Acórdão nº 2059/14.4/TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 22-06-2017

Data de Julgamento22 Junho 2017
Case OutcomeCONCEDIDA EM PARTE
Classe processualREVISTA
Número Acordão2059/14.4/TTLSB.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

Processo 2059/14.4TTLSB.L1.S1 (Revista)[1] – 4ª Secção

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

a). Relatório[2]:

AA intentou, em 26 de junho de 2014, na Comarca de Lisboa, Instância Central, 1ª Secção do Trabalho, J2, a presente ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de Processo Comum, contra “BB” peticionando que:

1. Se qualifiquem como contratos de trabalho desportivo os contratos celebrados entre o autor e o réu, condenando-se, em consequência, o réu a pagar a quantia de € 47.772,76, a título de proporcionais e de subsídios de férias e de Natal dos anos de 2007 a 2013;

2. Se qualifique a carta de revogação do contrato como um verdadeiro despedimento ilícito promovido pelo réu, condenando-se o mesmo a pagar-lhe a quantia de € 97.147,76.

Peticiona, subsidiariamente, a condenação do réu no pagamento de uma indemnização equitativamente fixada em € 50.000,00.

Subsidiariamente, ainda, e caso o tribunal conclua pela aplicação do n.º 3 do artigo 27.º, da Lei n.º 28/08, de 26 de junho, deverá ser ponderado o acréscimo do custo de vida e das despesas que foi obrigado a suportar e que não teria suportado caso não existisse despedimento ilícito, mais se condenando o réu na sua reintegração no seu posto de trabalho, com as mesmas condições contratuais previstas para a época desportiva 2013/2014, reintegração essa que deverá ocorrer no início da época desportiva imediatamente a seguir ao trânsito em julgado da sentença condenatória.

Mais peticiona o pagamento dos juros legais, desde a data da citação até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que:

- É praticante desportivo profissional da modalidade de andebol sendo que, em 20 de Março de 2007, celebrou com o réu um contrato de trabalho desportivo cumprido na época 2007/2008;

- O referido contrato foi substituído, para as épocas 2008/2009 e 2009/2010, por um contrato de prestação de serviço, substituição essa que aceitou por ser a única hipótese de manter a sua relação laboral com o réu;

- Em 26 de Janeiro de 2010, celebrou um outro contrato de prestação de serviço com o réu, válido para as épocas de 2010/2011 e 2011/2012;

- Celebrou, ainda, um outro contrato de prestação de serviço com o réu válido para as épocas 2012/2013 e 2013/2014, contrato esse que o réu fez cessar, unilateralmente, em Junho de 2013, com efeitos reportados a 31 de Julho de 2013;

- Não obstante a denominação aposta nos contratos celebrados após a época desportiva 2007/2008, a relação entre as partes manteve-se inalterada, estando sujeito às ordens, direção e fiscalização do réu;

- O réu, nas várias épocas desportivas em que o autor esteve ao seu serviço, nunca liquidou as retribuições atinentes aos subsídios de férias e subsídios de Natal;

- Devido ao despedimento promovido pelo réu ficou estupefacto, consternado e preocupado com o seu futuro e o da sua família;

- Ficou, igualmente, afetado do ponto de vista profissional e pessoal, pois ficou com o rótulo de “jogador dispensado”, circunstância que em muito afetou o seu prestígio nacional e internacional;

- O momento em que o réu operou a cessação do contrato dificultou-lhe a negociação de um bom contrato com outro clube, pois, nesse momento, todos os plantéis já estão completos;

- Na época 2013/2014, acabou por ir jogar para um clube alemão, mediante o pagamento da retribuição de € 4.700,00 mensais, num total de € 51.700,00;

- O custo de vida na Alemanha é substancialmente superior ao custo de vida em Portugal, pelo que os gastos que, por força da sua deslocação, teve que efetuar nunca teriam ocorrido não fosse a ilícita cessação do contrato por parte do réu.

Teve lugar a audiência de partes, não se tendo logrado a sua conciliação.

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Citado o Réu, apresentou contestação, alegando, em síntese, que:

- Entende que o único contrato relevante nos autos é o pelas partes firmado em 2012/2013 e 2013/2014;

- O contrato celebrado com vista às épocas 2008/2009 e 2009/2010 foi antecedido de negociações entre as partes – mormente quanto à duração do contrato e a quantia a pagar ao autor – e tanto porque a Liga Profissional de Andebol foi extinta na época 2008/2009 e, até aí, a Federação de Andebol de Portugal exigia aos clubes a celebração de contratos de trabalho com os seus atletas; idênticas negociações antecederam os demais contratos firmados entre as partes;

- Inexistia qualquer pressuposto de continuidade da prestação de serviços do autor uma vez que tanto dependia de inúmeros fatores, entre os quais, a qualidade da sua performance, a classificação da equipa, o orçamento disponível para a modalidade, entre outros, daí que, de contrato para contrato, as condições eram negociadas;

- O autor nunca manifestou qualquer oposição ou discordância quanto aos acordos alcançados, mormente quanto à natureza dos vínculos celebrados;

- O autor exercia a sua atividade de forma autónoma, limitando a sua atividade aos jogos e treinos de futebol, findos os quais se ausentava;

- O autor não recebia ordens do réu nem estava inserido na sua estrutura hierárquica, limitando-se a cumprir as orientações do treinador, nas quais o réu não tuinha qualquer interferência;

- Não estava, igualmente, sujeito a qualquer poder disciplinar;

- O contrato foi validamente cessado, tendo o autor recebido indemnização no valor de € 7.500,00 a cuja devolução não procedeu;

- Inexiste entre a conduta do réu e os alegados danos sofridos pelo autor qualquer nexo;

- O autor age em abuso do direito porquanto, ao longo dos anos, acordou e negociou diversos contratos de prestação de serviço nunca tendo manifestado qualquer discordância relativamente aos mesmos;

- Ainda que aos contratos celebrados venha a ser conferida a natureza de contrato de trabalho desportivo, não assiste direito ao autor a auferir quaisquer quantias a título de subsídios e proporcionais porquanto o valor global acordado já incluía estas retribuições;

- E, ainda que assim se não entenda, sempre os créditos daí emergentes estariam extintos, por prescrição, com exceção dos atinentes à época desportiva 2012/2013.

Conclui pela improcedência da ação com a sua consequente absolvição dos pedidos.

O autor respondeu à contestação, concluindo pela improcedência das exceções arguidas.

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Foi proferido despacho saneador, dispensando-se a realização de audiência preliminar, delimitou-se o objeto do litígio e dispensou-se a seleção da matéria de facto.

Procedendo-se à realização do julgamento e tendo-se fixado a matéria de facto, foi proferida sentença, em 21 de janeiro de 2016, na qual se decidiu:

I. “Julgar parcialmente procedente a ação e em consequência:

a. Reconhecer que entre autor e réu vigoraram, nas épocas desportivas 2008/2009 - 2009/2010 - 2010/2011 - 2011/2012 e 2012/2013, contratos de trabalho desportivo, submetidos ao regime jurídico previsto na Lei 28/98, de 26 de Junho;

b. Declarar que o réu promoveu, com efeitos reportados a 31 de Julho de 2013, o despedimento ilícito do autor;

c. Absolver, no mais, o réu dos pedidos.

II. Julgar procedente a exceção de prescrição dos créditos peticionados pelo autor relativos às épocas desportivas de 2007, de 2008/2009, de 2009/2010, de 2010/2011 e de 2011/2012 e, em consequência, absolver o réu do respetivo pedido [sic].

II

Inconformado, o Autor interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 15 de dezembro de 2016, julgou parcialmente procedente o recurso, revogou parcialmente a sentença recorrida, na parte em que julgou procedente a invocada exceção de prescrição dos créditos laborais peticionados pelo Autor e em que absolveu o Réu do pagamento da indemnização pelo despedimento ilícito e substituiu a referida sentença pelo presente acórdão:

- Considerando não prescritos os créditos peticionados pelo Apelante a título de subsídios de férias e de Natal;

- “Condenando o Réu, BB, a pagar ao Autor, a quantia de € 37.500,00 (trinta e sete mil e quinhentos euros – € 45.000,00 – € 7.500,00)[3], quantia acrescida de juros à taxa legal, desde a data da citação, até integral pagamento” [sic].

- Mantendo a sentença no demais.


III


Inconformado, agora, o Réu “BB” interpôs recurso de revista do acórdão do Tribunal da Relação, que foi admitido.

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O Réu concluiu a sua alegação da seguinte forma;

1. O presente recurso vem interposto da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que entendeu considerar não prescritos os créditos peticionados pelo Apelante a título de subsídios de férias e de Natal; e que, condenou o aqui Recorrente a pagar ao Autor a quantia de € 37.500,00, acrescida de juros, na sequência de ter recusado a aplicação do disposto no n.º 1, do art.º 27°, da Lei 28/98, de 26 de junho "ao presente caso em que o praticante desportivo foi despedido sem justa causa", por o considerar inconstitucional "quando confrontado com o disposto no art.º 393°, n.º 2-a), do CT/2009", tendo entendido que a indemnização devida ao Autor é a que resulta do disposto no art.º 393°, n.º 2-a), do CT; tendo deixado de descontar as quantias referidas no art.º 27°, n.º 3, da Lei 28/98, de 26 de junho, por recusa na aplicação deste normativo com fundamento na "natureza imperativa do art.º 339°, n.º 3, do CT".

2. A junção do "Relatório Comissão para a Revisão da Lei 28/98, de 26 de junho", nas alegações de recurso do aqui Recorrido, não deveria ter sido admitida pelo Tribunal recorrido na medida em que não se trata de um parecer de jurisconsultos, conforme disposto e previsto no art.º 652°, n.º 2, do CPC, pelo que, nesta parte, o Acórdão recorrido deve ser substituído por outro que não admita a junção e determine o desentranhamento do referido documento.

3. Os créditos peticionados pelo autor deveriam ter sido considerados prescritos pelo Tribunal da Relação no Acórdão de que agora se...

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