Acórdão nº 18995/22.1T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 10-09-2024

Data de Julgamento10 Setembro 2024
Número Acordão18995/22.1T8PRT.P1
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 18995/22.1T8PRT.P1

Relatora: Anabela Andrade Miranda

Adjunto: Artur Dionísio Oliveira

Adjunto: Rodrigues Pires


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Sumário

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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I—RELATÓRIO

“A..., Unipessoal, Lda.”, sociedade comercial por quotas, com sede na Rua ..., ..., Sala ..., ..., Porto, intentou a presente acção de despejo, contra AA, residente na Rua ..., 2.º andar, ... Porto pedindo o despejo do locado e o pagamento de uma indemnização pelos danos causados.

A ré contestou.


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Proferiu-se sentença que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a ré dos pedidos.

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Inconformada com a sentença, a autora interpôs recurso finalizando com as seguintes

Conclusões

1.ª) Sem prejuízo do respeito devido e institucional, parece-nos que, quer a matéria de facto, quer a matéria de direito foram deficientemente julgadas, quer porque a maioria dos elementos de prova carreados para os autos obrigariam a resposta diversa a alguns dos factos constantes nos dados como provados e, outrossim, nos dados como não provados, quer porque entendemos que foram ignoradas as disposições legais que deveriam presidir à solução jurídica correcta e adequada.

2.ª) A resposta à matéria de facto, ora em crise, não valorou devidamente os depoimentos das testemunhas arroladas pela apelante, sem que se consiga perceber os motivos, pois tais depoimentos foram isentos e credíveis. E menos se compreende uma vez que as testemunhas da autora não podem ser consideradas menos credíveis do que as indicadas pela ré, ora recorrida, até pelas profissões que desempenham, sendo ainda certo, que revelaram conhecimento directo dos factos em crise nos autos.

3.ª) Na matéria de facto dado como provada, nos pontos 15.º, 16.º e 19.º, o Tribunal “a quo” deu como assente por verdadeiro um facto essencial para decisão do litígio–autorização das obras pelo primitivo senhorio, pai dos vendedores.

4.ª) Entendeu o Tribunal “a quo” que o mesmo resulta provado dos depoimentos prestados pela corte de testemunhas apresentadas pela ré, ora apelada.

5.ª) Com o devido respeito não há um só depoimento credível nesse sentido, havendo apenas depoimentos no sentido de conhecerem as obras realizadas, há diversos anos, mas sobre a autorização não.

6.ª) O Tribunal “a quo” valorizou com especial ênfase o depoimento da primeira testemunha da ré, a Exma. Senhora BB, mas compulsada a sentença não se divisa qualquer referência à autorização dada pelo anterior senhorio. De resto é surpreendente a credibilidade emprestada a este depoimento, quando o próprio Meritíssimo Juiz, entre o 1m e 50s a 3m e 12s (ficheiro18995-22.1T8PRT_2023-11-20_15-03-46), questiona o depoimento da testemunha afirmando que é mau sinal começar a falar da porta sem ninguém a ter questionado sobre tal assunto.

7.ª) De igual modo, o Meritíssimo Juiz, entre os 24 m e 29s a 24m e 59s (ficheiro18995-22.1T8PRT_2023-11-20_15-03-46), volta a questionar o depoimento da testemunha BB, desta feita pelo facto de esta estar preocupada com questões cuja análise não lhe competia, como contratos e a porta.

8.ª) Mediante a leitura destes segmentos parece-nos óbvio que o Tribunal “a quo” ficou com sérias dúvidas sobre a credibilidade e isenção deste depoimento,

9.ª) Acresce que, o depoimento produzido pela testemunha BB sobre a caracterização da porta existente nas escadas comuns que impede o acesso ao piso superior, também comum, evidencia bem a sua falta de conhecimento acerca da factualidade em questão.

10.ª) Na verdade, a testemunha da autora, CC, empreiteiro de profissão, depõe, entre os 8m e 2s e os 8m e 32s (ficheiro 18995-22.1T8PRT_2023-11-20_11-49-38.mp3), no sentido de que a porta existente é uma porta de segurança. Também a testemunha da autora, DD, Professor de Direito da Escola de Direito da Universidade ..., depôs, entre os 3m e 59s e os 4m e 41s (ficheiro 18995-22.1T8PRT_2023-11-20_12-10-56.mp3), no sentido de a porta estar em bom estado, ser uma porta boa.

11.ª) Ora, a testemunha da ré, BB, “assevera” que a porta tem cerca de quarenta anos, é a mesma, nunca foi mudada e, “definitivamente”, não é uma porta de segurança, tal como se alcança do seu depoimento entre os 15m e 34s e os 16m e 24s (ficheiro18995-22.1T8PRT_2023-11-20_15-03-46).

12.ª) A própria ré, nas suas declarações de parte, contraria o depoimento da testemunha BB, tal como se constata na douta sentença: “A determinada altura mudou a porta e colocou uma melhor e que oferece mais segurança isto ainda em vida do Sr. EE (…)”.

13.ª) Analisadas, ainda que perfunctoriamente, as passagens indicadas deixam um rasto evidente de ignorância e fantasia acerca dos factos em questão, designadamente, no que respeita à materialidade essencial em juízo:

- A existência ou inexistência de autorização quer por parte do senhorio primitivo e pai dos vendedores do imóvel – EE -, quer por parte dos citados vendedores.

14.ª) De resto, nem a testemunha BB, nem as demais testemunhas, produziram qualquer afirmação credível acerca da autorização dada, diríamos mesmo, que não a produziram de todo. Na verdade, escrutinados os depoimentos da totalidade das testemunhas da ré não se divisa qualquer afirmação que sustente, minimamente, a tese vertida na sentença, segundo a qual a ré obteve a autorização do(s) senhorio(s) para edificar as construções nas zonas comuns do edifício.

15.ª) Os depoimentos das testemunhas da apelada incidiram sobre a existência das edificações (facto indisputado) mas não acerca da materialidade essencial nos autos – autorização do(s) senhorio(s) para realizar as obras, facto este crucial e relevante para a decisão da causa em qualquer das soluções de direito plausíveis.

16.ª) É mister afirmar que, compulsada a sentença, no que respeita à fundamentação de facto, não se antolha a mais singela linha no que tange à descrição do depoimento de qualquer uma das testemunhas da ré que afirmasse a existência da autorização dada pelo senhorio primitivo, ou qualquer outro.

17.ª) O único depoimento que sustenta a tese da ré da obtenção de autorização do primitivo senhorio é o da própria ré em sede de declarações de parte, conforme se alcança da, aliás, Douta Sentença: “Esclareceu que fez as obras no terraço há cerca de 46 anos por causa da humidade na casa. Essas obras foram feitas com expressa autorização do dono da casa, Sr. EE.”; “A determinada altura mudou a porta e colocou uma melhor e que oferece mais segurança isto ainda em vida do Sr. EE e com a expressa autorização deste.”

18.ª) Acresce que o Tribunal “a quo” não levou em linha de conta toda a prova documental carreada para os autos pela recorrente, maxime, o documento junto pela apelante em 23 de Maio de 2023, com a referência 35722730, assinado pelos vendedores do imóvel no qual, para o que aqui interessa, afirmam o seguinte:

- “d) Mais declaram que, no caso de a cobertura do terraço não se encontrar totalmente devoluta, por ocupação de pessoas ou bens, essa mesma ocupação dever-se-á ter como ilícita e sem título dado que não foi autorizada pelos declarantes e não têm conhecimento que anteriores proprietários tenham dado o consentimento.”

19.ª) O documento em questão não foi impugnado pela ré, ora recorrida.

20.ª) Na verdade, a apelada, notificada do documento junto com o requerimento da apelante – “Declaração” a negar a existência de autorização e afirmar a ilicitude das edificações –, não impugnou o respectivo teor, pelo que esse documento, cuja existência e função servia expressamente para tal fim (negar a existência de autorização e afirmar a ilicitude das edificações), tem de ser considerado como procedente e verdadeiro, nos termos do artigo 374.º do Código Civil.

21.ª) Isto é, cabe à parte contra quem é apresentado o documento pronunciar-se acerca do mesmo, impugnado expressamente o seu teor e os efeitos de que a contraparte se pretende fazer valer. Se não o fizer, remetendo-se a manifesto silêncio, reconhece, de forma tácita, a validade do seu teor – o silêncio vale como reconhecimento.

22.ª) À recorrida foi concedida a oportunidade de esgrimir a sua defesa quanto ao teor e veracidade do mesmo, mas manteve-se silente; foi-lhe atribuída a faculdade de deduzir impugnação, quer da sua admissão, quer da sua força probatória, tendo ignorado tal faculdade, não merecendo qualquer posição expressa por parte da apelada, que sempre deveria ser tomada no prazo geral de 10 (dez) dias, a contar da notificação do requerimento da autora com que foi apresentado – Cfr. n.º1 e n.º2 do artigo 149.º do Código de Processo Civil.

23.ª) Destarte, falhou a recorrida a impugnação tempestiva dos meios de prova que, no caso, tratando-se de um documento, sempre seria com o objectivo de afastar, se não a sua autenticidade, pelo menos a sua força probatória.

24.ª) Atendendo à não impugnação do documento denominado “Declaração”, junto aos autos, deve-se ter por reconhecida a sua autenticidade, com igual força probatória do seu teor, pelo que o Tribunal “a quo” deveria ter admitido como provados os factos nos precisos termos em que emergem do documento, no caso a inexistência de autorização dos senhorios e a consequente ilicitude das obras realizadas. – Cfr. artigo 376.º, n.º1 do Código Civil.

25.ª) Sendo certo que a análise de tal documento deveria, ainda, ter sido articulado com o depoimento de parte do legal representante da autora, ora recorrente, Exmo. Senhor FF que, entre o 1m e 46s e os 2m e 48s (ficheiro 18995-22.1T8PRT_2023-11-20_11-30-55.mp3), depôs no sentido de que na visita ao imóvel depararam-se com as obras e que os vendedores do imóvel afirmaram que iria ser tudo reposto e, se não fosse, fariam uma declaração no sentido da inexistência de autorização, tendo cumprido tal promessa ao assinarem o documento em questão.

26.ª) Tudo sopesado, e acima de tudo conjugando a prova testemunhal com a prova documental existente nos autos, entendemos, que a...

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