Acórdão nº 27063/20.0T8LSB.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 11-10-2023

Data de Julgamento11 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão27063/20.0T8LSB.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:


Relatório


A, com a profissão de Técnico Comercial, intentou acção sob a forma comum emergente de contrato individual de trabalho, contra Transportes Aéreos Portugueses S.A., e pediu que, julgando-se a acção procedente, a Ré seja condenada:
a) Na declaração de nulidade da cláusula que fixa o prazo do contrato a termo e o Autor seja considerado como trabalhador efectivo;
b) Na declaração de nulidade do despedimento do Autor, por ilícito, por inexistir justa causa e processo disciplinar;
c) A reintegrar o Autor no seu posto de trabalho, com todos os direitos e antiguidade incluindo a progressão na carreira se este não vier a optar pela indemnização até à audiência de julgamento e a pagar-lhe o montante de 1.286,98 € das retribuições vencidas, bem como as vincendas até ao trânsito em julgado da presente acção.
d) No pagamento de juros à taxa legal.
Alegou para tanto, em síntese, que foi contratado pela Ré no dia 10 de Abril de 2019, com um contrato de trabalho a termo certo, com a duração de 1 ano, para exercer as funções que identifica, que a cláusula do termo é nula posto que o motivo justificativo da contratação não está concretizado nem permite relacionar o motivo com a duração aposta no contrato, que nunca esteve afecto a nenhuma nova plataforma concreta, pois sempre trabalhou para todos os destinos operados nos sistemas que estavam a ser utilizados havia muito tempo e que a comunicação da caducidade do contrato de trabalho representa um despedimento ilícito por não ter sido precedido de procedimento disciplinar, sendo-lhe devidas as quantias que reclama.
Realizou-se a tentativa de conciliação não tendo sido possível obter o acordo das partes.
A Ré contestou por excepção e por impugnação. Por excepção, invocou a aceitação pelo Autor da compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo o que, no seu entender, faz presumir a aceitação da caducidade do contrato.
Por impugnação sustentou, em resumo, que o motivo aposto no contrato de trabalho satisfaz plenamente a exigência legal posto que está pormenorizado e concretizado e corresponde aos fundamentos legais para esse tipo de contratação e que o contrato de trabalho do Autor cessou por caducidade e não por despedimento ilícito.
Mais invocou que a presente acção respeita a interesses imateriais e que, por isso, o seu valor deverá ser fixado, de acordo com o artigo 303.º do CPC, em €30.000,01.
Finalizou pedindo a sua absolvição do pedido por via da procedência da excepção peremptória e, caso assim não se entenda, por via da improcedência da acção.
O Autor respondeu pugnando pela improcedência da excepção.
O valor da causa foi fixado, provisoriamente, em €5.000,01, no despacho saneador, proferido em 25.05.2021.
Foi dispensada a convocação da audiência prévia, proferido despacho saneador no âmbito do qual foi julgada improcedente a excepção deduzida pela Ré, bem como foi identificado o objecto do litígio e dispensada a enunciação dos temas da prova.

Realizou-se a audiência de julgamento e após foi proferida a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo:
“Em face do exposto, declaro integralmente procedente a presente acção e, em consequência:---
1. Declaro nulo o termo aposto no Contrato de Trabalho celebrado a 10 de Abril de 2019 entre o autor JM... e a ré Transportes Aéreos Portugueses S.a.; considerando tal contrato como Contrato de Trabalho por Tempo Indeterminado, com e para todos os efeitos.
2. Condeno a ré Transportes Aéreos Portugueses S.a. a reintegrar o autor JM..., com todos os direitos e antiguidade incluindo a progressão na carreira.
3. Condeno a ré Transportes Aéreos Portugueses S.A. a pagar ao autor JM... o montante € 1,286,98 (Mil, duzentos e oitenta e seis euros e noventa e oito cêntimos) a título de retribuições vencidas, bem como as prestações vincendas até ao trânsito em julgado da presente Sentença; sendo descontada a compensação paga pela caducidade do referido contrato e os valores que tenha o autor eventualmente recebido a título de subsídio de desemprego.
Valor da causa: € 1,286,98.
Custas pela ré (artigo 527.º do CPC).
Notifique e registe.”

Inconformada com a sentença, a Ré recorreu e sintetizou as alegações nas conclusões seguintes:
“A. Vem o presente recurso interposto da decisão que julgou a acção procedente, tendo declarado nulo o termo aposto ao contrato de trabalho celebrado entre o Autor e a Ré e, em consequência, condenou a Ré a reintegrá-lo na sua organização e a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde a data da cessação da relação laboral e até ao trânsito em julgado da sentença.
A sentença recorrida não se coaduna com a prova produzida, nem com o disposto nos normativos aplicáveis à situação sub judice, pelo que ao presente recurso deverá ser dado provimento, como se procurará demonstrar.
B. O valor da causa não poderá corresponder ao constante da sentença recorrida, sob pena de violação do disposto no art.º 303.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi art.º 1.º, n.º 2, al. a), do CPT, dado que estamos perante uma acção judicial cujo benefício imediato não pode traduzir-se em dinheiro, antes visando a efectivação de um direito extra-patrimonial, designadamente a reintegração do Recorrido na organização da Recorrente.
Com efeito, o interesse na manutenção de um contrato de trabalho não se resume à retribuição pois tal interesse tem subjacente o direito ao trabalho, que disfruta de consagração constitucional, dispondo de uma vertente que é própria e intrínseca à natureza humana.
Por conseguinte, e porque em causa estão interesses imateriais, o valor da acção deverá corresponder, no mínimo, à alçada da Relação acrescida de um cêntimo, ou seja, € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), o que expressamente se requer.
C. O Tribunal a quo errou ao não dar como provada a matéria constante da al. e) do elenco dos factos não provados, a qual consta dos artigos 16.º e 17 da Contestação da R. e que foi confirmada pelas testemunhas B (Cfr. minutos 00:08:08 e seguintes, 00:11:21 e seguintes e do seu depoimento) e C (Cfr. minutos 03:40 e seguintes, 26:50 e seguintes e 37:50 e seguintes do seu depoimento), pelo que deve o Tribunal ad quem aditar à decisão sobre a matéria de facto dois novos pontos, a saber:
“Os projectos de implementação de uma plataforma de CRM e outra de atendimento telefónico integradas visavam reduzir o número de tarefas de tratamento directo, que passariam a estar mais automatizadas.”
“Em consequência da implementação de tais plataformas a R. estimava registar e registou, no respectivo período inicial, redundâncias, atenta a necessidade de prestar formação aos trabalhadores sobre a nova plataforma e de os mesmos se habituarem a manuseá-la, circunstâncias que geraram a necessidade de contratar temporariamente mais recursos humanos, com vista a assegurar a manutenção do nível de serviço aos clientes da Companhia”.
D. Merece igualmente censura a decisão do Tribunal a quo de não dar como provada a
factualidade constante da alínea f) do elenco dos factos não provados, que foi alegada pela R. no art.º 22.º da sua Contestação.
Impunham decisão diversa da recorrida os depoimentos das testemunhas B (Cfr. minutos 00:08:08 e seguintes do seu depoimento), C (Cfr. minutos 05:17 e seguintes, e 39:05 e seguintes do seu depoimento) e D (Cfr. minutos 00:06 e seguintes do seu depoimento), que, de forma sincera e clara, atestaram que a implementação das novas plataformas informáticas no Call Center da R. se iniciou em 2019 e prolongou-se até Março / Abril de 2020, pelo que o Tribunal a quo deveria ter considerado que resultou demonstrado nos autos o seguinte:
“A implementação da nova plataforma de atendimento iniciou-se em 2019 e só veio a concretizar-se em Março/Abril de 2020.”
E. Resulta directamente da fundamentação do contrato celebrado com o Recorrida que o mesmo foi celebrado em consequência da decisão da Ré de implementar uma nova plataforma multicanal, e da necessidade de reforçar o quadro de pessoal em virtude das redundâncias que a R. estimava registar e que registou, no respectivo período inicial, atenta a necessidade de prestar formação aos trabalhadores sobre a nova plataforma e de os mesmos se habituarem a manuseá-la, com a concomitante necessidade de manter o nível de serviço prestado aos clientes da Companhia.
F. Registou-se um atraso na implementação das plataformas de CRM e atendimento telefónico, processo que só veio a concretizar-se em Março/Abril de 2020, circunstância que, conjugada com a paralisação da actividade operacional da Ré por força da eclosão da pandemia da Covid-19, em Março de 2020, levaram a Ré a proceder à denúncia do contrato de trabalho a termo certo celebrado com o Autor, porquanto as necessidades temporárias de mão de obra em que se fundou a sua contratação não se confirmaram e/ou consolidaram.
G. A Recorrente procurou precisar os motivos do recurso à contratação a termo do Autor, e fê-lo em termos suficientes e claros, tendo em conta a possibilidade dessa concretização e o grau de cognoscibilidade do destinatário, sendo certo que, atenta a especificidade da actividade desenvolvida pela Recorrente e o grau de incerteza dos fundamentos que justificaram a contratação, não era possível precisar mais a fundamentação do contrato, decorrendo a sua duração das próprias razões invocadas no texto do contrato.
H. O motivo aposto no contrato de trabalho celebrado entre o Recorrido e a Recorrente satisfaz plenamente a exigência legal de tal justificação e/ou fundamentação, sendo que in casu, os motivos justificativos apostos até são bastante pormenorizados e concretizados e correspondem aos fundamentos legais para esse tipo de contratação, nos termos do disposto nos arts. 140.º e 141.º do CT.
I. A Recorrente fez cessar o contrato de trabalho do Recorrido no respeito pelos
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