Acórdão nº 232/14.4JABRG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 07-09-2016
Data de Julgamento | 07 Setembro 2016 |
Case Outcome | PROVIDO EM PARTE |
Classe processual | RECURSO PENAL |
Número Acordão | 232/14.4JABRG.P1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
No âmbito do processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo n.º 232/14.4JABRG, da Comarca do .... – Instância Central – Secção Criminal – Juiz ..., foram submetidos a julgamento os arguidos:
AA, também conhecido pela alcunha “...”, [...], actualmente preso preventivamente no Estabelecimento Prisional do ...
BB, filha [...], actualmente presa preventivamente no Estabelecimento Prisional de ....
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Na acusação foi imputada aos arguidos, em co-autoria, na forma consumada, e em concurso real, a prática de:
- Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 210.º, n.º 2, alínea b), por referência ao artigo 204.º, n.º 1, alínea f), do Código Penal; e,
- Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas g), h) e j), todos do Código Penal.
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A demandante CC, Mãe da vítima, formulou pedido de indemnização civil contra os arguidos, peticionando a condenação de ambos no pagamento de indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais, no montante global de 126.550,00 €, acrescido de juros legais decorridos desde a data da notificação do pedido de indemnização civil.
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Realizado o julgamento, como se alcança da acta de leitura de fls. 1396/7/8, o Tribunal, nos termos do artigo 358.º, n.º 1 e 3, do CPP, procedeu a uma alteração não substancial da factualidade descrita na acusação, nada tendo sido requerido, tendo a defesa prescindido de qualquer prazo.
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Por acórdão do Tribunal Colectivo de ..., datado de 26 de Fevereiro de 2016, constante de fls. 1.400 a 1.457 do 6.º volume e depositado, pelas razões adiantadas na acta de fls. 1.398 (necessidade de correcção de erros ortográficos), no dia 1 de Março seguinte, conforme declaração de fls. 1.458, foi deliberado:
Parte Criminal
Condenar:
I - O arguido AA, pela prática de:
- Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea g), do Código Penal, na pena de 23 anos de prisão.
- Um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), do Código Penal, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi o arguido AA condenado na pena única de 23 (vinte e três) anos e 3 (três) meses de prisão.
II - A arguida BB, pela prática de:
- Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea g), do Código Penal, na pena de 17 anos de prisão.
- Um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), do Código Penal, na pena de 5 anos de prisão.
Em cúmulo jurídico, na pena única de 18 (dezoito) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
Parte Cível
Julgar o pedido de indemnização parcialmente procedente, condenando ambos os arguidos/demandados, a pagar, solidariamente, a quantia de 111.450,00 €, vencendo juros de mora a partir da notificação do pedido até efectivo pagamento, no que concerne ao valor de 1.450,00 €, atribuído a título de indemnização por danos patrimoniais.
O restante valor - 110.000,00 € - vencerá juros de mora computados desde a presente decisão até efectivo e integral pagamento.
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Inconformados com o assim deliberado, os arguidos interpuseram recursos em separado, sendo ambos endereçados ao Tribunal da Relação do Porto.
Observando a ordem de entrada.
A arguida interpôs recurso, apresentando a motivação de fls. 1.464 a 1.513, que remata com as seguintes conclusões, se bem que a conclusão V não seja obviamente uma conclusão, já que se limita a reproduzir texto do acórdão recorrido reportado a considerações sobre a pena única (transcrição integral, com realces do texto):
I. Afigura-se à aqui Recorrente que, salvo o devido respeito, a decisão proferida no douto Acórdão de fls. ... dos autos, e pela qual foi a aqui recorrente condenada, pela prática de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2 alínea g) do Código Penal, na pena parcelar de 17 anos de prisão e condenada ainda, pela prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 2, alínea b) do Código Penal na pena de cinco anos de prisão, em cumulo jurídico, na pena única de 18 (dezoito) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
II. A escolha da pena reconduz-se, numa perspetiva politico-criminal a um movimento de luta contra a pena de prisão. A este propósito dispõe o art.º 70º do Código Penal que “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e não privativa de liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente os finalidades da punição”. Assim exprime, o legislador, a preferência pelas penas não privativas da liberdade.
III. O disposto no artigo 40.º do Código Penal fornece os critérios que hão-de presidir à aplicação das penas: a proteção dos bens jurídicos e a reintegração social do agente, sendo certo que “em caso algum a medida da pena pode ultrapassar a medida da culpa”. Compaginando o teor do artigo 40.º nº 2 e os elementos contidos no artigo 71.º, ambos do Código Penal, temos que a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente (limite inultrapassável), das exigências de prevenção e tendo-se ainda em linha de conta todas as demais circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime (dos elementos essenciais da infração), deponham a favor do arguido ou contra ele.
IV. A determinação da medida da pena, dentro dos limites, definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção conforme dispõe o art.º 71.º, n.º 1 do Código Penal. Na determinação concreta da pena devem ponderar-se todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal, depuserem a favor ou contra o agente, nomeadamente as referidas no n.º 2 da mesma disposição legal.
V. No caso em concreto, no que respeita à Arguida BB, e tendo em conta que no douto Acórdão se refere que:
“Ponderado o atrás mencionado atendendo às exigências de prevenção geral e especial, bem como a necessidade de ressocialização do arguido, não olvidando que a pena nunca poderá ultrapassar a medida da culpa imputada ao arguido (artigo 40º, n.º 2 do Código Penal), consideramos adequado e proporcional:
(…)
ii) à arguida BB:
Pela prática do crime de roubo a pena parcelar de 5 (cinco) anos de prisão.
Pela prática do crime de homicídio qualificado a pena parcelar 17 (dezassete) anos de prisão.
(…)
Nos casos de concurso efectivo, é necessário determinar a pena que cabe a cada crime - pena parcelar - e em seguida submete-se a punição do concurso às regras dos artigos 77º e 78º do código Penal, estabelecendo uma pena única, a qual se alcança considerando, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
A moldura penal do concurso tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
Com efeito, dispõe o artigo 77º, n.º 1, do Código Penal que quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.
Segundo FIGUEIREDO DIAS, in Direito Penal - As -consequências Jurídicas do Crime, Lisboa, 1994, página 291:
"Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade - unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (...) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalido.de que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta.
(…)
Assim, em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 77º do Código. Penal, considerando a conduta da arguida inerente à gravidade dos factos levados a cabo, não se olvidando que os crimes foram levados na mesma ocasião, estando concatenados, consideramos adequada aplicar à arguida BB a pena única de 18 anos e 4 meses de prisão.”
VI. Porém, salvo o devido respeito e melhor opinião, o Tribunal a quo considerou apenas as circunstâncias que depunham contra a arguida/recorrente, não tendo em momento algum se pronunciado ou valorado qualquer circunstância que depusesse a favor desta, nomeadamente o facto de a mesma, a “pedido” do aqui tribunal recorrido, ter prestado declarações, no sentido de auxiliar o mesmo tribunal e pese embora de forma nervosa, respondeu a todas as perguntas que lhe foram colocadas, e sobretudo a circunstância de a arguida estar convenientemente inserida socialmente, ter modo de vida e não ser portador de antecedentes criminais.
VII. A recorrente tem um passado do qual, até dada altura da sua vida se orgulha, teve exatamente até essa parte da sua vida (concretamente ano de 2014), um comportamento conforme ao direito, sem cometer qualquer crime, reconhecendo os atos ilícitos e os crimes por si praticados.
VIII. Ora, sem prescindir a crítica e respetiva impugnação de parte da matéria de facto dada como provada, mormente a forma como relatada no douto acórdão do Tribunal “a quo”, e conforme supra referimos, o Tribunal a quo nem sequer teve em conta as condições pessoais e sócio-económicas da arguida.
IX. O conteúdo reeducativo das penas consagra, além do aspeto punitivo a reintegração social do delinquente na sociedade. A matriz humanista do nosso direito penal não bloqueia esta realidade, antes a promove. A Recorrente confessou o crime de roubo praticado, bem assim que infelizmente sabia da morte (assassínio) da vítima DD praticada pelo à data seu marido, AA, colaborando com a justiça, terá necessariamente de ser punida. Mas esse castigo não lhe pode nem deve fechar as portas de uma ulterior vida honesta.
X. Assim e...
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