Acórdão nº 1814/09.1BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 10-02-2022

Data de Julgamento10 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão1814/09.1BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACÓRDÃO
I- Relatório
Banco ……………………., S.A. (que incorporou por processo de fusão o T............................ – Instituição Financeira de Crédito, S.A.),interpôs recurso jurisdicional contra a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa a fls.537 e segs. (numeração em formato digital – sitaf), que absolveu dos pedidos o Ministério das Finanças e da Administração Pública – na acção administrativa especial em que a sociedade incorporada peticionava a anulação do despacho do Director de Finanças de Lisboa, de 22-05-2009 que «determinou o arquivamento do requerimento de prova do preço efectivo na transmissão de imóvel, apresentado pela Autora em 05-02-2009, nos termos do disposto no artigo 129.° do CIRC, com referência à alienação do prédio urbano, sito na Torre, da freguesia de ……………….., concelho de …………….., inscrito na matriz sob o artigo ………..°» e a consequente condenação da Entidade Demandada «a deferir o pedido de prova de preço efectivo apresentado pela ora Autora com referência à transmissão do imóvel acima identificado.»
Nas alegações de recurso de fls. 564 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente formulou as conclusões seguintes:
«[…] 2.ª O Tribunal recorrido julgou a ação administrativa apresentada pelo Recorrente totalmente improcedente, com fundamento na inexistência de restrição ilegítima do direito à reserva da vida privada, do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, do princípio da proporcionalidade e, bem assim, do princípio da tributação das empresas pelo rendimento real;
3.ª Salvo o devido respeito, não pode proceder o entendimento da sentença a quo;
4.ª Entende o Recorrente que a sentença recorrida incorre em omissão de pronúncia, uma vez que o Tribunal não se pronunciou sobre duas das questões suscitadas na petição inicial;
5.ª O Recorrente invocou na sua petição inicial que a correção em causa resultava da errónea aplicação do artigo 129.º, n.º 6, do Código do IRC na redação dada pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29 de dezembro, uma vez que a lei à data do facto tributário não exigia qualquer autorização prévia por parte do Recorrente, nem dos seus administradores, de levantamento do sigilo bancário, não podendo a falta desta constituir fundamento para o arquivamento do requerimento, nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC, o que não foi apreciado pelo Tribunal a quo, em violação do preceituado no n.º 1 do artigo 12.º da Lei Geral Tributária (“LGT”);
6.ª De igual modo, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a invocada ilegalidade da correção por violação do disposto no artigo 63.º-B da LGT;
7.ª Pelo que, tratando-se estas de questões sobre as quais se lhe impunha tomar conhecimento, uma vez que traduzem verdadeiras ilegalidades da decisão controvertida nos autos (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 25.05.2016, proferido no processo n.º01635/04.8BEPRT) e impendendo sobre o Tribunal o dever de as conhecer, a sentença a quo incorre em nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA;
8.ª Verificada a nulidade da sentença recorrida, nesta parte, deverá o Tribunal ad quem conhecer em substituição do mérito das questões não apreciadas pelo Tribunal a quo e melhor explicitadas nos artigos 13.º a 20.º, 138.º a 155.º e 156.º a 170.º da p.i., para os quais se remete, como determina o artigo 665.º, n.º 1, do CPC aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA e que resulta do princípio da economia processual (cf. neste sentido, exemplificativamente, acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 07.06.2018, proferido no processo n.º 448/16.9BELLE).
9.ª Sem prejuízo, a somar à nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia, acresce que a sentença recorrida padece de vários erros de julgamento, uma vez que não considerou verificadas nenhuma das inconstitucionalidades apontadas pelo ora Recorrente na sua p.i., não tendo considerado violado o direito à reserva da vida privada, nem os princípio da proporcionalidade, do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, nem da tributação das empresas pelo rendimento real, todos determinantes da inconstitucionalidade da decisão administrativa em crise nos autos;
10.ª Atente-se que, está apenas em causa nos autos a apresentação da declaração de autorização de acesso à informação bancária de alguns dos administradores do Recorrente e não do sujeito passivo, o que é determinante para a conclusão de que a interpretação do artigo 129.º, n.º 6, do Código do IRC sufragada pela administração tributária e mantida pelo Tribunal a quo incorre na violação dos aludidos princípios;
11.ª Com efeito, e desde logo, incorre a sentença recorrida em erro de julgamento quanto à invocada inconstitucionalidade do artigo 129.º, n.º 6, do Código do IRC (atual artigo 139.º), por violação do princípio da reserva da intimidade da vida privada, constitucionalmente consagrado no artigo 26.º da Lei Fundamental;
12.ª No que concerne à violação do princípio da reserva à intimidade da vida privada, tal consubstancia-se, desde logo, na circunstância de o eventual acesso à informação bancária do sujeito passivo e dos seus administradores, como condição necessária do deferimento do requerimento apresentado nos termos do artigo 129.º do Código do IRC, determinar o alargamento do núcleo de pessoas que tomam conhecimento de informações protegidas, relativas ao sujeito passivo, sem que este último tenha à sua disposição qualquer garantia de defesa ou alternativa que não seja a de autorizar o levantamento do sigilo bancário;
13.ª Efetivamente, muito embora se reconheça o objetivo estatal de combate à fraude e evasão fiscal e, bem assim, o direito do mesmo à arrecadação de impostos, tal tem de se compatibilizar com o direito à intimidade da vida privada, quer do sujeito passivo, quer dos terceiros envolvidos;
14.ª De facto, o legislador pretendeu consagrar, naquele n.º 6, do artigo 129.º (atual artigo 139.º), do Código do IRC um regime especial de derrogação do sigilo bancário que visou intimar o sujeito passivo à apresentação das autorizações para o acesso à sua informação bancária e à dos seus administradores, renunciando voluntariamente ao direito ao sigilo bancário e providenciando pela renúncia voluntária ao mesmo sigilo de terceiros, seus administradores à data da transmissão, não tendo, para esse efeito, acautelado minimamente a possível violação daquele direito à reserva da intimidade da vida privada;
15.ª Desta forma, não se avistando qualquer justificação para a consagração, no n.º 6 do artigo 129.º (atual artigo 139.º) do Código do IRC, de um regime legal com tais implicações na esfera de direitos do sujeito passivo e de terceiros, nada justifica, também e neste caso, a sobreposição dos referidos objetivos de combate à fraude e evasão fiscal e do próprio direito do Estado de cobrar impostos ao direito à reserva da intimidade da vida privada consignado naquela norma, razão pela qual é, desde logo, evidente que o preceito sob análise incorre em violação do direito à reserva da intimidade da vida privada, previsto no artigo 26.º, n.º 1, da CRP;
16.ª Assim, é por demais evidente que a interpretação do normativo do n.º 6 do artigo 129.º do Código do IRC, nos termos defendidos pelo Tribunal a quo, segundo a qual para o afastamento da aplicação da norma prevista no artigo 58.º-A do Código do IRC, se exige a apresentação de autorizações de derrogação de sigilo bancário dos administradores do Recorrente, i.e. de terceiros, incorre em violação do direito à reserva da intimidade da vida privada, previsto no artigo 26.º, n.º 1, da CRP, o que se invoca para os devidos efeitos legais;
17.ª Pelo que, deve a sentença recorrida ser revogada, por ilegalidade resultante da aplicação de norma inconstitucional;
18.ªEm adição à violação do referido princípio/direito, uma outra ocorre em consequência da concretização do comando ínsito naquele n.º 6 do artigo 129.º (atual artigo 139.º) do Código do IRC, qual seja, a violação dos princípios do Estado de Direito e do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva;
19.ª Afinal, o efeito imediato que acaba por derivar da consagração do regime legal previsto na referida norma é o de que o sujeito passivo, ainda que inteiramente convicto da razão que lhe assiste, se retraia no que respeita à utilização do expediente legal em causa, sob pena de sacrificar o seu direito à reserva da intimidade da vida privada;
20.ªÉ cristalino que, perante aquele n.º 6, do artigo 129.º, do Código do IRC, o sujeito passivo se depara com uma situação dilemática em que ou autoriza a derrogação do seu sigilo bancário e obtém de todos os terceiros, seus administradores, as autorizações relativas a essa derrogação ou se vê irremediavelmente privado de afastar a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 58.º-A do Código do IRC e, inclusive, de impugnar judicialmente a própria liquidação de imposto ou, se a este não houver lugar, as correções ao lucro tributável efetuadas por efeitos da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 58.º-A do Código do IRC;
21.ª Tal situação é especialmente evidente no caso dos presentes autos em que o Recorrente deu a referida autorização, tendo ainda logrado obtê-la de dois terceiros, seus administradores à data da transmissão, não tendo apenas conseguido juntar ao seu pedido a autorização de alguns dos terceiros que a administração tributária pretendia [cf. pontos 4) e 8) da matéria de facto dada como provada];
22.ª Pelo que, é inequívoco que o exercício do seu direito, bem como as legítimas expectativas que o sujeito passivo pudesse ter, de comprovar, perante a administração tributária, que o preço efetivamente praticado na alienação do imóvel em causa nos autos foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

Desbloqueie o acesso total com um teste gratuito de 7 dias

Transforme a sua pesquisa jurídica com a vLex

  • Acesso completo à maior coleção de jurisprudência de common law numa única plataforma

  • Gere resumos de casos com IA que destacam instantaneamente os principais pontos jurídicos

  • Funcionalidades de pesquisa avançada com opções precisas de filtragem e ordenação

  • Conteúdo jurídico abrangente com documentos de mais de 100 jurisdições

  • Confiado por 2 milhões de profissionais, incluindo os principais escritórios de advocacia do mundo

  • Aceda a pesquisas potenciadas por IA com o Vincent AI: consultas em linguagem natural com citações verificadas

vLex

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT