Acórdão nº 2403/09.6BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 31-10-2019

Judgment Date31 October 2019
Acordao Number2403/09.6BELRS
Year2019
CourtTribunal Central Administrativo Sul
Acórdão

I – Relatório

B... – Reciclagem de Sucatas, S.A.” intentou no Tribunal Tributário de Lisboa a presente Impugnação Judicial pedindo a anulação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa deduzida dos actos de liquidação adicional de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e respectivos Juros Compensatórios, referentes ao exercício de 2004, no montante global de 6.935,11€

Por sentença do mencionado Tribunal, de 12 de Novembro de 2018, a Impugnação Judicial foi julgada procedente e anuladas as liquidações sindicadas.

Inconformada a Fazenda Pública recorre dessa decisão para este Tribunal Central Administrativo tendo, nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões:


«A.
A questão a apreciar e a decidir no presente recurso versa unicamente sobre a legalidade da liquidação adicional de IRC e correspondentes juros compensatórios, proveniente da correcção efectuada pelo serviço de Inspecção Tributária (SIT), relativa ao exercício de 2004.

B.
Da leitura da sentença recorrida vislumbramos que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo se apoiou, essencialmente, no depoimento das testemunhas para proferir a decisão em crise, no entanto, não pode a Fazenda Pública concordar com o decidido uma vez que os factos presentes nas alíneas O) a X) do elenco probatório não logram demonstrar cabalmente a realidade das operações objecto dos autos.

C.
Dispõe o artigo 42º, nº1, al. g) do CIRC, vigente à data dos factos, que não se pode considerar para efeitos de apuramento do lucro tributável os encargos não devidamente documentados, mais dispondo o artigo 23º do CIRC que se consideram custos ou perdas do exercício os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

D.
Quando a Autoridade Tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74º da LGT, competindo à Autoridade Tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade, passando a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção.

E.
A AT não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo, invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada da operação referida na factura ser simulada, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade, prevista no art.75º da LGT.

F.
Considera a Fazenda Pública que a Impugnante não logrou demonstrar cabalmente que as operações objecto dos autos eram reais, tendo o Meritíssimo Juiz valorado erradamente os depoimentos das testemunhas, atribuindo-lhes uma força probatória superior a toda a restante prova documental presente nos autos.

G.
Ao contrário do defendido pela sociedade impugnante, ora recorrida, a Autoridade Tributária apresentou elementos que põem em causa a efectiva realização das operações: incongruência entre elementos, falta de documentos de suporte e discrepância entre as declarações dos intervenientes.

H.
Atento todo o supra exposto, não podia o Meritíssimo Juiz ter valorado o depoimento das testemunhas apresentadas pela impugnante de forma a considerar a acção procedente, uma vez que o fez em detrimento de toda a prova presente nos autos em sentido contrário.

I.
Nesta conformidade, deve considerar-se que a impugnante não apresentou prova da materialidade das operações constantes na factura, não podendo o custo constante da mesma ser deduzido, ao abrigo do art.º23º do CIRC à data vigente, atento o disposto na al. g) do n.º 1 do art.42º do mesmo diploma legal, tendo a Autoridade Tributária agido no estrito cumprimento da lei ao emitir a liquidação adicional impugnada, que deverá ser mantida no ordenamento jurídico.

J.
Neste contexto, entende a Fazenda Pública que o Tribunal a quo errou no seu julgamento de facto e direito, enfermando a sentença de uma errónea apreciação dos factos dos factos apurados como relevantes para a decisão e de uma errada interpretação da lei aplicável ao caso em apreço, devendo a sentença ser revogada.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente.

Porém, V. Exas. Decidindo, farão a costumada JUSTIÇA.»

A Sociedade Impugnante, doravante Recorrida, notificada da interposição do recurso jurisdicional e da sua admissão, apresentou contra-alegações, aí oferecendo as seguintes conclusões:

«1ª) As várias alusões deixadas nas alegações pelo Recorrente (RFP) à errónea apreciação dos factos relevantes, nomeadamente nos pontos 4, 6, 7 e 26 e consequente formal enquadramento no erro de julgamento (art.125º do CPPT e art.615º do CPC) são isso sim e na verdade formas indirectas e disfarçadas do mesmo dizer que impugna a decisão da sentença quanto à matéria de facto.

2ª) Não tendo na situação “sub Júdice” o RFP cumprido o que lhe está formalmente imposto (ali.a) do nº 2, ali. a), b) e c) do nº 1 ambos do art.640º do CPC) este Recurso deve ser rejeitado desde já e “ab initio”, como já decidido no Acórdão do TCA Sul lavrado no proc. 09966/16 do dia 12 de Janeiro do ano de 2017.

3ª) Toda a matéria de facto – EM CONCRETO - considerada como assente (ou provada) e que consta da pág. 4 até à pág. 10 da sentença, sob as letras A a Z, não foi colocada em crise (causa) pela Recorrente que jamais utilizou o procedimento do art. 640º do CPC, pelo que, “in totum” se consolidou a mesma com carácter definitivo para este processo não sendo modificável total ou parcialmente.

4ª) A regra na apreciação da prova (toda ela: testemunhal, documental, outra) é no sistema processual Português, o da livre convicção do Sr. Juiz (art.607º Nº 5 do CPC e art.127º do C.P. Penal), conforme a sua convicção e experiência acumulada, mas jamais com arbitrariedade ou capricho, tendo que obrigatoriamente fundamentar as suas decisões – vide neste contexto os nºs 1 e 2 do art.123º do CPPT)

5ª) Nas alegações o RFP consciente e voluntariamente nos seus pontos com os nºs 3 e 7 desconsiderou parte da matéria de facto provada (mas que na situação sub judice não impugnou, nem dela recorreu), o que gera subjectivamente discricionariedade e parcialidade na apreciação exclusiva das partes que lhe convém e daí que seja ilegal tal método, com efeito na improcedência do Recurso, como se espera.

6ª) Com essa consciente omissão a RFP quer – MAS TAL NÃO CONSEGUIRÁ – que este Tribunal não considere a materialidade dos factos provados sobre as letras B, C, D e F respeitante à existência de Guia da entrada da sucata (22.214,50€), sua pesagem e conferência, transporte nos veículos da Impugnante e emissão do recibo de quitação.

7ª) As testemunhas foram ouvidas em audiência contraditória sendo instadas pelo RFP e inquiridas pelo Sr. Juiz, tendo feito testemunhos com enorme e elevada razão de ciência e conhecimento directo do negócio (de compra e venda da sucata), pois trabalharam em tal produto nos locais inerentes a essa operação.

8ª) A prova testemunhal, embora sem expressa tipificação legal, é generalizadamente assumida e aceite pelos vários agentes judiciais como a “rainha”, em face da sua imediação, presença física, oralidade, sinais corporais (face, corpo e outros).

Tudo como aqui ocorreu.

9ª) Os factos provados de O a X também têm como motivação da sua aceitação o nº das páginas do PA, escritas no final de cada um dos mesmos.

10ª) Em audiência pública e contraditória a RFP fez às testemunhas as questões que entendeu, em vista de encontrar nas mesmas eventuais hesitações, pormenores ou dúvidas, mas as respostas dadas foram inequivocamente idóneas e verdadeiras, porque todas participaram ao longo do tempo nos vários momentos deste concreto – compra, transformação, transporte e revenda - e realizado negócio (das sucatas).

11ª) Com a tese da RFP sob Recurso está patente o “thema decidendum”, porém a mesma não deixa explicação e gera contradição em vários momentos do mesmo:
a)Porque é que o valor da venda da sucata, realizada pela Impugnante, junto da Siderurgia Nacional, não foi anulada oficiosamente para efeitos de dedução, em cédula de IRC da mesma Sociedade?
b)Porque é que a RFP não levou a audiência de Inquirição das testemunhas os seus técnicos – peritos que elaboraram o Relatório da Inspecção?
c)Porque é que a RFP não valoriza a independência e seriedade da Impugnante, quanto aos actos que esta praticou (com a petição inicial, na inquirição das testemunhas e pelos requerimentos de 2/10/2014 e de 25/9/2017), no sentido de ser conhecido o movimento bancário do cheque emitido para pagamento do preço de sucata?

12ª) A factura (Doc. 20 da p.i. e o facto “G” dos provados) cumpre com rigor o que a lei tipifica nas 6 alíneas do nº 5 do art.36º do IVA (anterior art.35º com 5 alíneas do mesmo código), carecendo de total suporte probatório o redigido em 8 pelo RFP no sentido de que ocorre “inexactidão dos elementos da factura”.

13ª) Inexiste dispositivo legal no ordenamento jurídico positivo Português que exija que da factura (art.35º do Código anterior do IVA e actual art.36º) constem o contrato celebrado, as guias de transporte e de entrada bem como a...

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