Acórdão nº 21702/13.6T2SNT-A.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 24-01-2019

Data de Julgamento24 Janeiro 2019
Número Acordão21702/13.6T2SNT-A.L1-2
Ano2019
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados

I - RELATÓRIO

C... e M... vieram interpor o presente recurso de apelação da sentença que julgou (apenas) parcialmente procedentes os embargos de executado que deduziram à execução, com processo comum, que contra eles (e A...) foi instaurada por V....
No requerimento executivo, apresentado em 22-08-2013, alegou este último que (sublinhado nosso):
- Por documento particular assinado pelos executados, em 10 de Janeiro de 2012, os executados reconheceram-se como devedores solidários para com o exequente da quantia de 22.445,91€ (vinte e dois mil, quatrocentos e quarenta e cinco euros e noventa e um cêntimos).
- Os executados reconheceram-se devedores de tal quantia e comprometeram-se a pagá-la, nos termos constantes do documento particular por si assinado, que ora se junta como título executivo, com início em Janeiro de 2002.
- Da quantia total de que se reconheceram devedores os executados pagaram até Janeiro de 2004 o valor global de 2727,25€.
- Desde Janeiro de 2004 nenhum dos executados fez qualquer pagamento.
- Apesar de devidamente interpelados pelo exequente desde Janeiro de 2004 que subsistem em dívida 19718,66€ (dezanove mil, setecentos e dezoito euros e sessenta e seis cêntimos) e que nenhum dos executados pagou até à data.
- Sobre a mencionada quantia e desde Janeiro de 2004 venceram-se juros à taxa legal de 4% até à presente data, no valor de 7.098,75€ (sete mil e e noventa e oito euros e setenta e cinco cêntimos) e continuarão a vencer-se até integral pagamento.
- O valor total da dívida é actualmente de 26.817,41€ (vinte e seis mil, oitocentos e dezassete euros e quarenta e um cêntimos), que pela presente se executam.

Em 27-08-2013, foi pelo Agente de Execução informado que havia sido decretada a insolvência do Executado A..., no processo n.º 3767/13.2TBOER do Juízo do Comércio de Sintra, sugerindo que se oficiasse no sentido de obter informação se a insolvência tinha sido de caráter pleno ou limitado, “tendo em conta a eventual suspensão ou continuação destes autos”.
Em 03-09-2013, foi junta, no processo principal, cópia de anúncio, datado de 12-07-2013, dando conta da prolação da sentença de 10-07-2013, que declarou a insolvência do Executado A... e fixou em 30 dias o prazo para a reclamação dos créditos.
Em 03-09-2013, ainda nos autos principais, que vêm prosseguindo apenas contra os ora Embargantes/Apelantes, foi efetuada a penhora do direito de compropriedade do Executado C... na proporção de 1/3 sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de V... sob o n.º 702.
Em 14-09-2015, o Agente de Execução veio informar que “a execução está suspensa em resultado de embargos de terceiros”.

Na petição de embargos, apresentada em 07-10-2013, os executados C... e M... (esta última sem que ainda tivesse sido sequer citada – por o A. E. considerar que não tinha de o fazer, citação que foi expressamente determinada por despacho de 13-07-2015) defenderam-se invocando, em síntese, que:
- O documento particular junto pela exequente consubstancia um contrato de mútuo que deve ter-se como nulo por falta dos requisitos de forma;
- Nunca foram interpelados para pagamento da dívida reclamada em sede executiva;
- A data dos documentos dados à execução é 10-01-2002 (e não 10-01-2012), tendo sido dois documentos, uma cópia e outro que se crê ser o original, com rubricas apostas em diferentes locais, pelo que os documentos são falsos;
- Tendo sido alegado pelo Exequente que os Executados estão em mora desde janeiro de 2004, demorou aquele quase 10 anos a exigir o pagamento da quantia ora reclamada, fazendo-o apenas já depois de ter sido declarada a insolvência do devedor A..., tendo o encerramento do processo de insolvência sido requerido pelo Administrador de Insolvência, em 10-09-2013, conforme relatório que juntam, como doc. 1, e cujo teor dão por inteiramente reproduzido, concluindo que é um abuso do direito a atuação do Exequente e pedindo a “libertação da garantia” nos termos dos artigos 640.º e 648.º, al. c), do CC.
Pugnam pela sua absolvição do pedido e o consequente levantamento da penhora.

Em 13-07-2015 (fls. 44-45), foi proferido despacho que recebeu os embargos de executado.

Em 21-09-2015, foi apresentada Contestação, na qual o Exequente/Embargado se pronunciou pela improcedência das exceções, alegando designadamente que o título executivo é um único documento, que foi assinado em 2002, sendo lapso a data de 2012, documento que não consubstancia um contrato de mútuo, mas um reconhecimento de dívida; e que não sabia que o Executado A... estava em processo de insolvência, nem sequer onde este se encontrava, pois ele andou desaparecido por muitos anos em Portugal e em França.
Realizou-se audiência final de julgamento, após a qual foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
Pelo exposto, julgo os presentes embargos de executado parcialmente procedentes e, em consequência, julgo extinta a execução na parte referente aos juros de mora peticionados em data anterior à citação do executado embargante e à interposição do embargos de executado quanto à executada M... – cfr. artigo 732.º, n.º 4, do Código de Processo Civil.
Mais julgo improcedente a oposição à penhora deduzida pelos embargantes.
Absolvo ambas as partes da condenação como litigantes de má-fé.

Desta decisão vieram os Executados/Embargantes interpor o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões (que reproduzimos sem os destaques a negrito):
1. A douta sentença, ora recorrida, erradamente, não atendeu ao pedido de «libertação da garantia» da fiança prestada pelos embargantes (aqui recorrentes).
2. Não obstante que a douta sentença tenha entendido - e bem - que «não logrou o exequente/embargado demonstrar ter efectuado a interpelação dos embargantes em data anterior à interposição da execução contra os mesmos, designadamente desde Janeiro de 2004». E, portanto, considerou que «No caso dos presentes autos, efectivamente, não se provou a interpelação dos embargantes prévia à interposição da presente execução».
3. Contudo, vem a concluir a mesma douta sentença, ora recorrida - mas erradamente - que «tal não tem outra consequência que não aquela que diz respeito aos juros de mora devidos, não afectando a exequibilidade do título apresentado pelo exequente...».
4. Não pode ser, com o devido respeito. O credor/exequente deixou passar 116 meses, ou seja, quase uma década (1) até se dispor a intentar a presente acção executiva, não tendo demonstrado nos autos ter interpelado os fiadores para efectuarem o pagamento durante todo esse tempo.
5. E isso não releva apenas para efeitos de juros de mora devidos - como erradamente se entendeu na decisão recorrida - atentas as circunstâncias do caso.
6. E isto assim, pois que, quando o credor exequente vem intentar a presente acção em final de Agosto de 2013, quase dez anos depois da mora, já o devedor A... havia sido declarado insolvente (facto provado n.º 2) sem que o credor tenha reclamado o seu crédito nesse processo (vd. relatório do Administrador cfr. facto provado n.º 2).
7. É que, uma coisa é o credor interpelar o fiador para pagar quando o devedor está em mora há 2, 3 ou 6 meses. Outra coisa, bem diferente, é o credor que deixa passar quase 10 anos, tendo o devedor inclusive acabado por ficar, ao fim desses quase 10 anos, em processo de insolvência - repita-se: sem que tão pouco o credor vá nesse mesmo processo reclamar o seu crédito (!) - e é, repare-se, apenas e só já depois de declarada aquela insolvência do devedor que surge então a (presente) acção executiva do credor a exigir judicialmente aos fiadores esse pagamento.
8. A douta sentença, erradamente, considerou que «não foi alegado nem demonstrado qualquer facto que permitisse concluir que caso o exequente tivesse actuado judicialmente em momento anterior os ora embargantes não tivessem que responder pela dívida exequenda».
9. Com o devido respeito, a insolvência do devedor A..., vários anos após a entrada em mora com o credor exequente, é um facto provado nos autos e que não pode deixar de ser considerado como relevante na solução jurídica do caso.
10. Como relevante é o decurso de tempo que o credor exequente levou a intentar a acção executiva e a “chamar” os fiadores a pagarem o que não recebeu atempadamente do devedor A....
11. E, tanto assim, que a douta sentença dentro dos factos que considerou provados «com relevância para a decisão da causa» tem no seu facto provado n.º 2 que: «O co-executado A... foi declarado insolvente a 10-07-2013, tendo no âmbito do respectivo processo de insolvência, o Sr. Administrador proposto, no seu relatório datado de 10 de Setembro de 2013, o encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente».
12. Repare-se que no «escrito datado de 10 de Janeiro de 2002» (facto provado n.º 1) que os aqui recorrentes e A... eram «devedores solidários, por virtude de contrato de fiança entre as mesmas partes junto» do recorrido (exequente) V....
13. E, é verdade que os aqui recorrentes, nessa qualidade de fiadores, se obrigaram, conforme o contrato de fiança, «a pagar a totalidade da quantia em dívida imediatamente após a simples recepção da comunicação de V..., declarando que A... não cumpriu as obrigações contratuais...». Mas a prova de tal facto não foi feita (cfr. facto não provado n.º 1).
14. Acresce que, como já fizemos referência e está provado nos autos (cfr. facto provado n.º 2) o credor exequente não intentou qualquer acção executiva contra o devedor A..., durante quase 10 anos, nem reclamou o seu crédito no processo de insolvência deste (vide «relatório datado de 10 de Setembro de 2013» do «processo de insolvência» junto aos autos — cfr. facto provado n.º 2).
15. Ora, essa inércia do credor/exequente V... durante
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT