Acórdão nº 1999/13.2TCLRS.L1-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 11-10-2018

Data de Julgamento11 Outubro 2018
Número Acordão1999/13.2TCLRS.L1-8
Ano2018
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 8ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa

ML… e AL… demandaram ME… e CA… pedindo que fosse declarada sentença que produza os efeitos da declaração negocial em falta dos réus ou seja, declarar-se e ordenar-se a transmissão para a autora da propriedade do quinhão hereditário da ré na herança indivisa de LS… e propriedade da mesma ré na herança indivisa de ME….
Alegaram, para tanto, que a autora, a ré e a irmã da 1ª e tia da ré, VM…, são únicas e universais herdeiras de LS…, bem como de EM….
Por contrato-promessa de 12/6/96, os réus declararam prometer vender à autora e esta prometeu comprar-lhes o quinhão hereditário da ré nas heranças, ainda indivisas, de LS… e de ME….
Os dois quinhões hereditários prometidos vender correspondem ao direito a uma terça parte indivisa de cada uma das heranças.
O preço ajustado foi de € 35.0000,00 (€ 30.000,00 correspondem à herança de LS… e € 5.000,00 de ME…).
Competia à autora designar a data da realização da escritura, avisando os réus com 8 dias de antecedência, o que o fez, enviando, em 7/7/97, carta registada datada de 3/7/97, recebida pelos réus, em 8/7/97.
Os réus não compareceram, não se fizeram representar, nem justificaram a falta.

Na contestação os réus excepcionaram a falsidade das escrituras de habilitação (existência de um quarto herdeiro irmão da ré – LA…), a anulabilidade do contrato-promessa (obtido por coação moral), impugnaram o alegado pelos autores, concluindo pela absolvição do pedido – fls. 31 e sgs.

Replicaram os autores, impugnando o alegado pelos réus, concluíram como na p.i. – fls. 60 e sgs.

Treplicaram os réus concluindo pela improcedência do alegado pelos autores na réplica, concluindo como na contestação.
Falecido o réu CA… foram habilitados como seus herdeiros ME… (ré nos autos principais), PJ… e LM… - fls. 59 do apenso.

Falecido o autor AL… foram habilitados como herdeiros a autora ML… e PD… – cfr. fls. 232.

Foi proferido despacho saneador e eleboradas a especificação e o questionário – fls. 241 e sgs.

Após julgamento foi prolatada sentença que julgando procedente a acção e improcedentes as excepções arguidas, decretou a execução específica do contrato-promessa de compra e venda celebrado em 12/6/96 entre a autora e os primitivos réus ME… e CA… e, em consequência, declarou a transmissão a favor da autora ML… do direito de propriedade da ré ME… sobre os quinhões hereditários das heranças indivisas de LS… e de ME… – fls. 794 e sgs.

Inconformada, a ré ME… apelou formulando as conclusões que se transcrevem:
1- Em 1983, a Rte apresentou acção de inventário e partilha da herança de LS….
2 - A Rte desistiu do pedido depois de as partes chegarem a acordo quanto à urbanização de terreno com 12,5 hectares de área, sito plena povoação de Apelação, Loures, através de uma sociedade a constituir (Sentença, pág.3, xvii.)
3 - Essa sociedade nunca se constituiu por falta de acordo dos maridos das outras herdeiras.
4 - As heranças de LO… e de E…, falecidos há mais de 40 anos, permanecem indivisas (sentença, pág. 3, xvii, por oposição a pág.2 i).
5 - Por esta razão e por quererem deixar de viver numa casa abarracada, a Rte e o seu marido, ela mulher-a-dias, ele operário, celebraram com AL…, marido da herdeira L…, um acordo
6 - Mediante o qual AL… financiava a compra de uma casa em bairro ainda hoje clandestino pelo preço de 14 800 contos.
7- Para habitar a dita casa foi preciso fazer o pagamento do sinal de 7 500 contos, comprar móveis e electrodomésticos,
8 - Cuja compra AL… também financiou.
9 - Por isso, aos 7 500 contos foram adicionados mais 2 000 contos, razão por que o acordo transcrito na douta sentença, pág. 4 xxiii, refere que foi entregue à Rte e seu marido a importância de 9.550 contos.
10 - Para completar o pagamento remanescente da casa da Rte, o AL… entregou mais 7 300 contos à Rte e marido. (sentença pág 4. Xxiv)
11- Por isso, na contestação, a Rte e seu marido, na qualidade de RR e de pessoas pobres mas honradas, não hesitaram em vir aos autos referir que lhes tinham sido feito estes pagamentos, que somam no conjunto 16 800 contos (83 916€).
12 - A Rte e seu marido não receberam outras importâncias dos AA.
13 - Aos 16 800 contos há a deduzir 15 000€ , equivalentes a 1/3 das rendas e da indemnização paga pela G…, à herança de que o AL… se apropriou (sentença, pág.5, xxvii).
14 - Com excepção do artigo anterior, sobre o qual não houve
suficiente pronúncia, a Rte sempre considerou que os 16 800 contos mutuados estão correctos.
15- Já não corresponde à verdade e a douta sentença erra a pronúncia quando considera que houve pagamento de 35 000 contos
16 - E que houve intenção de vender o quinhão aos recorridos por este preço (sentença vi).
17 - Para assim concluir, o douto Tribunal a quo fundamenta-se na confissão dos subscritores do contrato promessa, onde se afirma terem os alegados promitentes vendedores do quinhão hereditário recebido a importância de 35 000 contos.( Sentença, pá 4, xviii.)
18 - Presunção esta que a Rte sempre contestou tendo mesmo apresentado queixa crime contra a AL...
19 - A confissão do recebimento de 35 000 contos é ilidível e só por erros vários da douta sentença não foi considerada ilidida.
20 - Consta do requerimento probatório da Rte o seguinte pedido: « Os RR requerem a notificação dos AA para juntarem aos autos os documentos comprovativos dos pagamentos quesitados nos arts. l1, 15, 37, 41, 62, 63, 67, 70, 81, da B.l:, nos termos do art. 528/1 CPCivil»
21 – Os A não apresentaram nem cópia de cheques, nem movimento de conta bancária ou qualquer outro meio de prova do pagamento ou de consignação em depósito para além dos 16 800 contos aplicados na compra da casa e do respecivo recheio.
22 - Os documentos bancários ou outros de prova desse pagamento dos 18 200 contos em falta, não foram apresentados pelos AA e não podiam ser apresentados por inexistentes.
23 - Em lugar de extrair do silêncio dos AA as necessárias conclusões, a douta sentença omite a pronúncia sobre este requerimento probatório da Rte.
24 - É para fazer face a situações deste tipo que existe o artigo 429 CPC.
25 - O silêncio dos AA, sobre este requerimento, materializa uma clara violação do dever de cooperação com a justiça para a descoberta da verdade (art. 417 CPC).
26 - Violação esta muito conveniente para obstar à anulação da declaração de quitação do pagamento, não efectuado.
27- E que, também, dificulta a prova da existência de vício na formação de vontade da Rte e do seu marido quando assediados para assinarem um contrato promessa que AL… dizia ser apenas de garantia do pagamento da dívida de 16 800 contos.
28 - Requerida a apresentação de documentos, em poder dos AA, e não satisfeita essa apresentação, ficou ilidida a presunção de corresponder à realidade a confissão da Rte e marido, constante do contrato promessa, de terem recebido o preço de 35 000 contos.
29 - Em 1996, quando da celebração do contrato promessa o
quinhão valia bastante muito mais que 35 000 contos.
30 - Deu a sentença como provado que, em 1983, a Rte e o seu marido propuseram às tias a venda do quinhão hereditário por 35 000 contos (-+ 175 000€). (sentença pág 5, xxxiv)
31 - Este facto é verdadeiro, mas não permite concluir como fazem os recorridos, com errónea adesão da sentença, que esse valor de 35 000 contos, referenciado a 1983, tenha correspondência com os 35 000 contos referidos no contrato promessa, celebrado 13 anos depois, em 1996.
32 - Através da consulta ao sítio do Instituto Nacional de Estatística, em Taxas de Inflação em Portugal, Índices de Preços ao Consumidor, a agregação das taxas entre 1983 e 1992 conclui-se que os 35 000 contos pedidos em 1983, correspondem a 70 000 contos quando da celebração do protocolo de acordo, celebrado em 1992 ( transcrito na sentença xxiii)
33 - E correspondem a 98 000 contos em 1996, quando da celebração do contrato promessa e feita a declaração de quitação.
34 - Valor que não anda pela avaliação pericial judicial do quinhão, feita em 2012, que situou o valor do quinhão em 502 273,30€ (100 696 701$00). (sentença, pág 5, xxix).
35 - No final da década de 90 houve perda de valor do terreno de 12,5 hectares, sito na Apelação, em virtude da cabeça de casal da herança ou do construtor civil AL…, não terem tomado parte activa nas consultas públicas sobre a elaboração do PDM de Loures.
36 - Se for considerada a desvalorização introduzida pelo PDM de Loures que, após o contrato promessa, restringiu fortemente a capacidade construtiva nos 12,5 hectares, bem principal da herança, verifica-se que o preço de 35 000 contos referido no contrato promessa tem natureza usurária.
37 - Vício que se acentua se se considerar que os peritos não
ponderaram, nem tinham que ponderar a possibilidade de recuperação da capacidade construtiva nos artigos matriciais, rústicos e e urbanos da denominada Quinta de S Jorge, formada por 12,5 hectares, através de um plano de pormenor, para o qual a Câmara Municipal de Loures, se tem mostrado receptiva
38 - A promessa de venda por 35 000 contos, em 1996, nunca correspondeu à vontade livremente formada da Rte e do seu marido.
39 - Do que vem sendo alegado conclui-se que o negócio da venda do quinhão, mesmo que correspondesse à vontade dos pretensos promitentes vendedores, tinha a natureza de negócio usurário.
40 - Porquanto, o mesmo só se explicaria pela inexperiência e fragilidade da Rte e do seu marido, pessoas pobres, a quem a fingida generosidade dos AA permitiu à Rte comprar uma casa num bairro clandestino.
41- Pretender que, em 1996, o quinhão hereditário valia o mesmo que em 1983,
...

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