Acórdão nº 1856/07.1TBFUN-L.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 05-12-2017

Data de Julgamento05 Dezembro 2017
Case OutcomeNEGADA A REVISTA
Classe processualREVISTA
Número Acordão1856/07.1TBFUN-L.L1.S1
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça


Acordam na 6ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça,

I – relatório

1. AA, S.A., intentou, por apenso aos autos de insolvência de BB, ao abrigo do disposto no artigo 146.°, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE), acção declarativa de Verificação Ulterior de Créditos contra o Insolvente, BB, a Massa Insolvente de BB e todos os credores, pedindo que lhe seja reconhecido:

- crédito sobre CCe DD, no montante de €70.621,69,

- que o referido crédito goza de direito real de garantia de cumprimento, consubstanciado em duas hipotecas voluntárias constituídas sobre imóvel.

Alegou para o efeito e essencialmente:

- Terem sido constituídas duas hipotecas voluntárias sobre a fracção autónoma designada pela letra “…” do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, denominado “...” para garantia de dois contratos de mútuo que a EE, entretanto incorporada no ora AA, SA., celebrou com CC e DD;

- Terem os mutuários, previamente à outorga dos referidos empréstimos, adquirido tal imóvel a BB, tendo o contrato de compra e venda sido resolvido em beneficio da Ré Massa Insolvente de BB, passando, por isso a integrar o respectivo património daquela.

2. Após citação, a Ré Massa Insolvente apresentou contestação, excepcionado, para além do mais, a caducidade do direito de acção por violação do prazo previsto no artigo 146.º, do CIRE. Impugnou a factualidade alegada pugnando pela improcedência da acção.

3. Proferido despacho saneador (que conheceu as restantes excepções suscitadas, julgando-as improcedentes, relegando para sentença o conhecimento da caducidade do direito de acção) foi proferida sentença (em 18 de Outubro de 2016), que julgou improcedente a excepção de caducidade e deu procedência à acção, reconhecendo o crédito do Autor nos termos peticionados.

4. Inconformada a Ré Massa Insolvente apelou, defendendo a caducidade do direito de accionar por parte do Autor com fundamento na extemporaneidade da acção.

5. O Tribunal da Relação de Lisboa (por acórdão de 6 de Abril de 2017) concedeu provimento à apelação, julgou procedente a excepção de caducidade do direito de acção e, revogando a sentença, absolveu os Réus do pedido.

6. Interpõe o Autor recurso de revista, formulando as seguintes conclusões:

I – O acórdão recorrido faz uma errada interpretação das normas aplicáveis à contagem do prazo de caducidade da verificação ulterior de créditos.

II – O acórdão recorrido, admitindo por um lado que esse prazo não tem início com a constituição do direito, não pondera as consequências a retirar dessa constituição.

III – Impendendo sobre o administrador da insolvência o dever de reconhecer os créditos cuja inexistência não pode ignorar, ao fazer integrar na massa insolvente um bem sobre o qual incide garantia real por via de resolução, tem o consequente dever de dar disso conhecimento ao credor em causa.

IV – Em face dessa omissão, o credor com garantia real apenas pode lançar mão de verificação ulterior de créditos a partir da publicitação da venda do bem o qual incide a sua garantia.

V – É com a publicitação da venda que se inicia o prazo de três meses a que alude o artigo 146.º, n.º2, alínea b) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, independentemente da data da resolução em benefício da massa ou do seu registo.”.

7. A Ré Massa Insolvente pugnou pela inadmissibilidade do recurso.

8. – Por decisão da Relatora de 15-09-2017 foi deferida a reclamação do despacho que não admitiu o recurso e, em conformidade, requisitado o processo.



II – APRECIAÇÃO DO RECURSO

De acordo com o teor das conclusões das alegações (que delimitam o âmbito do conhecimento por parte do tribunal, na ausência de questões de conhecimento oficioso - artigos 608.º, n.º2, 635.º, n.4 e 639.º, todos do Código de Processo Civil, doravante CPC), impõe-se conhecer a seguinte questão:
ð Tempestividade da acção de verificação ulterior de créditos: do termo inicial do prazo de três meses previsto no artigo 146.º, n.º2, alínea b) (2ª parte), do CIRE

1. Os factos

A- Provados
1. O Banco Autor dedica-se ao exercício do comércio bancário
2. No exercício dessa actividade, a EE, entretanto incorporada no AA, SA., por efeito da fusão por incorporação daquela neste último, celebrou com CC e DD, dois contratos de empréstimo, a saber:
a) o contrato número …, no montante de € 9.771,61 (nove mil, setecentos e setenta e um euros e sessenta e um cêntimos), para fazer face a compromissos financeiros;
b) o contrato número …, no montante de €85.000,00 (oitenta e cinco mil euros), para aquisição de habitação própria permanente (conforme contratos de mútuo juntos aos presentes autos que aqui se dão por integralmente reproduzidos para os devidos e legais efeitos).
3.Em 19 de Novembro de 2007, por aditamento celebrado ao contrato número …, foram alteradas as condições contratuais inicialmente acordadas entre as partes, mantendo-se porém, a garantia anteriormente prestada.
4.Para garantia do cumprimento das obrigações emergentes dos contratos referidos em 2., CC e DD constituíram duas hipotecas voluntárias sobre o seguinte imóvel:
- Fracção autónoma designada pela letra "…" do prédio urbano sujeito ao regime da propriedade horizontal denominado "...", inscrito na matriz predial respectiva sob o art. … e descrito na Conservatória do Registo Predial do …, sob o n.° ... da freguesia de ....
5. As hipotecas referidas em 4. encontram-se registadas a favor do Autor pela AP. 79 de 2004/08/04 e pela AP. 80 de 2004/08/04.
6.O imóvel referido em 4. já havia sido adquirido por CC e DD previamente à outorga dos contratos referidos em 2., por compra a BB.
7. O contrato de compra e venda celebrado entre CC e DD, e o vendedor BB , foi resolvido em beneficio da Ré massa insolvente, tendo o referido imóvel passado a integrar o património desta.
8. A resolução referida em 7. foi confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 25.03.2010 e transitado em julgado em 19.04.2010, no âmbito do processo de impugnação de resolução que correu termos pelo Apenso C, em que foram Autores CCe DD e Ré a Massa Insolvente de BB.
9.O registo de aquisição da fracção referida em 4. a favor de CC e DD encontra-se cancelado pela AP. 812 de 2015/03/12.
10.Não resulta que o Autor tenha sido notificado da decisão referida em 8.
11. Foi proposta uma acção judicial contra o Autor com vista ao cancelamento dos registos das hipotecas constituídas sobre o imóvel identificado em 4., que foi julgada improcedente, tendo o Autor sido absolvido do pedido por sentença proferida em 4.08.2012 no âmbito do processo 369/06.3TCFUN, confirmada por Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, transitado em julgado em 10.01.2014.
12. - O Autor tomou conhecimento do anúncio publicado pelo Sr. Administrador de Insolvência, no … dos dias … e … de … de 2015 do qual consta: “foi designado o dia … de … de 2015, pelas 09:30 na rua …, n.° …, ….° andar, sala …, …, para a abertura de propostas que sejam entregues até esse momento, no domicílio profissional do Administrador Judicial acima indicado, pelos interessados na compra do seguinte bem :
Verba 1 - Fracção autónoma destinada a habitação, designada pela letra "…", situada no …° andar, do tipo T1+1, regime de propriedade horizontal, denominado "...", sito no …, freguesia de ..., concelho do …. A fracção encontra-se inscrita na matriz urbana sob o artigo ….° A, da freguesia de ..., com o valor patrimonial de 6 93.177,88 e descrita na Conservatória do Registo Predial do ... sob o n.° .../…” ....
“O bem é vendido na situação física e jurídica em que se encontra.”
13. O valor em dívida, relativamente aos contratos de empréstimo referidos em 2. ascende, na presente data, a €70.621,69, sendo €63.505,68 referente ao contrato de empréstimo n.° ... e €7.116,01, referente ao contrato de empréstimo n.° ....
14. Por sentença datada de 6 de Junho de 2007 e transitada em julgado em 4.02.2008, foi declarada a insolvência de BB.
15.A sentença referida em 2.14. foi publicada em 23 de Janeiro de 2008, no Diário de República, 2.a Série, n.°16.
16. O prazo para reclamação de créditos foi fixado em 30 (trinta) dias.

B) Não provados
As circunstâncias da resolução referida em 7. foram comunicadas ao...

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