Acórdão nº 2834/18.0T8STR.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 10-01-2023

Data de Julgamento10 Janeiro 2023
Case OutcomeNEGADA
Classe processualREVISTA
Número Acordão2834/18.0T8STR.E1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I

Município de Tomar intentou contra AA, BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK e LL (1ºs RR.) e LEGESPA, S.A., acção declarativa, com processo comum, pedindo que seja decretado:

«i. O reconhecimento do direito de preferência da Autora na aquisição do imóvel em causa, com declaração de invalidade da escritura pública de compra e venda do imóvel entre Primeiros Réus e Ré Adquirente;

E, em consequência,

ii. A transmissão do bem imóvel em causa a favor da Autora, substituindo a sentença à vontade dos Primeiros Réus e da Ré Adquirente;

iii. O cancelamento do registo predial de aquisição do imóvel a favor da Ré Adquirente e a determinação de registo predial de aquisição do imóvel a favor da Autora com efeitos à data da outorga da escritura pública de compra e venda entre Primeiros Réus e Ré Adquirente;

iv. A nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre a Ré Adquirente e a Autora por impossibilidade de objeto (ausência de direito);

v. A condenação da Ré Adquirente a restituir à Autora todas as rendas recebidas ao abrigo do contrato de arrendamento previsto na alínea anterior (alínea iv), bem como outras quantias que desta ou de terceiro tenha recebido por virtude ou decorrência da sua condição de proprietária, acrescidas de juros vencidos e vincendos à taxa legal em vigor».

Alegou o A. ter o direito de preferência na aquisição do prédio urbano sito em Tomar (identificado no art. 20º da p.i.), vendido pelos 1.ºs RR. à R. LEGESPA, S.A., em 11-05-2018, estribando-se na sua qualidade de arrendatário desde 1964.

Invocou, ainda, por decorrência do reconhecimento da violação do seu direito de preferência e consequente registo do mesmo a seu favor, com o cancelamento do registo de aquisição a favor da Adquirente Ré, a nulidade do contrato de arrendamento celebrado entre a Ré adquirente e o A., por carecer de objecto, pois que a adquirente deixa de ter a qualidade (putativa) de proprietária do bem em causa.

Contestaram os 1ºs RR., deduzindo a excepção de caducidade do direito de accionar e alegando, sem prescindir disso, a inexistência do direito legal de preferência e o não exercício atempado do direito convencional de preferência.

Depois de, ainda, impugnarem parte da factualidade alegada pelo A., concluíram pela improcedência da acção.

Contestou também a R. LEGESPA, S.A., defendendo a caducidade do direito de acção e a inexistência do direito legal de preferência.

Concluiu, após impugnação de factualidade da petição inicial, pela improcedência da acção.

O A. respondeu, em 11-09-2019, batendo-se pela improcedência das excepções deduzidas e pugnando pela existência de outros (para além do que invocara na petição inicial) fundamentos do direito de preferência, sustentado nos vários preceitos legais que aí enuncia.

Foi proferido saneador-sentença, que julgou verificada a caducidade do direito do Autor e a inexistência do direito legal de preferência, improcedendo, assim, a acção.

Inconformado, o A. recorreu para o Tribunal da Relação de Évora, que revogou a sentença relativamente à questão da caducidade, julgando improcedente o recurso quanto ao mais decidido em 1.ª Instância, em consequência do que confirmou a improcedência da acção.

Tendo o A., na resposta à contestação, invocado, conforme se referiu, o direito legal de preferência com fundamentos diferentes do que fora alegado na petição inicial, arguiu, no recurso de apelação, a omissão de pronúncia da 1ª Instância quanto a esse aspecto, o que motivou a seguinte apreciação pelo Tribunal da Relação:

«Em 1.ª Instância não foram apreciados os direitos legais de preferência invocados pelo Recorrente para além daquele que está consagrado no art. 1091.º do CC. Trata-se do direito de preferência estabelecido no artigo 126.º do DL n.º 380/99, de 22 de setembro, por o edifício se situar nas áreas do plano com execução programada, i.e., no âmbito do plano de pormenor do Centro Histórico de Tomar; do direito de preferência para fins e objetivos de política pública estabelecido no artigo 29.º da Lei n.º 31/2014, de 30 de Maio, Lei de bases gerais da política pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo; do direito legal de preferência consagrado no artigo 58.º do DL n.º 307/2009, de 23 de Outubro; do direito legal de preferência consagrado na Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, nas transmissões a título oneroso para os imóveis classificados ou em vias de classificação ou imóveis localizados nas respetivas zonas de proteção.

Tais direitos, para além de contenderem com a natureza pública do Recorrente e com relações de índole administrativa, foram invocados apenas na resposta apresentada pelo A às exceções invocadas pelos RR. Na petição inicial tais direitos legais de preferência não foram trazidos à colação para sustentar a pretensão deduzida, nem nela foram carreados factos atinentes ao imóvel, à respetiva localização e situação jurídica de modo a aferir a subsunção do caso aos diversos regimes jurídicos invocados.

Na medida em que na petição inicial o Recorrente apenas se arrogou do seu direito de preferência na qualidade de arrendatário, a invocação posterior dos demais direitos legais de preferência configura alteração da causa de pedir. Alteração essa que se afigura inadmissível à luz do disposto no art. 265.º do CPC.

Não cabe, pois, apreciar os referidos direitos legais de preferência no âmbito deste processo.»

Irresignado com o acórdão da Relação, o A. interpôs recurso de revista excepcional para este Supremo Tribunal, ao abrigo do disposto no art. 672.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), do CPC, concluindo as suas alegações pela seguinte forma:

«A. O presente Recurso de Revista vem interposto do Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, em 09.09.2021, que decidiu confirmar parcialmente a Sentença proferida em 27.10.2020, e o seu objeto encontra-se restringido aos segmentos decisórios constantes de fls. 22 a 27, do Acórdão sob revista (cf. n.º 2, do artigo 635.º, do CPC).

B. O Recorrente tem legitimidade, está em tempo, e encontram-se reunidos os requisitos estabelecidos na Lei Processual Civil para a interposição de recurso em geral (cf. artigos 629.º, n.º 1, do CPC), e da revista excecional consagrada no artigo 672.º do CPC,

C. Pois que não só estamos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, torna a presente revista de importância fundamental (cf. alínea a), do n.º 1, do artigo 672.º, do CPC),

D. Como perante um quadro em que a revista é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito (cf. alínea b), do n.º 1, do artigo 672.º, do CPC),

E. E, bem assim, perante uma “oposição de julgados” (cf. alínea c), do n.º 1, do artigo 672.º, do CPC).

F. As questões retratadas na presente Revista – incorreta interpretação e aplicação do regime da (in)admissibilidade da alteração da causa de pedir, do regime previsto na alínea a), do n.º 1, do artigo 1091.º, do Código Civil e do regime do n.º 2, do artigo 59.º, do NRAU – são dotadas de “relevância jurídica ou social que torna a revista de importância fundamental”, porquanto não só suscitam dúvidas na Jurisprudência,

G. Como apresentam contornos indiciadores de que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto e das partes envolvidas no litígio, podendo representar, assim, uma orientação para a resolução desses prováveis futuros casos, já que se mostra de enorme suscetibilidade a ocorrência de Ações para a apreciação: daqueles regimes, impondo-se, por conseguinte, a precisão dos seus regimes em conformidade com a jurisprudência que tem vindo a ser proferida.

H. As questões relacionadas com a interpretação e aplicação do direito legal de preferência quando interpretadas no sentido restritivo perfilhado pelo Acórdão sob revista, são ainda são suscetíveis de comportar uma violação do Princípio da Igualdade consagrado no artigo 13.º, da CRP,

I. Pelo que, comprovada se encontra a relevância jurídica ou social que torna a presente revista de importância fundamental dada a panóplia de questões que no presente caso se colocam, e a suscetibilidade de violação de princípios e direitos fundamentais.

J. A presente Revista emerge de uma “Necessidade de Melhor Aplicação do Direito”, já que a decisão sob revista não se manteve dentro das soluções plausíveis de direito, revelando, antes, a existência de erro(s) manifesto(s), grosseiro(s).

K. O Acórdão sob revista revela uma errada interpretação e aplicação do regime da “alteração da causa de pedir” (cf. n.º 1, do art. 265.º, do CPC), ao presente caso, e ao decidir não ser de conhecer os direitos legais de preferência invocados pelo Recorrente, já que o conhecimento de tais factos era permitido ao abrigo do poder de cognição e gestão processual do Juiz (cf. artigo 5.º e 6.º, do CPC), por se tratarem não só de factos essenciais à procedência da pretensão formulada, como de factos notórios, que foram invocados na sequência da instrução e discussão da causa, tendo o Recorrente manifestado a vontade de se aproveitar desses factos, e tendo sido facultado aos Recorridos o exercício do contraditório.

L. Nestes termos, e ao contrário do preconizado no Acórdão sob revista, o Recorrente careou para os autos factos essenciais que lhe conferiam um direito legal de preferência, e juntou a respetiva prova, tendo aquela sido notificada aos Recorridos e ficado na disponibilidade do douto Tribunal de 1.ª instância, não tendo a mesma sido desentranhada e/ou objeto de qualquer decisão sobre o seu teor ou alcance e/ou pronúncia ou oposição por parte dos Recorridos.

M. Este entendimento encontra fundamento nos Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação do Porto, em 15.09.2014, no âmbito do Processo n.º 3596/12.0TJVNF.P1, e em 09.03.2020, no âmbito do Processo n.º 6793/18.1T8PRT.P1, bem como no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, em...

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