Acórdão nº 197/08.1TBMTR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 28-10-2014
Data de Julgamento | 28 Outubro 2014 |
Case Outcome | NEGADA A REVISTA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 197/08.1TBMTR.P1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
I. – Relatório.
AA, intentou em 1 de Setembro de 2008, acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra BB, CC e DD, formulando a seguinte pretensão:
1- A título principal:
a) declarar-se resolvido o contrato-promessa celebrado com a aqui Autora, aludido nos arts. 1.° a 7.° da petição; e, em consequência,
b) condenar-se os Réus a pagar à Autora a quantia de € 76.814,88, correspondente ao dobro do sinal que esta prestou, acrescida dos competentes juros de mora legais, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
2- A título subsidiário:
a) condenar-se os Réus a pagar à Autora a quantia de € 75.662,66, que corresponde ao montante actualizado, de acordo com o índice de correcção monetária, do preço por esta pago àqueles, acrescida dos juros moratórios vincendos, contados desde a data da citação dos Réus até efectivo e integral pagamento, a título de indemnização pelos prejuízos que o incumprimento desse contrato lhe causou; ou,
b) a título de indemnização pelos prejuízos causados pela conduta inadimplente dos Réus, condenar-se estes últimos a pagar à Autora a quantia de € 68.979,03, correspondente à restituição do preço por esta adiantado com o acréscimo resultante da aplicação da taxa de inflação ocorrida entre a data em que aquela cifra foi entregue (13.09.1990) e a data de propositura da presente acção (01.09.2008), bem como os juros moratórios legais que se vencerem desde a citação dos Réus até efectivo e integral pagamento; ou ainda,
c) condenar-se os Réus a pagar à Autora quantia equivalente ao valor actualizado dos imóveis que lhe foram prometidos vender através do contrato celebrado, que se estima em montante nunca inferior a € 75.000,00, acrescida dos juros moratórios que se venceram desde a data da respectiva fixação até efectivo e integral pagamento.
3- Ainda a título subsidiário:
Caso o pedido principal acima deduzido não obtenha provimento e também sejam julgados improcedentes qualquer dos pedidos alternativos formulados a título subsidiário, então devem os Réus ser condenados a restituir à Autora a quantia de € 38.407,44, ao abrigo do instituto do enriquecimento sem causa, acrescida dos competentes juros moratórios legais, contados desde 24.10.2007 até efectivo e integral pagamento, cifrando-se os juros já vencidos na quantia de € 1.317,43.
Para o pedido que impetra, aduz como fundamento factual que:
- em 13 e Setembro de 1990, o primeiro Réu e a sua esposa (entretanto falecida) outorgaram um documento escrito que denominaram «promessa de venda», através do qual declararam prometer vender à Autora os três prédios que identifica, pelo preço global de 7.700.000$00, correspondente a € 38.407,44;
- a Autora pagou a totalidade do preço convencionado, cujo recebimento foi expressamente reconhecido por parte dos promitentes vendedores, no referido documento;
- a esposa do primeiro Réu faleceu, tendo deixado como únicos herdeiros os Réus, cônjuge e três filhos;
- apesar de diversas vezes interpelados, os Réus jamais diligenciaram pela marcação da escritura de compra e venda dos ditos imóveis, pelo que a Autora e marido os interpelaram, através de notificação judicial avulsa, para o efeito, vindo a notifica-los novamente, por cartas registadas com aviso de recepção, concedendo-lhes um prazo para procederem à marcação da escritura, sob pena de se ter por incumprida a obrigação;
- os Réus nada fizeram ou disseram, pelo que se tem por definitivamente incumprida a obrigação, por culpa dos réus;
- a quantia entregue pela Autora, ainda que corresponda ao preço acordado, também tem o carácter de sinal, pelo que lhe assiste o direito de obter dos Réus o dobro daquilo que prestou;
- ainda que assim não se entenda, sempre tem a Autora o direito à reparação do prejuízo que lhe causaram, a título de dano emergente ou lucro cessante, correspondente ao montante que lhes pagou devidamente actualizado de acordo com o índice de correcção monetária ou, pelo menos, da aplicação da taxa de inflação ou, ainda, de acordo com o valor de mercado dos prédios em causa, ou, finalmente, caso nenhuma das hipóteses seja atendida, sempre tem a Autora direito à restituição da quantia que entregou por via do instituto do enriquecimento sem causa.
Contestaram os demandados, CC, DD e EE, tendo, simultaneamente, deduzido habilitação de herdeiros, atento o óbito do primeiro Réu, ocorrido a 21 de Outubro de 2008 (a acção foi instaurada em 1-9-2008), seu pai, do qual são os únicos e universais herdeiros, e mediante impugnação, contraminaram a versão da demandante, por, alegam, não ter existido qualquer promessa de venda, mas sim um pedido de arrendamento dos prédios em causa, por parte da Autora, com vista a que esta se pudesse candidatar a vários fundos comunitários para exploração agrícola, pedido que recebeu a concordância do falecido Réu, tio da Autora, pelo que foi celebrado um contrato de arrendamento que nunca se efectivou – cfr. item 13.º da contestação;
- Nunca o primeiro Réu e a sua esposa assinaram o contrato promessa de compra e venda a que os demandantes aludem;
- A certificação da alegada assinatura foi feita à revelia do primeiro Réu.
- Do doc. nº 1 com a p.i. não consta a impressão digital de FF, o que põe em crise a autenticidade da assinatura alegadamente feita a rogo e cuja falsidade invocam. FF não esteve presente no Cartório de Montalegre, não autorizou que alguém por si assinasse a rogo, e do documento não consta a sua impressão digital.
- Aduzem não ser verdade que pelos prédios em causa a Autora entregou aos pais dos ora contestantes a quantia de 7.700.000$00, acrescentando que estes nada receberam da Autora, e muito menos esse valor.
- Por fim, alegam, que a Autora nada pagou ao primeiro Réu e sua esposa, pois que estes, nada lhe venderam, pelo que concluem pela improcedência da acção. (Cfr artigos 27º a 29º da contestação)
Na réplica, a Autora responde à matéria de excepção invocada pelos Réus, alegando que a dita FF, a 13 de Setembro de 1990, se deslocou ao Cartório Notarial de Montalegre e que, na presença do ajudante daquela repartição notarial, após ter declarado não saber ler e assinar, lhe foi lido o documento, tendo aquela confirmado o rogo que prestara. Pugna pela improcedência das excepções e pela procedência da acção.
Na decisão proferida, em primeira (1.ª) instância – cfr. fls. 471 a 491 – foi decidido julgar a acção improcedente, com a consequente absolvição dos desmandados.
Interposto recurso, veio o tribunal de apelo, por decisão de 2 de Junho de 2014 – cfr. fls. 614 a 629 – a revogar a decisão apelada e consequentemente (sic): “a) declara-se resolvido o contrato-promessa celebrado com a aqui Autora, aludido nos arts. 1.º a 7.° da petição; e, em consequência, b) condena-se os Réus a pagar à Autora a quantia de € 76.814,88, correspondente ao dobro do sinal que esta prestou, acrescida dos competentes juros de mora à taxa supletiva legal para as operações civis, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.”
Desfeiteada com a decisão, impugnam, em revista, os demandantes, tendo alinhado o sumário conclusivo que a seguir se deixa extractado.
I.A. – Quadro Conclusivo.
“1. A presente acção funda-se na alegada celebração de um contrato promessa de compra e venda através de um escrito particular que incluiu o alegado pagamento de um sinal, sendo que tais factos - a celebração do contrato e o pagamento do sinal foram alegados pela Autora, impugnados atabalhoadamente, mas, ainda assim, impugnados - pelos Réus e, em consequência, introduzidos na base instrutória, constituindo, juntamente com os fatos que alegadamente justificavam a resolução daquele contrato, a causa de pedir nesta acção.
2. A sua eliminação da base instrutória (pontos 1.º e 10.º) e julgar-se as perguntas em que tal matéria se consubstancia como não respondidas significa a eliminação da causa de pedir da acção, sendo que o Tribunal da Relação conheceu de matéria que, na nossa opinião, não podia conhecer, desde logo porque não foi interposto recurso que visasse a alteração da matéria de facto incluída na base instrutória.
3. Mantendo-se a formulação dos quesitos 1.º e 10.º, manter-se-á o teor das respostas dadas pelo Tribunal de 1.ª Instância, uma vez que a Relação do Porto não considerou que estas respostas tivessem de ser outras.
4. O Tribunal de 1.ª Instância não deu como provado o acordo de vontades subjacente ao contrato promessa judicado porque da documentação constante dos autos e da realização do julgamento (que contou com o depoimento de parte da própria Autora, a partir de Braga, com o depoimento do seu marido e de um número significativo de testemunhas), o Tribunal se convenceu, sem sombra para qualquer dúvida, que o papel com base no qual a Autora pretendia receber a quantia peticionada não passava de um mero papel que não correspondia a nenhum acordo de vontades nesse sentido.
(…) Itens eliminados da síntese conclusiva por corresponderem ao articulado na contestação sob os artigos 6.º a 13.º)
15. O documento em causa era, no entanto, hábil a instruir o processo de financiamento do projecto que a Autora e o marido tinham intenção de levar por diante, porque bastava uma promessa de venda para haver financiamento, porque bastava que os prédios estivessem inscritos na matriz em nome dos promitentes vendedores e porque a área em causa era suficiente para obter os financiamentos pretendidos.
16. O facto de um dos prédios ser dos pais da Autora e outro do irmão da Autora não importava porque o que interessava é que estivessem na matriz em nome do promitente vendedor do contrato.
(…)
18. Perante esta factualidade, o Tribunal nada mais podia fazer que dar como não provada a celebração do contrato promessa constante do escrito particular datado de há 23 anos atrás. Com efeito, o documento que está em causa nos autos, designado...
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