Acórdão nº 229/13.1TBPFR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 16-06-2014
Data de Julgamento | 16 Junho 2014 |
Número Acordão | 229/13.1TBPFR.P1 |
Ano | 2014 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Processo n.º 229/13.1TBPFR.P1
Sumário do acórdão:
I. Com redacção coincidente com a do artigo 64.º do CPC, o artigo 18.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei 3/99 de 3.01), consagra no seu n.º 1 a natureza residual da competência dos tribunais judiciais, definida a partir da enunciação, no mesmo diploma legal, da competência em razão da matéria atribuída aos tribunais de competência específica.
II. O artigo 85.º da citada lei orgânica define, nas suas várias alíneas a competência legalmente atribuída aos tribunais do trabalho, estipulando, nomeadamente, na alínea o), que lhes compete conhecer «[d]as questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal seja directamente competente».
III. Tal normativo exige dois requisitos cumulativos: i) que se trate de uma questão entre sujeitos da relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência; ii) que o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal [do trabalho] seja directamente competente.
IV. O nexo de acessoriedade, de complementaridade e de dependência que justifica a atribuição de competência nos termos da citada alínea pressupõe a natureza substantiva das relações conexas, não bastando a conexão processual
V. Não se discutindo na acção qualquer relação laboral ou outra conexa com esta, mas apenas a questão de saber se os réus se encontram ou não vinculados ao pagamento da quantia peticionada, face ao teor da transacção celebrada no âmbito de uma acção laboral, em que na qualidade de legais representantes da entidade empregadora assumiram a sua responsabilidade solidária relativamente aos créditos dos autores, o juízo cível tem competência material.
I. Relatório
Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto
B…, C…, D…, E…, F…, G…, H…, I…, J…, K…, L…, M…, N… e O… instauraram acção declarativa, sob a forma comum, contra P… e mulher, Q…, S…, Lda., e T…, Lda., pedindo que estes sejam condenados a pagar-lhes os montantes devidos a titulo de créditos salariais, fundando tal pretensão na celebração de uma transacção, judicialmente homologada por sentença, na qual dois os primeiros réus, legais representantes das 3.ª e 4.ª rés, se obrigaram solidariamente com estas no pagamento dos créditos ora peticionados.
Os réus Q…, e T…, Lda., contestaram, alegando em síntese: a Ré S… não tem legitimidade, uma vez que esta foi declarada insolvente, tendo a respectiva sentença transitado em julgado; tal como os autores alegam, os créditos laborais peticionados foram alvo de uma transacção judicial; no entanto, os autores executaram a referida transacção, tendo sido deduzida oposição à execução, que foi procedente quer na primeira, quer na segunda instância, encontrando-se já transitado em julgado tal decisão; o Tribunal é materialmente incompetente, porquanto a causa de pedir se funda em créditos laborais; os créditos peticionados prescreveram; verifica-se o abuso de direito por parte dos autores, que litigam com má fé.
Os autores apresentaram réplica, respondendo à matéria das excepções, alegando: a 3.ª autora tem legitimidade; os réus confundem legitimidade com personalidade judiciária, sendo que a 3.ª autora, apesar da declaração de insolvência, só perde personalidade judiciária com o encerramento da liquidação e respectivo registo, o que ainda não aconteceu; a excepção de incompetência material, deve improceder, porquanto o 1.º e 2.ª ré não foram partes no processo que correu termos no 1.º Juízo do Tribunal de Penafiel, sob o n.º 1716/07.6TTPNF; quanto à excepção de caso julgado e prescrição, os réus não invocam qualquer facto que sustente as excepções.
Realizou-se a “audiência prévia” prevista no artigo 591.º do Código de Processo Civil, na qual, depois de o M.º Juiz declarar que estavam reunidas as condições para decisão imediata do mérito da acção, foi facultada às partes a discussão de facto e de direito da causa.
Foi proferido despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º do Código de Processo Civil, tendo o M.º Juiz conhecido das excepções deduzidas (que julgou improcedentes) e do mérito da causa, concluindo com o seguinte dispositivo:
«Face ao exposto, julgo a presente acção totalmente procedente, por provada, condenando os réus, solidariamente, a pagar aos autores as quantias, tal como segue:
a) à A. B…: 9.855,32 euros
b) à A. C…: 9.035,55 euros
c) ao A. D…: 1.975,99 euros
d) ao A. E…: 2.608,93 euros
e) ao A. F…: 3.926,17 euros
f) ao A. G…: 5.599,67 euros ao A. H…: 11.621,08 euros
h) ao A. I…: 5.391,60 euros
i) ao A. J…: 795,21 euros
j) ao A. K…: 10.376,48 euros
k) ao A. L…: 3.958,07 euros
l) ao A. M…: 10.949,63 euros
m) ao A. N…: 253,00 euros
n) ao A. O…: 4.043,14 euros
2) Quantias que serão acrescidas de juros vencidos e vincendos desde 2.7.2010 até integral pagamento.».
Não se conformaram os réus e interpuseram recurso de apelação, apresentando alegações que concluem desta forma:
«ASSIM E EM CONCLUSÕES
- DECLARAR O TRIBUNAL A QUO COMO INCOMPETENTE PARA A PRESENTE ACÇÃO, NOS TERMOS ART. 85º, AL. O) LOFTJ – JÁ QUE OS VALORES AGORA PETICIONADOS RESULTAM, TÊM A SUA GÉNESE NA EXISTÊNCIA DE CRÉDITOS LABORAIS OU CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA SER O TRIBUNAL DO TRABALHO SEJA O TRIBUNAL DO COMÉRCIO POR ANTES DA TRANSAÇÃO TER SIDO DECLARADA INSOLVENTE A SOCIEDADE DE ONDE RESULTARAM OS CRÉDITOS LABORAIS E CONSEQUENTEMENTE OS VALORES AGORA PETICIONADOS
- ENTENDEMOS QUE O ART. 574º CPC FOI CUMPRIDO PELOS RECORRENTES, NOMEADAMENTE COM OS FATOS ALEGADOS NOS ARTIGOS 22º E 23º DA CONTESTAÇÃO QUE IMPEDIA QUE OS RECORRIDOS VISSEM DE IMEDIATO O SEU PEDIDO RECONHECIDO
TERMOS EM QUE SE REQUER COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS SEJA DECLARADO O TRIBUNAL A QUO INCOMPETENTE MATERIALMENTE PARA APRECIAR A PRESENTE ACÇÃO OU CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA SEJAM REMETIDOS OS AUTOS À 1ª INSTÂNCIA PARA PROSSEGUIMENTO DOS MESMOS.».
Os recorridos apresentaram resposta às alegações de recurso, nas quais alegam a sua intempestividade[1], concluindo que o mesmo deve ser julgado improcedente.
Subiram os autos a este Tribunal, tendo o relator proferido decisão sumária singular, ao abrigo do disposto na...
Sumário do acórdão:
I. Com redacção coincidente com a do artigo 64.º do CPC, o artigo 18.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei 3/99 de 3.01), consagra no seu n.º 1 a natureza residual da competência dos tribunais judiciais, definida a partir da enunciação, no mesmo diploma legal, da competência em razão da matéria atribuída aos tribunais de competência específica.
II. O artigo 85.º da citada lei orgânica define, nas suas várias alíneas a competência legalmente atribuída aos tribunais do trabalho, estipulando, nomeadamente, na alínea o), que lhes compete conhecer «[d]as questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal seja directamente competente».
III. Tal normativo exige dois requisitos cumulativos: i) que se trate de uma questão entre sujeitos da relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência; ii) que o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal [do trabalho] seja directamente competente.
IV. O nexo de acessoriedade, de complementaridade e de dependência que justifica a atribuição de competência nos termos da citada alínea pressupõe a natureza substantiva das relações conexas, não bastando a conexão processual
V. Não se discutindo na acção qualquer relação laboral ou outra conexa com esta, mas apenas a questão de saber se os réus se encontram ou não vinculados ao pagamento da quantia peticionada, face ao teor da transacção celebrada no âmbito de uma acção laboral, em que na qualidade de legais representantes da entidade empregadora assumiram a sua responsabilidade solidária relativamente aos créditos dos autores, o juízo cível tem competência material.
I. Relatório
Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto
B…, C…, D…, E…, F…, G…, H…, I…, J…, K…, L…, M…, N… e O… instauraram acção declarativa, sob a forma comum, contra P… e mulher, Q…, S…, Lda., e T…, Lda., pedindo que estes sejam condenados a pagar-lhes os montantes devidos a titulo de créditos salariais, fundando tal pretensão na celebração de uma transacção, judicialmente homologada por sentença, na qual dois os primeiros réus, legais representantes das 3.ª e 4.ª rés, se obrigaram solidariamente com estas no pagamento dos créditos ora peticionados.
Os réus Q…, e T…, Lda., contestaram, alegando em síntese: a Ré S… não tem legitimidade, uma vez que esta foi declarada insolvente, tendo a respectiva sentença transitado em julgado; tal como os autores alegam, os créditos laborais peticionados foram alvo de uma transacção judicial; no entanto, os autores executaram a referida transacção, tendo sido deduzida oposição à execução, que foi procedente quer na primeira, quer na segunda instância, encontrando-se já transitado em julgado tal decisão; o Tribunal é materialmente incompetente, porquanto a causa de pedir se funda em créditos laborais; os créditos peticionados prescreveram; verifica-se o abuso de direito por parte dos autores, que litigam com má fé.
Os autores apresentaram réplica, respondendo à matéria das excepções, alegando: a 3.ª autora tem legitimidade; os réus confundem legitimidade com personalidade judiciária, sendo que a 3.ª autora, apesar da declaração de insolvência, só perde personalidade judiciária com o encerramento da liquidação e respectivo registo, o que ainda não aconteceu; a excepção de incompetência material, deve improceder, porquanto o 1.º e 2.ª ré não foram partes no processo que correu termos no 1.º Juízo do Tribunal de Penafiel, sob o n.º 1716/07.6TTPNF; quanto à excepção de caso julgado e prescrição, os réus não invocam qualquer facto que sustente as excepções.
Realizou-se a “audiência prévia” prevista no artigo 591.º do Código de Processo Civil, na qual, depois de o M.º Juiz declarar que estavam reunidas as condições para decisão imediata do mérito da acção, foi facultada às partes a discussão de facto e de direito da causa.
Foi proferido despacho saneador, nos termos do n.º 1 do artigo 595.º do Código de Processo Civil, tendo o M.º Juiz conhecido das excepções deduzidas (que julgou improcedentes) e do mérito da causa, concluindo com o seguinte dispositivo:
«Face ao exposto, julgo a presente acção totalmente procedente, por provada, condenando os réus, solidariamente, a pagar aos autores as quantias, tal como segue:
a) à A. B…: 9.855,32 euros
b) à A. C…: 9.035,55 euros
c) ao A. D…: 1.975,99 euros
d) ao A. E…: 2.608,93 euros
e) ao A. F…: 3.926,17 euros
f) ao A. G…: 5.599,67 euros ao A. H…: 11.621,08 euros
h) ao A. I…: 5.391,60 euros
i) ao A. J…: 795,21 euros
j) ao A. K…: 10.376,48 euros
k) ao A. L…: 3.958,07 euros
l) ao A. M…: 10.949,63 euros
m) ao A. N…: 253,00 euros
n) ao A. O…: 4.043,14 euros
2) Quantias que serão acrescidas de juros vencidos e vincendos desde 2.7.2010 até integral pagamento.».
Não se conformaram os réus e interpuseram recurso de apelação, apresentando alegações que concluem desta forma:
«ASSIM E EM CONCLUSÕES
- DECLARAR O TRIBUNAL A QUO COMO INCOMPETENTE PARA A PRESENTE ACÇÃO, NOS TERMOS ART. 85º, AL. O) LOFTJ – JÁ QUE OS VALORES AGORA PETICIONADOS RESULTAM, TÊM A SUA GÉNESE NA EXISTÊNCIA DE CRÉDITOS LABORAIS OU CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA SER O TRIBUNAL DO TRABALHO SEJA O TRIBUNAL DO COMÉRCIO POR ANTES DA TRANSAÇÃO TER SIDO DECLARADA INSOLVENTE A SOCIEDADE DE ONDE RESULTARAM OS CRÉDITOS LABORAIS E CONSEQUENTEMENTE OS VALORES AGORA PETICIONADOS
- ENTENDEMOS QUE O ART. 574º CPC FOI CUMPRIDO PELOS RECORRENTES, NOMEADAMENTE COM OS FATOS ALEGADOS NOS ARTIGOS 22º E 23º DA CONTESTAÇÃO QUE IMPEDIA QUE OS RECORRIDOS VISSEM DE IMEDIATO O SEU PEDIDO RECONHECIDO
TERMOS EM QUE SE REQUER COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS SEJA DECLARADO O TRIBUNAL A QUO INCOMPETENTE MATERIALMENTE PARA APRECIAR A PRESENTE ACÇÃO OU CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA SEJAM REMETIDOS OS AUTOS À 1ª INSTÂNCIA PARA PROSSEGUIMENTO DOS MESMOS.».
Os recorridos apresentaram resposta às alegações de recurso, nas quais alegam a sua intempestividade[1], concluindo que o mesmo deve ser julgado improcedente.
Subiram os autos a este Tribunal, tendo o relator proferido decisão sumária singular, ao abrigo do disposto na...
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