Acórdão nº 2375/18.6T8VFX.L1.S3 de Supremo Tribunal de Justiça, 28-10-2020

Data de Julgamento28 Outubro 2020
Case OutcomeINDEFERIDA A ARGUIÇÃO DE NULIDADES
Classe processualREVISTA EXCECIONAL
Número Acordão2375/18.6T8VFX.L1.S3
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Processo n.º 2375/18.6T8VFX.L1.S3 (Revista excecional) - 4ª Secção

CM/LD/JG

Acordam na formação a que se refere o n.º 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1. AA, Autor e Recorrente (Apelante) na ação que propôs contra SCC – SOCIEDADE CENTRAL DE CERVEJAS E BEBIDAS, S.A., veio arguir a nulidade do acórdão que lhe indeferiu o recurso de revista excecional, invocando o disposto do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC e artigo 20.º da CRP, apresentando o seguinte requerimento:

«1. A decisão de que se reclama não admitiu o recurso de revista excecional interposto pelo Recorrente contra Acórdão do Tribunal da Relação, vindo alegar, em suma, que não existe oposição de julgados entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento,

2. postulando que o acórdão fundamento defende, em tese, a admissibilidade de pedidos implícitos, e que o acórdão recorrido não rejeita a admissibilidade de pedidos implícitos, limitando-se, num quadro processual diferente, a revogar decisão anterior, considerando que existira excesso de pronúncia face ao objeto do recurso.

3. E concluindo que se trata de situações diversas que, face às suas particularidades, não poderiam ser equacionadas, em termos de solução jurídica, como tendo na sua base a mesma questão fundamental de direito.

4. Em circunstâncias usuais, a decisão quanto à verificação dos pressupostos de admissibilidade do recurso de revista excecional, devendo ser sumariamente fundamentada, é definitiva, não sendo suscetível de reclamação ou recurso - cfr. artigo 672.º, n.os 3 e 4 do CPC.

Porém,

5. O controlo da legalidade das decisões judiciais é uma garantia constitucionalmente protegida, nos termos do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, sendo corolário do princípio da legalidade que perpassa em todo o ordenamento jurídico português e encontra expressão escrita nas normas adjetivas que regulam o processo.

6. Isto por dizer que independentemente da impossibilidade de apresentação de reclamação ou recurso contra uma decisão com a qual um cidadão português não concorde, o mesmo goza da garantia constitucionalmente protegida relativamente à legalidade dessa mesma decisão.

7. Legalidade essa que se subsume a aspetos formais e a aspetos substantivos, e em particular no que aqui se frisa, passa pela devida e válida fundamentação das decisões judiciais - cfr. se alcança, além do mais, do artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do CPC.

É que

8. A decisão de que se reclama não cuidou de fundamentar devidamente o seu entendimento!

9. O coletivo que não admitiu o recurso de revista excecional ateve-se a uma argumentação vaga, e - salvo o devido respeito -, deixou-se mover pela falta de identidade entre as questões de facto decididas nos acórdãos em confronto, ao invés de considerar apenas e só as questões de direito neles discutidas, ceterís paribus.

10. Concluindo que um acórdão não contradizia o outro, e, portanto, decidindo pelo indeferimento da admissão da revista excecional.

11. Contudo, e seguindo de perto os introitos das alegações do recurso de revista excecional, a questão a decidir prende-se, inevitavelmente, com a decisão sumária proferida pela relatora, mormente se padece de nulidade por excesso de pronúncia no respeitante â existência de um despedimento e sua ilicitude.

12. Conforme facilmente se constata, toda a argumentação do acórdão recorrido quanto a esta questão incidiu na doutrina perfilhada de que ocorre excesso de pronúncia face ao objeto do recurso, que nada refere quanto a qualquer pedido implícito referente à existência de despedimento e sua ilicitude, sendo certo que o próprio Autor, peticionou uma ampliação do pedido, por não ter formulado corretamente ab initio.

13. No respeitante à questão da existência do despedimento e da sua ilicitude, considera ainda, não estarmos perante uma situação de ampliação do pedido pelas razões explanadas na decisão sumária, mormente pelo facto de tal figura jurídica não se destinar à supressão de vícios ou omissões puramente formais, e ainda por mais que não seja porque o Autor não justificou por que razão, apenas na resposta à contestação formulou tais pedidos.

14. Mais se constata da decisão do acórdão recorrido no respeitante à alegada questão da ausência do pedido de declaração da existência de um despedimento e da sua ilicitude, o entendimento de que, independentemente da forma, tenha esta sido ilícita ou não, como o contrato que existiu entre o Autor e a Ré está sempre dependente da vontade e interesse das partes, pretenderem, ou não, o conhecimento judicial da validade, regularidade e ilicitude dessa forma de extinção do seu direito.

15. Nesta senda, entende que a decisão transitada em julgado faz depender os pedidos formulados de reintegração e pagamento dos salários intercalares da existência de um pedido expresso de despedimento ilícito, pelo que não poderia agora o Tribunal da Relação, enveredar pelo argumento da existência de um pedido implícito, face ao caso julgado que se formou.

16. Salvo o devido respeito que é muito, a interpretação efetuada pelo douto acórdão recorrido, viola o dever de gestão processual previsto no n.º 2 do art.º 6.º do CPC, bem como o, n.º 2 do artigo 28.º do CPC e ainda o n.º 1, alínea b) do artigo 389.º do CT.

17. Isto dito, o caso em concreto assume especial particularidade e chama à colação o douto Acórdão n.º 217/12.5TBSAT.C1, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra em 03.12.2013, Proc. 217/12.5, Secção Cível, Relator Teles Pereira, in www.dgsi.pt, segundo o qual, entende que, a efetiva compreensão pelo julgador dentro do processo (dentro de um mesmo processo) de quais os pedidos explícitos e devidamente localizados e de quais os pedidos implícitos e, eventualmente, deslocalizados dentro do articulado - isto no sentido de serem somente apresentados na narração e, portanto, fora da parte conclusiva do articulado inicial e menos claramente - uma incidência deste tipo deve ser objeto de um tratamento coerente e uniforme, porquanto, se se diz algo equivalente a que esse pedido existe, para daí deduzir um pressuposto processual, não se vislumbra como, depois disso, se possa deixar de pressupor a existência desse mesmo pedido (dizer até que ele não foi formulado…) para efeitos de aferição da legitimidade substantiva que é dedutível da formulação desse mesmo pedido.

18. Ainda na esteira do referido acórdão é expresso o entendimento, igualmente partilhado em Acórdão desta Relação de 10/09/2013 (Jorge Arcanjo), também subscrito pelos ora relator e o aqui Primeiro Adjunto: “[o] pedido formulado pelo autor na petição inicial (artigo 467º, nº 1, e) do CPC) deve, em regra, ser feito na conclusão. Contudo, tal não obsta a que possa também ser expresso na parte narrativa do articulado, desde que se revele com nitidez a intenção de obter os efeitos jurídicos pretendidos”.

19. Face ao exposto, dúvidas não poderiam restar que, in casu, o Acórdão da Relação, do qual se recorre, que se encontra em contradição com o douto Acórdão n.º 217/12.5TBSAT.C1, proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra em 03.12.2013, Proc. 217/12.5, Secção Cível, Relator Teles Pereira, in www.dgsi.pt, que assume especial particularidade para o caso em concreto.

20. Tudo isto, conforme melhor se expôs em sede das Alegações do recurso de revista excecional que não foi admitido e, adiante, se retomará.

B. Do poder-dever de condenação no pedido implícito:

21. Sem pretender acrescer ao que já foi dito em sede própria, não é de todo possível ignorar as especificidades do processo de trabalho.

22. Atentando-se aqui e em particular nos poderes especificamente cometidos ao juiz de Trabalho, cujo dever de gestão processual encontra uma dimensão acrescida, concomitante com a extensão dos seus poderes de cognição factual, quando comparados com os iguais mecanismos previstos no processo civil.

23. Veja-se que dispõe o artigo 27.º, n.º 2, al. b), do CPT, que o juiz pode convidar as partes a completar e a corrigir os articulados, quando no decurso do processo reconheça que deixaram de ser articulados factos que podem interessar à decisão da causa.

24. Adicionalmente, o artigo 72.º, n.º 1, do CPT confere ao juiz o poder-dever de ampliar dos temas de prova ou de tomar em consideração na decisão quaisquer factos essenciais que, embora não articulados, surjam no decurso da produção da prova e sejam relevantes para a boa decisão da causa.

25. Assim, embora encontrando óbvias limitações quando confrontado com o princípio processual do dispositivo, é inegável que em matéria laboral, o julgador possui certa autonomia para instar as partes a completar os seus articulados ou, até, a ampliar os temas de prova ou vir a considerar na decisão quaisquer factos essenciais que venham a ser descortinados na produção de prova.

26. O que é por dizer que o Tribunal do Trabalho pode conhecer e condenar além dos factos articulados pelas partes.

27. Factos não são pedidos, porém, e quanto à dicotomia entre os pedidos delimitados pelo autor e o poder jurisdicional do Tribunal do Trabalho em condenar para além dos mesmos ocorre também uma situação a todos os títulos excecional, no princípio de condenação extra vel ultra petitum, positivada no artigo 74.º do CPT.

28. Norma que impõe ao juiz de Trabalho a condenação em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 412.º do CPC, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.

29. Seguindo de perto Artur da Silva Carvalho, “A Condenação Extra Vel Ultra Petitum”, Verbo Jurídico, 2008, trata-se de um mecanismo jurídico-processual único no ordenamento jurídico português, visto que confere ao Juiz o poder de garantir a prevalência da Justiça Material...

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