ACÓRDÃO Nº 283/2024
Processo n.º 907/2023
1.ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Benedita Urbano
Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), em que é recorrente A., foi interposto recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15.11 – LTC), da decisão singular proferida por aquele Tribunal em 09.06.2023.
2. O recorrente interpôs o recurso de constitucionalidade pela seguinte forma:
“[…]
tendo sido notificado da Decisão Sumária datada de 07/06/2023 que indefere a reclamação apresentada, e não se podendo com a mesma conformar, vem apresentar
RECURSO
Para o Tribunal Constitucional
O que faz nos termos e com os fundamentos seguintes (arts. 70º 1 b), 71º, nº 1, 72º, 1 b), 75º, nº 1 e 75º-A, nº 1 todos da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional):
Junta Alegações
Exmos. Senhores Juízes Conselheiros
no Tribunal Constitucional
Alegando diz,
“A.”
MOTIVAÇÃO:
-FUNDAMENTOS:
Matéria de Direito:
• Do Acesso ao Direito/Direito de Acesso à Justiça (art. 20º, nº 1, 2 e 4 da CRP).
I.
ALEGAÇÕES DE RECURSO
(DECISÃO DE 07 DE JUNHO DE 2023)
1.
Foi proferida douta decisão sumária que consignou:
(…)
Das normas indicadas extrai-se que a decisão final sobre o pedido de protecção jurídica apenas pode ser impugnada judicialmente e que a decisão que recaia sobre a mesma, proferida pelo tribunal de primeira instância competente, nos termos do art. 28º, nº 1 da LAJ, não admite qualquer recurso para o Tribunal da Relação competente.
Daqui resulta igualmente que qualquer nulidade no procedimento administrativo, seja por omissão de formalidade essencial, seja pela eventual existência de acto tácito, tem de ser arguida através da impugnação judicial dentro do prazo e com as formalidades constantes das normas citadas, por forma a possibilitar a sua sanação, não podendo ser conhecida no âmbito da impugnação judicial deduzida. Neste sentido, vejam-se o Ac. TRP de 24-05-2021, proc. 2466/19.6T8AVR-A.P1, relator Miguel Baldaia de Morais e o Ac. TRG de 18-06-2020, proc. 4117/17.4T8VNF-B.G1, relator António Barroca Penha.
Consequentemente, qualquer despacho relativo a essa matéria tem de ser considerado como parte integrante da decisão relativa à impugnação judicial e, por esse motivo, sob a alçada do citado art. 28º, nº 5 e, por esse motivo, irrecorrível. Por outro lado, qualquer despacho relativo à nulidade da decisão proferida pelo tribunal competente relativamente ã impugnação judicial é também ele irrecorrível como resulta do citado art. 28º, nº 5.
(...)
2.
A douta decisão sumária prolatada aplicou, em singelo entendimento, erroneamente, as regras de direito aplicáveis ao caso concreto.
3.
Cabendo pertinentemente relevar que todo o raciocínio expendido assenta na identificação de uma decisão em manifesta inconstitucionalidade, por violação dos números 1 e 4 do artigo 20.° da Constituição, quando barra à parte a possibilidade de sindicar a decisão.
4.
Pois que a interpretação, implicitamente feita do art. 615º, nº 4 do CPC de modo a que a nulidade só possa ser arguida perante o Tribunal, tout court, sem contemplar as situações em que se verifica uma nulidade do procedimento administrativo que apenas se pode invocar em sede de recurso de impugnação, fere manifestamente o acesso ao direito por parte do cidadão.
5.
Certo que a invocação da parte perante uma interpretação manifestamente inconstitucional ou que fere princípios basilares da nossa Constituição, bem como a interpretação de tal preceito legal de modo desconforme à salvaguarda do direito do cidadão de aceder à justiça foi estoicamente ignorada.
6.
Impondo-se a alteração da decisão recorrida.
7.
A bem da reposição da legalidade que em sede própria se requereu.
8.
E aqui se reitera a bem da obtenção de uma decisão diversa.
9.
Lembrando que o Recorrente é titular de um direito substantivo, denominado por direito à ação judicial, que a todos está garantido com força obrigatória direta e geral (artigo 18° da CRP) pelos artigos 20º/4 da CRP, 10º da Declaração universal dos Direitos do Homem, adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas através da sua resolução 217º (III) de 10.12.1948, 6º/1 da convenção Europeia dos direitos do homem, assinada em Roma a 4 de Novembro de 1950 e 47º da carta dos direitos Fundamentais da União Europeia, Anexa ao Tratado de Lisboa, mas também o está pelo art. 2º/2 do código de Processo Civil de 2013.
10.
Bem como, por manifesta violação do disposto no artigo 20° ''Acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva'’’ da Constituição, o qual prescreve:
"1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
2. Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
3. A lei define e assegura a adequada proteção do segredo de justiça.
4. Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.
5. Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.”
11.
Nessa senda, recorde-se que dispõe o art. 70º, nº 1, al. b) da LTC que cabe recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
12.
Do mesmo modo, prevê o art. 72º, nº 2 da LTC que os recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70º só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.
13.
Por fim, vem o art. 75º-A, nº 2 do LTC referir que sendo o recurso interposto ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70º, do requerimento deve ainda constar a indicação da norma ou princípio constitucional ou legal que se considera violado, bem como da peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade.
14.
Ora, ao longo das suas peças processuais sempre cuidou o a parte de consignar as potenciais questões, que a não serem decididas diferentemente, configuravam uma interpretação ilegal e inconstitucional de princípios e dispositivos legalmente previstos.
15.
Além de o claro e inequívoco (além de injustificado) das condições de exercício pelo recorrente do direito a aceder ao sistema judiciário, vedando-lhe a defesa judicial dos seus interesses por meio de uma proteção jurídica de que goza e lhe foi atribuído.
16.
Na verdade, todas estas questões de inconstitucionalidade material constituem a base fundamental do inconformismo do aqui Recorrente.
17.
A interpretação que, em abstrato e em cada momento, não reconhece a criação de meios adequados de reação do destinatário de uma decisão desfavorável desde logo impede-o de exercer os seus direitos, privando-o do contraditório.
18.
Ao cidadão que se vê confrontado com atos processuais «no seu» processo sem ter conhecimento dos mesmos e, posteriormente, se vê privado de o sindicar acaba, invariavelmente, discriminado e coartado no seu raio de ação para defesa dos seus direitos.
19.
Problemática cuja variedade decisória carece de maior uniformização obtida através de um maior número de decisões judiciais.
CONCLUSÕES: REVOGAÇÃO DA,
APESAR DE TUDO, DOUTA DECISÃO
Pelo exposto, extraem-se, como resenha final, as alíneas subsequentes, com indicação dos fundamentos porquanto se peticiona a alteração da decisão proferida pelo Tribunal a quo:
A) A decisão de que se recorre não teve em consideração os argumentos expendidos pela parte;
B) Remetendo a apreciação das nulidades para o Tribunal que tiver proferido tal decisão;
C) Quando in casu a nulidade decorre do próprio processo administrativo que por deficiente inquina a decisão no recurso de impugnação;
D) Interpretação inconstitucional, implicitamente feita do preceito do art. 615º, nº 4 do CPC porque, restritivamente, impedindo a arguição das nulidades, barra o aceso ao direito e aos tribunais ao cidadão;
E) À revelia do seu direito de acesso à justiça constitucionalmente consagrado;
F) Como por certo V. Exas. não deixarão de fazer cumprir
G) Cientes da consequente limitação nos seus direitos de reação ao ato desfavorável na sua esfera jurídica;
Termos e fundamentos por que, estando verificados os pressupostos de admissibilidade do presente recurso, deve ser o...