Acórdão nº 2983/16.0T8MTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 28-03-2023
Data de Julgamento | 28 Março 2023 |
Case Outcome | CONCEDER A REVISTA, REPRISTINANDO-SE A SENTENÇA PROFERIDA PELO TRIBUNAL DE 1ª INSTÂNCIA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 2983/16.0T8MTS.P1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acórdão
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I.Relatório
1. AA intentou a presente ação com processo comum de declaração contra BB, CC, DD, EE e CC, pedindo:
a) Que seja declarada a simulação da partilha junta como documento nº 31 com a petição inicial, assim como da escritura de compra e venda que deu origem ao registo do negócio expresso no documento também junto com a petição inicial com o n.º 33;
b) Em consequência, que os imóveis e o recheio resultantes da partilha regressem ao património dos respetivos réus, antes da outorga dos negócios (partilha e compra e venda);
c) Que se ordene o cancelamento de qualquer registo efetuado em consequência da partilha do património conjugal e da compra e venda efetuadas e aludidas nos artigos 26, 27, 28 e 43 da petição inicial.
Ou, caso assim não se entenda,
a) Que se declarem como verificados os pressupostos da impugnação pauliana e que seja decretada a ineficácia em relação ao autor da partilha do património conjugal e da compra e venda referidas na petição, sendo ordenada a restituição dos bens nos termos do artigo 616º, nº 1, do C.C;
b) Que se ordene o cancelamento de todo e qualquer registo efetuado em consequência dos identificados negócios.
Alega que:
- foi sócio na sociedade C..., Lda., conjuntamente com os aqui primeiro e quarto Réus;
- a sociedade tinha o capital social de €52 373,76, dividido por seis quotas, três de €13 093,44 e três de €4 364,48, cabendo a cada um dos três sócios uma quota de cada um dos referidos valores;
- O objeto da sociedade era comércio de café, snack-bar, restaurante e churrasqueira e para a sua gerência foram designados todos os sócios, obrigando-se a mesma com a intervenção de dois gerentes em conjunto;
- em 24/04/2009 (com registo em 4/05/2009 e efeitos a partir desta data), o quarto Réu renunciou à gerência na sociedade e em .../.../2012 partilhou as suas quotas em processo de divórcio;
- os três sócios da sociedade foram gerentes de facto e de direito até 4/05/2009 e o Autor e o primeiro Réu foram-no a partir dessa data até à insolvência da sociedade, em 17/05/2013;
- ao longo dos últimos anos de atividade a sociedade foi acumulando débitos com o Estado, facto que era do conhecimento de todos os sócios e na altura em que o quarto Réu renunciou à gerência já existiam dívidas fiscais que eram do seu conhecimento e que se comprometeu a liquidar;
- em 2010, a sociedade foi notificada pela Autoridade Tributária para o pagamento de impostos em dívida, os quais em 9/11/2015 totalizavam €24 302,15;
- em face do não pagamento dos impostos pela sociedade, uma vez que não tinha património e estava insolvente, a Administração Fiscal iniciou um processo de reversão contra os sócios gerentes da mesma;
- o Autor e os primeiro e quarto réus foram notificados da reversão e nenhum exerceu o direito de resposta ou impugnou judicialmente a mesma tendo a reversão sido procedente e passaram os gerentes da sociedade a ser notificados pessoalmente para o pagamento da dívida;
- pela Administração Tributária foram penhorados ao Autor saldos bancários em montante superior a €15 000,00. Sucede que, sendo a responsabilidade pelo pagamento dos impostos solidária, só parte da responsabilidade lhe cabe, assistindo-lhe o direito de regresso contra os seus antigos sócios, os primeiro e quarto Réus;
- o Autor tentou saber que bens os seus antigos sócios possuíam antes de avançar com ação de regresso para lhe ser paga a quota-parte dos valores que cabem aos primeiro e quarto Réus, constatando que nada possuem;
- estes, no decurso dos processos de execução fiscal, coordenados entre si, alienaram todos os bens suscetíveis de penhora de forma a diminuírem a garantia patrimonial do crédito que sabiam que iria surgir pelo pagamento pelo Autor das dívidas fiscais contraídas por todos os sócios da sociedade;
- o quarto Réu, após a renúncia à gerência, sabendo da sua responsabilidade pelas dívidas fiscais da sociedade, conluiado com a quinta Ré, sua esposa, resolveu alienar o seu património através de partilha. Assim, dissolveram o seu casamento em processo de divórcio por mútuo consentimento e procederam à partilha do património conjugal, na qual indicaram como ativo um imóvel (casa de morada de família), participações sociais sujeitas a registo (as quotas que detinham na sociedade C..., Lda.) e o recheio da casa de morada de família, indicando como passivo um empréstimo do Banco Comercial Português no valor de €2 536,55. Alegadamente, o casal acordou a partilha com a adjudicação do imóvel, do recheio e do passivo à quinta Ré e das participações sociais ao quarto Réu, devendo este receber a título de tornas €14 885,85 que referiu ter recebido;
- é evidente que os quarto e quinto Réus nada quiseram partilhar;
- o quarto Réu não recebeu as tornas que declara ter recebido e a quinta Ré não as pagou;
- nessa partilha houve uma divergência intencional entre a vontade real e a vontade declarada, por acordo do casal e com o intuito de enganar o Autor e outros eventuais credores;
- os quarto e quinto Réus acordaram na partilha, mas sabiam que o quarto Réu, enquanto gerente da sociedade C..., Lda., era devedor à administração fiscal e que com a perda de todo o seu património por força da partilha diminuía totalmente a garantia patrimonial do crédito do fisco em primeira linha e do crédito do aqui Autor se revertido naquele;
- por outro lado, o único património do primeiro e segundo Réus era um prédio sito na Rua ..., em ..., ..., o qual decidiram “vender” ao seu filho, terceiro Réu;
- é também aqui evidente que os primeiro e segundo Réus nada quiseram vender e que o terceiro Réu nada quis comprar. Também não foi efetuado o pagamento de qualquer preço. Todos estes Réus sabiam das dívidas da sociedade à administração fiscal e tinham consciência da reversão que iria ocorrer;
- houve assim uma divergência intencional entre a vontade real e a vontade declarada, por acordo prévio entre os três primeiros Réus e com o intuito de enganar terceiro, ou seja, o Autor e outros credores, nomeadamente, a administração fiscal;
- os alegados vendedores e comprador sabiam que o primeiro Réu, enquanto gerente da sociedade C..., Lda.”, era devedor à administração fiscal e que este, com a perda de todo o seu património por força da venda realizada, diminuía de forma total a garantia patrimonial do crédito do fisco em primeira linha e do crédito do aqui Autor que inevitavelmente seria revertido naquele;
- em ambos os casos, se assim não se entender, considera estarem preenchidos os pressupostos da impugnação pauliana;
- efetivamente, os Réus sócios gerentes, utilizando negócios jurídicos, o primeiro a compra e venda e o quarto a partilha por divórcio, alienaram formalmente os únicos bens que possuíam;
- com essa alienação tornou-se impossível ao credor fiscal obter a satisfação integral do seu crédito, a qual neste momento está a obter do autor, penhorando-lhe todo o seu património por força da reversão da dívida para os sócios.
2. Citados, apenas os Réus EE e CC contestaram.
Alegam que:
- em finais de abril, princípios de maio de 2009, a sociedade C..., Lda., atravessava as dificuldades normais que, nessa altura, afetaram a generalidade das atividades comerciais e em especial a restauração;
- o quarto Réu, ao final de cada mês, não retirava qualquer remuneração, por forma a que a sociedade pudesse enfrentar as dificuldades e cumprir as obrigações perante fornecedores;
- nessa altura a sociedade não tinha débitos significativos, nem perante os fornecedores, nem perante a Fazenda Nacional e Segurança Social;
- na data da sua renúncia à gerência o quarto Réu nada devia à sociedade ou aos outros sócios e não se comprometeu a pagar as dívidas da sociedade, tanto mais que desconhecia a existência concreta das mesmas;
- igualmente desconhece a existência de processos de reversão contra os sócios da sociedade, para os quais não foi notificado, sendo que aqueles que o Autor refere são reportados a impostos do ano de 2012, contra si não existe processo de reversão;
- também não está alegada e muito menos demonstrada a existência de qualquer crédito do Autor, pelo que não lhe assiste o direito de regresso que invoca;
- o divórcio do quarto Réu e da quinta Ré e a partilha subsequente não lesou o Autor e, por isso, este não foi enganado;
- por outro lado, o Autor não interveio como simulador em nenhum ato e não é um herdeiro legitimário que pretenda agir em vida do Autor de sucessão, pelo que não tem legitimidade para arguir a nulidade por simulação que, aliás, não existe;
- acresce que nunca o quarto Réu seria responsável pelo pagamento de dívidas da sociedade em reversão, pois a gerência de facto do estabelecimento esteve sempre nas mãos dos outros sócios, o Autor e o primeiro Réu;
- entre o quarto e quinto Réus não houve qualquer conluio com intenção de prejudicar o Autor;
- o quarto Réu não tinha possibilidades económicas de adjudicar a habitação e pagar pensão à quinta Ré e esta, por seu turno, não pretendia ver-lhe adjudicadas as quotas. A habitação e o passivo relativo à sua aquisição foram adjudicados á quinta Ré e, em contrapartida, a mesma prescindiu do direito a alimentos. Concorreu também para a formação dos respetivos quinhões a adjudicação dos bens móveis;
- o autor carece de legitimidade para propor a presente ação, por não ter sido alegado nem demonstrado qual o crédito que detém sobre os contestantes, não estando, de igual forma, preenchidos os requisitos de que depende a admissibilidade da ação de impugnação pauliana;
3. Notificado para o efeito, o Autor veio responder à matéria de exceção invocada pelos quarto e quinto Réus na contestação, pugnando pela improcedência da mesma.
4. Foi realizada audiência prévia, tendo-se decidido pela improcedência da exceção de ilegitimidade ativa invocada pelos quarto e quinto Réus, após o que se procedeu a fixação do...
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