Acórdão nº 21090/22.0T8LSB.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 20-06-2024

Data de Julgamento20 Junho 2024
Número Acordão21090/22.0T8LSB.L1-2
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I. Relatório
Vem a I … – S … M … I …, Ld.ª propor a presente ação declarativa de condenação com a forma e processo comum contra A … e B …, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 7.380,00, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos.
Alega, em síntese, para fundamentar o seu pedido, que celebrou com os RR. um contrato de mediação imobiliária, em regime de exclusividade, tendo desenvolvido todas as diligências tendentes à captação de interessados na aquisição do imóvel dos RR. e logrado encontrar interessado na aquisição do imóvel. Mais alega que os RR. recusaram a proposta efetuada pelo dito interessado e que posteriormente lhe alienaram o imóvel, sem intervenção da A. e sem lhe pagarem o valor da comissão acordado, nem quando foram interpelados para o fazerem.
Devidamente citados os RR. vieram contestar, aceitando a celebração do contrato de mediação imobiliária com a A. e impugnando, no mais, o essencial dos factos alegados, concluindo pela total improcedência da ação e pedindo a condenação da A. como litigante de má fé, no pagamento de multa e indemnização de € 5.000,00 a seu favor.
A A. veio responder ao pedido de condenação como litigante de má fé, concluindo pela sua improcedência.
Foi dispensada a realização de audiência prévia, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.
Realizou-se a audiência final e foi proferida sentença que julgou a ação totalmente procedente e condenou os RR. a pagarem à A. a quantia de €7.380,00, acrescida de juros à taxa legal, vencidos desde 08.07.2022 e vincendos até integral pagamento. Mais absolveu a A. do pedido de condenação como litigante de má-fé e condenou os RR. como litigantes de má-fé no pagamento da multa de 4 (quatro) unidades de conta.
É com esta sentença que os RR. não se conformam e dela vêm interpor recurso pedindo a sua revogação e substituição por decisão que julgue totalmente improcedente o pedido contra si formulado, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que se reproduzem:
A. O A., ora Recorrido, intentou a presente ação judicial contra os Réus, ora Recorrentes, na qual peticionou o pagamento de uma quantia de €7.380,00€, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, a título de remuneração prevista no contrato de mediação imobiliária n.º …/….
B. A causa de pedir fundamenta-se no âmbito do CMI que os RR. se obrigavam a pagar à A. a título de remuneração, a quantia de €6.000,00 (seis mil euros) acrescida de IVA à taxa legal em vigor.
C. Falamos concretamente do contrato de mediação imobiliária n.º …/…, celebrado entre as partes.
D. Quanto ao presente processo judicial, os Recorrentes entendem que a factualidade dada como provada não foi corretamente apreciada e decida pelo tribunal a quo, não tendo a prova sido alvo de um escrutínio e valoração correta pelo tribunal, merecendo assim o reparo a sentença quanto à decisão da matéria de facto.
E. Tendo precisamente em consideração os factos que foram dados como provados e não provados neste processo, entendem os Recorrentes que o tribunal a quo ficou aquém do que devia ter sido decidido.
F. Não houve em tempo algum, qualquer violação de qualquer das clausulas constante do CMI, considerando-se assim e legalmente o contrato resolvido por parte dos RR., tão pouco violaram qualquer clausula de exclusividade, até porque se os contratos se mantivessem em vigor e o proprietário vender o seu bem não se poderá considerar o âmbito de exclusividade, apenas se se tratasse de exclusividade reforçada, ou no contrato tivesse sido convencionada “cláusula de irrevogabilidade”, em face do princípio da liberdade contratual, o que não é o caso.
G. E compreende-se que assim o seja, tendo em consideração que não houve qualquer oposição à rescisão do CMI informada ao A.
H. Parece-nos completamente desajustado o entendimento de que seria exigível por parte do Tribunal “a quo”, o qual deveria ter decidido pela absolvição dos RR., não se tendo feito prova de que os mesmo sabiam que os compradores já haviam se proposto à compra do mesmo bem através da A.
I. O Autor não pode igualmente vir reclamar valores indevidos por um serviço que na verdade não prestou, alias, o A. deveria informar devidamente o seu cliente, os aqui RR. dos dados de quem se propõe comprar e não simplesmente ocultar e vir agora reclamar promoveu junto dos compradores C … e D ….
J. O A, ora Recorrido, ao não ter informado os RR. quem eram os proponentes à compra do seu bem, impossibilitou os RR. de poder recusar o negócio com os compradores C … e D ….
K A omissão do dever de informação a que se encontrava adstrito o A. deu causa direta e necessária à impossibilidade dos RR. na realização da devida venda do bem, estes que foram condenados, pois se não sabiam e não tiveram conhecimento não podem reagir favoravelmente a decisão do Tribunal “a quo” que lhes foi desfavorável.
L. Entendem os RR. que também quanto a este aspeto mal andou o Tribunal a quo, os RR. devem ser consequentemente absolvidos do pedido e da instância.
M. Em suma: tendo em conta a matéria de facto dada como provada e não provada a presente sentença deverá ser reformulada por outra que julgue a ação totalmente improcedente por não provada e os RR. ABSOLVIDOS na integralidade dos pedidos efetuados em sede de petição inicial.
A A. veio responder ao recurso pugnando pela sua improcedência e confirmação da sentença proferida.
II. Questões a decidir
São as seguintes as questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos Recorrentes nas suas conclusões- art.º 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do CPC- salvo questões de conhecimento oficioso- art.º 608.º n.º 2 in fine:
- da (pretensa) impugnação da matéria de facto;
- da (in)existência do direito da A. à remuneração contratualmente acordada.
III. Fundamentos de Facto
- da (pretensa) impugnação da matéria de facto
Os Recorrentes, embora venham manifestar a sua discordância com a decisão sobre a matéria de facto, a verdade é que o fazem apenas em jeito de “desabafo”, sendo forçado até dizer-se que se trata de uma impugnação da matéria de facto em sentido próprio.
Os mesmos limitam-se a afirmar que “entendem que a factualidade dada como provada não foi corretamente apreciada e decidida pelo tribunal a quo, não tendo a prova sido alvo de um escrutínio e valoração correta pelo tribunal, merecendo assim o reparo a sentença quanto à decisão da matéria de facto” e que “tendo precisamente em consideração os factos que foram dados como provados e não provados neste processo, entendem os Recorrentes que o tribunal a quo ficou aquém do que devia ter sido decidido.”
Entende-se, por isso, que não está configurada no presente recurso uma verdadeira impugnação da decisão da matéria de facto, não evidenciando as alegações, nem as conclusões, que os Recorrentes pretendem submeter a mesma à reapreciação deste tribunal.
De qualquer modo, mesmo que se considerasse que os Recorrentes procedem à impugnação da matéria de facto, sempre a mesma teria que ser rejeitada, por total inobservância dos requisitos previstos no art.º 640.º n.º 1 e n.º 2 al. a) do CPC.
Nem na sua alegação de recurso, nem tão pouco nas conclusões os Recorrentes observam qualquer um dos requisitos previstos no art.º 640.º n.º 1 al. a), b) e c) do CPC, já que não identificam nem os factos que consideram incorretamente julgados, não indicam os meios de prova que impõem uma diferente decisão, nem apontam qual ela seja.
O art.º 640.º do CPC impõe um ónus a cargo do Recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto dispondo:
1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o Recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
b) (…)
3. (…)
No caso, os Recorrentes apenas se insurgem genericamente contra a decisão da matéria de facto, não identificando os factos provados ou não provados de que discordam, não indicando a resposta que pretendem que seja dada aos mesmos, nem apontando qualquer elemento de prova que possa fundamentar uma diferente decisão, não fazendo qualquer análise crítica da prova produzida.
Resta concluir, sem necessidade de outras considerações que a entender-se que os Recorrentes vêm impugnar a matéria de facto, sempre a mesma tem de ser rejeitada, nos termos do n.º 1 do art.º 640.º do CPC, pela total omissão dos pressupostos elencados nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 de tal artigo.
*
Resultaram provados e não provados os seguintes factos:
1. A autora é uma sociedade comercial por quotas que se dedica, entre outros, à mediação imobiliária, intermediação na compra, venda, arrendamento ou atividades similares sobre imóveis (artigo 1.º da petição inicial).
2. A autora é detentora da licença AMI n.º …, emitida pelo Instituto dos Mercados Público, do Imobiliário e da Construção (artigo 2.º da petição inicial).
3. No âmbito da sua atividade, a autora explora a marca Re/max no imobiliário português, sendo comercialmente conhecida como Re/max Grupo Lounge.
4. A autora e os réus celebraram, em 03.02.2022, um contrato de mediação
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