Acórdão nº 1829/17.6BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 15-07-2024

Data de Julgamento15 Julho 2024
Número Acordão1829/17.6BELSB
Ano2024
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
DECISÃO

I- RELATÓRIO

A Senhora Juíza do Juízo Administrativo Social do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (doravante, também TAC de Lisboa) veio, na mesma decisão em que se declara materialmente incompetente para o conhecimento da causa, requerer oficiosamente junto deste Tribunal Central Administrativo (TCA) Sul, ao abrigo do disposto na alínea t) do nº1 do artigo 36º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), a resolução do conflito negativo de competência, em razão da matéria, suscitado entre si e a Senhora Juíza do Juízo Administrativo Comum do mesmo Tribunal, uma vez que ambas se atribuem mutuamente competência, negando a própria, para conhecer da ação administrativa que A………………………intentou no TAC de Lisboa contra a Ordem dos Enfermeiros.


*

Chegados os autos a este TCA Sul, foi ordenado o cumprimento do disposto no artigo 112º, nº 1 do CPC; as partes nada disseram.

*

Foi dada vista ao Exmo. Procurador-Geral Adjunto, conforme dispõe o artigo 112.º, n.º 2, do CPC, que emitiu pronúncia no sentido de a competência dever ser atribuída ao Juízo Administrativo Comum do TAC de Lisboa.

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- QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A questão colocada consiste em determinar se a competência para decidir a presente ação, que deu entrada em juízo em 7 de agosto de 2017, em que está em causa um litígio relacionado com o exercício do poder disciplinar, cabe ao Juízo Administrativo Comum do TAC de Lisboa ou ao Juízo Administrativo Social do mesmo Tribunal.


*

II. FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

Para julgamento do presente conflito, são relevantes as seguintes ocorrências processuais:

1) Em 7/8/2017,A ……………….., intentou no TAC de Lisboa, ação administrativa contra a Ordem dos Enfermeiros com vista à impugnação do Acórdãonº 53/2017, do Plenário do Conselho Jurisdicional da Entidade Demandada, datado de 21/04/2017, que deliberou o arquivamento do procedimento disciplinar aos Enfermeiros V ………………, F ……………………. e H ……………………., no âmbito do processo disciplinar nºPD/……………/CJ/JS, peticionando e concluindo do modo que segue:
“Nestes termos, e nos mais de direito que forem doutamente supridos, DEVE CONCEDER-SE PROVIMENTO AO RECURSO DA DECISÃO FINAL proferida pelo Plenário do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros em 21/04/2017, com todas as suas legais consequências, como é de direito e da melhor JUSTIÇA!

Conclusões:

Foram prestadas falsas declarações da médica Drª A……………..em sede de prova testemunhal a favor da senhora enfermeira H……………..no processo disciplinar na OE, que são fundamento bastante para que o acórdão proferido pelo Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros esteja inquinado de vício e que a decisão de arquivamento do processo disciplinar volte a ser reapreciada e são fundamento para a reabertura do processo disciplinar contra os enfermeiros F…………….e H……….……………

Termos em que, e com a expressa menção da formação do ato tácito do deferimento da concessão do pedido de proteção jurídica à Autora na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, pede que seja concedido provimento ao recurso da decisão final proferida pelo Plenário do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros, com todas as suas legais consequências, como é de direito e da melhor JUSTIÇA!!

[cfr. P.I., 4 Docs., Procuração fls. 1/157– SITAF]

2) Por decisão de 03/02/2024, a Senhora Juíza do Juízo Administrativo Comum do TAC de Lisboa, excecionou a incompetência em razão da matéria daquele tribunal e determinou a remessa dos autos ao Juízo Administrativo Social do mesmo Tribunal por entender ser esse o competente,aduzindo, para tanto, a fundamentação de direito que, de seguida, se transcreve nos trechos mais significativos. Assim:

«(…)O artigo 44.º.-A, n.º 1, alínea b), do ETAF, atribui expressamente competência ao juízo administrativo social para conhecer de todos os processos relativos ao exercício do poder disciplinar.

A atual redação do artigo 44.º-B do ETAF resultou do DL n.º 74-B/2023, de 28/08, aprovado ao abrigo da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 34/2023, de 19/07.

A Lei 34/2023, de 19/07, autoriza o Governo a alterar o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, constando do seu artigo 2.º – relativo ao sentido e extensão da autorização legislativa – que a mesma se destinava a “Clarificar as competências dos juízos administrativos sociais nas matérias relativas a vínculos de emprego público, nomeadamente as respeitantes ao exercício do poder disciplinar e efetivação de responsabilidade civil, e dos juízos de contratos públicos, concretizando os tipos contratuais abrangido” [cf. alínea e)] – sublinhado nosso.

Deste modo, o DL n.º 74-B/2023, de 28/08, não podia inovar quanto à definição da competência dos juízos administrativos sociais, mas apenas clarificá-la, designadamente no que aos processos – como o presente – dizem respeito a litígios emergentes do exercício do poder disciplinar.

Do exposto decorre que – sob pena de violação da lei autorizativa (Lei 34/2023, de 19/07) pelo DL autorizado (DL n.º 74-B/2023)– a norma do artigo 11.º do DL 174/2020, de 13/12, implica que transitem para o Juízo Administrativo Social os processos pertinentes a litígios relativos ao exercício do poder disciplinar que em 29/08/2023 (data da entrada em vigor do DL .º 74-B/2023 – cf. artigo 9.º) se encontrassem pendentes no Juízo Comum.

Interpretação diversa levaria à conclusão que o DL n.º 74-B/2023 não se limitou a clarificar, mas inovou na definição das competências do Juízo Administrativo Social, o que, como supra explicado, violaria o sentido e extensão da lei autorizativa-

(…)

a) declaro o juízo comum do TACL incompetente em razão da matéria para conhecer da presente intimação;

b) declaro o juízo social do TACL competente em razão da matéria para conhecer do presente processo (…)».

[cfr. decisão- fls.934/936 SITAF]

3º) Uma vez ali chegados, a Senhora Juíza a quem os presentes autos foram distribuídos proferiu sentença, com data de 27/03/2024, a declarar-se igualmente incompetente em razão da matéria para dirimir o litígio que lhe foi submetido, devolvendo a competência ao tribunal remetente. Dessa decisão, extrai-se o seguinte trecho:

«(…)a presente acção foi contestada, seguindo a tramitação normal e, tendo sido distribuída no âmbito do Juízo Administrativo Social (JAS), após a criação e a entrada em funcionamento dos Juízos de competência especializada – cfr. DL n.º 174/2020, de 13/12 e Portaria n.º 121/2020, de 22/05 -, i.e. após 1/Set/2020, nela foi proferida decisão de incompetência material do Juízo Administrativo Social deste Tribunal, em 03/Fev./2022 (a fls. 903 e segs. do SITAF) e ordenada a remessa dos autos ao Juízo Administrativo Comum (JAC), deste mesmoTribunal, decisão essa sem recurso e aceite pelo JAC (cfr. despachos subsequentes - sendo o primeiro de 22/01/2023 -, até à nova sentença de incompetência material, que antecede),

(…)

(…)a contrario do entendimento vertido na sentença do JAC que antecede, não se trata aqui de uma lei interpretativa, com efeitos retroactivos, à luz do qual se remeteu para este Juízo Administrativo Social, um processo que vinha sendo tramitado no JAC, desde Set./2021 posto que uma lei, para ser considerada uma lei interpretativa, depende da verificação de requisitos cumulativos, que dela dimanam (cfr. art.º 13.º/1/C.Civil), não é o Julgador que lhe atribui tal natureza e efeitos retroactivos, sem mais, sendo certo que, «(…) para que uma lei se possa qualificar como interpretativa, parece-nos, ela tem de revelar, ao menos implicitamente,uma intenção de clarificação do regime legal anterior, intenção essa que há de ser revelada, ou pelo seu teor literal, ou pelo preâmbulo do diploma que a aprova ou, no mínimo, pelos respetivos trabalhos preparatórios

(…)

o entendimento vertido no Ac. do STJ, de 9 de Dezembro de 2021, em sede de recurso para uniformização de jurisprudência, no que à qualificação de uma lei como sendo lei interpretativa concerne (Proc. n.º 2227/18.0YRLSB.S1-A, www.dgsi.pt), do qual se destaca o seguinte: «(…)

17. O critério determinante da qualificação de uma lei como interpretativa depende do preenchimento cumulativo de dois requisitos: o primeiro consiste em “a lei [nova] regular um ponto de direito...

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