Acórdão nº 28842/21.6T8LSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 28-06-2023

Data de Julgamento28 Junho 2023
Case OutcomeREVISTA IMPROCEDENTE.
Classe processualREVISTA (COMÉRCIO)
Número Acordão28842/21.6T8LSB.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça




Proc. nº 28842-21.6T8LSB.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção):

*

IAA intentou acção declarativa com processo comum contra “Banco Santander, SA”.
Alegou o A., em resumo:
A R. detém uma participação superior a 99,85% do capital social da sociedade “Santander Totta, S.G.P.S., S.A.”, sociedade de que o A. é accionista minoritário, detendo 116.908 valores mobiliários representativos do seu capital.
O A., por escrito, exigiu à R. que esta lhe fizesse uma oferta de aquisição daqueles valores mobiliários o que a R. recusou.
O A., enquanto acionista minoritário, tem direito de exigir a aquisição pela R. das acções por si detidas a um preço justo a fixar, nos termos previstos no art. 490.º do C.S.C..
Formulou o A. o seguinte pedido:
«1. Que ao Autor seja reconhecido o direito de alienação potestativa dos valores mobiliários representativos do capital da sociedade Santander Totta, SGPS, S.A. que detém, nos termos e para os efeitos conjugados do artigo 490 (5) (6) do CSC.
2. Que a Ré seja condenada a ver reconhecido esse direito.
3. Que ao Autor seja reconhecida a possibilidade de produzir os efeitos jurídicos da alienação potestativa previstos no artigo 490 (6) do CSC perante a Ré relativamente dos valores mobiliários representativos do capital da a sociedade Santander Totta, SGPS, S.A. que detém e sobre os quais exigiu a oferta prevista no artigo 490(5) do CSC.
4. Que a Ré se sujeite aos efeitos do exercício do supra referido direito potestativo e em consequência seja condenada a adquirir ao Autor os valores mobiliários representativos do capital da sociedade Santander Totta, SGPS, S.A. que este seja titular, na quantidade de 116.908 ações, nos termos e para os efeitos do artigo 490 (6) do CSC, ao preço fixado pelo tribunal, tendo como referência o valor justo apurado na perícia colegial requerida a que se deve somar os dividendos distribuídos e não pagos (ex dividend) e diminuído do valor de dividendos aprovados para distribuir no curto prazo mais ainda não distribuídos e pagos (cum dividend), caso tais efeitos não tenham sido considerados no valor justo determinado pela perícia.
5. Que o valor justo da sociedade Santander Totta seja determinado por perícia judicial, a ser realizada por três Revisores Oficiais de Contas por forma a determinar o valor justo que o Autor deve receber como contrapartida pelos valores mobiliários a alinear potestativamente, o qual deste momento desconhece e não tem forma de conhecer».
A R. contestou, invocando factualidade que, em seu entender, afastaria o direito invocado pelo A., defendendo a inaplicabilidade ao caso do art. 490.º do CSC e o não preenchimento dos requisitos do mesmo artigo, aludindo designadamente ao âmbito de aplicação espacial do art. 490 do CSC (definido pelo art. 481) que não abrangeria o caso dos autos, bem como invocando o abuso de direito por parte do A..
Concluiu pela improcedência da acção.
No saneador, o Tribunal de 1ª instância, decidiu nos seguintes termos:
«Julga-se a presente ação improcedente e, em consequência, decide-se, absolver a ré BANCO SANTANDER, S.A. do pedido contra si deduzido pelo autor AA».
O A. interpôs recurso “per saltum” para o STJ, formulando na alegação de recurso oferecida as conclusões que se seguem:
«1. O autor interpõe o presente recurso da douta sentença proferida pelo tribunal a quo, que ponderada toda a matéria de facto e de direito, decidiu que a presente ação é improcedente e, em consequência, decidiu absolver a ré do pedido contra si deduzido.
2. O tribunal a quo entende que o regime da previsto no artigo 490 do CSC não tem aplicação no caso dos autos força do disposto no artigo 481 do mesmo diploma, considerando que a sociedade detentora da maioria das participações do capital social da sociedade dominada tem sede em Espanha.
3. Por conseguinte, entende o tribunal, que não assiste ao autor, ora recorrente, o direito de alienação potestativa conferido pela aludida norma, designadamente no artigo 490 (5), do CSC.
4. O presente recurso vem na modalidade da revista per saltum, por recair apenas sobre a matéria de direito, o que é feito nos termos e ao abrigo nos artigos 627, 629 (1), 631,637, 639, 672, 675, 678 (1), aplicável ex vi artigo 644 (1,a) e 678 (3), todos do CPC.
5. O recorrente tem legitimidade para interpor o presente recurso acompanhado das respetivas alegações sob a matéria de direito (cf. artigo 631 do CPC) e está em tempo de o fazer (cf. artigo 638 do CPC).
6. Os factos assentes são os que consta em §3 supra, para onde se remete e aqui se dão como reproduzidos, mas que resumidamente sustentam que a ré, sociedade constituída e com sede em Espanha, detém mais de 90 % do capital social da sociedade dominada, constituída e com sede em Portugal, e que o autor, ora recorrente, exigiu, por escrito, que a ré, ora recorrida, lhe fizesse uma oferta nos termos no artigo 490 (5), do CSC, a qual foi recusada.
7. Sendo, portanto, o exercício do direito de alienação potestativa nos termos do artigo 490 (5), do CSC, que se discute nesta ação.
8. O recorrente, mui respeitosamente, discorda da douta sentença pelas razões vertidas nos § 4 supra, para onde se remete para uma completa compreensão e evitando aqui uma repetição fastidiosa e prolixa do que ai se encontra de forma resumida.
9. Mas que, resumindo, se estriba no facto de não concordar com a interpretação de que o artigo 481 (2), do CSC, impeça operar o direito contido no artigo 490 (5), do CSC, quando a sociedade dominante tenha sede no estrangeiro.
10. Pelo contrário, entende o recorrente, que, para efeitos da aplicação do artigo 490 (5), do CSC, impõe-se proceder à interpretação corretiva do artigo 481 (2), do CSC, no sentido que basta que uma das sociedades em causa tenha uma ligação espacial com o território nacional, com acontece com a sociedade dominada, não sendo exigido que a sociedade dominante tenha sede em Portugal.
11. O recorrente requer ainda o reenvio prejudicial, tudo nos termos do §5 supra, com força obrigatória conferida pelo artigo 267 § 3, do TFUE, para que o TJUE interprete, a titulo prejudicial, o artigo 18, do TFUE, no sentido de questionar esse tribunal se tal norma de direito da União Europeia se opõe-se à interpretação de uma norma de direito nacional de um Estado Membro que seja discriminatória entre grupos nacionais e grupos estrangeiros, como é o caso do artigo 481 (2), do CSC para efeitos de aplicação do artigo 490 (5), do CSC».
Contra alegou a R., dizendo que o fazia com ampliação do objecto do recurso apresentando as conclusões que se transcrevem:
«1. O RECORRIDO detém mais de 99% do capital social da sociedade Santander Totta, SGPS, S.A.
2. O RECORRENTE propôs a presente acção contra o RECORRIDO para, na qualidade de titular de 116.908 acções da sociedade Santander Totta, SGPS, S.A., requerer a condenação do RECORRIDO no reconhecimento do seu pretenso direito de alienação potestativa dessas acções, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 5 e 6 do artigo 490.º do CSC.
3. O Tribunal recorrido considerou que o artigo 481.º, n.º 2 do CSC impedia a aplicação do regime previsto no invocado artigo 490.º do CSC ao RECORRIDO, dado que a sua sede está localizada em ..., Espanha, e, como tal, julgou improcedente a acção.
4. O RECORRENTE alega que o Tribunal a quo deveria ter procedido a uma interpretação correctiva do artigo 481.º, n.º 2 do CSC, no sentido de que, para efeitos do disposto no artigo 490.º do CSC, não é exigível que a sociedade dominante tenha sede em Portugal, bastando que uma das sociedades em questão tenha uma ligação espacial com o território nacional.
5. O RECORRENTE alega ainda que a interpretação sufragada pelo Tribunal recorrido é incompatível com os artigos 13.º e 81.º, n.º 1, alínea e), da CRP e com o artigo 18.º do TFUE, requerendo o reenvio prejudicial com força obrigatória desta questão para o TJUE, nos termos do artigo 267.º § 3, do TFUE.
6. As alegações do RECORRENTE carecem de fundamento e são improcedentes em toda a sua extensão.
7. No caso concreto, o STJ não deverá proceder ao reenvio prejudicial para o TJUE da questão suscitada pelo RECORRENTE, ao abrigo da doutrina do «acte éclairé» e da doutrina do «acte clair».
8. A questão da não aplicação do Título VI do CSC português a entidades com sede noutro Estado-Membro já foi decidida anteriormente pelo TJUE no Acórdão “Impacto Azul”( C-186/12 – Impacto Azul, ECLI:EU:C:2013:412).
9. A interpretação dos artigos 481.º e 490.º do CSC sufragada pelo RECORRENTE é, ela sim, susceptível de fazer incorrer o STJ na obrigação de realizar o reenvio prejudicial de uma questão – diferente daquela que é colocada pelo RECORRENTE – para o TJUE
10. A aplicação do regime do artigo 490.º do CSC a sociedades com sede no estrangeiro configuraria uma restrição à liberdade de estabelecimento e uma afronta ao artigo 49.º, n.º 1, do TFUE.
11. Não se pode proceder a uma interpretação correctiva do artigo 481.º, n.º 2, do CSC, de modo a que este passe a dispor que o Título VI do CSC se aplica a entidades estrangeiras, dado que tal seria totalmente contrário ao elemento literal, histórico e sistemático da norma.
12. Ao proceder-se à referida interpretação correctiva incorrer-se-ia numa inconstitucionalidade por violação do princípio da segurança jurídica e tutela da confiança, previsto no artigo 2.º da CRP.
13. O artigo 490.º do CSC apenas se aplica aos casos em que a detenção de 90% ou mais do capital social é superveniente e não aos casos em que a sociedade é constituída com essa configuração.
14. O Santander Totta SGPS, S.A. foi, desde a sua constituição, detido a mais de 90% pelo RECORRIDO, pelo que nunca lhe seria aplicável ao disposto no artigo 490.º do CSC.
15. De modo a evitar que o RECORRENTE pudesse evitar numa posição minoritária no capital social do Santander Totta, SGPS, S.A., foram-lhes feitas três ofertas, que o RECORRENTE
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT