Acórdão nº 1980/14.4TBVDL.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 03-10-2019
Judgment Date | 03 October 2019 |
Case Outcome | CONCEDIDA A REVISTA |
Procedure Type | REVISTA |
Acordao Number | 1980/14.4TBVDL.L1.S1 |
Court | Supremo Tribunal de Justiça |
2ª SECÇÃO CÍVEL
I. Relatório
1. Nos presentes autos de inventário instaurados por óbito de AA, foi proferido, com data de 16-03-2018, o seguinte despacho:
«Uma vez que os autos se encontram sem qualquer movimento há mais de seis meses, por inércia negligente dos interessados em promover os seus termos, ao abrigo do disposto no artigo 281.º n.º 1 do C. P. C., julga-se deserta a instância e, em conformidade com o disposto no artigo 277.º alínea c) do C. P. C., julga-se extinta a instância.
Valor da ação: o valor dos bens do ativo da relação de bens – cf. artigos 302.º n.º 4 e 306.º n.ºs 1 e 2 do C. P. C.
Registe e notifique».
2. Inconformados com a decisão de 16.03.2018, em 12.04.2018, dela apelaram os interessados BB e outros para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão proferido em 07.02.2019, julgou improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.
3. De novo inconformados com esta decisão, dela interpuseram os interessados BB e outros recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
« 1 - No âmbito das condicionantes à aceitação do presente Recurso de Revista, e, conforme acima se explanou, não verifica a existência de Dupla Conforme, atendendo a que, com razoável evidência, verifica-se uma violação expressa da respectiva lei, o que veio a propiciar a decisão de “ Deserção “, facto, aliás, que só poderá potenciar uma deficiente tramitação processual, conforme se aplique, um, ou outro, dos percursos legislativos, o que não deixa de propiciar um diverso enquadramento jurídico da situação em apreço, acabando por evidenciar uma diversidade de percursos, que acabará por nos revelar, também, “ decisões substancialmente distintas ”.
2 - E, na certeza de que tal limitação, a existir, contrariaria o princípio do Acesso ao Direito e da Tutela Jurisdicional efectiva, que, na nossa Constituição, tem consagração expressa no seu artigo 20º; para além, da relevância jurídica de que o caso se reveste, que requer a necessidade de uma melhor aplicação do direito. Além do mais,
3 - Será de relevar o interesse particular de uma evidente relevância social de que a situação se reveste, quer, por afetar mais de 35 interessados processuais, que intervêm nos presentes autos, como ainda, mais ficará condicionada, inequivocamente, a titularização de vários bens imóveis que fazem parte da massa da herança da falecida AA.
4 - Para além, ainda, da contradição entre ( i ) o sentido do proferido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa e, ( ii ) o sentido da pretérita decisão prolatada, consubstanciada no doutro Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 24/05/2018 - Relator Francisco Matos, no âmbito do processo nº 1.393/12.2TBOLH.E1, já transitado em julgado e, que foi proferido no domínio da mesma legislação e, sobre a mesma questão fundamental de direito. Por outro lado,
5 - Releva que:
a) - Os presentes autos perduram, já, por mais de 15 anos; atraso, exclusivamente, induzido pelo próprio sistema judiciário.
b) - Mas, faltando, decorridos que foram todos estes anos, e, em última decisão final / estrutural, apenas, o despacho final de homologação da respectiva partilha. Objetivamente,
c) - Está já totalmente concluída a fase das respectivas Licitações de bens;
d) - Com adjudicações provisorias, já, efetivadas.
e) - Não havendo nada mais de estrutural a promover, com exceção da última habilitação de herdeiros, entretanto, já requerida.
f) - Releva-se, ainda, o facto de ter, entretanto, falecido o “ Cabeça de Casal “, senhor CC, sem que, nos autos e, ( i ) quer por determinação do Senhor Juiz do processo; ( ii ) quer, por iniciativa dos respetivos herdeiros; se tenha verificado a nomeação de novo Interessado para o desempenho de tal mandato.
g) - Tal facto, no que diz respeito aos Interessados processuais, poderá ter parecido uma inércia processual; mas, se assim aconteceu, a mesma foi absolutamente involuntária e, tão só, devido ao distanciamento do relacionamento familiar que se foi gerando entre os Interessados, em função de uma menor fluência de comunicação entre todos os interessados, que gerou, outrossim, uma menor afinidade familiar entre os interessados, quer primitivos, quer sucessores destes.
h) - O que não aconteceria, caso houvesse CABEÇA DE CASAL. Por outro lado,
i) - Quanto à simplicidade, celeridade e, economia processuais, releva-se que a deserção dos presentes autos tornaria bem mais oneroso a instauração de um novo processo de inventário, para além, ainda, de que seria o mesmo, outrossim, bem mais moroso, bem mais complexo e, praticamente, impossível de concretizar na nova sede - os Notários - por onde o novo processo passaria a tramitar; Por outro lado,
6 - Tendo em conta uma atenta apreciação processual dos próprios autos, entender-se-á que os “ Interessados processuais originários - com relação aos Interessados sucessores destes, - têm, objectivamente, um interesse próprio e diferenciado destes últimos Interessados, não existindo, de facto, entre ambos, uma integral e correspectiva sobreposição de direitos e deveres - Ver Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 26/01/2017, Relator Anabela Tenreiro, no âmbito do processo nº 861/861/08.5TBBCL-E.G1 - 2ª Seção - sendo que, o enquadramento do direito dos “ Interessados sucessores “ à herança da inventariada AA é, efetivamente, distinto do direito daqueles, uma vez que, contrariamente ao direito dos Interessados originários, flui do direito à herança reportada ao decesso da De Cujos AA; quando o enquadramento dos Interessados sucessores nos presentes autos “ abarca, apenas, o direito à herança da Interessada originária falecida - mãe daqueles -; direito esse que é distinto do direito à herança dos Interessados originários “. E,
7 - Mais do que decidir-se pela deserção dos autos, por eventuais efeitos da inércia processual, a consequência lógica de tal inércia deveria ser, antes, ou, a ineficácia da habilitação entretanto, requerida, ou, a aplicação de qualquer sanção pecuniária que seja pertinente aplicar.
Ver, o já referido Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 24/05/2018, Relator Francisco Matos, no âmbito do processo nº 1.393/12.2TBOLH.E1 -.
Ainda,
8 - Nenhuma referência vem feita nos autos sobre a regularidade, ou não, das notificações dos Interessados processuais; bem assim, se as mesmas notificações foram, efetivamente, recebidas.
9 - Bem ainda, e, quando à notificação do Cabeça de Casal, sabe-se que a mesma não chegou a acontecer, precisamente, devido ao seu decesso, quando caberia sempre ao Cabeça de Casal, nos termos da Lei, promover a respectiva habilitação.
Ademais,
10 - Em invocação da violação da lei, releva-se que os presentes autos de Inventário (por herança) correm termos pelo Tribunal Judicial de …, sendo a tramitação do mesmo regulado pelos artigos 1.326 e ss., do C.P.C. de 1961.
E,
11 - Quanto à forma de habilitação dos sucessores dos interessados falecidos, estatui o artigo 1.332, nº 1, do C.P.C. de 1961 que: “ Se falecer algum interessado direto na partilha antes de concluído o inventário, o Cabeça de Casal indica os sucessores do falecido, juntando os documentos necessários, notificando-se a indicação aos outros interessados e, citando-se para o inventário as pessoas indicadas “.
Isto é,
12 - A habilitação dos falecidos terá lugar no próprio processo e, logo que dos autos surja conhecimento de um óbito, tomam-se declarações ao Cabeça de Casal que indicará os herdeiros do falecido, notificando-se esta indicação aos outros interessados e, citando-se para o inventário as pessoas indicadas, sendo que, na falta de impugnação, dar-se-ão por habilitadas as pessoas indicadas. Ora,
13 - Tendo, no decurso dos presentes autos, falecido o Cabeça de Casal competiria, então, ao Tribunal A Quo suprir tal lacuna processual da falta de Cabeça de Casal. Conclusivamente,
14 - A declaração de deserção depende de decisão judicial que aprecie a conduta da parte, já que a deserção é condicionada pela negligência da parte em promover os termos do processo, conforme dispõe o artigo 281º do CPC.
15 - O comportamento omissivo da parte tem de ser apreciado e valorado.
16 - Tal apreciação está sujeita ao princípio do contraditório, nos termos do...
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