Acórdão nº 21/17.4T8CSC.L2-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 04-04-2024

Data de Julgamento04 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão21/17.4T8CSC.L2-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]:

I – RELATÓRIO
1G..., S.A., com sede no Edifício ..., ..., Rua ..., ..., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra:
- S..., Lda., com sede na Avenida ..., ...,
deduzindo o seguinte petitório:
a) ser declarada a resolução do contrato de arrendamento, vigente entre a Autora e a Ré, com fundamento na falta de pagamento da renda, por período superior a três meses;
b) ser a Ré condenada a desocupar o locado, entregando-o à autora livre de pessoas e bens, e no mesmo estado em que o recebeu;
c) ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de € 7.053,20, correspondentes às rendas em dívida, acrescida de juros vencidos e vincendos, até integral e efectivo pagamento, e bem assim no pagamento de todas as rendas que se vencerem até à declaração de resolução do contrato, e respectivos juros vincendos;
d) ser a Ré condenada ao pagamento de indemnização pela ocupação do imóvel, calculada em quantia equivalente ao dobro do valor das rendas actualizadas, pelo período decorrido entre a data da decisão de despejo e a data de entrega efectiva do imóvel;
e) ser a Ré condenada nas custas, em procuradoria e demais encargos.
Subsidiariamente, e para o caso de se considerar nulo o contrato promessa de arrendamento, sem conceder, peticionou dever a Ré:
a) ser condenada a restituir o imóvel desocupado à Autora, no mesmo estado em que se encontrava, à data da ocupação;
b) ser condenada a pagar à Autora as quantias devidas pela ocupação do imóvel, em causa, a título de indemnização, correspondente ao valor das rendas estipuladas no contrato, pelo período dessa utilização, bem como o valor estipulado como renda por cada mês de utilização que na pendência da acção judicial ainda vier a fazer do mesmo imóvel, tudo acrescido dos respectivos juros à taxa legal, até efectivo e integral pagamento;
c) ser a Ré condenada nas custas, em procuradoria e demais encargos legais.
Para tanto, alegou, em resumo, o seguinte:
- É proprietária do imóvel, sito na Av. ..., em ..., Lugar ..., por o ter adquirido à Caixa Geral de Depósitos ;
- após a aquisição, foi confrontada com a existência de um contrato-promessa de arrendamento ;
§ tal contrato teria sido celebrado pelo anterior proprietário BB e a sociedade Ré, detida pelo mesmo BB em conjunto com a irmã, em 01-10-1991, com a validade de 5 anos, automaticamente renovável, e com a renda mensal de 10.000$00 (€ 49,88), a ser paga no primeiro dia útil anterior àquele a que respeita ;
- a Autora, anteriormente à presente acção, procedeu a uma proposta de actualização da renda para o NRAU e interpôs, em 2014, no Balcão Nacional de Arrendamento, um procedimento simplificado de despejo por falta de pagamento de rendas que veio a ser considerado improcedente por o tribunal ter considerado não ter havido prévia notificação da alteração do senhorio ;
- procedeu, então, à notificação da inquilina, em 06-07-2016, dessa alteração do proprietário do imóvel, seguindo-se o procedimento para actualização da renda ao abrigo do NRAU que, considerando os diversos requisitos legais e as características do imóvel, e tendo seguido os procedimentos legais que descreve, se fixou em € 1.750,89, com referência a 30-09-2016 ;
- todavia, a inquilina não procedeu ao pagamento nem das rendas anteriores no valor unitário de € 49,88 nos meses de Julho a Setembro de 2016, nem das rendas posteriores, no valor actualizado de € 1.750,89, nos meses de Outubro de 2016 a Janeiro de 2017 ;
- entende, por isso, encontrar-se em dívida, à data da entrada da acção (03-01-2017), o valor total de € 7.053,20, acrescido de juros de mora, o que justifica o pedido de resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas ;
- bem como a condenação da Ré no pagamento das rendas vencidas, e ainda das rendas que se vencerem na pendência da acção e até ser decretada a resolução do contrato de arrendamento e, a partir daí, o valor correspondente ao dobro das rendas mensais, até efectiva entrega do locado.
2 – Devidamente citada, veio a Ré apresentar contestação, por impugnação e excepção, invocando questões referentes à liquidação da taxa de justiça, à ineptidão da p.i. e à ilegitimidade passiva por não ter sido demandada a subarrendatária do imóvel, ao valor da causa e à pendência de causa prejudicial nos tribunais tributários em que se discute a validade da venda do imóvel à Autora, tendo, ainda, impugnado parcialmente os factos alegados no articulado da Autora.
Mencionou, igualmente, acerca da correspondência trocada entre as partes aquando do processo de transição para o NRAU e actualização da renda, reproduzindo parte dessas missivas, e alegando ter a Autora desconsiderado os argumentos então apresentados para se opôr a esse procedimento e que mantém actualidade.
Mais alegou encontrar-se a proceder ao pagamento da renda ao senhorio por si conhecido em virtude de não ser claro ser a Autora a proprietária do imóvel, bem como a receber a renda da subarrendatária, sem que a questão da reavaliação fiscal do imóvel se mostre resolvida, entendendo, por isso, não poder proceder a acção de despejo por estarem pagas as rendas.
Finalmente, requereu a intervenção nos autos da subarrendatária e a título de reconvenção pediu que fosse reconhecida a existência de uma servidão legal de passagem onerando o prédio em causa (arrendado) em favor de um prédio rústico confinante, “em benefício da proprietária desse imóvel, bem como dos legais representantes da Ré, bem como de CC e seus amigos, para que não sejam privados do direito que exercem há mais de 27 anos”.
Conclui, no sentido de serem conhecidas e declaradas as nulidades e excepções invocadas, com a sua consequente absolvição da instância, ou, em alternativa, ser julgada improcedente a acção, com a sua consequente absolvição dos pedidos formulados.
3 – Conforme fls. 71, 72 e 76 a 78, veio a Autora apresentar réplica, bem como, correspondendo a convite, responder às excepções e ao pedido de suspensão da instância.
Invocou a legal inadmissibilidade do pedido reconvencional, pois a proprietária do prédio vizinho é AA, igualmente titular de 75% das quotas da sociedade Ré, pelo que não tem esta mesma Ré legitimidade e interesse na dedução dessa pretensão.
Apresentou, ainda, articulado de resposta às excepções no sentido de não se verificarem quaisquer dessas excepções, designadamente, por a causa pendente nos tribunais tributários não interferir na situação de incumprimento do contrato de arrendamento, conforme já fora decidido na anterior acção de despejo, acrescentando que, ao contrário do alegado na contestação, ocorreu a iniciativa do senhorio para que o contrato de arrendamento transitasse para o NRAU, mantendo-se a Ré sem pagar qualquer renda.
4 – Conforme despachos de fls. 82 e 83, 90 e 91 e 133 a 135:
- dispensou-se a realização de audiência prévia ;
- deferiu-se o incidente de intervenção principal de CC ;
- determinou-se a junção aos autos de documentação para conhecer acerca da requerida suspensão da instância ;
- julgou-se improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial ;
- decidiu-se pela não admissibilidade da reconvenção deduzida pela Ré ;
- fixou-se o valor da causa ;
- julgou-se improcedente o Tribunal, em razão do valor, determinando-se a remessa dos autos ao Tribunal julgado competente (Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Central Cível ...).
5 – Em 28/06/2018, a Autora comunicou aos autos ter a Ré sido objecto de dissolução administrativa, e publicada o cancelamento da matrícula em 30-01-2018, com a consequente extinção da personalidade jurídica e caducidade do arrendamento, com efeitos na subsistência do alegado contrato de subarrendamento, pelo que peticionou a restituição imediata do imóvel.
6 – Por decisão de 06/09/2018, determinou-se:
- não suspender a instância por se encontrar pendente o processo n.º 1322/08.... no Tribunal Tributário ... ;
- atenta a dissolução da Ré arrendatária, há mais de seis meses, declarou-se extinto por inutilidade superveniente da lide o pedido de resolução do contrato de arrendamento, condenando-se a Interveniente a desocupar o locado e a entregá-lo livre de pessoas e bens ;
- relativamente aos demais pedidos formulados na acção – condenação no pagamento das rendas vencidas e vincendas –, consignou-se que caberia à Autora, caso pretendesse o prosseguimento da acção para o efeito, alegar e provar que a sociedade Ré, entretanto extinta, tinha bens que foram partilhados pelos sócios, e, identificando os visados, requerer o prosseguimento da acção contra esses.
7 – Dessa decisão foi interposto recurso pelas Ré e Interveniente, tendo esta Relação, por douto Acórdão de 28/02/2019, decidido julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão de não suspensão da instância por causa prejudicial, bem como a caducidade do contrato de arrendamento e a obrigação da Interveniente subarrendatária entregar o locado.
8 – No que se reporta ao pedido subsistente, veio a Autora requerer o prosseguimento da acção, em 29/10/2019, deduzindo-o contra:
- AA, residente na Rua ..., em ..., e
- BB, residente na Rua ..., em ...,
na qualidade de sócios da Ré declarada extinta, por estes terem recebido no âmbito de um processo de falência créditos no valor de € 808.952,58, de que era titular a mesma Ré, acrescentando ter-lhe o imóvel sido, entretanto, entregue em 03-05-2019.
Alegou, em resumo, o seguinte:
- a Ré S... foi objecto de dissolução administrativa, em 2017, tendo sido averbado o registo da dissolução, encerramento da liquidação e cancelamento da sua matrícula, na Conservatória do Registo Comercial ..., em 30.01.2018 ;
- a mesma Ré, manteve um contrato de arrendamento, com a A. em vigor até 30.04.2019, sendo que os sócios da mesma Ré, procederam à entrega do mesmo imóvel arrendado, aos
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