulado posterior, para além do mais, rejeita a existência de fundamento para a excepção do não cumprimento do contrato porque a autora efectuou o pedido de licenciamento camarário em 2010 e porque realizou obras no locado em 2013, 2014 e 2016 na sequência das queixas recebidas da ré.
Alegou ainda que o depósito efectuado, para ter o efeito liberatório pretendido, deveria ter sido superior, no montante de € 6.141,35, e não apenas de € 5.767,22.
A autora requereu nesta fase a condenação da ré como litigante de má fé, em multa a ponderar e indemnização não inferior a € 500,00, por não ignorar o carácter infundado das suas pretensões.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença em que, respondendo à matéria de facto controvertida, se decidiu nos seguintes termos:
Em virtude dos motivos expostos:
a) Julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência, condeno os réus no pagamento dos montantes das rendas em atraso, no valor total de € 1.548,27, e das rendas vincendas na pendência desta acção, devendo ser restituído aos réus o montante por si já entregue e depositado na medida em que exceda tais montantes.
b) Absolvo os réus do demais peticionado pela autora.
c) Julgo a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, condeno a autora a reparar as infiltrações na parede da sala da garagem contígua às escadas exteriores do edifício locado, bem como a pintar a mesma parede, absolvendo a autora do demais peticionado pelos réus.

Inconformado com tal decisão, apela Ré “X – SERVIÇOS LINGUISTICOS, LDA” e, pugnando pela respectiva revogação, formula nas suas alegações as seguintes conclusões:
1 – A ré impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, pedindo que a mesma seja alterada para dela passarem a constar os seguintes factos dados como provados e eliminados os seguintes factos dados como não provados.
2 – Quanto aos factos provados: alterar a redacção do ponto 1, aditar os pontos 4, 17, 19 e 22, e renumerar os restantes pontos:
1. A autora e a ré celebraram a 25 de Novembro de 2011 um contrato de arrendamento, aquela na qualidade de senhoria e esta de arrendatária, sobre o prédio urbano sito na Avenida … em Peso da Régua, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ..., com início em 1 de Abril de 2012.
4. De acordo com a cláusula décima do contrato de arrendamento, o local arrendado destina-se exclusivamente a prestar a actividade de serviços linguísticos, tradução simultânea, guias, escolas de línguas pela segunda outorgante.
17. Porque deixou caducar o pedido efetuado em 21/11/2011, referido no número anterior, a autora, apenas em 16 de Fevereiro de 2016 pediu novamente, junto da Câmara Municipal, a alteração da utilização do locado;
19. Da existência de licença de utilização para fim não habitacional depende a candidatura da ré a projectos financiados por fundos.
22. No entanto, a autora tinha conhecimento da existência dessas salas e que a ré destinara a garagem existente no rés-do-chão a salas de aula e ensino de línguas.
3 – A redacção do ponto 1 dos factos provados deve ser alterada tendo em conta que:
. A data 25/11/2011 consta do art.º 1º da Petição Inicial, art.º 21º da Contestação e art.º 101º da Réplica, não impugnados pela parte contrária;
. A data 25/11/2011 consta, rasurada, do contrato de arrendamento junto aos autos, que não foi impugnado;
. O requerimento com pedido de alteração da licença de utilização deu entrada na Câmara em 21/11/2011;
4 – O ponto 4 deve ser aditado tendo em conta que:
. Foi alegado no art.º 27º da Contestação, não impugnado pela parte contrária e consta do contrato de arrendamento juntos aos autos com a Petição Inicial.
. a inclusão deste facto tem relevância na apreciação da atitude das partes quanto à questão da licença de utilização e e necessidade da sua alteração.
5 – O ponto 17 deve ser aditado tendo em conta que:
. Este facto foi alegado no art.º 43º da Contestação e consta do procedimento camarário junto aos autos com a ref. Citius 1557884 que a autora foi notificada, através do ofício datado de 27/02/2012 para, em 15 dias, juntar os elementos previstos no art.º 15º da Portaria 232/2008, sob pena de rejeição do pedido e que, nesse prazo, a autora não juntou nada, tendo deixado caducar o pedido.
. Este facto vem, ainda, demonstrado pela troca de e-mails junta aos autos com a ref. Citius 1532282, designadamente o e-mail que a autora dirigiu à ré no dia 17/02/2016 informando-a que “Finalmente foi ontem entregue o pedido elaborado com toda a documentação necessária para solicitar a alteração mencionada.”
6 – O ponto 19 deve ser aditado tendo em conta que:
. Consta do documento n.º 2 junto com a Contestação e vem alegado nos artigos 29º e 41º da Contestação, que não foram impugnados pela parte contrária;
. O facto de nunca terem sido rejeitadas candidaturas apresentadas pela ré a fundos europeus com fundamento na inexistência da licença de utilização para fins não habitacionais, não leva à conclusão de que tal licença não é exigível para a apresentação dessas candidaturas, o que parece ter sido confundido pela sentença em crise.
7 – O ponto 22 deve ser aditado tendo em conta que:
. Vem alegado no art.º 50º da Contestação que não foi impugnado pela autora na réplica.
. Decorre das variadas obras que a autora levou a cabo na garagem do locado e que se mostram provadas nos pontos 20, 30, 34, 35, 36, 37 e 38 da sentença;
. Demonstrado através do e-mail que a autora dirigiu à ré em 5 de agosto de 2015, junto aos autos através da ref. Citius 1532282.
8 – Factos não provados: retirar do elenco dos factos não provados os pontos A. e B. e ainda o ponto D., este último porque não se trata de um facto, mas de uma consequência jurídica.

9 – Quanto à decisão sobre a matéria de direito, importa alterar a sentença quanto ao julgamento dos seguintes aspectos jurídicos da causa:
10 – A Recorrente pretende que a exceção de não cumprimento do contrato por si alegada seja julgada procedente, uma vez que resultaram provados factos que impõem que assim seja proferida tal decisão.
11 – Com a procedência da exceção de não cumprimento do contrato e consequente...

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