Acórdão nº 27/09.7PFEVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27-04-2010
Data de Julgamento | 27 Abril 2010 |
Número Acordão | 27/09.7PFEVR.E1 |
Ano | 2010 |
Órgão | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I - RELATÓRIO.
No âmbito do Proc. 27/09.7PFEVR, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Évora, foi submetido a julgamento, em processo sumário, o arguido J, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 292º, nº 1, e 69º, nº 1, al. a), do Código Penal.
Realizado o julgamento, foi decidido:
“A) Condenar o arguido J pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo artº 292º, nº 1 do Cód. Penal na pena de multa de 80 (oitenta) dias, à razão diária de 6 € (seis euros), o que perfaz a pena de multa de 480 € (quatrocentos e oitenta euros), e a que corresponde, não sendo a multa paga voluntária nem coercivamente, nem sendo requerida e exequível a sua substituição por dias de trabalho, 53 (cinquenta e três) dias de prisão subsidiária.
B) Condenar o arguido na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de 5 (cinco) meses e 15 (quinze) dias, nos termos do disposto no artº 69º, nºs 1, al. a) e 2, do Cód. Penal.
C) Condená-lo finalmente no pagamento das custas do processo, com uma uc de taxa de justiça, reduzida a metade e demais encargos a que o arguido tiver dado causa – cfr. artºs 344º, nº 2, al. c) e 514º, nº 1, do Cód. Proc. Penal e 8º, nº 5, com referência à Tabela III, do Reg. das Custas Processuais”.
Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido, extraindo da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões:
“1 - A sanção acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de cinco meses e quinze dias constante da decisão recorrida não teve em conta, como deveria, as consequências em concreto para o ora recorrente, sendo excessiva e desproporcionada.
2 - Sendo certo que a proporcionalidade e adequação da pena se mede, também, pelos efeitos que subjectivamente produz no infractor, devendo ser ponderadas todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de ilícito deponham a favor do agente.
3 - Devendo a condenação, com equidade, ter em conta a necessidade do ora recorrente na utilização da carta para a realização da sua actividade profissional.
4 - E porque, conforme se referiu, a duração mínima imposta por Lei se mostrar comprovadamente suficiente.
5 - Razões pelas quais a sanção acessória de inibição de conduzir deve ser fixada em três meses.
6 - A condenação do ora recorrente na pena de multa e na pena de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período em questão não atentou em determinadas circunstâncias que resultariam em vantagens que se configuram como determinantes para a aplicação de penas menos gravosas ao mesmo.
7 - De facto, não se levou em consideração na decisão recorrida o que vai dito, nomeadamente, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21 de Janeiro de 2009, proferido no âmbito do Processo nº 7609/08, cuja tese se subscreve integralmente, cujos princípios deverão ser aplicados ao caso dos presentes autos.
8 - Ali defende-se a tese de que, aplicando a situação ao caso dos presentes autos, no conhecimento seguro de que a taxa de álcool no sangue indicada no aparelho após teste levado a efeito na pessoa do condutor, Arguido e ora Recorrente, foi de 1,74 g/L e de que este resultado se situa dentro dos intervalos regulamentarmente definidos como erros máximos admissíveis, na impossibilidade de determinar em qual deles se situa, concluir-se-á, na aplicação prática do princípio da presunção da inocência na vertente in dubio pro reo, no sentido do erro mínimo e, assim, pela aplicação da taxa de desconto de 30% sobre aquele valor indicado no alcoolímetro.
9 - A incerteza irremovível e inultrapassável relativamente à existência e concreta expressão do desvio entre o valor da indicação e o valor padrão, inerente às medições ainda que efectuadas por alcoolímetros que obedeçam a todas as normas regulamentares, constitui fundamento para que se proceda - por aplicação dos princípios e regras probatórias que regem o processo penal - ao desconto do valor do erro máximo admissível definido no quadro anexo à Portaria nº 1556/2007 ao valor de TAS indicado no talão emitido pelo alcoolímetro.
10 - Quanto às consequências jurídicas de tal consideração, deverão manter-se válidos os pressupostos considerados na douta sentença sob recurso relativamente aos elementos determinativos da escolha da pena, apenas com a ressalva no que concerne à medida das mesmas, atento o grau de ilicitude que, por via da alteração a introduzir, deverá ser reduzido de forma relativa, o que deverá ser tido em consideração no cálculo do seu quantum penal.
11 - Por outro lado, o nº 2 do art. 69.º do C.P. prevê que: “A proibição … pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria.”
12 - Tal previsão permite a restrição da proibição de conduzir veículos com motor na via pública a determinadas categorias de veículos, permitindo a condução de outra ou outras.
13 - Considerando a natureza do crime praticado – de perigo comum abstracto – em que se pune a circunstância do agente se ter disposto a conduzir na via pública sob o efeito do álcool, representando desse modo a probabilidade de um dano para a vida ou integridade física do próprio ou de terceiros (resultando, assim, o perigo do próprio comportamento do agente e não da categoria do veículo que conduz) a aplicação de tal restrição terá de resultar como exigência dos próprios factos apurados, afastando a necessidade de sancionar o perigo relativamente à condução de determinados veículos.
14 - No caso dos presentes autos deu-se como provado que o arguido/recorrente exerce a profissão de Mecânico, depreendendo-se, das regras da experiência, que presta assistência técnica numa vasta área do território alentejano.
15 - Os factos em apreço em nada se relacionam com o exercício da sua actividade profissional – o dia da prática dos factos, 24/10/2009, era um Sábado, e os mesmos ocorreram cerca das 04H e 40m.
16 - Toda a pena há-de servir, exclusivamente, finalidades de prevenção geral e especial, no sentido de prevenir o cometimento de novos crimes por parte do arguido e de manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das suas normas que tutelam bens jurídicos essenciais pelo que, não retirar da sanção a condução do seu veículo de trabalho representa um excesso de punição que apenas se justificaria à luz das teorias retributivas dos fins das penas, ou seja, para “castigar” o arguido pela sua actuação ilícita.
17 - A inclusão de tal veículo na proibição não é exigida pelas necessidades de prevenção especial, considerando, ainda, o arrependimento demonstrado pelo arguido, e em nada reforça a confiança da comunidade na aplicação da lei, uma vez que a sua exclusão não põe em causa o sentimento de confiança do cidadão nas instituições jurídico-penais.
18 - A pena a aplicar deve permitir que o arguido continue a exercer a sua actividade profissional, continuando integrado a esse nível, sendo certo que a condução será exercida em obediência e no exclusivo âmbito da sua actividade profissional, sem que possa beneficiar da mesma ao nível pessoal.
19 - Razão pela qual se pede seja excluída da pena acessória de inibição de conduzir o veículo ligeiro, de passageiros, utilizado pelo arguido na sua profissão, de marca OPEL, modelo FRONTERA, matriculado sob o nº GP.
Nestes termos e nos demais de Direito, com o Douto Suprimento de V.ªs Ex.ªs, deve ser dado provimento ao presente recurso, e, consequentemente, deve a Douta Decisão recorrida ser anulada, condenando-se o ora recorrente:
- Na pena acessória de inibição de conduzir veículos com motor na via pública, pelo período de três meses.
- Com excepção do veículo ligeiro, comercial, utilizado pelo arguido na sua profissão, de marca OPEL, modelo FRONTERA, matriculado sob o nº GP”.
O Ministério Público na primeira instância apresentou resposta ao recurso, concluindo pela total improcedência do mesmo.
Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.
Notificado o arguido, nos termos do disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, não foi apresentada qualquer resposta.
Foram colhidos os vistos legais.
Procedeu-se à conferência, cumprindo, agora, apreciar e decidir.
II - FUNDAMENTAÇÃO.
1 - Delimitação do objecto do recurso.
É pacífica a jurisprudência do S.T.J. no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, do conhecimento das questões oficiosas (artigo 410º, nºs 2 e 3, do C. P. Penal).
Ora, as questões suscitadas pelo recorrente no presente recurso são, em síntese, as seguintes:
1ª - A pena acessória que foi imposta ao arguido é excessiva e desproporcionada, devendo a mesma ser reduzida a um período que não ultrapasse os 3 meses?
2ª - Deve ou não o julgador fazer descontos de margens de erro sobre o valor constante dos talões emitidos pelos aparelhos alcoolímetros aprovados e ensaiados pelo I.P.Q.?
3ª - A pena acessória a aplicar deve permitir que o arguido continue a exercer a sua actividade profissional, devendo ser excluído do âmbito da proibição de conduzir o veículo de matrícula 40-85-GP, utilizado pelo arguido no exercício da sua profissão?
2 - A decisão recorrida.
A sentença recorrida, no que concerne aos factos (provados e não provados) e à fundamentação da decisão de facto, é do seguinte teor:
“O Tribunal, discutida a causa, tem como provados os seguintes factos:
No dia 24 de Outubro de 2009, cerca das 04h40m, o arguido J conduzia o veículo automóvel, ligeiro de passageiros, de matrícula GP, pelo Largo Luís de Camões, em Évora, após ter ingerido bebidas alcoólicas.
O arguido foi,...
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