Acórdão Nº 186/97 de Tribunal Constitucional, 11-03-1997

Número Acordão186/97
Número do processo913/96
Data11 Março 1997
Classe processualReclamação
Acórdão 186/97

ACÓRDÃO Nº 186/97

Proc. nº 913/96 (Reclamação)

2ª Secção

Relator: Cons. Sousa e Brito

Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional :

I

RELATÓRIO

1. Acusados da co-autoria, com outros quatro arguidos, de um crime de «abuso de autoridade» previsto e punido nos termos da conjugação dos artigos 94º alínea e) e 95º corpo do Código de Justiça Militar (adiante CJM), vieram A. e B., elementos da Guarda Nacional Republicana, a ser julgados e condenados pelo 1º Tribunal Militar Territorial de Lisboa, julgamento este anulado por Acórdão do Supremo Tribunal Militar de 27/4/95 que considerou ter ocorrido na audiência de julgamento "nulidade essencial", ordenando, em função disso, nos termos do artigo 457º nº 2 do CJM, a sua reforma "no mesmo Tribunal de instância".

Transitada esta decisão, baixou o processo ao 1º TMTL que, cumprindo o Acórdão do STM, procedeu a novo julgamento. No início deste, através de requerimento ditado para a acta (conforme certificação a fls. 10) suscitaram os dois arguidos aqui reclamantes a inconstitucionalidade do artigo 457º nº 2 do CJM fundada na circunstância de o julgamento estar a ser repetido pelo mesmo Tribunal que proferira a decisão anulada. A este propósito, também na mesma acta, consignou o Tribunal o seguinte (v. fls. 11) :

"A questão ora suscitada nos autos encontra-se expressamente decidida no douto Acórdão do Supremo Tribunal Militar a fls. 404 vº (refere-se ao Acórdão de 27/4/95), pelo que sobre a mesma não pode este Tribunal voltar a pronunciar-se. Discordando do decidido pelo Supremo Tribunal Militar, sempre os réus poderiam ter apresentado em tempo o competente recurso. Não o tendo feito, este Tribunal procederá a julgamento como ordenado pelo Supremo Tribunal Militar”.

Realizado esse (novo) julgamento, foram os arguidos aqui reclamantes condenados pelo crime referido no libelo na pena de sete meses de presídio militar.

Recorreram, então, através da peça certificada a fls. 30/34, para o Supremo Tribunal Militar, formulando as conclusões que se transcrevem :

" 1ª - Deve o Acórdão recorrido ser julgado nulo e sem efeito por deficiência e obscuridade no julgamento da matéria de facto, nos termos do artigo 458º alínea c) do CJM.

2º Caso assim não venha a ser (...) entendido então os réus pedem ao Tribunal ad quem que atenda às circunstâncias quer endógenas quer exógenas que rodearam a prática do ilícito criminal militar substituindo-lhes a pena efectiva de sete meses de presídio militar em que cada um deles foi condenado, ainda que por igual tempo de presídio militar mas suspensa por um período de tempo que por bem for entendido pelo alto critério de V. Excelências.

3º Caso assim, igualmente, não venha a ser doutamente entendido, porque a isso se opõe a política criminal militar que enforma o Código de Justiça Militar, suscita-se, e desde já, a inconstitucionalidade do Código de Justiça Militar, cuja aplicação aos ora recorrentes ofendeu e desrespeitou o princípio da igualdade e da proporcionalidade estabelecidos nos artigos 13º, 18º nº 2, 2ª parte e 266º todos da Constituição da República Portuguesa."

2. Apreciando este recurso, através do Acórdão certificado de fls. 35 a 49, entendeu o Supremo Tribunal Militar, na parte que interessa à presente reclamação, o seguinte :

"--------------------------------------------

A parte final do nº 2 do citado artº 457º determina que anulado pelo Supremo Tribunal Militar um julgamento efectuado num Tribunal Militar de instância a sua reforma far-se-á no mesmo Tribunal.

A questão, posta pela primeira vez, da inconstitucionalidade desse preceito é interessante e carece de estudo e decisão ponderadas.

Sucede, porém, que, in casu e agora não é possível a sua apreciação porque a referida norma não foi aplicada pelo Tribunal recorrido nem o é agora por este Supremo Tribunal. Na verdade, o aludido preceito foi aplicado no acórdão de fls. 395 e seguintes (refere-se aqui o Supremo Tribunal Militar ao já falado Acórdão de 27/4/95), transitado em julgado, tendo o Tribunal a quo apenas cumprido o determinado nesse Acórdão ao repetir o julgamento. E este Supremo Tribunal tem também de acatar o caso julgado resultante do seu acórdão anterior, pelo que a eventual inconstitucionalidade suscitada nunca poderia sobrepor-se àquele.

Assim, improcede o referido recurso, já que o tribunal a quo, ao proferir o aresto recorrido, se limitou a acatar, como lhe cumpria, o decidido por este Supremo Tribunal em acórdão transitado em julgado."

Mais adiante, ao confirmar a pena aplicada no Tribunal de instância aos arguidos, ponderou ainda o Supremo Tribunal Militar no mesmo aresto :

"--------------------------------------------

, as circunstâncias da infracção e as suas consequências e a intensidade do dolo justificam que se mantenha a pena a cada um deles aplicada pelo aresto recorrido, de sete (7) meses de presídio militar.

Pedem os recorrentes que tal pena seja declarada suspensa na sua execução.

Para além de ser jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal que as penas de presídio militar não podem ser suspensas, o certo é que in casu não se justifica tal suspensão, pelas necessidades de prevenção geral e especial resultantes do cumprimento das penas.

--------------------------------------------"

3. A estes aspectos da decisão se refere o recurso de constitucionalidade intentado interpor para este Tribunal no requerimento certificado a fls. 51. Trata-se de recurso fundado na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82 de 15 de Novembro, acrescentando aí os ora reclamantes que o interpõem :

"(...) por violação dos princípios, de independência e imparcialidade, artigo 206º, do contraditório, artigo 32º nº 5, todos da CRP, respectivamente pelos artigos 457º nº 2, na parte em que manda que o processo seja reformado no mesmo tribunal de instância e artigo 401º ambos do CJM e ainda porque a aplicação aos recorrentes das normas contidas no CJM violou o princípio da igualdade e proporcionalidade estabelecidos nos artigos 13º, 18º nº 2, 2ª parte e 266º todos da CRP."

Proferiu, então, o Relator do processo o despacho certificado a fls.52, não admitindo o recurso. Aí se lê a dado passo :

"-------------------------------------------

Ora, embora a constitucionalidade do art. 457º nº 2 in fine do CJM, tenha sido suscitada, o certo é que o Acórdão de fls. não aplicou a mesma norma.

Esta foi utilizada em anterior aresto deste Supremo Tribunal(...) transitado em julgado, limitando-se quer o Tribunal de Instância, quer este Supremo Tribunal a acatar o caso julgado."

E mais adiante, relativamente ao outro aspecto suscitado no requerimento de interposição de recurso, acrescenta o mesmo despacho:

"Quanto à aplicação aos recorrentes do CJM é óbvio que não constitui recurso de constitucionalidade.

É entendimento uniforme e pacífico do Tribunal Constitucional, com base nos textos constitucional e legal, que os recursos de constitucionalidade versam somente sobre normas e não sobre as decisões dos tribunais em si mesmo consideradas.

Ora, os recorrentes não arguem de inconstitucional o CJM, mas sim a sua aplicação aos recorrentes, o que está excluído da competência do Tribunal Constitucional.

Poder-se-ia entender que a inconstitucionalidade arguida seria da interpretação dada ao CJM (pelo menos a algumas das suas disposições) pelo aresto de que se pretende recorrer, mas nem isso ocorre.

Está em causa o entendimento deste Supremo Tribunal que não é aplicável no processo criminal militar a suspensão da execução das penas de presídio militar e prisão militar.

Ora, in casu, tal suspensão não foi aplicada por este Tribunal considerar que não se justifica tal suspensão, 'pelas necessidades de prevenção geral e especial resultantes do cumprimento das penas', afastar a eventual aplicação ou não da norma do CJM que proíbe ou autoriza a mesma suspensão.

Mas, mesmo que assim se não entenda, o certo é que a orientação deste Supremo Tribunal resulta da inexistência de norma do CJM que autorize a suspensão da pena e da recusa de aceitar como aplicáveis subsidiariamente normas do Código Penal, o que pode traduzir inconstitucionalidade por omissão, não apreciável pelos tribunais ordinários ou erro ou inconstitucionalidade da própria decisão judicial, não havendo em qualquer dos casos, recurso para o Tribunal Constitucional."

Confirmada posteriormente pelo Acórdão do Supremo Tribunal Militar de fls. 5 a 7, foi tal recusa de admissão do recurso objecto da presente reclamação, pelas seguintes razões:

"-------------------------------------------

os reclamantes, no recurso que interpuseram do acórdão proferido pelo 1º Tribunal...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT