Acórdão nº 231/16.1GABBR.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 03-02-2021

Data de Julgamento03 Fevereiro 2021
Número Acordão231/16.1GABBR.C1
Ano2021
Órgão Tribunal da Relação de Coimbra





Acórdão da 5ª secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra



I – Relatório

1.1. O arguido T. veio recorrer da sentença proferida pelo Juízo Local Criminal das Caldas da Rainha (Juiz 1) do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria que o absolveu da prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º. 1, al. a), 2, 4 e 5, do Cód. Penal, e o condenou pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art.º 181º.1 do Cód. Penal, na pena de 95 dias de multa, à taxa diária de 5 euros e ainda no pedido de indemnização civil no montante de 500,00 euros.

1.2. No recurso em apreciação o recorrente apresentou as seguintes conclusões:

1ª Questão: Extinção por caducidade do direito de queixa da assistente relativamente aos fatos considerados provados nos nºs 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 na douta sentença recorrida, com o consequente arquivamento dos autos quanto a esses fatos e quanto ao crime de injúria que o Tribunal a quo considerou que aqueles fatos integravam e pelos quais condenou o arguido:

a) No caso sub judice, o Tribunal a quo decidiu que as condutas do arguido não integravam a prática de um crime de violência doméstica, mas sim a prática de crime de injúria, crime este pelo qual o Tribunal a quo condenou o arguido.

b) O crime de injúria é um crime particular, e, como tal, exige expressamente a apresentação de queixa como pressuposto do procedimento criminal, e a subsequente acusação particular.

c) A assistente apresentou queixa por violência doméstica no dia 17 de outubro de 2016, por fatos, alegadamente, cometidos em 17.06.2016, 13.09.2016 e 19.09.2016, conforme consta do auto de notícia de fls. 2 e 3 e entre os fatos denunciados está o fato considerado provado no 5.

d) A assistente apresentou a queixa, no dia 17 de outubro de 2016, que deu origem à instauração dos presentes autos, mas não apresentou queixa pelos fatos que o Tribunal a quo considerou provados nos nºs 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 e que considerou integrarem a prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art.º 181º nº 1 do Cód. Penal.

e) O procedimento criminal pelo crime de injúria previsto no art.º 181º nº 1 do Cód. Penal, depende de queixa e da subsequente acusação particular (art.º 188º do Cód. Penal).

f) No caso dos autos, nenhuma queixa foi apresentada pela ofendida contra o arguido relativamente aos fatos considerados provados nºs 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 da douta sentença recorrida.

g) No caso dos autos, admitindo em tese abstrata de raciocínio, que as declarações prestadas pela assistente em 30.01.2018, constantes do auto de inquirição de fls. 216 e seguintes, constituem manifestação da vontade de perseguição criminal do arguido, o certo é que só poderia abranger a actividade desenvolvida nos seis meses anteriores à data de tal inquirição (30.01.2018), uma vez que relativamente aos atos parciais anteriores a esse período de tempo já se mostra extinto por caducidade o direito de queixa, o que obsta a que o arguido possa ser, quanto a eles, criminalmente perseguido.

h) Ora nenhum dos fatos considerados provados nos nºs 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 da douta sentença recorrida ocorreu no período de seis meses imediatamente anterior ao auto de inquirição de fls. 216 (30.01.2018), e, também, não ocorreu no período de seis meses imediatamente anterior à acusação particular deduzida em 09.07.2018 pela assistente.

i) Pelo que deve concluir-se que se mostra extinto por caducidade o direito de queixa da assistente relativamente aos fatos considerados provados nos nºs 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 da douta sentença recorrida.

j) Devendo, consequentemente, proferir-se decisão que revogue o decidido na douta sentença recorrida, no segmento que condenou o arguido pela prática de um crime de injúria, sendo substituído por douta decisão do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra que declare extinto por caducidade o direito de queixa da assistente relativamente aos fatos considerados provados nos nºs 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 na douta sentença recorrida, determinando o consequente arquivamento dos autos quanto a esses fatos e quanto ao crime de injúria que o Tribunal a quo considerou que aqueles fatos integravam e pelos quais condenou o arguido.

2ª Questão: Arquivamento dos autos relativamente ao fato considerado provado no nº 5 na douta sentença recorrida, que não pode integrar a prática de um crime de injúria p. e p. pelo art.º 181º nº 1 do Cód. Penal, por ausência de acusação particular e por falta de legitimidade do Ministério Público para o procedimento criminal pelo crime de injúria, p. e p. pelo art.º 181º nº 1 do Cód. Penal na pessoa da assistente:

k) Atribuída natureza particular ao crime de injúria p. e p. pelo art.º 181º nº 1 do Cód. Penal, pelo art.º 188º do C. Penal, a dedução de acusação particular, imposta pelo art.º 50º do C.P.P., constitui pressuposto processual do procedimento criminal respetivo, ou seja, condição positiva daquele mesmo procedimento que, do mesmo modo, condiciona a responsabilidade penal [Taipa de Carvalho, Sucessão de leis penais, 3ª ed. 2008 p.385].

l) Sendo a falta de acusação particular insuscetível de suprimento, a sua verificação na fase de recurso impede o prosseguimento do procedimento criminal pelo crime respetivo, colocando-se a questão após a condenação do arguido em resultado da qualificação jurídica dos factos provados operada na douta sentença recorrida.

m) Aliás, não sendo passível de suprimento a falta de acusação particular, carece o Ministério Público de legitimidade para o prosseguimento do processo pelo referido crime de injúria – art.º 50º do C.P.P., impondo-se o arquivamento dos autos nessa parte.

n) Com a exposta fundamentação, deve proferir-se decisão que conceda provimento ao recurso, decidindo que, por ausência de acusação particular e falta de legitimidade do Ministério Público para o procedimento criminal pelo crime de injúria, p. e p. pelo art.º 181º nº 1 do Cód. Penal na pessoa da assistente, pelo fato considerado provado no nº 5 na douta sentença recorrida, deve determinar-se o arquivamento dos autos nesta sede relativamente àquele fato que não pode integrar a prática de um crime de injúria p. e p. pelo art.º 181º nº 1 do Cód. Penal.

3ª Questão: Proferindo-se decisão que revogue o decidido na douta sentença recorrida relativamente aos fatos considerados provados nos nºs 7 a 21, considerando quanto aos mesmos extinto por caducidade o direito de queixa e decidindo-se o arquivamento dos autos relativamente ao fato considerado provado nº 5, como o arguido requer, deverá proferir-se decisão revogando os segmentos da douta sentença recorrida que condenou o arguido pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art.º 181º nº 1 do Cód. Penal, e que, consequentemente, condenou o arguido/demandado a entregar à assistente/demandante, a quantia de 500,00 € (quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais, sendo substituída por douta decisão que absolva o arguido da prática do crime por que foi condenado, e que o absolva da condenação em indemnização à assistente:

o) Caso seja dado provimento às questões 1 e 2 suscitadas pelo arguido, por falta de fatos, de ilicitude e de dolo do arguido, deve decidir-se que não se mostram preenchidos os elementos objetivos e os elementos subjetivos do crime de injúria, devendo proferir-se decisão que revogue o decidido na douta sentença recorrida e que absolva o arguido do crime por que foi condenado.

p) Sendo no presente recurso dado provimento às questões 1 e 2 suscitadas pelo arguido, como o arguido requer, o pedido de indemnização civil deixa de se fundar na prática de um crime, deixa de existir a prática de um crime de injúria pelo arguido e deixa de existir responsabilidade criminal do arguido.

q) O pedido de indemnização civil deduzido no processo penal deve ter como causa de pedir os mesmos fatos que são pressuposto da responsabilidade criminal pelos quais o arguido foi acusado e pelos quais foi condenado.

r) Para a fixação do "quantum" indemnizatório terá o julgador de se socorrer das regras estabelecidas no Código Civil, designadamente, das contidas nos artigos 483º e seguintes e 562º e seguintes.

s) Desde logo coloca-se a questão da prescrição relativamente ao pedido de indemnização civil, pois todos os fatos considerados provados nos nºs 7 a 21 ocorreram mais de três anos antes de 30.01.2018, da data do auto de inquirição de fls. 216, e, como tal, relativamente aos fatos considerados provados nos nºs 7 a 21 ocorreu prescrição, nos termos do nº 1 do art.º 498º do Cód. Civil, prescrição que o arguido invoca e que tem por consequência a absolvição do arguido do pedido de indemnização civil deduzido pela assistente.

t) Acresce que o crime de injúria prescreve no prazo de dois anos, nos termos do art.º 118º nº 1 alínea d) do Cód. Penal, pelo que o caso sub judice não beneficia do prazo alargado, previsto no dispõe o nº 3 do art.º 498º do Cód. Civil, para outro tipo de crimes com prazo de prescrição superior a três anos.

u) No caso sub judice, não se verificaram todos os pressupostos da responsabilidade civil, pois os fatos 7 a 21 não podem ser considerados provados, não podem consubstanciar a violação de um direito alheio, não se verificando a ilicitude e a culpa, pressupostos da responsabilidade civil.

v) Pelo que constam provados danos, mas inexistem fatos ilícitos que permitam estabelecer o nexo de causalidade entre os fatos e os danos, pressuposto da responsabilidade civil, pelo que não é possível afirmar que os danos são resultantes de comportamentos do arguido.

w) Dos excertos da douta fundamentação recorrida que se transcreveram, resulta que a douta sentença recorrida relevou, apenas, no contexto em que o fez as...

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