Acórdão nº 2441/09.9TAGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18-11-2013
Data de Julgamento | 18 Novembro 2013 |
Número Acordão | 2441/09.9TAGMR.G1 |
Ano | 2013 |
Órgão | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acórdão
I - RELATÓRIO
1. No processo Comum (tribunal Singular n.º 2441/09.9 TAGMR, do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, foi proferido despacho, nos autos de fls. 275 a 277, no qual foi homologada a desistência de queixa apresentada pelo ofendido e assistente Francisco Ferreira, bem como ainda do pedido de indemnização civil que este havia formulado-.
2. Ali se decidindo não condenar o assistente no pagamento das custas processuais relativas à instância criminal.
(…)»
3. Inconformado, o MP recorre, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [fls.285 ]:
«(…)
CONCLUSÕES
l- v - EM CONCLUSÃO
1 - Nos presentes autos, por decisão proferida na ata de audiência de julgamento de 19 de Fevereiro de 2013 foram homologadas as desistências de queixa e do pedido de indemnização civil apresentadas pelo assistente / demandante, e foi então decidido: ( ... ) "não
condenar o assistente desistente no pagamento das custas processuais devidas pela instância criminal, atento o disposto no art. o 517. o, alínea a) do Código de Processo Penal";
2 - O nosso dissídio para com o decidido nos autos, com todo o alto respeito que nos merece a posição ali vertida, é o entendimento que, diversamente do decidido e no sentido da posição por nós oportunamente manifestada nos autos - cfr. fls. 275, impor-se-ia a condenação do assistente na taxa de justiça e encargos devidos, na conjugação do disposto nos artigos 515.°,
n.01, alínea d) e 519.° do Código de Processo Penal.
3 - Na verdade, concatenando o disposto nos artigos 515.°, n.°I, alínea d), 517.° e 518.° do Código de Processo Penal é possível afirmar-se que não estão nos autos reunidos os necessários pressupostos para que o assistente beneficie da decretada isenção do pagamento da taxa de justiça devida e os encargos associados à atividade a que deu lugar;
4 - Com efeito, das diversas versões que o artigo 517.° do Código de Processo Penal já teve ao longo da sua existência a par ainda do que dispõe o artigo 515.°, n."l , alínea d). parece resultar o entendimento que a isenção do pagamento da taxa de justiça pelo assistente tem lugar quando ocorra absolvição por razões supervenientes à acusação particular que formulou que não lhe sejam imputáveis.
5 - Ora desde logo, no caso dos autos não se está perante qualquer absolvição, uma vez que o julgamento não foi sequer iniciado e o tribunal não tomou decisão sobre o mérito da absolvição do arguido (sendo que entre elas se podem contar, por exemplo, a descriminalização dos factos imputados, a amnistia, a prescrição, etc.);
9 - De facto a expressão /I razão não imputável/l, surgindo dispersa em diversas outras normas - cfr. designadamente artigos 49.°, n.03 e 59.°, n.06 do Código Penal =, assim tem sido interpretada no sentido de razão cujos efeitos não são dominados, subtraída a qualquer possibilidade de conformação ou intervenção, no caso, do assistente;
10 - Para o caso poder integrar a previsão da norma, terão que se tratar de razões (circunstâncias) que hão-de conduzir à não condenação do arguido, ocorrendo em momento anterior ao conhecimento de mérito da causa ou sendo dele contemporâneas, isto é, sendo
conhecidas e declaradas na decisão proferida após realização do julgamento, mas cujos efeitos não são domináveis pelo ofendido/ assistente.
11 - Ora no caso da desistência de queixa tal acto surge intrinsecamente ligado ao declarante e a ele imputável, muito embora na sua base possa estar (como normalmente acontece) uma reparação do crime e cujo efeito é por si pretendido e dominável (extinção do
procedimento) .
12 - Na verdade, como bem sabemos, nos casos de desistência de queixa o que está na sua base é um prévio entendimento entre as partes (ofendido/arguido) e em que o ofendido/ assistente antes de avançar com a desistência procura e obtém a reparação que considera satisfatória para dar o seu perdão ao arguido, perdão esse é aceite pelo arguido e onde a vontade de ambos conflui no sentido da extinção do procedimento e com isso evitar o julgamento, fazendo por via de tal desistência por termo ao processo.
13 - E se é esta a realidade, resulta que a interpretação efetuada na decisão posta em crise implicará um completo esvaziamento da alínea d) do n."l do artigo SIS," do Código de Processo Penal. na parte em que prevê o caso de desistência de queixa como um caso sujeito a tributação;
14 - Pois que, estando-se na presença de um crime de natureza particular (e no dos autos um caso em que a acusação particular não foi acompanhada pelo Ministério Público), com aquela interpretação acolhida pelo tribunal a quo estar-se-á a deixar entrar pela janela (artigo 517.°) aquilo que o legislador impediu que entrasse pela porta (artigo 515.°), com a atribuição de uma isenção de custos pelo uso da máquina penal pública para um caso "de natureza particular", passando tal norma a funcionar qual SCUT;
15 - E disso é exemplo paradigmático o caso dos autos. Duzentas e setenta e oito folhas de processado, com diligências efectuadas em comarcas diferentes, intervenção de OPe, magistrados, funcionários e pedindo-se € 5,500 de indemnização, com um singelo pedido de desculpas volvidos três anos e dois meses sobre a queixa crime e relativamente ao qual o arguido se considerou reparado, fica o assistente isento do pagamento de quaisquer quantias (taxa de justiça e encargos);
16 - Por outro lado, tal interpretação dada pelo tribunal conduzirá ainda a enviesamentos interpretativos, pois que quem se declarar reparado e desistir da queixa fica isento de pagamento de taxa de justiça e com isso ganha uma isenção de pagamento de encargos que a sua atividade deu lugar, e quem nada disser, mesmo tendo havido reparação, e desistir pura e simplesmente, paga taxa de justiça e encargos.
17 - Também a interpretação acolhida na decisão conflitua com a harmonia do sistema, naquilo que constitui a previsão na norma adjetiva civil - artigo 451.°, n.01 do Código de Processo Civil-, resultando incongruente que para os casos em que se decide pedir a reparação de um dano conexo com um crime por via de uma ação cível (no caso de estarem reunidos os pressupostos para o afastamento do principio da adesão) a desistência implique um necessário custo para o desistente e se se vier a optar e obter a reparação do dano por via da ação penal fique isento de pagamento.
18 - Aliás, na alteração ao Regulamento das Custas Processuais feita pela Lei n.º 7/2012 de 13 de Fevereiro, no incentivo à extinção da instância no seu Artigo 5.°, contemplando diversos tipos de desistência, não se fez incluir "desistências de queixa" que bem se sabia ser ato sujeito a taxa de justiça (e até de encargos no caso de crimes de natureza particular) e não fora esta norma e o tribunal teria condenado o demandante desistente nas custas pela desistência do pedido de indemnização civil.
19 - Por fim, cremos que a interpretação que assim fazemos do disposto no artigo 517.° do Código de Processo Penal o é de acordo com a Constituição da República Portuguesa pois que, com aquilo que os autos demonstram, não se estará na presença de uma qualquer desproteção da vítima, mas sim na responsabilização de alguém que assume a qualidade de assistente (sujeito processual) depois de apresentar queixa e conforma um procedimento criminal por crime de natureza particular,...
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