Acórdão nº 181/12.0TBLNH.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 17-10-2013
Judgment Date | 17 October 2013 |
Acordao Number | 181/12.0TBLNH.L1-6 |
Year | 2013 |
Court | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
I – Relatório
Miguel e cônjuge intentaram e fizeram seguir, no Tribunal Judicial da Lourinhã, contra João e cônjuge e Vicente a presente acção declarativa com processo ordinário pedindo que a mesma seja julgada procedente por provada e, em consequência:
a) Declarada inexistente a aquisição, por sucessão hereditária e dissolução da comunhão conjugal, do “dominium” sobre o prédio urbano dos réus, porque além de não existir na realidade, sendo um prédio virtual, corresponde à parcela de terreno que integra o artigo matricial rústico (artigo 53, da secção FFF, da freguesia da Lourinhã) que faz parte integrante do prédio dos autores, lavrada a favor dos réus, duplicando-o com parte do prédio pertencente aos primeiros (aos autores), seja considerada nula, inexistente e indevidamente lavrada pela inscrição de aquisição G – Um (ap. n.º 14 de 15.09.1999) e,
b) Em consequência, declarada nula e inexistente, em consequência dos vícios em que se fundamenta a anterior, a inscrição de aquisição G – Dois (ap. n.º 12 de 21.10.1999) da descrição predial n.º 01040 (Atalaia).
c) Declarada nula e/ou inexistente a transmissão operada entre os réus pela escritura de compra e venda exarada de fls. 47 a fls. 48 do Livro de Notas n.º 72-E, do extinto 2.º Cartório Notarial de Torres Vedras, ordenando que seja efectuado o respectivo averbamento da anulabilidade decretada.
d) Serem os réus condenados a reconhecer o “dominium” dos autores sobre a aludida parcela de terreno que corresponde ao prédio rústico inscrito sob o artigo 53, da Secção FFF, da freguesia da Lourinhã, que por sua vez faz parte integrante do prédio (misto) descrito sob o n.º 01051 (Atalaia).
e) Serem os réus condenados a respeitar o direito dos autores sobre a aludida parcela de terreno e que a mesma faz parte integrante do prédio (misto) de que são titulares, abstendo-se da prática de qualquer acto (s) que coloque em crise o “dominium” dos autores, seus donos e legítimos possuidores, com exclusão de outrem.
f) Serem os réus condenados, solidáriamente, a pagarem aos autores a título de indemnização pelos danos (morais e materiais) causados, o montante de quatro mil euros.
Para tanto e em síntese alegaram ser donos e legítimos possuidores do prédio misto, sito na freguesia de Atalaia, concelho de Lourinhã, constituído por terra de cultura arvense (parte rústica), adega e logradouro (parte urbana), inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 53, da Secção FFF e na matriz predial urbana sob o artigo 619, ambos da freguesia da Lourinhã.
Tal prédio misto fora adquirido, por compra, pelos autores com o seu irmão e cunhado Clemente a Manuel e mulher.
Que o autor e o seu irmão, Clemente, em data anterior a 1970, construíram um muro divisório a separar a casa de habitação, adega e logradouro (parte urbana) da terra de semeadura (parte rústica), prédio misto pertencente na sua totalidade, exclusivamente, sem a menor oposição de quem quer que seja e à vista de toda a gente, aos autores.
Mais alegaram que o 2.º réu, Vicente, durante algum tempo cultivou a parte rústica que lhe foi dada de arrendamento por Clemente, declarou junto do Serviço de Finanças, em 29 de Julho de 1999, que a aludida parcela de terreno lhe pertencia, inscrevendo-a como se de um prédio autónomo se tratasse.
Esta parte é constituída por lote de terreno para construção urbana, com a área de 340 m2, tendo o referido réu, Vicente, aproveitado o óbito de sua mulher, Clementina, para requerer a abertura de uma nova descrição predial n.º 01040, declarando que a aludida parcela de terreno integrava a herança aberta por óbito de sua mulher, requerendo, indevidamente e com base em declaração falsa, que a tinha adquirido por sucessão hereditária e dissolução da comunhão conjugal.
Recorrendo assim a falsas declarações para requerer a abertura de uma nova descrição predial n.º 01040 (Atalaia) duplicando a parcela rústica do prédio descrito sob o n.º 01051 (Atalaia), descrição esta aberta há mais de sessenta anos, deste modo criando um prédio virtual e/ou uma ficção com o nítido propósito de se locupletarem à custa dos autores com o prédio rústico pertencente a estes últimos, usurpando o direito dos autores e tentando adquirir, deste modo, o “dominium” sobre uma parcela de terreno pertencente aos primeiros.
Os réus, João e mulher contestaram a acção, defendendo-se, por excepção e por impugnação, tendo a final pugnado:
a) Pela procedência por provada da excepção de caso julgado invocada e por via disso serem os réus absolvidos da instância ou caso assim não se entenda;
b) Declarar-se reconhecido o direito de propriedade dos réus (e não dos autores como por lapso vem referido) do lote de terreno identificado nos docs. 3 e 4 da PI por o terem adquirido de boa-fé em 1999;
c) Serem os réus (e não os autores como por lapso vem escrito) reconhecidos apenas como proprietários de 340 m2 do prédio descrito sob o n.º 1051 da freguesia da Atalaia, onde está implantado o prédio urbano inscrito na matriz sob o art. 619 da Lourinhã, oficiando-se ao Registo Predial para proceder à correcção do registo em conformidade com a realidade do prédio.
Quanto à defesa por excepção, os contestantes alegaram, em síntese, que os autores pretendem é tentar discutir de novo o mérito da acção declarativa que correu termos no mesmo Tribunal Judicial da Lourinhã com o n.º 537/08. 3TBLNH e que lhes foi desfavorável.
Quanto aos factos que os autores pretendem vir trazer a discussão nos presentes autos, os mesmos encontram-se prejudicados em virtude da sentença proferida, nesses autos n.º 537/08. 3TBLNH, já ter determinado o seguinte:
a) Declaro que os autores (aqui réus) são proprietários do lote de terreno para construção urbana com a área de trezentos e quarenta metros quadrados, sito na Rua 8 de Dezembro, lugar e freguesia de Atalaia, concelho da Lourinhã, sob o número mil e quarenta, freguesia da Atalaia, Lourinhã, e aí registado a seu favor o direito de propriedade sobre tal imóvel, pela inscrição G – 2;
b) Condeno os réus (aqui autores) a retirar do prédio quaisquer plantações e sementeiras por si ali colocadas;
c) Condeno os réus (aqui autores) a tapar a abertura que fizeram do seu prédio para o lote de terreno dos autores (aqui réus) e demolirem a barraca de folha de zinco ou chapa e outros materiais que ali colocaram;
d) Condeno os réus (aqui autores) a restituir aos autores (aqui réus) o lote referido em a); e
e) Condeno os réus (aqui autores) a abster-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua a utilização, por parte dos autores (aqui réus) do lote referido em a).
Mais adiantaram que sendo as partes as mesmas, o pedido agora formulado pelos autores é o contrário do pedido formulado pelos réus nos autos 537/08.3TBLNH e a causa de pedir os mesmos, entende-se verificada a excepção dilatória do caso julgado e em virtude disso deve-se dar lugar à absolvição da instância.
Sendo que se os autores não se conformavam com a decisão então proferida, teriam ao seu alcance o recurso da decisão, o que não o fizeram, pelo que a mesma transitou em julgado e decidiu a questão definitivamente.
Os réus defenderam-se ainda – para o caso de improceder a invocada excepção – impugnando a factualidade alegada pelos autores no articulado inicial, adiantando, em síntese, que o prédio não foi dado de arrendamento, mas sim comprado (a parte que pertencia há muito a Clemente) prédio esse que se encontrava autonomizado pelo muro edificado entre o referido Clemente e seu irmão e cunhado que, desde pelo menos 1970, já haviam acordado na sua divisão e cada um actuava como exclusivo dono da sua parcela.
Mais adiantaram que, já após terem adquirido o lote de terreno correspondente à parte rústica, os autores abriram um portão para acesso ao referido lote dos réus, sem autorização e contra a sua vontade.
Sendo que os autores ao partirem o muro, ao entrarem no prédio dos réus, impediram o acesso e utilização do prédio destes, tendo inclusivamente enchido de terra o portão de entrada, não permitindo aos réus utilizarem o seu prédio, cuja aquisição está devidamente titulada através do respectivo registo, após uma posse ininterrupta por si e pelos anteriores proprietários de mais de 28 anos.
Na sequência de tais atitudes vieram os réus a constatar que os autores colocaram uma barraca em folha de chapa ou zinco, plantaram produtos hortícolas e fizeram sementeiras contra a vontade dos réus, vindo a ocupar ilicitamente o seu prédio.
Os autores replicaram respondendo à matéria da excepção do caso julgado e, a final, pugnaram pela improcedência da mesma, decidindo-se como peticionado no articulado inicial.
Findos os articulados, o Mm.º Juiz a quo proferiu despacho saneador julgando procedente a excepção de caso julgado invocada, absolvendo os réus da instância.
Inconformados com tal decisão dela os autores interpuseram recurso que foi...
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