Acórdão nº 29492/21.2T8LSB.L2-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 04-07-2024

Data de Julgamento04 Julho 2024
Número Acordão29492/21.2T8LSB.L2-2
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes da 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa que compõem este coletivo:

I - RELATÓRIO

1.1– Os autores A e B, identificados nos autos, instauraram em 13-12-2021, a presente ação comum contra o réu Condomínio C, relativo ao prédio constituído em propriedade horizontal situado na Rua …, nº …, e Rua…, nº …, peticionando:
- A declaração de nulidade da deliberação da assembleia do condomínio C, de 21-10-2021, constante do ponto 1, ata 57;
- Cumulativamente, a declaração de anulabilidade de tal deliberação.
Fundamentaram os pedidos no facto de o conteúdo da referida deliberação ser contrário à lei, dado não ser permitido peticionar à parte contrária o pagamento de honorários de advogado, a ação subjacente a tal deliberação não ter sido intentada contra os anteriores administradores de condomínio nessa qualidade, e por versar sobre assunto que não constava expressamente da respetiva ordem de trabalhos.
1.2 – Regularmente citado, o réu apresentou contestação, tendo excecionado a sua ilegitimidade passiva, considerando, para tanto, que nos termos do disposto no artigo 1433º, nº 6, CC a ação deveria ter sido instaurada contra todos os condóminos que aprovaram a deliberação impugnada.
O réu apresentou ainda defesa por impugnação, concluindo, para o caso de não proceder a exceção de ilegitimidade arguida, que a ação deveria ser julgada improcedente.

1.3 – Respondendo ao convite que lhes foi dirigido, os autores pronunciaram-se sobre a exceção de ilegitimidade, pugnando pela sua improcedência (requerimento de 08-06-2022 – referência 42524982);

1.4 – Realizou-se a audiência prévia, na qual foi afirmada a regularidade da instância e julgada improcedente a exceção de ilegitimidade passiva. Foi ainda identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova

1.5 – Tendo as partes comunicado e documentado a existência de uma nova deliberação de ratificação da deliberação que se encontra em discussão nos autos, tomada em Assembleia de Condóminos de 05-04-2022, não impugnada, foi proferida decisão que julgou a instância extinta por inutilidade superveniente da lide (decisão de 15-03-2023 - referência 42367205).

1.6 – Não se conformando com tal decisão, os autores da mesma interpuseram recurso para este Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do qual foi proferido acórdão em 13-07-2023, já transitado em julgado, que, revogando a decisão recorrida, determinou que os autos prosseguissem, com a produção de prova e a prolação de decisão final.

1.7 – Foi, de seguida, agendada e realizada audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que absolveu o réu dos pedidos formulados.

2 - Não se conformando com a decisão proferida, os autores da mesma interpuseram recurso, pugnando pela sua revogação e substituição por outra que julgue a ação procedente, solicitando ainda a correção de erro de escrita do seu dispositivo, na parte em que, por manifesto lapso, menciona que a ação é julgada procedente.
Os recorrentes concluíram as suas alegações com as seguintes conclusões:
“1ª – Não é aceitável que, na presente ação, seja dado como provado o fundamento apresentado na ação de indemnização, que os Recorrentes intentaram contra ex-administradores do Recorrido, julgada improcedente (“os Autores demandaram os ali Réus por atos praticados no estrito cumprimento das suas funções de administradores, de acordo com o mandato recebido dos demais condóminos, que lhes cabia executar e em conformidade com a posição das administrações anteriores, consentânea com a tradição das assembleias de condóminos”):
2ª – A abrangência, claramente redundante dessa narrativa está em contradição com o previsto artigo 5º, nº 1, do Regulamento do Condomínio, onde, sem reserva, portanto, imperativamente, se transcreve o art.º 1424º, nº 1, do Código Civil, dispondo: “As despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos Condóminos na proporção do valor das suas frações.”;
3ª – E, no que respeita às funções da administração do Condomínio, entre outras e além das que licitamente lhe sejam atribuídas pela assembleia, apenas lhe cabe, no caso de incumprimento, “Exigir dos condóminos a sua quota parte nas despesas aprovadas, com as implicações previstas na parte final do nº 5 do artigo 15º do referido Regulamento (”As despesas de cobrança coerciva, incluindo despesas judiciais, honorários do advogado e outras, serão também da conta do Condómino devedor.”);
4ª – A inobservância das referidas disposições evidencia que aqueles ex-administradores do Recorrido, a pretexto do exercício das sua funções, portanto, sem a necessária aprovação, no caso, inexistente até à data da propositura da presente ação, exorbitaram ao exigir dos Recorrentes o pagamento de despesas judiciais, às quais atribuíram o elevado valor de 17.263,95€ e que depois incluíram nas contas do exercício do ano de 2014;
5ª – Nessa circunstância, porque lesados pela publicidade a que aqueles ex-administradores assim deram causa, alegadamente atentatória do seu bom nome, os Recorrentes intentaram a identificada ação;
6ª – E já antes, alguns Condóminos, incluindo os Recorrentes, opuseram-se a deliberações que, em diversas circunstâncias, imputaram a Condóminos despesas judiciais fora do âmbito de incumprimento relativo à sua quota parte nas despesas comuns;
7ª – Conforme consta da deliberação de 31.01.2017, a que se refere a Ata 45, junta com o requerimento de 21.12.2022, a administração então em exercício apresentou parecer jurídico do Ilustre Advogado Dr. MM, onde se conclui não haver fundamento para pedir aos Autores o pagamento da referida quantia;
8ª - Aliás, enfrentando essa administração, nessa ocasião, protestos de um grupo de condóminos, com destaque para a intervenção, escrita em 7 páginas, assinada pelo condómino Sr. Dr.D., Juiz Conselheiro jubilado;
9ª – E sobre essa mesma incidência, conforme consta da Ata 47, (documento 7º, junto com a petição inicial), a assembleia de condóminos, realizada em 27.05.2017, firmou alguns critérios, nomeadamente nos seguintes termos: ““(…) a norma não pode ser aplicada fora deste âmbito”; “(…) só em casos de incumprimento do Condómino se poderá pedir o pagamento das despesas efetuadas pelo Condomínio”; “Caso a ação em Tribunal seja colocada à figura do administrador, a mesma deve ser suportada pelo Condomínio, o contrário deve ocorrer caso se trate de uma ação a título pessoal contra um condómino que seja a administrador”;
10ª – A douta sentença recorrida não se confina a esses critérios e, na Fundamentação de Direito, refere que “É entendimento da jurisprudência e doutrina maioritária que no caso em que as deliberações tomadas em assembleia violem preceitos de natureza imperativa, que visem proteger interesses e a ordem pública ou que exorbitem os poderes da assembleia, o vício será de nulidade (…)”;
11ª – Contudo, a Meritíssima Juíza “a quo” não atende à alegação dos Recorrentes, na petição inicial, no que concerne a não lhes ser exigível o pagamento de honorários, na parte que exceda o indicado em custa de parte, conforme dispõem os art.ºs 533º, nº 3, do Código de Processo Civil e 26º, nº 3, alínea c) do Regulamento das Custas Processuais;
12ª – E, ao abrigo do princípio da liberdade contratual entende que a assembleia “(…) pode deliberar noutro sentido e atribuir ao condómino o pagamento das despesas de custas e honorários com advogado, quando aquele dá causa à ação judicial respetiva”. E que “Tal deliberação representa uma norma que se enquadra na esfera de poderes conferidos à Assembleia de Condóminos por estar ainda em causa uma deliberação sobre pagamento de despesas efetuadas no interesse comum, sem constituir qualquer abuso de direito (…)”;
13ª – Salvo o devido respeito, não se admite que, no caso concreto, sejam afastadas as citadas normas da lei e do Regulamento do Condomínio, onde, até para acautelar procedimento de grupo minoritário de condóminos, consta uma norma travão, conforme dispõe o seu artigo 20º, nos seguintes termos: “Este Regulamento só poderá ser alterado mediante deliberação da Assembleia de Condóminos, com a maioria de cinquenta vírgula um por cento do capital investido”;
14ª – E, como se prova pela Ata da assembleia de condóminos donde dimana a deliberação impugnada (documento 6º, junto com a petição inicial), a mesma reuniu com a presença de 365,50/1000 do capital investido. Portanto, sem quórum suficiente para legitimamente alterar normas do próprio Regulamento, designadamente no tocante a repartição de despesas entre Condóminos, para as atribuir a um só Condómino;
15ª - A douta sentença recorrida dá por provado ter a Assembleia de Condóminos de 05.04.2022 (ata 58), ratificado a deliberação da Assembleia de Condóminos de 21.10.2021 (ata 57), “(…) no sentido de mandatar a administração para exigir ao condómino do 8º C, Sr. E., o pagamento do valor de €7.470,21, correspondente aos custos suportados pelo condomínio com os honorários dos condóminos que foram demandados pelo primeiro (…), por causa do exercício das suas funções como administradores (…)” E que “Os Autores não impugnaram judicialmente esta deliberação”;
16ª – Importa por isso salientar que essa 2ª deliberação enferma do vício apontado á 1ª deliberação, ou seja, a alegada nulidade, razão pela qual não se justificava que fosse impugnada judicialmente ou para dela conhecer se requeresse ampliação, na presente ação; Como se considerou, a dita ratificação é simplesmente repetitiva;
17ª – Pelo modo como a Meritíssima Juíza “a quo” admite o uso da liberdade contratual, a matéria de facto, na presente ação, salvo o devido respeito, está incorretamente apreciada e revela contradição com as normas aplicáveis, levando a que ocorra grave erro de julgamento;
18ª – Concretamente, o ponto 6 dos factos provados, mostra-se
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