Acórdão nº 2952/15.7T8FNC.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 14-12-2021

Data de Julgamento14 Dezembro 2021
Case OutcomeNEGADA A REVISTA (RECURSO DE REVISTA REGIME REGRA); REMETER À FORMAÇÃO (RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL)
Classe processualREVISTA
Número Acordão2952/15.7T8FNC.L2.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I – Relatório

1. AA propôs ação declarativa com forma comum contra BB (1.º Réu) e CC (2.º Réu), em que peticionou a condenação dos réus a pagar-lhe, solidariamente, as seguintes quantias:

a) €200.000,00 (duzentos mil euros), acrescidos de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até efetivo pagamento, pela perda do direito à vida do seu filho;

b) €30.000,00 (trinta mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos pelo autor, em consequência da morte do seu filho DD, acrescidos de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento;

c) €36.000,00 (trinta e seis mil euros) a título de danos patrimoniais sofridos, acrescidos de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento;

d) €2.455,50 (dois mil quatrocentos e cinquenta e cinco euros e cinquenta cêntimos) a título de despesas suportadas com o funeral, acrescidas de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a citação e até integral e efetivo pagamento.

2. Por acórdão transitado em julgado, os réus foram condenados, em co-autoria, pela prática do crime de homicídio qualificado de que foi vítima DD, filho do autor; o autor sofreu uma grande dor e desgosto com a morte de DD, passando a padecer de uma depressão; o falecido DD vivia com os seus pais, contribuindo mensalmente com €300, 00, para as despesas da casa; com o falecimento de DD o Autor deixou de dispor de meios para prover a todas as despesas, uma vez que está desempregado; o autor gastou € 2.455,50 em flores e preparativos do funeral do seu filho DD; o mencionado DD faleceu no estado de solteiro e sem deixar descendentes, sucedendo-lhe como únicos herdeiros os seus pais, AA e EE.

3. O 1 ° réu apresentou contestação, impugnando a factualidade alegada pelo autor, pugnando pela improcedência da ação, com a consequente absolvição do pedido; invocou, nomeadamente, que os factos alegados pelo autor “não estão provados e não está dispensada a prova dos factos invocados” (art. 12º da contestação).

O 2° réu aderiu e fez sua a contestação apresentada pelo co-réu BB – cfr. fls. 239.

4. Foi proferido o despacho de fls. 253-254, em 03-05-2016, na sequência do qual as partes se pronunciaram conforme consta de fls.255, 256 e 257.

Em 21-11-2016 dispensou-se a realização de audiência prévia e proferiu-se despacho saneador, julgando-se verificados todos os prossupostos processuais, com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova (despacho de fls. 260-261).

Posteriormente e em face da reclamação apresentada pelo autor foi proferido o despacho de fls. 280-281, em 28-03-2017, na sequência do qual foi realizada a audiência prévia, em 19-04-2017, conforme ata de fls. 282 a 289 dos autos [1].

5. Realizou-se a audiência final, em 24-10-2017.

No início da audiência o réu CC fez juntar procuração forense outorgada a favor da mandatária FF, pela qual lhe atribui poderes forenses para o representar (fls. 376) na sequência do que foi proferido despacho julgando cessada a intervenção da patrona nomeada, GG, mais se determinando que fica “a mesma dispensada de estar presente na presente audiência” (fls. 378 dos autos)[2].

Tendo-lhe sido concedida, no seu uso disse o seguinte:

«Corroboro o quanto foi dito no requerimento que antecede pelo meu Ilustre colega Dr. HH e reforço o quanto referido, acrescentando que desde que a Defensora Oficiosa foi nomeada ate à presente data, houve sempre impedimento da mesma para representar o Réu CC, impedimento esse que está consignado no artigo 94º, nº 6, do Estatuto da Ordem dos Advogados, porquanto a defensora, Dra. GG, exerce actividade no mesmo escritório do Dr. II, Ilustre Advogado e que foi advogado da família da vitima no âmbito do processo-crime, bem como no pedido de indemnização cível enxertado nos autos de processo crime, nº 78/12...., que correu termos no Tribunal Judicial de ... - ... Juízo.

Sublinhe-se que o nº 6 da citada norma estatutária tem no seu propósito prevenir situações que, em abstracto, potenciem e no caso concreto não há dúvida que efectivaram a afectação independência a isenção bem como violação do segredo profissional da advogada e tal resultou notório na audiência preliminar em que a Advogada/Defensora interveio contra os interesses do Réu nos termos do que encontra gravado.

Tal artigo 96º, nº 6, também tem como propósito evitar situações de indefesa material, pelo que, com a actuação perpetrada foram lesados os artigos 4º do Código de Processo Civil, o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia do Direito do Homem, artigo 47º paragrafo 1º e 2º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, pelo que, atento o quanto exposto em nome do estado de direito e em respeito pelo principio da dignidade da pessoa humana, não resta outra alternativa ao Tribunal, que não a declaração de nulidade de todos os actos praticados pela defensora, bem como conceder ao Réu a prorrogativa de exercer toda a sua defesa que, a partir da nomeação da sua defensora não foi efectuada, nomeadamente, complementar o requerimento de prova.

Frise-se que a defensora jamais por momento algum, conforme nos foi referido pelo Réu e que é facilmente aferido nos registos do Estabelecimento Prisional, para questioná-lo acerca de indicação probatórias, tendo a defensora indicado duas testemunhas, cujo depoimento é ante visivelmente desfavorável ao Réu.

Pede-se deferimento”».

Pela FF foi dito que “substabelece no Dr. HH, com reserva, os poderes que lhe foram conferidos pelo réu CC, ao abrigo da procuração junta aos autos”.


Após o que pelo mandatário Dr. HH, foi peticionado como segue:

“O Reu, CC retira a eficácia aos actos praticados pela sua Defensora Oficiosa que esteve presente em situação de indiciada incompatibilidade, não o consultou quanto à prova a produzir ou à matéria em debate fazendo da sua presença uma situação de ausência material de defesa efectiva até agora e que assim se põe termo”.


Mais foi consignado em ata como segue:

“De seguida, pela Ilustre Mandatária Dra. FF, foi pedida a palavra, tendo-lhe sido concedida, no seu uso disse o seguinte:

Corroboro o quanto foi dito no requerimento que antecede pelo meu Ilustre colega Dr. HH e reforço o quanto referido, acrescentando que desde que a Defensora Oficiosa foi nomeada ate à presente data, houve sempre impedimento da mesma para representar o Réu CC, impedimento esse que está consignado no artigo 94º, nº6, do Estatuto da Ordem dos Advogados, porquanto a defensora, Dra. GG, exerce actividade no mesmo escritório do Dr. II, Ilustre Advogado e que foi advogado da família da vitima no âmbito do processo-crime, bem como no pedido de indemnização cível enxertado nos autos de processo crime, nº 78/12...., que correu termos no Tribunal Judicial de ... - ... Juízo.

Sublinhe-se que o nº 6 da citada norma estatutária tem no seu propósito prevenir situações que, em abstracto, potenciem e no caso concreto não há dúvida que efectivaram a afectação independência a isenção bem como violação do segredo profissional da advogada e tal resultou notório na audiência preliminar em que a Advogada/Defensora interveio contra os interesses do Réu nos termos do que encontra gravado.

Tal artigo 96º, nº6, também tem como propósito evitar situações de indefesa material, pelo que, com a actuação perpetrada foram lesados os artigos 4º do Código de Processo Civil, o artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia do Direito do Homem, artigo 47º paragrafo 1º e 2º da Carta dos Direitos

Fundamentais da União Europeia, pelo que, atento o quanto exposto em nome do estado de direito e em respeito pelo princípio da dignidade da pessoa humana, não resta outra alternativa ao Tribunal, que não a declaração de nulidade de todos os actos praticados pela defensora, bem como conceder ao Réu a prorrogativa de exercer toda a sua defesa que, a partir da nomeação da sua defensora não foi efectuada, nomeadamente, complementar o requerimento de prova.

Frise-se que a defensora jamais por momento algum, conforme nos foi referido pelo Réu e que é facilmente aferido nos registos do Estabelecimento Prisional, para questioná-lo acerca de indicação probatórias, tendo a defensora indicado duas testemunhas, cujo depoimento é ante visivelmente desfavorável ao Réu.

Pede-se deferimento”.

Foi de seguida proferido o seguinte despacho:

“O Réu, CC, esteve até ao momento regularmente representado pela advogado nos presentes autos, o qual representou-o nas diligências já efectuadas, tendo apresentado requerimento probatório oportunamente, não tendo sido invocado qualquer irregularidade nessa representação aquando da prática de tais actos ou do conhecimento dos mesmos, não tendo sido apresentada qualquer prova do ora alegado por forma a demonstrar os fundamentos do incidente, razão pela qual se indefere a requerida ineficácia dos actos praticados pela referida defensora, sem prejuízo de eventual responsabilidade que se venha a apurar em termos disciplinares em sede própria.

Mais se diz que o referido Réu não está impedido de requerer a substituição das testemunhas que foram arroladas pela sua patrona, verificados os pressupostos legais, caso os seus novos representantes nestes autos assim o entendam conveniente para a sua defesa.

Em face do exposto indefere-se o requerido.

Notifique”.

Após o que a FF, formulou o seguinte requerimento:

“A prova do domicílio profissional da advogada/defensora oficiosa encontra-se documentada nos presentes autos. A coincidência da morada profissional da mesma com a do Defensor Oficioso da vítima na acção do processo-crime é facilmente e aferível pelo tribunal agora, neste momento, se assim o entender, através de mera consulta...

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