Acórdão nº 196/11.6TTPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25-10-2012

Data de Julgamento25 Outubro 2012
Número Acordão196/11.6TTPTM.E1
Ano2012
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I. Relatório
M…, residente em…, intentou, no Tribunal do Trabalho de Portimão, acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra:
1. F…, residente em…;
2. Z…, residente na Rua…,
pedindo que lhe sejam reconhecidos «(…) todos os direitos emergentes do Contrato de Trabalho existente entre ela e a sociedade “M…, Lda”, e que foi rescindido pela Autora (…)» e a condenação dos Réus no pagamento dos créditos salariais devidos por aquela sociedade no montante de € 12.492,36 acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
Alegou para o efeito, em síntese, que foi admitida ao serviço da referida sociedade em 6 de Abril de 1998, para exercer as funções de empregada de limpeza, que os Réus eram os únicos sócios e gerentes da mesma sociedade, que se encontra dissolvida, e que não lhe foi pago o subsídio de Natal de 2010, bem como as retribuições de Dezembro do mesmo ano e de Janeiro de 2011.
Por este motivo, em 15 de Fevereiro de 2011, através de carta registada com aviso de recepção, enviada à sociedade, resolveu o contrato de trabalho com justa causa: todavia, quer a sociedade, quer os seus dois representantes legais, ora Réus, não procederam ao pagamento das quantias em falta que totalizam € 12.492,36.
A sociedade foi extinta em 26 de Outubro de 2010, tendo aquando da extinção, os Réus, únicos sócios daquela, declarado que a mesma não possuía activo nem passivo a liquidar, quando, é certo, para além de activo a sociedade tinha passivo, pelo menos o resultante de créditos salariais da Autora.
Assim, uma vez que os ora Réus prestaram declarações falsas aquando da extinção da sociedade, são responsáveis pelo pagamento das dívidas peticionadas nos autos.

Frustrada a audiência de partes, contestaram os Réus reconhecendo que a Autora foi admitida ao serviço da sociedade M…, Lda., em 06-04-1998, que devido à crise económica e impossibilidade de cumprimento de obrigações legais a sociedade foi dissolvida, tendo disso previamente sido informada a Autora.
Não procederam à liquidação de importâncias em dívida à Autora pois esta abandonou o posto de trabalho, pretendiam reintegrá-la noutra empresa, a constituir, sem perda de direitos, altura em que seriam pagas as importâncias em falta.
E por considerarem que inexistiram falsas declarações da sua parte e que não são responsáveis pelo pagamento de qualquer valor indemnizatório, pugnam pela improcedência da acção.

Foi dispensada a realização de audiência preliminar, julgada improcedente uma pretensa excepção dilatória de ilegitimidade passiva, fixado valor à causa (€ 12.492,36), bem como os factos assentes, e elaborada a base instrutória.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, respondeu-se à base instrutória, sem reclamação das partes, após o que foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, sendo a parte decisória do seguinte teor:
«Pelo exposto:
1. Julga-se a acção parcialmente procedente e, em conformidade, condenam-se os réus a pagar à autora:
a. A quantia global de € 2118,54, a título de retribuições referentes aos meses de Dezembro de 2010, Janeiro e Fevereiro de 2011, subsídio de Natal de 2010, férias não gozadas e subsídios de férias de Natal proporcionais ao trabalho prestado no ano da cessação do contrato, acrescida de juros, à taxa de 4%, desde data dos respectivos vencimento e até efectivo e integral pagamento;
b. Absolvem-se os réus da restante parte do pedido;
(…)».

Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:
«A) O presente Recurso é interposto da douta Sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, na parte em que considerou que, por não provada a subjacente justa causa, a Autora não tem direito à peticionada indemnização prevista no artigo 396º do Código do Trabalho;
B) Salvo o devido respeito, a Apelante, não concorda com tal decisão pois face à legislação aplicável, e à Jurisprudência, não se fez justiça;
C) Nos termos do disposto na alínea a) do número 2 do artigo 394º, no número 5 desse mesmo artigo e nos artigos 395º e 396º, todos do Código do Trabalho em vigor, desde que se verifique a falta de pagamento pontual da retribuição por um período superior a 60 dias e seja efectuada a comunicação por escrito do propósito do trabalhador em resolver o contrato,
D) Tal comunicação torna-se eficaz conferindo ao trabalhador o direito á indemnização prevista no artigo 396º do Código do Trabalho;
E) Tendo resultado como provado a falta de pagamento pontual da retribuição por período de 60 dias (meses de Dezembro de 2010, Janeiro de 2011 e Subsídio de Natal de 2010), nos termos do disposto no número 5 do artigo 394º do Código do Trabalho, tal falta considera-se culposa;
F) E a alínea a) do número 2 dessa disposição legal – artigo 394º do C.T. dispõe que a falta culposa de pagamento pontual da retribuição constitui justa causa de resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador;
G) Tendo a Autora, ora Apelante, optado pela resolução do contrato de trabalho com o fundamento da verificada falta de pagamento pontual da retribuição que se prolongava por período de 60 dias,
H) E tendo observado o disposto no número 1. do artigo 395º do Código do Trabalho quanto à comunicação dessa resolução, com o envio da carta de 15 de Fevereiro de 2011 – k) dos Factos Assentes da Matéria de Facto - ,
I) Assiste o direito à ora Apelante à indemnização a que alude o artigo 396º do Código do Trabalho, sem que esta tenha necessidade de demonstrar ou comprovar que tal falta de pagamento tornou imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho;
J) O douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Abril de 2010, a que o Meritíssimo Juiz “a quo” faz referência na sua Sentença, não pode ser invocado pois a questão nele decidida não tem qualquer semelhança com a dos presentes autos;
L) Basta que a resolução do contrato se fundamente em conduta culposa do empregador, como é o caso, para que a trabalhadora tenha direito a uma indemnização;
M) Tanto mais que de acordo com o disposto no artigo 799º do Código Civil a culpa do empregador presume-se, incumbindo a este provar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua;
N) De acordo com a lei, não tinha a ora Apelante que alegar que se encontrava perante uma situação de incumprimento da entidade empregadora que, pela sua gravidade e consequências, punha de imediato em causa a subsistência da relação de trabalho;
O) Nesse sentido, entre outros, o douto Acórdão da Relação do Porto de 21 de Fevereiro de 2011, assim como e ainda que referentes ao Código do Trabalho de 2003, mas que se aplicam mutatis mutandis, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13 de Janeiro de 2010 (Procº 44/08.4 TTALM.L1-4), o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 1 de Março de 2010 (Procº 425/08.3 TTGDM.P1) e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Maio de 2007 (Procº nº 07S532), de 19 de Novembro de 2008 (Procº nº 08S1871), de 3 de Novembro de 2010 (Procº nº 425/07.0 TTCBR.C1.S1) e de 12 de Outubro de 2011 (Procº nº 2384/07.0 TTLSB.L1.S1);
P) Nos termos do disposto na alínea a) do número 2 e no número 5, do artigo 394º do Código do Trabalho, o comportamento da entidade empregadora foi culposo, pelo que está assim provada a subjacente justa causa para a resolução do contrato de trabalho pela trabalhadora ora Apelante,
Q) Resolvido o Contrato de Trabalho com justa causa, tem a ora Apelante direito á indemnização por antiguidade, prevista no artigo 396º do Código do Trabalho, e que foi peticionada;
R) Que os Réus, ora Apelados, devem ser condenados a pagar àquela;
S) Tal entendimento é perfilhado por vários Autores, ainda que com referência a anterior legislação, tais como Monteiro Fernandes e Pedro Romano Martinez;
T) Ao assim não se decidir, salvo o devido respeito, o douto Tribunal “a quo” não fez a devida aplicação da lei, nomeadamente o disposto no artigo 799º do Código Civil e nos artigos 394º, 395º e 396º do Código do Trabalho, nem valorou os factos».
E a terminar pede que seja concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida, para ser substituída por outra que considere que a Autora resolveu com justa causa o contrato de trabalho e condene os Réus a pagar à Autora o valor de € 9.366,56 a título de indemnização de antiguidade.

Os Réus, recorridos, não responderam ao recurso.
Este foi admitido na 1.ª instância, como de apelação, com subida imediata nos autos, e efeito devolutivo.

Neste tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, que não foi objecto de resposta, no sentido da procedência do recurso por, em suma, uma vez que o não pagamento da retribuição se prolongou por período superior a 60 dias, independentemente da culpa do empregador ou da prova da impossibilidade da manutenção da relação laboral, existe justa causa de resolução do contrato de trabalho.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Objecto do recurso
Tendo em conta que o objecto dos recursos é delimitado pelas
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