ACÓRDÃO N.º 250/2009
Processo n.º 389/09
(Por apenso ao Processo n.º 6/PE
Plenário
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – O Partido Humanista (PH), dizendo-se inconformado com o Acórdão n.º 231/2009, proferido pela 3.ª Secção, que indeferiu a reclamação deduzida pelo mesmo partido contra o Acórdão n.º 227/2009, o qual, por sua vez, decidiu rejeitar, nos termos do artigo 28.º, n.º 2, da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, a lista de candidatura à eleição para deputados do Parlamento Europeu, a realizar no dia 7 de Junho próximo, por si apresentada, dele recorre para o Plenário, terminando a pedir a revogação da decisão recorrida “mediante a admissão do candidato rejeitado e, por tabela, da lista de candidatura do Partido Humanista” e, “sem prescindir, prevendo a hipótese de não ser dado provimento ao recurso, então [que o Tribunal considere que], o recorrente procede desde já, a título subsidiário, à substituição do seu cabeça de lista do seguinte modo, ao abrigo do disposto no artigo 37.º, n.os 1 a) e 2 da citada Lei n.º 14/79: todos os demais candidatos integrantes da sua lista subirão uma posição na mesma, pelo que a actual candidata n.º 2 passará para nº 1, substituindo aquele, e assim sucessivamente”.
2 – Nas suas alegações de recurso, o recorrente refuta a correcção do decidido com base na argumentação que condensou nas seguintes conclusões:
1. A República Portuguesa assenta no respeito e na garantia da efectivação dos direitos fundamentais e no aprofundamento da democracia participativa.
2. O direito de concorrer a um cargo público electivo, como é o caso de deputado ao Parlamento Europeu, configura um direito e liberdade fundamental de participação política.
3. A restrição a esse direito só pode ser feita por lei expressa (nos termos e condições do artigo 18º, n.ºs 2 e 3 da CRP), insusceptível de interpretação extensiva ou aplicação analógica, sob pena de perversão dos princípios constitucionais estruturantes da República Portuguesa.
4. Apesar de caber na previsão normativa do artigo 50º, nº 3 da CRP, o artigo 5º f) da Lei nº 14/87, de 29 de Abril, não se refere expressamente aos juízes de paz, mas sim tão-só aos “juízes em exercício de funções”, querendo com isso apenas limitar a inelegibilidade aos Juízes de Direito que estejam em efectividade de funções.
5. Assim, a aplicação desta norma aos juízes de paz é, no mínimo, duvidosa, devendo essa dúvida ser resolvida, em qualquer caso, a favor da prevalência dos direitos fundamentais do cidadão, isto é, da elegibilidade dos juízes de paz.
6. Na verdade, os julgados de paz, embora sejam classificados como uma categoria de tribunais, não podem ser havidos como órgãos de soberania e não partilham a função jurisdicional com os tribunais, sendo antes uma instância não jurisdicional ou para-jurisdicional de resolução alternativa de conflitos, de criação facultativa.
7. E os juízes de paz não têm o estatuto dos Juízes de Direito. Estes, são titulares de um órgão de soberania e têm estatuto próprio. Aqueles, são equiparados a técnicos superiores da administração pública, não passando de funcionários públicos qualificados aos quais se aplicam os direitos e deveres do funcionalismo público.
8. Assim sendo, os juízes de paz não estão abrangidos pela norma do artigo 5º f) da Lei nº 14/87, de 29 de Abril, quer porque o referido preceito não os inclui, quer porque não se podem equiparar aos “juízes em exercício de funções”, sob pena de violação do princípio da igualdade (cfr. artigo 13º da CRP), na sua dupla dimensão de “tratar igual o que é igual e diferente o que é diferente”.
9. Deste modo, a decisão recorrida viola os artigos 48º nº 1 e 50º, n.os 1 e 2 da CRP, devendo, pois, ser revogada mediante a admissão do candidato rejeitado e, por tabela, da lista de candidatura do Partido Humanista.
10. Aliás, a decisão recorrida enferma de nulidade, dado não se ter pronunciado sobre todas as questões suscitadas pelo recorrente, nomeadamente quanto à inserção dos julgados de paz na previsão normativa do artigo 202º, nº 4 da CRP e à sua alternatividade em relação aos tribunais judiciais, bem como em relação à admissibilidade da sua lista de candidatura na hipótese de não apresentação ou improcedência do presente recurso.
B – Fundamentação
3 – Como decorre da última conclusão das alegações, e traduzindo afirmação anteriormente exarada, o recorrente apoda o acórdão recorrido de sofrer de nulidade, por este “não se ter pronunciado sobre todas as questões suscitadas pelo recorrente, nomeadamente quanto à inserção dos julgados de paz na previsão normativa do artigo 202.º, n.º 4, da CRP e à sua alternatividade em relação aos tribunais judiciais, bem como em relação à admissibilidade da sua lista de candidatura na hipótese de não apresentação ou improcedência do presente recurso”.
Estando posta em causa a validade do acórdão recorrido, por aí urge começar, por razões de precedência lógico-jurídica, a apreciação do recurso.
Ao contrário, todavia, do defendido, o acórdão recorrido não padece de qualquer nulidade por omissão de pronúncia.
Senão vejamos. E começando pela última causa de nulidade assacada. A admissibilidade da lista de candidatura do recorrente, aquando da dedução da reclamação prevista no n.º 1 do artigo 30.º da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio (aplicável por mor do disposto no art.º 1.º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril), era uma questão que só poderia ser colocada nos termos do artigo 37.º, n.º 1, alínea a) daquela Lei, ultrapassado que estava o momento previsto no artigo 28.º, n.º 2, do mesmo diploma. Na verdade, e dando execução a este preceito, o Tribunal, pelo seu Acórdão n.º 212/2009, ordenara já a notificação do mandatário da lista para que procedesse à substituição do candidato tido por inelegível, no prazo de dois dias, sob pena de rejeição de toda a lista.
Sendo assim, a substituição de candidatos apenas poderia ocorrer ao abrigo do disposto no referido artigo 37.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 14/79, que prevê que “apenas há lugar à substituição de candidatos até quinze dias antes das eleições em caso de eliminação em virtude de julgamento definitivo de recurso fundado na inelegibilidade”.
Estando, todavia, o recorrente a reclamar da decisão de rejeição da lista e tendo anunciado que viria, ainda, recorrer da pronúncia que o tribunal fizesse sobre essa reclamação – caso não lhe fosse favorável – não podia o acórdão recorrido...