Acórdão nº 27590/22.4T8LSB.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 09-05-2024

Data de Julgamento09 Maio 2024
Número Acordão27590/22.4T8LSB.L1-2
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

MC e marido, AC, intentaram acção declarativa de condenação com processo comum contra AS, pedindo que seja declarada a caducidade de contrato de arrendamento que identificam, com fundamento no falecimento da inquilina, e que a R. seja condenada a entregar a fracção objecto do contrato de arrendamento livre de pessoas e coisas, bem como no pagamento de uma indemnização mensal de €1.000,00, desde a citação até à entrega efectiva.
Alegam para tanto, e em síntese, que:
· São proprietários da fracção autónoma em questão, dada em arrendamento à mãe da R.;
· Tendo a mãe da R. falecido em 7/1/2022, extinguiu-se o contrato de arrendamento em questão, caducidade que a R. não reconhece, recusando-se a restituir o locado, por entender que o arrendamento se lhe transmitiu, em virtude de residir em economia comum com a inquilina desde o início do arrendamento;
· O valor locatício da fracção é, no mínimo, de €1.000,00 mensais, considerando a área, local e valores praticados.
Citada a R., apresentou contestação onde, em síntese, alega que os AA. acordaram com a sua mãe a transição do arrendamento para o NRAU, pelo que lhe é aplicável o disposto nos art.º 1106º e 1107º do Código Civil, não se tendo assim extinguido o arrendamento por caducidade com o óbito da sua mãe, mas tendo-se transmitido para si, porque vivia com a inquilina em economia comum há mais de um ano. Conclui pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.
Foi proferido despacho saneador tabelar e dispensada a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas da prova.
Após realização da audiência final foi proferida sentença pela qual a acção foi julgada improcedente, com a absolvição da R. dos pedidos contra si formulados.
Os AA. recorrem desta sentença, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
A) Os recorrentes são senhorios da fracção autónoma, Letra C, que corresponde ao rés-do-chão esquerdo do prédio no regime de propriedade horizontal, sito na Rua …, n.º …, em Lisboa;
B) Para aquela fracção foi celebrado contrato de arrendamento para habitação própria e permanente em data anterior a 1982;
C) A partir daquela data, 2 de Novembro de 1982, passou MS a ser inquilina do respectivo locado, pagando as rendas ao senhorio e tratando entre si de todos os assuntos relacionados com o local, objecto daquele contrato de arrendamento;
D) Por carta de 20-10-2020, a A. comunicou a MS o seguinte:
Como certamente tem conhecimento o v/contrato encontra-se sujeito ao NRAU desde o ano de 2012;
Houve acordo quanto ao acerto do valor de rendas, proposto pelo inquilino e aceite pelo senhorio, durante o tempo acordado;
Sendo assim, considerando o V/RABAC e o valor tributário do locado, a renda encontrada foi aquela que vos foi transmitida através da minha carta de 22 de Setembro, ou seja, de €206,20 e que se aplica à renda referente ao mês de Dezembro de 2020;
E) Ali, o arrendatário alegou e comprovou que o rendimento anual bruto corrigido do seu agregado familiar é inferior a cinco retribuições mínimas nacionais anuais;
F) Assim, inexistindo acordo das partes, a transição só opera depois de decorrido certo prazo sobre a recepção pelo senhorio da resposta do arrendatário à sua comunicação inicial – cinco anos, ficando a actualização das rendas condicionadas durante esse período em função de percentagem do RABC.;
G) Somente após a sobrevinda do termo do prazo de diferimento assegurado ao arrendatário poderá o senhorio promover a transição do contrato para o NRAU, sem que aquele possa invocar as circunstâncias previstas na lei, o que não foi feito pelo senhorio;
H) Por carta recebida pelos senhorios em 01 de Abril de 2022, remetida por AS (R), esta informa do falecimento de sua mãe, MS, inquilina daquele locado, ocorrido em 07 de Janeiro de 2022 (assento de óbito);
I) Na mesma carta, a Ré solicita a transmissão do contrato de arrendamento para o seu nome, dizendo que residia com a mãe em economia comum desde o início do referido contrato de arrendamento;
J) Em resposta a esta carta os senhorios informaram a, agora ré, que aquele contrato de arrendamento por falecimento da inquilina caducou, não havendo lugar a transmissão a seu favor, considerando que a mesma não preenchia os requisitos para o efeito;
K) Nesta acção os AA não discutem a transição do contrato de arrendamento, antes não aceitam a transmissão do contrato de arrendamento para a filha, aqui Ré;
M) A inquilina, mãe da Ré, faleceu a 7 de Janeiro de 2022 na vigência da Lei n.º 6/2006 de 27 de Fevereiro, na redacção dada pela Lei 2/2020 de 31/03, no seu art.º 57.º, transmissão por morte, afasta aquela transmissão por falta de requisitos para aquela transmissão a favor da filha;
N) O Tribunal a quo, para julgar a acção improcedente aplicou o disposto nos artigos 1106.º e 1107.º do CC, considerando não caduco o arrendamento e assim se transmitindo a sua filha, aqui Ré.
A R. apresentou alegação de resposta, aí pugnando pela manutenção da sentença recorrida.
***
Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos art.º 635º, nº 4, e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, as questões submetidas a recurso, delimitadas pelas aludidas conclusões, prendem-se tão só com a caducidade do arrendamento por não ser transmissível à R., em consequência do óbito da primitiva inquilina.
***
Na sentença recorrida considerou-se provada a seguinte factualidade (com correcção das referências processuais e eliminação da referência aos meios de prova):
1. Os AA. são senhorios da fracção autónoma, letra C, que corresponde ao rés‑do‑chão esquerdo do prédio no regime de propriedade horizontal, sito na Rua …, n.º …, em Lisboa, inscrito no art.º matricial … C, da freguesia de Benfica.
2. Foi celebrado contrato de arrendamento para habitação própria e permanente em data anterior a 1982.
3. Com data de 2/11/1982 foram os AA. notificados pelo Tribunal de Família de Lisboa, 3.º Juízo, de que por sentença transitada em julgado foi atribuído o direito ao arrendamento da casa de morada da família sita na fracção identificada em 1. para a requerente MS, arrendamento que estava titulado em nome do requerente marido, daquele divórcio.
4. A partir de 2/11/1982 passou aquela MS a ser inquilina da fracção identificada em 1., pagando as rendas ao senhorio e tratando entre si de todos os assuntos relacionados com o local, objecto daquele contrato de arrendamento.
5. Mediante carta de 29/10/2020 a A. comunicou a MS o seguinte:
(…)
Acuso recebida a v/carta com data de 30 de Setembro pp, cujo conteúdo tomei devida nota:
Como certamente tem conhecimento o v/contrato encontra-se sujeito ao NRAU desde o ano de 2012;
Houve acordo quanto ao acerto do valor de rendas, proposto pelo inquilino e aceite pelo senhorio, durante o tempo acordado;
Esta situação não invalidou a sujeição do contrato àquele NRAU, cujo valor da renda se considera sujeito;
Sendo assim, considerado o v/ RABAC e o valor tributário do locado, a renda encontrada foi aquela que vos foi transmitida através da minha carta de 22 de Setembro, ou seja de 206,20€ e que se aplica à renda referente ao mês de Dezembro de 2020;
Apresento os m/cumprimentos. (…)”.
6. Por carta recebida pelos AA. em 1/4/2022, remetida pela R., esta informa do falecimento de sua mãe, MS, inquilina daquele locado, ocorrido em 7/1/2022.
7. Na mesma carta a R. solicita a transmissão do
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