Acórdão nº 2027/07.2TMLSB-B.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 22-04-2010
Data de Julgamento | 22 Abril 2010 |
Número Acordão | 2027/07.2TMLSB-B.L1-2 |
Ano | 2010 |
Órgão | Tribunal da Relação de Lisboa |
ACORDAM OS JUÍZES DA 2ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
I. RELATÓRIO
K..., natural de Gavle, Suécia e com domicílio escolhido na Rua ..., em Lisboa, instaurou contra R..., natural do Reino Unido e residente na Avª ..., em Lisboa, INVENTÁRIO, em 21.02.2005, por apenso à acção de divórcio, pretendendo a partilha dos bens comuns do casal composto por requerente e requerido, após decretamento do divórcio.
Invocou, para tanto, ter intentado acção de divórcio com fundamento em separação de facto por seis anos consecutivos, o qual foi decretado, não tendo requerente e requerida chegado a acordo quanto à partilha dos bens comuns do casal, sendo o requerido o cônjuge mais velho, pelo que deverá ser ele a exercer as funções de cabeça de casal.
O requerido foi notificado do dia para juramento e declarações, e veio invocar, por requerimento de 12.04.2005, a fls. 15, que o extinto casal composto pela requerente e pelo requerido não tem bens a partilhar, pois foram casados no regime da separação de bens e nenhum dos ex-cônjuges se acha na posse e administração de bens comuns ou próprios do outro, pelo que entende que não existe base factual ou jurídica para a instauração do inventário, requerendo, por isso, o seu arquivamento.
Respondeu a requerida, por requerimento de 14.04.2005, a fls. 17, invocando a existência de convenção antenupcial, na qual se acordou apenas a separação dos bens da mulher relativamente ao marido, mas não se regulou a separação de bens do marido relativamente à mulher.
Atentas as diferentes nacionalidades de requerente e requerido e tendo ambos domicílios diferentes, sendo o requerido em Portugal e a requerente em Londres, a validade substancial das convenções antenupciais deveria submeter-se à lei da nacionalidade do cônjuge marido, por força dos princípios previstos nos artigos 1106º e 1107º do Código de Seabra, sendo, por outro lado, a lei portuguesa a lei de conexão mais estreita, atentos os factores de residência e da situação dos bens imóveis em causa.
Finaliza a requerente, alegando que vigora entre os cônjuges o regime de separação de bens quanto aos bens da titularidade da requerente e o regime de comunhão geral de bens, no tocante aos bens da titularidade do requerido, aplicando-se, por outro lado, à convenção antenupcial celebrada na Suécia, a lei sueca, por força do artigo 24º do Código de Seabra, sendo tal convenção válida para os tribunais portugueses, tão somente para os imóveis situados em Portugal.
Conclui, assim, a requerente que a convenção antenupcial, celebrada na Suécia, é formal e substancialmente válida.
Juntou, para tanto, documentação que visa comprovar o alegado.
Foi proferido despacho de 22.04.2005, a fls. 100, nos seguintes termos: Independentemente do que vier a decidir-se sobre o regime de bens que vigora entre os interessados, entendemos que sempre terão interesse o juramento e as declarações do cabeça de casal, pelo que mantemos a data designada.
O requerido prestou, em 26.04.2005, declarações de cabeça de casal, continuando a defender que não existe motivo para inventário e que o entendimento da requerente nunca poderá ser exequível em Portugal, por ser manifestamente contrário à ordem pública e aos princípios constitucionais da República Portuguesa, requerendo, no entanto, prazo para apresentação da relação de bens.
Por ter sido igualmente interposto procedimento cautelar de arrolamento que, então, se encontrava pendente de recurso, o requerido efectuou a junção aos autos das suas alegações de recurso apresentadas nessa providência de arrolamento (Apenso A).
Por requerimento de 15.09.2005, a fls. 170, o requerido veio requerer a suspensão dos termos do inventário até que ao Tribunal fosse possível definir qual o regime de bens do dissolvido casamento em causa, justificando-se, então, se fosse caso disso, o seu prosseguimento, propugnado, a requerente, pelo indeferimento da pretensão do requerido.
Por despacho de 14.10.2005, a fls. 224 a 225 vº, foi determinado, designadamente, que “(..) resulta da parte final do nº 1 do artigo 1335º do CPC que a suspensão da instância no processo judicial de inventário com fundamento em questões prejudiciais relevantes, referidas nesse normativo, suscitadas no próprio inventário e que não devam ser incidentalmente resolvidas no mesmo, apenas deverá ser determinada com a consequente remessa das partes para os meios comuns, logo que os bens se mostrem relacionados. Assim sendo, decide-se, por ora que o cabeça de casal apresente a relação de bens ainda em falta devidamente instruída documentalmente (…)
O requerido veio juntar aos autos acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, na sequência de recurso de agravo por ele interposto contra decisão proferida no procedimento cautelar de arrolamento intentado pela requerente, acórdão esse que concedeu provimento ao agravo, ordenando-se o levantamento do arrolamento dos bens, em virtude da requerente K... não ter feito prova da existência de bens comuns ou próprios da requerente sob administração do requerido, ali agravante.
O requerido - cabeça de casal - juntou relação de bens, em 03.07.2006, a fls. 305 a 310 e 353 e 354, reafirmando o seu entendimento de que não há lugar a inventário subsequente ao divórcio entre requerente e requerida. E, em virtude de tal lhe ter sido ordenado, apresentou duas relações de bens, uma atinente aos seus bens e outra em relação aos bens da requerida.
A requerente reclamou, através do requerimento apresentado em 31.07.2006, a fls. 365 a 379, por omissão e indicações incorrectas, solicitando a notificação do cabeça de casal para corrigir e excluir as verbas que indicou.
Em 02.10.2006, foi proferido o despacho de fls. 613 e 614, no qual se considerou que: “Em 20 de Abril de 2006 foi proferido acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do recurso interposto no apenso de arrolamento nº 149-D/02, aí tendo sido decidido, além do mais, que o regime de bens do casamento que vigorou entre os interessados foi o de separação de bens. Desse acórdão foi interposto, pela ora requerente, recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e, a manter-se a decisão proferida no Tribunal da Relação de Lisboa, esta lide será necessariamente atingida pela figura jurídica da impossibilidade superveniente (…) decidiu-se, por isso, o seguinte: Nos termos do disposto no nº 2 do artigo 1335º, 276º, nº 1, c) e 179º, todos do C.P.C. ordenar a suspensão da instância até que se mostre decidida definitivamente, designadamente por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do apenso de arrolamento nº ..., a questão respeitante ao regime de bens do casamento que os interessados R... e K... celebraram entre si”.
Posteriormente, a fls. 650, a requerente veio pedir o levantamento da suspensão da instância com fundamento na circunstância do Supremo Tribunal de Justiça não ter tomado conhecimento do recurso do acórdão da Relação proferido no âmbito do processo de arrolamento de bens, nos termos constantes de fls. 654 e 655.
Por despacho de 16.04.2007, a fls. 663, o Tribunal a quo declarou cessada a suspensão da instância e ordenou a junção aos autos de certidões dos Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Supremo Tribunal de Justiça.
E por despacho de 23.04.2007, a fls. 683, o Tribunal a quo decidiu que: "(…) não subsiste qualquer fundamento legal para prosseguir com o presente processo de inventário pelo que nos termos do disposto nos artigos 287° , e ) e 463°, n° 1 , ambos do C.P.C. , decidimos julgar extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide, ordenando o arquivamento dos autos".
Da aludida decisão recorreu a requerente, pugnando pela sua revogação.
O requerente contra alegou, entendendo dever manter-se o despacho impugnado e assim o arquivamento do processo, uma vez que o regime de bens do casamento é o de separação e, por isso, não há bens a partilhar.
Foi proferida decisão por este Tribunal da Relação de Lisboa, de 27.06.2008, ao...
I. RELATÓRIO
K..., natural de Gavle, Suécia e com domicílio escolhido na Rua ..., em Lisboa, instaurou contra R..., natural do Reino Unido e residente na Avª ..., em Lisboa, INVENTÁRIO, em 21.02.2005, por apenso à acção de divórcio, pretendendo a partilha dos bens comuns do casal composto por requerente e requerido, após decretamento do divórcio.
Invocou, para tanto, ter intentado acção de divórcio com fundamento em separação de facto por seis anos consecutivos, o qual foi decretado, não tendo requerente e requerida chegado a acordo quanto à partilha dos bens comuns do casal, sendo o requerido o cônjuge mais velho, pelo que deverá ser ele a exercer as funções de cabeça de casal.
O requerido foi notificado do dia para juramento e declarações, e veio invocar, por requerimento de 12.04.2005, a fls. 15, que o extinto casal composto pela requerente e pelo requerido não tem bens a partilhar, pois foram casados no regime da separação de bens e nenhum dos ex-cônjuges se acha na posse e administração de bens comuns ou próprios do outro, pelo que entende que não existe base factual ou jurídica para a instauração do inventário, requerendo, por isso, o seu arquivamento.
Respondeu a requerida, por requerimento de 14.04.2005, a fls. 17, invocando a existência de convenção antenupcial, na qual se acordou apenas a separação dos bens da mulher relativamente ao marido, mas não se regulou a separação de bens do marido relativamente à mulher.
Atentas as diferentes nacionalidades de requerente e requerido e tendo ambos domicílios diferentes, sendo o requerido em Portugal e a requerente em Londres, a validade substancial das convenções antenupciais deveria submeter-se à lei da nacionalidade do cônjuge marido, por força dos princípios previstos nos artigos 1106º e 1107º do Código de Seabra, sendo, por outro lado, a lei portuguesa a lei de conexão mais estreita, atentos os factores de residência e da situação dos bens imóveis em causa.
Finaliza a requerente, alegando que vigora entre os cônjuges o regime de separação de bens quanto aos bens da titularidade da requerente e o regime de comunhão geral de bens, no tocante aos bens da titularidade do requerido, aplicando-se, por outro lado, à convenção antenupcial celebrada na Suécia, a lei sueca, por força do artigo 24º do Código de Seabra, sendo tal convenção válida para os tribunais portugueses, tão somente para os imóveis situados em Portugal.
Conclui, assim, a requerente que a convenção antenupcial, celebrada na Suécia, é formal e substancialmente válida.
Juntou, para tanto, documentação que visa comprovar o alegado.
Foi proferido despacho de 22.04.2005, a fls. 100, nos seguintes termos: Independentemente do que vier a decidir-se sobre o regime de bens que vigora entre os interessados, entendemos que sempre terão interesse o juramento e as declarações do cabeça de casal, pelo que mantemos a data designada.
O requerido prestou, em 26.04.2005, declarações de cabeça de casal, continuando a defender que não existe motivo para inventário e que o entendimento da requerente nunca poderá ser exequível em Portugal, por ser manifestamente contrário à ordem pública e aos princípios constitucionais da República Portuguesa, requerendo, no entanto, prazo para apresentação da relação de bens.
Por ter sido igualmente interposto procedimento cautelar de arrolamento que, então, se encontrava pendente de recurso, o requerido efectuou a junção aos autos das suas alegações de recurso apresentadas nessa providência de arrolamento (Apenso A).
Por requerimento de 15.09.2005, a fls. 170, o requerido veio requerer a suspensão dos termos do inventário até que ao Tribunal fosse possível definir qual o regime de bens do dissolvido casamento em causa, justificando-se, então, se fosse caso disso, o seu prosseguimento, propugnado, a requerente, pelo indeferimento da pretensão do requerido.
Por despacho de 14.10.2005, a fls. 224 a 225 vº, foi determinado, designadamente, que “(..) resulta da parte final do nº 1 do artigo 1335º do CPC que a suspensão da instância no processo judicial de inventário com fundamento em questões prejudiciais relevantes, referidas nesse normativo, suscitadas no próprio inventário e que não devam ser incidentalmente resolvidas no mesmo, apenas deverá ser determinada com a consequente remessa das partes para os meios comuns, logo que os bens se mostrem relacionados. Assim sendo, decide-se, por ora que o cabeça de casal apresente a relação de bens ainda em falta devidamente instruída documentalmente (…)
O requerido veio juntar aos autos acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, na sequência de recurso de agravo por ele interposto contra decisão proferida no procedimento cautelar de arrolamento intentado pela requerente, acórdão esse que concedeu provimento ao agravo, ordenando-se o levantamento do arrolamento dos bens, em virtude da requerente K... não ter feito prova da existência de bens comuns ou próprios da requerente sob administração do requerido, ali agravante.
O requerido - cabeça de casal - juntou relação de bens, em 03.07.2006, a fls. 305 a 310 e 353 e 354, reafirmando o seu entendimento de que não há lugar a inventário subsequente ao divórcio entre requerente e requerida. E, em virtude de tal lhe ter sido ordenado, apresentou duas relações de bens, uma atinente aos seus bens e outra em relação aos bens da requerida.
A requerente reclamou, através do requerimento apresentado em 31.07.2006, a fls. 365 a 379, por omissão e indicações incorrectas, solicitando a notificação do cabeça de casal para corrigir e excluir as verbas que indicou.
Em 02.10.2006, foi proferido o despacho de fls. 613 e 614, no qual se considerou que: “Em 20 de Abril de 2006 foi proferido acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito do recurso interposto no apenso de arrolamento nº 149-D/02, aí tendo sido decidido, além do mais, que o regime de bens do casamento que vigorou entre os interessados foi o de separação de bens. Desse acórdão foi interposto, pela ora requerente, recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e, a manter-se a decisão proferida no Tribunal da Relação de Lisboa, esta lide será necessariamente atingida pela figura jurídica da impossibilidade superveniente (…) decidiu-se, por isso, o seguinte: Nos termos do disposto no nº 2 do artigo 1335º, 276º, nº 1, c) e 179º, todos do C.P.C. ordenar a suspensão da instância até que se mostre decidida definitivamente, designadamente por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do apenso de arrolamento nº ..., a questão respeitante ao regime de bens do casamento que os interessados R... e K... celebraram entre si”.
Posteriormente, a fls. 650, a requerente veio pedir o levantamento da suspensão da instância com fundamento na circunstância do Supremo Tribunal de Justiça não ter tomado conhecimento do recurso do acórdão da Relação proferido no âmbito do processo de arrolamento de bens, nos termos constantes de fls. 654 e 655.
Por despacho de 16.04.2007, a fls. 663, o Tribunal a quo declarou cessada a suspensão da instância e ordenou a junção aos autos de certidões dos Acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Supremo Tribunal de Justiça.
E por despacho de 23.04.2007, a fls. 683, o Tribunal a quo decidiu que: "(…) não subsiste qualquer fundamento legal para prosseguir com o presente processo de inventário pelo que nos termos do disposto nos artigos 287° , e ) e 463°, n° 1 , ambos do C.P.C. , decidimos julgar extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide, ordenando o arquivamento dos autos".
Da aludida decisão recorreu a requerente, pugnando pela sua revogação.
O requerente contra alegou, entendendo dever manter-se o despacho impugnado e assim o arquivamento do processo, uma vez que o regime de bens do casamento é o de separação e, por isso, não há bens a partilhar.
Foi proferida decisão por este Tribunal da Relação de Lisboa, de 27.06.2008, ao...
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