Acórdão nº 233/09.4TBVNC.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça, 12-01-2017
Judgment Date | 12 January 2017 |
Case Outcome | NEGADA A REVISTA |
Procedure Type | REVISTA |
Acordao Number | 233/09.4TBVNC.G1.S2 |
Court | Supremo Tribunal de Justiça |
Em 2009.10,10, no então Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Cerveira, a Junta de Freguesia de Vila Nova de Cerveira, intentou a presente ação declarativa contra AA - Investimentos Imobiliários e Turísticos, S.A.
Pediu
a) - se declarasse que a ré não é dona nem legítima possuidora da parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26 e do caminho em terra batida, com o trajeto e configuração assinalado a amarelo na planta que se junta como doc. nº 27, e, em consequência
b) - se declarasse que a parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26 e o caminho em terra batida, com o trajeto e configuração assinalado a amarelo na planta que se junta como doc. nº 27, constituem terrenos baldios que são possuídos, utilizados e geridos pelos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira, segundo os usos e costumes, com direito ao seu uso e fruição.
c) - se condenasse a ré a reconhecer o direito de uso e fruição dos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira sobre a parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26 e o caminho em terra batida, com o trajeto e configuração assinalado a amarelo na planta que se junta como doc. nº 27,
d) - se condenasse a ré a demolir todas as construções e obras que fez na parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26, concretamente os muros de vedação de pedra, de blocos de cimento e as vedações com esteios e com rede construídos e o portão colocado no referido caminho em terra batida, e a entregá-la imediatamente à A. completamente livre e devoluta.
e) - se condenasse Ré a pagar à A. a indemnização a liquidar ulteriormente quanto aos prejuízos e danos materiais sofridos com a sua conduta e até efetiva desocupação e entrega, danos que por se encontrarem em curso são neste momento indetermináveis,
f) - e se condenasse a Ré a pagar à A., a título de sanção pecuniária compulsória (artº 829-A do Cód. Civil), uma quantia a fixar pelo Tribunal, por cada dia de atraso na entrega da parcela de terreno com a configuração e delimitação assinalada a cor laranja na planta que se junta como doc. nº 26, após o trânsito em julgado da decisão final.
Alegou
em resumo, que
- à data da criação da Assembleia de Compartes houve delegação dos poderes de administração dos baldios na Junta de freguesia;
- em Cerveira existem vários montes – Monte BB, Monte CC, Monte DD ou DD - contíguos entre si, constituídos por vários prédios rústicos, compostos de mato e pinhal, montes esses que estão submetidos o Regime Florestal parcial, inserindo-se no Perímetro Florestal das Serras de Vieira e Monte EE;
- tais montes têm a área global de 142,7 hectares e a configuração da planta junta à petição inicial;
- há mais de 1, 5, 10, 15, 20, 30, 50, 100, 200 e mais anos, desde tempos imemoriais, que os moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira vêm utilizando colectivamente os terrenos que constituem os referidos montes, Monte BB, Monte CC, Monte DD ou DD, sempre lhes tendo sido permitido o livre acesso a tais montes, os quais se encontravam cruzados por vários carreiros de passagem a pé e por caminhos públicos;
- os terrenos que constituem os montes do BB, Monte CC, Monte DD constituem terrenos baldios, que são geridos pelos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira;
- a ré é dona de um empreendimento que foi construído nos prédios que constituíam a Quinta da …, com a área total de 9,57 hectares, alegando quais as confrontações da referida unidade predial.
- a ré tem vindo a ocupar uma parcela de terreno baldio localizada a poente desse empreendimento, de que é proprietária, ocupando uma parcela de terreno com a área de 20,1 hectares que sempre foi gerida, possuída e utilizada colectivamente pelos moradores de Cerveira, violando os direitos de uso e fruição dos moradores da freguesia de Vila Nova de Cerveira sobre os terrenos baldios dos indicados Montes.
Contestando
e também em resumo, a ré alegou que
- a autora não é parte legítima;
- da freguesia de Cerveira não foi submetida qualquer parcela a terreno baldio no perímetro florestal das Serras de Vieira e Monte EE, deste modo questionando a existência de terrenos baldios na área da circunscrição da freguesia de Cerveira;
- os prédios rústicos referidos na petição inicial estão inscritos a favor da Junta de Freguesia, o que se traduz num contrassenso;
- os terrenos ou são baldios e não são de ninguém, devendo constar de cadastro ou inventário de baldios, que não existe, ou pertencem à Junta de Freguesia;
- da análise dos documentos relativos a esses mesmos prédios rústicos, verifica-se que a área está longe de atingir os 142,7 hectares referidos na petição inicial, além de que, pelas confrontações, verifica-se a existência de inúmeros particulares nas zonas que compõem os montes do BB, CC e DD;
- existe uma justificação notarial efetuada em 1990 pela qual a Câmara Municipal se declara dona de um prédio rústico sito nos Lugares de Chã de ..., Chão … e Por Trás do Espírito Santo e que confronta com a Quinta FF, não obstante a escritura de justificação, afirmando considerar tal prédio baldio;
- ao contrário do alegado pela autora, os montes referidos na petição inicial não são contíguos entre si, uma vez que, não obstante o Monte AA confrontar com a Chá de Vilar, em parte, o Monte BB está separado do Monte AA através de propriedades privadas;
- não é verdade o que a autora alega quanto à utilização isolada ou coletiva, dos montes em causa, com as configurações indicadas na petição inicial;
- é dona da totalidade do prédio denominado Quinta FF e dos demais terrenos anexos onde já edificou diversas moradias na sequência de loteamento aprovado;
- não obstante a Quinta FF pudesse ter a configuração descrita no documento nº 25 junto com a petição inicial, o certo é que a R. adquiriu muitos outros terrenos adjacentes a essa propriedade;
- alega ainda a R. o modo de aquisição das suas propriedades.
Houve réplica, tendo na mesma a autora procedido à alteração e modificação do pedido, alegando que em face da alegação da ré, de que parte dos terrenos que se encontra a ocupar foram adquiridos pela seus anteriores proprietários, e que, já que tratando-se de negócios jurídicos de terrenos baldios, são nulos, impondo-se a declaração de nulidade ou ineficácia dos referidos negócios jurídicos.
Por despacho de fls. 661 e 662, foi admitida a ampliação do pedido formulado pela autora e foi esta convidada a fazer intervir como réus as pessoas mencionadas na contestação e que procederam à transmissão dos prédios para a ré, o que aquela fez por requerimento de fls. 667 a 669 e que foi admitido.
A chamada GG, Lda, uma vez citada, veio fazer seus os articulados da ré.
A fls. 692 e 693, vieram os chamados HH e mulher fazer seus os articulados da ré, dizendo ainda que o prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 771 foi por eles adquirido ao anterior proprietário, II e mulher, e o prédio rústico inscrito na matriz sob o art. 404 foi por eles comprado a JJ e mulher.
Por despacho de fls. 712 e 713, foi a autora convidada a vir concretizar a matéria alegada na petição inicial relativamente ao que efetivamente reivindica, sem mera remissão para as plantas, o que aquela fez.
Proferido despacho saneador – onde a autora foi considerada parte legítima - fixada a matéria assente e elaborada a base instrutória, foi realizada audiência de discussão e julgamento.
Em 2014.04.28, foi proferida sentença, em que se julgou a ação improcedente.
A autora apelou, sem êxito, pois a Relação de Guimarães, por acórdão de 2015.02.25, confirmou a decisão recorrida.
Novamente inconformada, a autora deduziu revista.
Em 2015.10.29, proferido acórdão em que se decidiu revogar o acórdão recorrido “no segmento em que se decidiu não proceder à reapreciação dos depoimentos invocados pelo apelante, determinando que a Relação proceda à integral apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto “.
Em 2016.05.02, foi proferido novo acórdão na Relação de Guimarães, em que se julgou novamente improcedente o recurso e confirmou a sentença recorrida.
Mais uma vez inconformada, a autora deduziu recurso de revista normal e, subsidiariamente, excecional.
Pela relatora do processo na Relação não foi admitida aquela.
Pela formação a que se refere o nº3 do artigo 672º do Código de Processo Civil, foi admitida a revista excecional, com base na alínea a) do nº1 do artigo 672º do Código de Processo Civil, com o esclarecimento que não estando admitida aquela revista normal, as questões sobre a matéria de facto encontravam-se definitivamente resolvidas.
A recorrente apresentou as respectivas alegações e conclusões.
A recorrida contra alegou, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.
Cumpre decidir.
As questões
Tendo em conta que
- o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil;
- nos recursos se apreciam questões e não razões;
- os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido
são os seguintes os temas das questões propostas para resolução:
A) – Matéria de facto
B) – Ónus da prova e presunção.
Os factos
São os seguintes os factos que foram dados como provados nas instâncias:
Por acordo das partes e /ou provados por documento
1. Encontra-se junta aos autos uma ata de reunião de compartes com o teor constante de fls. 29, onde se incluem os seguintes dizeres: “Ata n.º 1 Nos catorze dias do mês de Julho do ano de mil novecentos e noventa e nove, reuniram...
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