Acórdão nº 196/14.4JELSB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11-10-2016
Judgment Date | 11 October 2016 |
Acordao Number | 196/14.4JELSB.E1 |
Year | 2016 |
Court | Court of Appeal of Évora (Portugal) |
Recurso n.º 196/14.4JELSB.
Acordam, em Conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.
No âmbito dos Autos de Inquérito, com o n.º 196/14.4JELSB, a correrem termos, ora, pela Comarca de Santarém - Instância Central - Secção Criminal – J3, o M.mo Juiz de Instrução veio, por Decisão Instrutória prolatada a de 24 de Maio de 2015, entre o mais, a não Pronunciar os arguidos BB, CC, DD, EE e FF pela prática, em co-autoria, de um crime de Associação Criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, n.º 2, do Dec. Lei, n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
Inconformado com o assim decidido traz a Magistrada do Ministério Público o presente recurso, onde formula as seguintes conclusões:
1 – Na Decisão Instrutória ora recorrida, os Arguidos BB, CC, DD, não foram pronunciados quanto ao crime de associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, do referido Dec. Lei, n.º 15/93, de 22 de Janeiro, uma vez que o M.mo JIC concluiu que os factos descritos na acusação não são suficientes para preencher o crime em causa.
2 – Ao invés, consideramos, que a situação descrita na acusação – se bem que circunscrita agora à actuação dos arguidos CC, BB e DD, juntamente com pelo menos um outro indivíduo de identidade não apurada, configura um processo de formação de vontade colectiva e que os factos apontam para a existência de uma estrutura organizada e que reveste a estabilidade e permanência exigida pelo tipo do crime de associação criminosa.
3 – Tal decorrendo, desde logo, dos factos que foram dados como provados pelo M.mo JIC, no despacho ora recorrido, de que o arguido DD praticou o crime de tráfico de estupefacientes, tais como:
- A apreensão de 450 embalagens de cocaína no interior da máquina exportada pelo DD (cfr. auto de busca e apreensão (fls, 1698 a 1764) ao armazém, …).
- As intercepções telefónicas nas quais se encontram espelhados os contactos e a proximidade mantida entre os arguidos DD e CC.
- O depoimento da testemunha … fls. 3406, que indicia o relacionamento entre os arguidos BB, CC e DD.
- As imagens constantes do Apenso A onde é possível verificar, não só os contactos e a proximidade existente entre os arguidos CC e BB, mas, também, a presença do arguido DD em Lisboa e os contactos com o arguido CC.
- A constatação de que o arguido DD deslocou-se a Portugal nas seguintes datas: 5-10-2013 a 9-10-2013, 28-01-2014 a 21-02-2014, sendo que no dia 20-02-2014 deslocou-se a Paris com o arguido BB, 3-10-2014, 27-07-2015, sendo que o arguido CC deslocou-se ao Brasil entre 18 e 24 de Maio de 2015, indiciadoras de que o propósito das mesmas seria o de camuflar nas máquinas exportadas um transporte de cocaína.
- A presença do arguido CC no dia 27 de Julho de 2015 no aeroporto de Lisboa, altura em que chegou a Portugal o arguido DD.
4- Acrescente-se ainda que a própria natureza do transporte da cocaína para Portugal e a quantidade (500Kg) que, através de tal meio, se conseguiu introduzir no território nacional, com os elevadíssimos lucros que através da sua posterior distribuição se lograria obter é, desde logo, reveladora da existência de uma associação, já que sem o suporte dado por uma forte estrutura organizacional, dificilmente os arguidos teriam conseguido ultrapassar todos os obstáculos de natureza física e nomeadamente os alfandegários com vista a alcáçar tal objectivo.
5- Sendo que os arguidos agiram forçosamente em comum e de forma duradoura, com o fim abstracto de cometimento de crimes de tráfico de estupefacientes, desde logo no período próximo que antecedeu o momento da vinda da primeira máquina para Portugal, cuja exportação do Brasil para território nacional já se inseria num plano superior – em última ratio – de preparação para posterior transporte da cocaína nos autos.
6- Sendo reconhecido que a prova da existência de uma associação criminosa, de quem a promoveu, fundou ou dirigiu ou, simplesmente, a apoiou ou dela fez parte, é uma prova muito difícil de alcançar. Já que, não havendo confissões, raramente existe prova directa, entende-se que este é um dos casos em que precisamente a convicção do julgador deverá ser formada através da avaliação conjunta de todos os indícios existentes nos autos e de acordo com as regras da experiência comum.
7- Em suma, existem nos autos os indícios suficientes para que os arguidos DD, CC e BB sejam submetidos a julgamento, para além dos ilícitos pelos quais foram pronunciados, também pelo crime de associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, do referido Dec. Lei, n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
Respondeu ao recurso o arguido DD, Dizendo:
1. Bem andou a douta decisão instrutória ao não pronunciar os arguidos pelo crime de associação criminosa;
2. O recorrente não apresentou recurso em matéria de facto quanto aos factos indiciados;
3. Nos factos indiciados na decisão instrutória imputa-se aos arguidos actos relacionados com um transporte de cocaína por via marítima do Brasil para Portugal- ponto 1 a 15.
4. E que o plano dessas pessoas era este.
5. Para que se possa preencher, ainda que indiciariamente, o crime que agora reclama o recorrente, falta:
a. A reiteração criminosa;
b. A estabilidade;
c. E que o grupo seja tendencialmente permanente.
6. Requisitos que ficam definitivamente afastados apenas pela leitura do ponto 1 a 15 da decisão instrutória.
7. Acresce, como bem o salienta a decisão recorrida, ser inexistente uma vontade autónoma e superior dos arguidos.
8. Não se violou, por isso, qualquer das normas apontadas pelo recorrente.
Nesta Instância, a Sra. Procuradora Geral-Adjunta emitiu parecer no sentido do recurso merecer provimento.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
É do seguinte teor o Despacho recorrido, na parte que ora importa:
Vejamos agora os elementos constitutivos do crime de associação criminosa p e p pelo art.º 28° do DL 15/93, de 22 de Janeiro e verificar se os mesmos se mostram indiciados nos autos e/ou se os factos descritos na acusação são suficientes para preencher o crime em causa.
Estabelece o citado artigo 28.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, sob a epígrafe "Associações criminosas":
1- Quem promover, fundar ou financiar grupo, organização ou associação de duas ou mais pessoas que, actuando conce1iadamente, vise praticar algum dos crimes previstos nos artigos 21.º e 22.º é punido com pena de prisão de 10 a 25 anos. (redacção da Lei n. º 45/96, de 03-09).
2 - Quem prestar colaboração, directa ou indirecta, aderir ou apoiar o grupo, organização ou associação referidos no número anterior é punido com pena de prisão de 5 a 15 anos.
3 - Incorre na pena de 12 a 25 anos de prisão quem chefiar ou dirigir grupo, organização ou associação referidos no n.º 1 (redacção da citada Lei n.º 45/96).
4-Se o grupo, organização ou associação tiver como finalidade ou actividade a conversão, transferência, dissimulação ou receptação de bens ou produtos dos crimes previstos nos artigos 21.º e 22.º, o agente é punido:
a) Nos casos dos n.ºs 1 e 3, com pena de prisão de 2 a 10 anos;
b) No caso do n.º 2, com pena de prisão de um a oito anos.
Com efeito, trata-se de um crime de perigo abstracto em que o específico bem jurídico protegido é a paz pública.
A mera existência de uma associação destinada à prática de crimes cria um perigo de perturbação que, só por si, viola a paz pública e assim se justifica uma dispensa antecipada de tutela.
Na doutrina como na jurisprudência, reconhece-se, sem discrepâncias, que para a existência de uma associação é essencial que...
Acordam, em Conferência, os Juízes que constituem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora.
No âmbito dos Autos de Inquérito, com o n.º 196/14.4JELSB, a correrem termos, ora, pela Comarca de Santarém - Instância Central - Secção Criminal – J3, o M.mo Juiz de Instrução veio, por Decisão Instrutória prolatada a de 24 de Maio de 2015, entre o mais, a não Pronunciar os arguidos BB, CC, DD, EE e FF pela prática, em co-autoria, de um crime de Associação Criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, n.º 2, do Dec. Lei, n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
Inconformado com o assim decidido traz a Magistrada do Ministério Público o presente recurso, onde formula as seguintes conclusões:
1 – Na Decisão Instrutória ora recorrida, os Arguidos BB, CC, DD, não foram pronunciados quanto ao crime de associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, do referido Dec. Lei, n.º 15/93, de 22 de Janeiro, uma vez que o M.mo JIC concluiu que os factos descritos na acusação não são suficientes para preencher o crime em causa.
2 – Ao invés, consideramos, que a situação descrita na acusação – se bem que circunscrita agora à actuação dos arguidos CC, BB e DD, juntamente com pelo menos um outro indivíduo de identidade não apurada, configura um processo de formação de vontade colectiva e que os factos apontam para a existência de uma estrutura organizada e que reveste a estabilidade e permanência exigida pelo tipo do crime de associação criminosa.
3 – Tal decorrendo, desde logo, dos factos que foram dados como provados pelo M.mo JIC, no despacho ora recorrido, de que o arguido DD praticou o crime de tráfico de estupefacientes, tais como:
- A apreensão de 450 embalagens de cocaína no interior da máquina exportada pelo DD (cfr. auto de busca e apreensão (fls, 1698 a 1764) ao armazém, …).
- As intercepções telefónicas nas quais se encontram espelhados os contactos e a proximidade mantida entre os arguidos DD e CC.
- O depoimento da testemunha … fls. 3406, que indicia o relacionamento entre os arguidos BB, CC e DD.
- As imagens constantes do Apenso A onde é possível verificar, não só os contactos e a proximidade existente entre os arguidos CC e BB, mas, também, a presença do arguido DD em Lisboa e os contactos com o arguido CC.
- A constatação de que o arguido DD deslocou-se a Portugal nas seguintes datas: 5-10-2013 a 9-10-2013, 28-01-2014 a 21-02-2014, sendo que no dia 20-02-2014 deslocou-se a Paris com o arguido BB, 3-10-2014, 27-07-2015, sendo que o arguido CC deslocou-se ao Brasil entre 18 e 24 de Maio de 2015, indiciadoras de que o propósito das mesmas seria o de camuflar nas máquinas exportadas um transporte de cocaína.
- A presença do arguido CC no dia 27 de Julho de 2015 no aeroporto de Lisboa, altura em que chegou a Portugal o arguido DD.
4- Acrescente-se ainda que a própria natureza do transporte da cocaína para Portugal e a quantidade (500Kg) que, através de tal meio, se conseguiu introduzir no território nacional, com os elevadíssimos lucros que através da sua posterior distribuição se lograria obter é, desde logo, reveladora da existência de uma associação, já que sem o suporte dado por uma forte estrutura organizacional, dificilmente os arguidos teriam conseguido ultrapassar todos os obstáculos de natureza física e nomeadamente os alfandegários com vista a alcáçar tal objectivo.
5- Sendo que os arguidos agiram forçosamente em comum e de forma duradoura, com o fim abstracto de cometimento de crimes de tráfico de estupefacientes, desde logo no período próximo que antecedeu o momento da vinda da primeira máquina para Portugal, cuja exportação do Brasil para território nacional já se inseria num plano superior – em última ratio – de preparação para posterior transporte da cocaína nos autos.
6- Sendo reconhecido que a prova da existência de uma associação criminosa, de quem a promoveu, fundou ou dirigiu ou, simplesmente, a apoiou ou dela fez parte, é uma prova muito difícil de alcançar. Já que, não havendo confissões, raramente existe prova directa, entende-se que este é um dos casos em que precisamente a convicção do julgador deverá ser formada através da avaliação conjunta de todos os indícios existentes nos autos e de acordo com as regras da experiência comum.
7- Em suma, existem nos autos os indícios suficientes para que os arguidos DD, CC e BB sejam submetidos a julgamento, para além dos ilícitos pelos quais foram pronunciados, também pelo crime de associação criminosa, p. e p. pelo art.º 28.º, do referido Dec. Lei, n.º 15/93, de 22 de Janeiro.
Respondeu ao recurso o arguido DD, Dizendo:
1. Bem andou a douta decisão instrutória ao não pronunciar os arguidos pelo crime de associação criminosa;
2. O recorrente não apresentou recurso em matéria de facto quanto aos factos indiciados;
3. Nos factos indiciados na decisão instrutória imputa-se aos arguidos actos relacionados com um transporte de cocaína por via marítima do Brasil para Portugal- ponto 1 a 15.
4. E que o plano dessas pessoas era este.
5. Para que se possa preencher, ainda que indiciariamente, o crime que agora reclama o recorrente, falta:
a. A reiteração criminosa;
b. A estabilidade;
c. E que o grupo seja tendencialmente permanente.
6. Requisitos que ficam definitivamente afastados apenas pela leitura do ponto 1 a 15 da decisão instrutória.
7. Acresce, como bem o salienta a decisão recorrida, ser inexistente uma vontade autónoma e superior dos arguidos.
8. Não se violou, por isso, qualquer das normas apontadas pelo recorrente.
Nesta Instância, a Sra. Procuradora Geral-Adjunta emitiu parecer no sentido do recurso merecer provimento.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
É do seguinte teor o Despacho recorrido, na parte que ora importa:
Vejamos agora os elementos constitutivos do crime de associação criminosa p e p pelo art.º 28° do DL 15/93, de 22 de Janeiro e verificar se os mesmos se mostram indiciados nos autos e/ou se os factos descritos na acusação são suficientes para preencher o crime em causa.
Estabelece o citado artigo 28.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, sob a epígrafe "Associações criminosas":
1- Quem promover, fundar ou financiar grupo, organização ou associação de duas ou mais pessoas que, actuando conce1iadamente, vise praticar algum dos crimes previstos nos artigos 21.º e 22.º é punido com pena de prisão de 10 a 25 anos. (redacção da Lei n. º 45/96, de 03-09).
2 - Quem prestar colaboração, directa ou indirecta, aderir ou apoiar o grupo, organização ou associação referidos no número anterior é punido com pena de prisão de 5 a 15 anos.
3 - Incorre na pena de 12 a 25 anos de prisão quem chefiar ou dirigir grupo, organização ou associação referidos no n.º 1 (redacção da citada Lei n.º 45/96).
4-Se o grupo, organização ou associação tiver como finalidade ou actividade a conversão, transferência, dissimulação ou receptação de bens ou produtos dos crimes previstos nos artigos 21.º e 22.º, o agente é punido:
a) Nos casos dos n.ºs 1 e 3, com pena de prisão de 2 a 10 anos;
b) No caso do n.º 2, com pena de prisão de um a oito anos.
Com efeito, trata-se de um crime de perigo abstracto em que o específico bem jurídico protegido é a paz pública.
A mera existência de uma associação destinada à prática de crimes cria um perigo de perturbação que, só por si, viola a paz pública e assim se justifica uma dispensa antecipada de tutela.
Na doutrina como na jurisprudência, reconhece-se, sem discrepâncias, que para a existência de uma associação é essencial que...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO