Acórdão nº 2773/22.0T8ACB-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 09-01-2024

Data de Julgamento09 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão2773/22.0T8ACB-A.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE EXECUÇÃO DE ALCOBAÇA)

I - Relatório

1. C... Unipessoal, Lda., com sede nas ..., intentou acção executiva para pagamento de quantia certa, contra AA, residente nas ..., com base em título executivo de Injunção.

O executado deduziu embargos de executado, nos quais alegou, além do mais, que nunca teve conhecimento do procedimento de injunção, onde não houve notificação, pois estava nos EUA onde reside habitualmente há anos, como o gerente da exequente bem sabia. Assim, apesar da aposição de fórmula executória, não existe título executivo

A exequente contestou, alegando que nunca o executado lhe indicou que residia nos EUA e indicou a morada que era do seu conhecimento e que corresponde à morada constantes nas bases de dados (tributária e automóvel) e onde o executado foi citado para a execução, pelo que foi devidamente aposta a fórmula executória, concluindo pela improcedência da oposição.

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A final foi proferida sentença que julgou improcedente os embargos.

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2. O embargante recorreu, concluindo que:

1. – Face à prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente, aos depoimentos das testemunhas BB e CC, devem ser dados como provados os seguintes factos que o Tribunal a quo deu como não provados:

“a) Sem prejuízo do referido em 6º e 7º, o legal representante da exequente bem sabia e sabe que o executado não residia em Portugal, mas sim nos EUA.

b) Quando na injunção indicou como domicilio a Rua ..., em ..., a ora exequente bem sabia que o ora executado não residia naquele local e que estava nos EUA, pretendendo que não houvesse contestação, o que conseguiu.

c) O executado nunca teve conhecimento do procedimento da injunção.

d) O ora executado informou o legal representante da ora exequente de que residia nos EUA.

e) Sem prejuízo do referido em 6.º e 7.º, o executado mencionou ao legal representante da exequente que tinha sido emigrante nos EUA e que por isso repartia parte do ano entre Portugal e os Estados Unidos da América.”

2. - Na Rua ..., ... em ..., existiam duas caixas de correio, uma própria do inquilino e outra para a arrecadação onde reside o ora recorrente.”

3. – Nos meses de Setembro, Outubro e Novembro do ano 2022 o recorrente não esteve em Portugal.

4. – A testemunha BB durante este período, ia com regularidade quinzenal à caixa de correio do recorrente e nunca viu qualquer notificação do BNI que fosse endereçada ao executado.

5. – Está provado que o recorrente não teve conhecimento da carta enviada pelo BNI.

6. - E que, ao contrário do que decidiu o Mmº Juiz a quo, esse desconhecimento NÃO LHE PODE SER IMPUTÁVEL

7. – A presunção legal da notificação foi elidida.

8. – Há que fazer prova da existência ou não da dívida, só é possível com a procedência deste recurso.

9. – O formalismo da notificação (citação) não pode prevalecer sobre a justiça material – a divida existe ou não existe?

10. – O recorrente não recebeu a notificação (citação) da injunção.

11. – E cumpriu o dever de ter alguém que lhe visse na caixa do correio qualquer comunicação.

12. – Esta pessoa – a testemunha BB – nunca viu na caixa do correio qualquer notificação do BNI.

13. – O ora recorrente, a residir nos EUA quando foi notificado, não podia receber a notificação para deduzi8r oposição à injunção.

14. – Estamos num país de emigrantes que, quando em Portugal, têm uma residência onde não vivem habitualmente e têm uma residência no país de acolhimento.

15. - Como concluiu esse douto Tribunal: “IV – A citação por via postal simples, com prova de depósito da carta foi pensada para os citandos comprovadamente residentes em Portugal, como resulta do elemento sistemático.”– Proc. 523/04 de 22/06/2004, in www.dgsi.pt

16. - No caso concreto provou-se, sem sombra de dúvida, que o ora recorrente não reside em Portugal como decorre, aliás da douta sentença proferida, nomeadamente, dos seguintes factos dados como provados:

“6.º O executado tem residência habitual nos EUA, deslocando-se e permanecendo em Portugal por número de vezes e períodos não concretamente apurados, onde tem residência na morada correspondente à Rua ....

7.º Por ocasião das obras referidas em 5.º, que terminaram em data não concretamente apurada de 2021, anterior a 25/05/2021, o legal representante da exequente tinha conhecimento do referido em 6.º.

8.º Em 10/10/2022 o executado encontrava-se nos EUA.”

17.– Nos presentes autos há falta de citação – artº 188.º, n.º 1, al. e) do C.P.C., pelo que todos os actos subsequentes são nulos – artº 187.º al. a) do C.P.C.

18. - Ao decidir como decidiu - i. e., que o ora recorrente tinha sido regularmente notificado do procedimento de injunção, violou o Meritíssimo Juiz aquo os artigos 187.º, alínea a) e 188.º, n.º 1, alínea e) do C.P.C.

Nestes termos recurso deve ser julgado procedente, declarando V. Exªs que o recorrente não foi devidamente notificado/citado, assim se fazendo JUSTIÇA

3. Inexistem contra-alegações.

II - Factos provados

1.º Nos autos de execução foi apresentado como título executivo o requerimento de injunção que se encontra anexo ao r.e. e aqui se dá por reproduzido, entregue em 09/09/2022 e ao qual foi atribuída força executiva em 11/11/2022, constando a menção “não” em “domicílio convencionado”, para pagamento da quantia total de 5.918,20 €, relativa à factura n.º ...6, de 25/05/2021, e demais acréscimos, nos termos que se encontram descritos na “exposição dos factos”.

2.º O aqui executado, então requerido, foi notificado no âmbito do procedimento de injunção na morada indicada pela requerente, aqui exequente, sita na Rua ..., em ..., através de via postal registada com aviso de recepção, datada de 13/09/2022, tendo sido devolvida ao BNI com a menção “mudou-se”.

3.º Na sequência do referido em 2.º, o BNI efectuou pesquisa nas bases de dados quanto ao requerido (SS, AT e IC), constando nas mesmas a morada Rua ....

4.º Na sequência do referido em 3.º, o executado foi notificado no âmbito do procedimento de injunção na morada ali referida, através de via postal simples com prova de depósito, certificada em 10/10/2022 pelo distribuidor postal.

5.º A exequente e o executado acordaram entre si a realização pela primeira ao segundo de obras de remodelação de imóvel pertença do executado e sito na Rua ..., a que respeita o documento que se encontra anexo à p.i. de oposição (doc. 1) e à contestação (doc. 5) e aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual consta como destinatário “AA Rua ... ...”.

6.º O executado tem residência habitual nos EUA, deslocando-se e permanecendo em Portugal por número de vezes e períodos não concretamente apurados, onde tem residência na morada correspondente à Rua ....

7.º Por ocasião das obras referidas em 5.º, que terminaram em data não concretamente apurada de 2021, anterior a 25/05/2021, o legal representante da exequente tinha conhecimento do referido em 6.º.

8.º Em 10/10/2022 o executado encontrava-se nos EUA.

9.º A exequente indicou no requerimento de injunção a morada do executado que era do seu conhecimento.

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Factos não provados

a) Sem prejuízo do referido em 6.º e 7.º, o legal representante da exequente bem sabia e sabe que o executado não residia em Portugal, mas sim nos EUA.

b) Quando na injunção indicou como domicílio a Rua ..., em ..., a ora exequente bem sabia que o ora executado não residia naquele local e que estava nos EUA, pretendendo que não houvesse contestação, o que conseguiu.

c) O ora executado nunca teve conhecimento do procedimento de injunção.

d) O ora executado nunca informou o legal representante da ora exequente de que residia nos EUA.

e) Sem prejuízo do referido em 6.º e 7.º, o executado mencionou ao legal representante da exequente que tinha sido emigrante nos EUA e que por isso repartia parte do ano entre Portugal e os Estados Unidos da América.

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III - Do Direito

1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 635º, nº 4, e 639º, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

Nesta conformidade, a única questão a resolver é a seguinte.

- Alteração da matéria de facto.

- Procedência dos embargos, por falta de conhecimento da notificação na injunção.

2. O recorrente impugna todos os factos não provados a) a e), que pretende passem a provados, com base nos depoimentos das testemunhas que indica (cfr. conclusão de recurso 1.).

2.1. Quanto ao facto não provado sobre d) essa pretensão não pode ser alcançada por uma razão adjectiva. Tal facto não provado foi alegado, não pelo apelante, mas pela embargada/exequente no art. 3º da contestação aos embargos.

Agora, o recorrente quer que se prove o contrário. Mas nunca alegou tal facto, ao contrário, como devia, se entendia que ele era essencial ou relevante, nos termos do art. 5º, nº 1, do NCPC. Certo é que o facto que o recorrente pretende seja dado por provado não foi alegado por ele ou pela embargada/exequente. Não foi alegado por nenhuma das partes.

Sendo facto essencial, então devia ter sido alegado pelo recorrente/embargante. Sendo facto complementar (art. 5º, nº 2, b), do NCPC), não poderia operar pois não foi pelo apelante solicitado ao tribunal a quo que o assim considerasse, nem o tribunal tomou essa iniciativa, com respeito pelo contraditório das partes.

Não procede, esta parte da impugnação.

2.2....

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