Acórdão nº 277/15.7T8LRA-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 12-06-2018

Data de Julgamento12 Junho 2018
Número Acordão277/15.7T8LRA-A.C1
Ano2018
Órgão Tribunal da Relação de Coimbra



Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:



I - A Causa:



M (…) S.A., Ré nos autos à margem identificados em que é Autora R (…), e interveniente D (…) notificada do despacho com conclusão de 15.12.2017, de fls…, com o qual não se conforma, veio dele interpor recurso de apelação, alegando e concluindo que:

A) A Ré/ Apelante, por requerimentos de 17.02.2017 e 18.10.2017, com as refs., respectivamente, 24937543 e 27083737, a fls…, requereu a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça (o que a Interveniente também fez).
B) O Sr. Procurador da República promoveu, com vista de 12.12.2017, a fls…, que fosse deferida parcialmente a pretensão da Ré/ Apelante, e as partes dispensadas do pagamento do remanescente de 5/4 da taxa, isto é, que as partes apenas tivessem de liquidar a taxa de justiça remanescente de € 3.856,00.
C) Acontece que, o Tribunal a quo, por Despacho com conclusão de 15.12.2017, de fls…, indeferiu a dispensa de pagamento de remanescente de taxa de justiça, por entender não se encontrarem reunidos os pressupostos a que alude o n.º 7, do RCP.
D) Essa decisão é ilegal por violação do n.º 1, e 7, do artigo 6.º, do RCP, n.º 7, do artigo 530.º, do CPC, e inconstitucional por violação dos Princípios de Acesso ao Direito e Tutela Jurisdicional Efetiva, da Proporcionalidade e Proibição do Excesso – artigos 2.º, 18.º, e 20.º, da CRP.
E) Dos termos conjugados dos n.º 9, do artigo 14.º, e n.º 7, do artigo 6.º, do RCP, alcança-se que, para os casos em que o valor da causa é superior a € 275.000,00 (duzentos e setenta e cinco mil euros) a parte apenas paga inicialmente a taxa de justiça correspondente ao valor de base tributária e, o remanescente será considerado apenas na conta final, no caso de haver responsabilidade pelo pagamento de custas e, quando o responsável pelo impulso processual não seja condenado, deverá efetuar o pagamento no prazo de dez (10) dias a contar da notificação da decisão que ponha termo ao processo.
F) Porém, o valor da taxa de justiça não pode ser fixado tendo por base uma mera correspondência matemática com o valor da causa, pelo que, o aludido pagamento poderá ser dispensado pelo Meritíssimo Juiz, em face da complexidade da causa e conduta das partes, uma vez que o valor remanescente da taxa de justiça não tem como único e exclusivo pressuposto o valor da ação, mas também o pressuposto de complexidade da causa e da conduta das partes – n.º 1, do artigo 6.º, do RCP.
G) A complexidade da causa é aferida com base nos pressupostos do n.º 7, do artigo 530.º, do CPC: “(…) articulados ou alegações prolixas; (…) questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou (…) impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas. (…).”.
H) O Tribunal a quo, para justificar o indeferimento do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, de forma algo contraditória, refere que, por um lado o julgamento contou com 4 sessões, 15 testemunhas, por vezes com recurso a interprete, que as partes não contribuíram para uma solução consensual, e que as questões de facto necessitaram de uma apreciação algo especifica.
I) E por outro que:
a. “é certo que os autos, em termos de decisão da matéria de direito, não se revelaram de especial complexidade”, e,
b. “No que se refere à conduta processual das partes salvaguardando a elevação e correcção das mesmas e que não pomos sequer em questão”.
J) Ou seja, a própria Juiz a quo reconheceu que em termos de direito o processo não revelou especial complexidade, e que as partes tiveram uma conduta processual elevada e correcta, tudo razões que militam claramente a favor da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
K) Por outro lado, não pode servir de justificação, salvo o devido respeito, para fundamentar a alegada complexidade da causa, que as partes não tenham contribuído para uma solução consensual, pois é pressuposto do recurso aos tribunais a existência de desacordo, e a falta de contribuição para uma solução consensual, isto é, se as partes conseguissem chegar a um consenso não recorreriam, provavelmente, à via judicial.
L) Assim como também não se poderá considerar, certamente, que 4 sessões de julgamento, ou mesmo 15 testemunhas, possa ser considerada elevada complexidade, quando sabemos que, estando em causa três partes – Autora, Ré e Interveniente -, poderiam ter sido arroladas, sem contabilizar as da reconvenção, 30 testemunhas, sendo que apenas foram arroladas 15, isto é, metade do legalmente permitido.
M) Os presentes autos iniciaram-se como uma acção declarativa comum de condenação, ou seja, a Autora pediu, unicamente, que a Ré, ora Apelante, fosse condenada a pagar o valor correspondente a certas facturas, algo que, para se compreender bem a pouca complexidade do processo, poderia ter sido peticionado num requerimento injuntivo.
N) Se é certo que a Ré/ Apelante deduziu reconvenção, não é menos certo que essa reconvenção, pese embora tivesse um valor elevado, não necessitava de uma análise jurídica complexa, ou morosa - em suma alegou que a Autora, e Interveniente, tinham, com os serviços que lhe prestaram, causado um prejuízo e, como tal, deveria operar a compensação relativa ao valor que a Autora peticionava, e condenadas no remanescente do valor do prejuízo – uma simples questão de responsabilidade civil contratual.
O) Logo a única questão aqui em causa, repete-se, que não necessitava de nenhuma análise jurídica complexa, prendia-se com o facto da contabilização dos prejuízos sofridos pela Ré/ Apelante, e se a Autora e Interveniente eram responsáveis pelos mesmos.
P) Ao longo do processado não foram suscitadas questões controversas e/ou de especial dificuldade técnico-jurídica e que requeressem análise conjunta e/ou combinada com questões de âmbito diverso; assim como não requereram nem implicaram a realização de várias diligências probatórias e morosas.
Q) Por outro lado e no que tange à conduta processual das partes ao longo do processo, importa realçar que denotou, desde logo, cooperação total com o Tribunal, não usando de expedientes dilatórios, nem usando o processo anormalmente; atuaram e agiram com lisura, apenas se podendo qualificar como uma conduta normal de litigante cooperante entre si e com o Tribunal no delineamento do objeto do processo e thema decidendum.
R) A taxa de justiça, à semelhança das demais taxas tem natureza bilateral pelo que constitui contrapartida devida pela utilização do serviço público de justiça, logo, deve ser fixada em proporção com o serviço prestado.
S) Assim, no descrito contexto processual é totalmente desproporcionado o montante de taxa de justiça remanescente a pagar pela Ré/ Apelante por aplicação do n.º1, do artigo 6.º, do RCP, impondo-se desde logo a aplicação do regime previsto no n.º 7, do artigo 6.º, do RCP, com a função de adequar o custo da ação à menor complexidade.
T) A entender-se de forma diferente, estar-se-ia a violar a génese e objetivos do RCP e os Princípios Constitucionais do Acesso aos Tribunais e da Tutela Jurisdicional Efetiva, da Proporcionalidade e da Proibição do Excesso, artigos 6.º, e 11.º, do RCP, n.º 7, do artigo 530.º, do CPC, e artigos 2.º, 18.º, e 20.º, da CRP, pelo que encontram-se reunidos os pressupostos de dispensa de pagamento de remanescente de taxa de justiça.
U) Aliás, entre outras decisões do Tribunal Constitucional, por Ac. n.º 421/2013 de 15 de Julho de 2013, julgou inconstitucional “(…) por violação do direito de acesso aos tribunais consagrado no artigo 20º da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2º e 18º, n.º 2 segunda parte, da Constituição, as normas contidas nos artigos 6º e 11º, conjugadas com a tabela I-A anexa, do Regulamento das Custas Processuais, na redação introduzida pelo DL 52/2011, de 13 de Abril, quando interpretadas no sentido de que o montante de taxa de justiça é definido em função do valor da ação sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante de taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título. (…).”.
V) Por último importa referir que a Ré/ Apelante foi condenada a pagar à Autora € 59.880,00 + juros, sendo que, se o remanescente da taxa de justiça não for dispensado, significa que esta vai ter de pagar, em taxa de justiça, € 28.917,00, ao qual acrescem as custas de parte (uma vez que tanto a Autora como a Interveniente irão também ter de suportar directamente o remanescente da taxa que farão repercutir nas custas de parte).
W) Donde, facilmente se compreende que a Ré/ Apelante, caso não seja dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça, terá de suportar, entre taxa de justiça e custas de parte (que reflectem directamente o valor das taxas de justiça liquidadas), directa e indirectamente, € 141.142,50 (cento e quarenta e um mil cento e quarenta e dois euros e cinquenta cêntimos)!
X) Isto é, terá de suportar directamente € 31.365,00 (taxa de justiça + remanescente da taxa de justiça), e, indirectamente, € 109.777,50 (custas de parte onde se incluem as taxas de justiça liquidadas pela Autora e Interveniente), o que, em termos prático, corresponde a pagar directamente ao sistema público de administração da justiça, pelos presentes autos, € 94.095,00,
Y) O que viola claramente os princípios da proporcionalidade e da igualdade!
Z) Pelo que a Decisão de Indeferimento de dispensa de pagamento de remanescente de taxa de justiça é ilegal por violação do preceituado no n.º 1, e 7, do artigo 6.º, e 11.º, do RCP, n.º 7, do artigo
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