Acórdão nº 1868/21.2T8CTB.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 08-02-2024

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Case OutcomeCONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA.
Classe processualREVISTA
Número Acordão1868/21.2T8CTB.C1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça


Processo 1868/21.2T8CTB.C1.S1


Revista


110/23


Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


AA instaurou acção de processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL, S.A., peticionando que a acção seja julgada procedente e, em consequência, se decida:


“a) Condenar o Banco R. a integrar o A. na situação jurídica em que se devia encontrar, ou seja a desempenhar funções e actividades profissionais compatíveis com a categoria de Director, nos termos do ACT, a saber: “Diretor, diretor adjunto, subdiretor- Tomam as decisões de gestão no quadro das políticas e objetivos da entidade empregadora e na esfera da sua responsabilidade; colaboram na elaboração de decisões a tomar ao nível do conselho de administração; superintendem no planeamento, organização e coordenação das atividades deles dependentes. Às categorias profissionais sucessivamente elencadas corresponde maior poder de decisão e responsabilidade”


b) Condenar o R. a indemnizar o A., a título de danos não patrimoniais, no montante de € 300.000,00;


c) Condenar o R. a pagar ao A. quer os juros vencidos nos montantes indicados e articulados, quer os juros vincendos até efectivo e integral pagamento”.


Frustrou-se a conciliação das partes.


A Ré contestou.


Foi realizada audiência final.


Por sentença de 28.06.2022 de foi decidido o seguinte:


Nestes termos, e em face do exposto, decido julgar a ação parcialmente procedente, e, em consequência, condeno a ré CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL, S.A.,:


a) A integrar o A. na situação jurídica em que se devia encontrar, ou seja a desempenhar funções e atividades profissionais compatíveis com a categoria de Diretor, nos termos do ACT, a saber: “Diretor, diretor adjunto, subdiretor - Tomam as decisões de gestão no quadro das políticas e objetivos da entidade empregadora e na esfera da sua responsabilidade; colaboram na elaboração de decisões a tomar ao nível do conselho de administração; superintendem no planeamento, organização e coordenação das atividades deles dependentes. Às categorias profissionais sucessivamente elencadas corresponde maior poder de decisão e responsabilidade”


b) A indemnizar o A., a título de danos não patrimoniais, no montante de € 70.000,00;


c) A pagar ao A. os juros vencidos e vincendos, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento”.


A Ré interpôs recurso de apelação e o Autor interpôs recurso subordinado.


Pelo acórdão do Tribunal da Relação de 24.03.2023 foi decidido o seguinte:


VI – Termos em que se delibera:


a) Julgar a apelação do réu (recurso independente) totalmente procedente em função do que se decide absolver o réu dos pedidos formulados pelo autor.


b) Julgar o recurso subordinado totalmente improcedente”.


Pese embora nada se refira no dispositivo, o Tribunal da Relação procedeu a diversas alterações à matéria de facto:


- eliminou os factos provados 32), 33), 34) e o ponto de exclamação do facto 28) e eliminou o facto não provado 1)


- alterou a redacção dos pontos 9-D), 36), 38), 39), 40) e 45), que passou a ser a seguinte:


“9) O percurso profissional do A. e correspectivas vicissitudes do contrato individual de trabalho do A. inclusive em relação ao R., foi o seguinte: (…) D- No FINIBANCO, S.A. a) Admissão mediante contrato individual de trabalho de 19 de Março de 1997, com efeitos a partir de 1 de Abril de 1997, com a categoria de Director, Grupo I, nível 14, nos termos estabelecidos no ACTV para o sector bancário;


36) Sentimentos e sintomatologias que o autor atribui à actuação do R.


38) Foi-lhe diagnosticada uma sintomatologia ansiosa – crises de ansiedade extrema / ataques de pânico (taquicardia, suor exagerado, tonturas, náuseas) que desencadearam medo de sair de casa, estando a limitar o seu dia-a-dia – e, ainda, a apresentação de sentimentos de frustração e injustiça, que atribui aos factos aqui enunciados.


39) O A. desenvolveu uma depressão grave, estando a receber tratamento clínico, o que atribuí ao comportamento da ré.


40) O R nunca curou de com ele negociar uma qualquer outra compensação (retributiva ou não).


45) O A. sente profundo desânimo, tristeza, desgosto, indignação e perda de auto estima, bem como uma dificuldade acrescida em cumprir as obrigações assumidas, o que atribui à situação criada.”;


- aditou 2 factos (sem lhes atribuir numeração):


- Em face das iniciativas de reestruturação em curso, transversais a todo o Banco, foram também apresentadas ao Autor, de boa-fé, as condições do programa de rescisões ou reformas, que de facto contemplam a reforma ou o acordo, em condições de adesão voluntária.


- A abordagem ao Autor foi feita nos mesmíssimos termos que ocorreram com todos os outros trabalhadores do Banco Réu que reuniam condições para esse efeito.”


O Autor veio interpor recurso de revista, arguindo, além do mais, a nulidade do acórdão, e formulando as seguintes conclusões:


1. O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra é, face à alteração da matéria de facto que sentenciou, nulo, por violação das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código do Processo Civil, ex vi al. a) do n.º 2 do art. 1.º do CPT;


2. O encadeamento de factos referentes ao presente processo, que, no fundo, é uma sumula da actuação do Réu, não pode passar ao lado do presente e permite sedimentar a questão jurídica na íntegra, como veremos;


3. Daí a decisão da matéria de facto da Primeira Instância, que se aplaude, decisão essa que é instrutória do presente, não o limitando, e que servirá, esperamos, para sedimentar Acórdão revogatório da decisão da Relação de Coimbra.


4. A prova documental carreada para os autos é manifestamente suficiente para afastar as conclusões do Tribunal da Relação de Coimbra, considerando, até, a confissão do recorrido, o que, nos termos dos artigos 362.º e seguintes do Código Civil, acarretaria a uma diferente decisão quanto aos factos provados.


5. Tendo em conta o direito processual em vigor, é possível ligar o princípio da aquisição processual ao disposto no artigo 413.º do Código de Processo Civil: «O tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las, sem prejuízo das disposições que declarem irrelevante a alegação de um facto, quando não seja feita por certo interessado».


6. O Acórdão de que se recorre, ao considerar a alteração quanto à matéria de facto, alterando a decisão da Primeira Instância, e ao sustentar a decisão na caracterização desses factos, omitindo toda a demais prova carreada para os autos, nomeadamente a prova documental, que, nos termos dos artigos 362.º e seguintes do Código Civil, deve prevalecer, é nulo, considerando que a sua fundamentação é errada (ou, mesmo, inexistente) e sem abrigo na Lei processual, além de que manifestamente excede as questões de que podia tomar conhecimento – nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b) e d).


7. É, também e assim, nulo, considerando as regras adjectivas de julgamento de prova, uma vez que a Relação de Coimbra alterou a prova elaborando um juízo conclusivo, diga-se com firmeza, sobre o juízo (a repetição é propositada) efectivado pela Primeira Instância. E fê-lo sem o poder fazer, extravasando, até, os limites da sua apreciação – 652.º do CPC.


8. Está consolidado na jurisprudência deste Supremo Tribunal o entendimento de que, não obstante a convergência decisória das instâncias, quanto ao mérito da causa, é admissível recurso de revista, nos termos gerais, do acórdão proferido pela Relação em que seja apontada a existência de erro decisório relativamente à aplicação da lei processual no que se refere à reapreciação da decisão sobre a matéria de facto.


9. Considera o recorrente que, a bem do Princípio da Igualdade de armas e do Duplo Grau de Jurisdição, pode o Supremo Tribunal de Justiça sindicar para além do (evidente, como se verá) erro no controlo da aplicação da lei adjectiva em qualquer das dimensões destinadas à fixação da matéria de facto provada e não provada, o que requer.


10. não só o Tribunal da Primeira Instância discorreu sobre as declarações das partes e depoimentos das testemunhas de forma metódica e transparente, como captou e fez reflectir no papel o que foi dito em audiência.


11. Não oferece qualquer reparo a escolha da matéria de facto provada e não provada, na Sentença da Primeira Instância, nem, tão pouco, a fundamentação da sua escolha, não devendo a mesma ser alterada – também em referência ao Princípio da Aquisição Processual.


12. O Tribunal da Relação de Coimbra tomou apenas conhecimento parte das provas oferecidas pelo Réu, omitindo pronúncia sobre as provas oferecidas pelo Autor, violando, desde logo, o artigo 415.º do CPC.


13. O Réu assume que o Autor foi contratado para Director, sabe que as funções que são exercidas devem corresponder à categoria contratada e confessou que além de só lhe ter dado funções de Gerente, acabou por, há 6 anos, retirar-lhe o pouco que lhe tinha atribuído, reduzindo o seu dia-a-dia a nada!


14. Mais, utiliza o facto de o Autor ter admitido, na contratação inicial, ser admitido provisoriamente no nível 14, com mudança automática para o nível 16 ao fim de um curto período, claramente por causa do início de actividade (!!), para justificar esse comportamento!


15. Omitindo, diga-se, a transitoriedade dessa situação de facto, com reposição automática imediata do nível de admissão ao fim de um, repete-se, curtíssimo período!


16. Ou seja, perante mais uma prova inequívoca que o Autor foi contratado para Director, o Réu tenta convencer-nos que é exactamente o contrário.


17. Depois, tornou-se evidente, até por confissão do superior hierárquico do Recorrido, que o Banco não entregou ao Autor a Gerência do Balcão da ... (que até podia ter reposto alguma “Paz Laboral” à situação) considerando...

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