Acórdão nº 2043/12.2TBSTR-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24-04-2013
Data de Julgamento | 24 Abril 2013 |
Número Acordão | 2043/12.2TBSTR-C.E1 |
Ano | 2013 |
Órgão | Tribunal da Relação de Évora |
1. N..., e mulher J..., melhor identificados nos autos, vieram requerer a sua declaração de insolvência, apresentando um plano de pagamentos.
Proferido despacho liminar e organizado o apenso do incidente de aprovação do plano de pagamentos, procedeu-se à notificação dos credores, nos termos do n.º 2 do artigo 256º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março.
Na sequência das respostas apresentadas, vieram os devedores apresentar novo plano de pagamentos, com os valores corrigidos, e posteriormente, nova lista corrigida dos créditos e, na falta de aprovação por unanimidade do plano apresentado, requereram o suprimento do consentimento dos credores oponentes.
2. Por sentença de fls. 333 a 340 (ref. 443813), certificada nestes autos, foi indeferido o pedido de suprimento do consentimento dos credores oponentes ao plano de pagamentos apresentado e, em, em consequência, rejeitada a homologação do plano de pagamentos apresentado.
Inconformados com esta decisão – de indeferimento do pedido de suprimento da aprovação dos credores oponentes – vieram os devedores dela interpor recurso, suscitando a questão prévia da inconstitucionalidade da norma do n.º4 do artigo 258º do CIRE, que determina a irrecorribilidade da decisão em causa, invocando a violação dos artigos 13º, 18º e 20º da Constituição.
A fls. 365, foi proferido despacho (ref. 4518871) de não admissão do recurso, ao abrigo do n.º 4 do artigo 258º do CIRE.
3. Notificados deste despacho, apresentaram os recorrentes reclamação, nos termos do artigo 688º do Código de Processo Civil, com os seguintes fundamentos:
1. Foram os Reclamantes notificados que a decisão recorrida não é passível de interposição de recurso de apelação, não tendo, pois, o mesmo sido admitido.
2. Ora, não podem os Reclamantes concordar com tal posição, porquanto foi suscitada a questão da (in)constitucionalidade do disposto no artigo 258.º, n.º 4, do CIRE,
3. Pelo que deverá o recurso interposto ser apreciado por parte desse Exmo. Tribunal superior.
4. Com efeito, não desconhecem os Reclamantes que a decisão tomada ao abrigo do disposto no artigo 258.º, n.º 4, do CIRE não é passível de recurso ordinário, tendo isto mesmo sido dito pelos Reclamantes, nas suas alegações de recurso.
5. Ocorre que o que se impõe decidir é a questão da inconstitucionalidade do disposto no artigo 258.º, n.º 4, do CIRE ao impedir a interposição de recurso da decisão de não suprimento da oposição dos credores à aprovação do plano de pagamentos.
6. Na verdade, a decisão de não suprir a aprovação de credores pode implicar o “desmoronar” da vida dos Reclamantes e porque está em causa uma decisão que influirá necessariamente sobre a sua capacidade jurídica que ficará naturalmente limitada e assim sobre o seu estado,
7. Afigura-se evidente que a irrecorribilidade da decisão de não suprimento configura uma norma cujo teor é manifestamente inconstitucional, por violar os artigos 13º, 18º e 20.º, da Constituição da Republica Portuguesa.
8. Isto porque, o indeferimento do pedido de suprimento da aprovação pelos credores, do presente plano de pagamentos tem, como efeito obrigatório, a declaração de insolvência dos Recorrentes na plenitude dos termos, conforme previsto nos artigos 262º, 36º e/ou 39º do CIRE e não a constante do artigo 259º do mesmo Código, cujas efeitos e consequências são totalmente distintos.
9. Acresce que, contrariamente aos efeitos limitados da declaração de insolvência prevista no artigo 259º do CIRE, a declaração na plenitude do artigo 36º do CIRE implica a publicidade e registo nos assentos de nascimento de cada um dos Recorrentes conforme o prevê o artigo 38º nº 2 al. a) do CIRE e a apreensão e ulterior liquidação de todos os seus bens pelo Administrador da Insolvência. (v.g. artigo 38º al. g do CIRE).
10. Ou seja, podemos declarar que o ESTADO e os INTERESSES IMATERIAIS dos Recorrentes são alterados.
11. Estabelecendo paralelo com a Lei Civil, veja-se que tal situação foi devidamente acautelada por parte do legislador no Código do Processo Civil, ao ter determinado que quando esteja em causa o estado das pessoas ou interesses imateriais – âmbito este no qual temos de enquadrar a presente lide - as acções consideram-se sempre de valor equivalente à alçada da Relação e mais €: 0,01.
12. E tendo em conta a sensibilidade da matéria e para salvaguardar a garantia de uma decisão ponderada, alvo de análise pelas Instâncias Superiores e a título excepcional, tanto o recurso de apelação como o recurso de revista têm efeito suspensivo, conforme o dispõem os artigos 692º nº 3 al. a) e 723º nº 1 do CPC.
13. Para além do exposto, e na sequência do que vem sendo expandido, a verdade é que o CIRE, no seu artigo 259.º nº 3, prevê a possibilidade de interposição de recurso da sentença homologatória do plano de pagamentos por parte de credores e independentemente do seu valor.
14. Mas por seu turno, no artigo 258.º, n.º 4, do mesmo diploma legal, coarta de forma injustificada a possibilidade de recurso, do não suprimento da aprovação de credores, que tem de ser forçosamente entendida e interpretada como uma decisão de não homologação do plano de pagamentos.
15. Ponderando os valores que se encontram em causa, por um lado a VIDA e o “modus vivendi” de um agregado familiar com filhos menores e, por outro lado, um mero crédito reclamado a ser ou não ressarcido, não se entende e não se pode aceitar, à luz da mais elementar noção de Justiça, a disparidade de tratamento entre Devedores e os credores.
16. Com efeito, importa mais acautelar uma decisão justa no que tange à aprovação de um plano de pagamentos que dirigirá e supervisionará a vida de um agregado familiar no futuro ou um mero crédito reclamado e, para mais, independentemente do seu valor?!?
17. Saliente-se ainda o facto de, no âmbito do plano de insolvência, não existir qualquer limitação à possibilidade de se recorrer da sentença de homologação ou não homologação de um plano de insolvência, conforme resulta de forma evidente dos artigos 214º e 215º do CIRE.
18. O mesmo se passando no processo especial de revitalização, o qual é aplicável a pessoas singulares e colectivas e no âmbito do qual inexiste igualmente qualquer limitação à possibilidade da homologação ou não de um...
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