Acórdão nº 1773/22.5T8ENT-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23-05-2023

Data de Julgamento23 Maio 2023
Número Acordão1773/22.5T8ENT-B.E1
Ano2023
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Processo 1773/22.5T8ENT-B.E1 Reclamação
Tribunal Recorrido: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA ... - JUÍZO DE EXECUÇÃO ... – JUIZ ...
Reclamante: SOCIEDADE A..., LDA.
Reclamado: AA
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Acordam, em conferência, na 1ªa Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora,
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I. Relatório.
Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa que AA moveu contra Sociedade A..., Lda., para haver dela a quantia de 40 430,86 €, veio a Executada deduzir oposição por embargos de executado.

No âmbito destes autos de oposição foi proferido o seguinte despacho:
“Atento o teor dos requerimentos que antecedem, para descoberta da verdade e boa decisão da
causa, notifique as partes, sobretudo o exequente para, em 10 dias, se pronunciarem sobre as seguintes
questões, esclarecendo o que tiverem por conveniente:
- de quantos mútuos (empréstimos) se trata;
- se entregou as quantias em dinheiro;
- em que datas, ainda que aproximadas, as entregou;
- se eram onerosos ou gratuitos;
- datas de vencimento ou prazos;
- se a embargante estava ou não obrigada à restituição, em que prazos e termos;
- se os alegados empréstimos estavam ou não vencidos aquando da propositura da execução.
E., d.s.”
*
Inconformada com tal despacho, veio a Embargante do mesmo interpor
recurso, concluindo, após alegações, da seguinte forma:
a) Após audiência prévia do passado dia 23/06/2023, a fls. ..., com a Ref.ª 93729859, resultou o seguinte despacho:
“Notifique as partes para, no requerido prazo de 15 (quinze) dias, querendo, alegarem integralmente por escrito de facto e de Direito, nos termos previstos no art. 591.º, n.º 1, al. b), do NCPC, bem como para se pronunciarem quanto à possibilidade de ser proferida decisão sem realização de audiência de julgamento.”;
b) Recorrente e recorrido apresentaram as suas alegações, sem que de nenhuma delas resultasse qualquer oposição à prolação de sentença “sem realização de audiência de julgamento”.;
c) Após o que foi proferido o douto despacho recorrido, a fls. ..., com a Ref.ª 94476407, convidando as partes, “sobretudo o exequente” para, em 10 dias, se pronunciarem dobre as seguintes questões:
- de quantos mútuos (empréstimos) se trata; - se entregou as quantias em dinheiro;
- em que datas, ainda que aproximadas, as entregou;
- se eram onerosos ou gratuitos;

- datas de vencimento ou prazos;
- se a embargante estava ou não obrigada à restituição, em que prazos e termos;
- se os alegados empréstimos estavam ou não vencidos aquando da propositura da execução.”;
d) O embargado aproveitou para vir alegar factos essenciais que, embora vagos e falsos, não havia alegado em sede de req1uerimento executivo;
e) Entende a recorrente que o despacho de que ora se recorre violo o principio do dispositivo consagrado no art.º 5º nº 1 do Cód. Proc. Civil já que, tratando-se os documentos que suportam a presente execução de meros documentos quirógrafos utilizados para prova de negócios nulos por falta de forma, conforme o embargado reconhece, e não tendo sido alegados no requerimento executivo os factos essenciais, constitutivos da relação causal subjacente à emissão dos alegados títulos, não pode também agora vir o douto Tribunal a quo vir facultar à parte um direito que já não detinha em sede de contestação de embargos;
f) Na verdade os factos sobre os quais o douto Tribunal a quo determinou que as partes se pronunciassem são factos essenciais – porque estruturadores de exequibilidade dos documentos dados à execução – e não instrumentais ou complementares ou concretizadores resultantes da instrução da causa e decorrentes dos anterior e oportunamente alegados;
g) Verificando-se, assim, uma violação do princípio do dispositivo consagrado no art.º 5.º n.º 1 do Cód. Proc. Penal;
h) A proibição de correção, retificação, alteração ou complemento do requerimento executivo é unanimemente acolhida pela jurisprudência conforme Acordão citados e que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais;
i) Sendo também a doutrina unânime quanto à mesma questão;
j) O embargado não alegou, no seu requerimento executivo, os factos essenciais, constitutivos da relação causal limitando-se a referir que “Tais cheques destinavam-se a devolver ao exequente o valor de diversos empréstimos que em 2019 em numerário o exequente havia feito à executada, ...”.
l) Tal alegação, vaga e imprecisa, não contém em si qualquer um dos elementos essenciais da relação causal, revelando absoluta falta de causa de pedir;
m) Tal como a recorrente alegou na sua petição de embargos.
n) No aludido contexto, entende a recorrente, não pode agora o douto Tribunal a quo facultar ao embargado a possibilidade de vir a completar e rectificar o seu requerimento executivo alegando os factos essenciais e elementos constitutivos da alegada relação causal subjacente à emissão dos títulos, quando não o havia alegado no competente requerimento executivo;
o) Consequentemente, revogando-se o despacho em apreço com a Ref.ª CITIUS 94476407 e, bem assim, ordenando-se o desentranhamento e entrega ao embargado do seu requerimento de 23/10/2023 com a Ref.ª CITIUS 10097441, se fará a costumada JUSTIÇA.
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O Exequente contra-alegou pugnando pela inadmissibilidade do recurso e, para o caso de assim não se entender, pela improcedência do mesmo.
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Acerca de tal requerimento de interposição de recurso foi proferido o seguinte despacho:
“O despacho de 13/10/2023:
foi proferido ao abrigo dos princípios do contraditório (art. 3.º, n.º 3, NCPC), da colaboração (arts. 7.º, esp. n.º 2, e 417.º, esp. n.º 1, NCPC), e aperfeiçoamento (art. 590.º, esp. n.os 2, al. b), 3 a 7, NCPC), como claramente, sem dificuldade, do mesmo e respetivo enquadramento pressuponente resulta.
O que é por demais evidente (tanto que o exequente também refere a inadmissibilidade do recurso).
E o Tribunal certifica/consigna.
Consequentemente, a decisão foi proferida no âmbito do uso legal de poder discricionário art. 679.º CPC anterior, art. 630.º, n.º 1, NCPC, o que é manifesto (arts. 7.º, esp. n.º 2, e 417.º, esp. n.º 1, NCPC, e 590.º, esp. n.º 7, sendo irrecorrível).
E constitui despacho de mero expediente, convidando à colaboração das partes, e “notificando as partes, sobretudo o exequente para, em 10 dias, se pronunciarem sobre as seguintes questões, esclarecendo o que tiverem por conveniente” (contraditório), não tendo havido decisão sobre o litígio, nem que afete a esfera jurídica de nenhuma das partes art. 630.º, n.º 1, NCPC.
Acresce que se verifica a inutilidade do recurso, porquanto não foi proferida decisão sobre o litígio, e desta poderão as partes afetadas eventualmente recorrerem.
Pelo que o recurso é inadmissível.
Razões pelas quais se decide rejeitar o recurso interposto, extinguindo a instância do mesmo, ao abrigo do disposto no art. 641.º, n.º 2, al. a), do NCPC.
Custas do recurso interposto a cargo dos recorrentes, nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
E., d.s. Req. 05.07.2022”
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Inconformada com esse despacho, veio a Embargante reclamar do mesmo, alegando que:
“Atento o despacho de que ora se reclama, o despacho recorrido trata-se de despacho de mero expediente “proferido ao abrigo dos princípios do contraditório (artº, nº 3, NCPC), da colaboração (artºs 7º, esp. nº2, e 417º, esp. nº 1, NCPC), e aperfeiçoamento (artº 590º, esp. nºs 2, al. b), 3 a 7 NCPC)”.
É com tal entendimento que a reclamante não pode concordar ou conformar-se.
Pois é unânime a jurisprudência ao considerar que “Constituem despachos de mero expediente aqueles que apenas têm por finalidade regular ou disciplinar o andamento ou a tramitação processual e que não importam decisão ou julgamento, denegação, reconhecimento ou aceitação de qualquer direito” conforme Ac. do TRC de 06/06/2018, no Proc. nº 517/16.5GCLRA.C1.

No caso em apreço o despacho recorrido denega, manifestamente direitos da embargante/recorrente.
Ou seja, a embargante/recorrente tem o direito de ver a questão dirimida dentro do perímetro fixado pelas próprias partes e em respeito pelo princípio do dispositivo.
O despacho recorrido, não só veio permitir a introdução nos autos de factos a eles estranhos, como poderá vir a constituir uma verdadeira decisão surpresa já que, atento o douto despacho proferido em sede de audiência prévia – com o qual as partes concordaram – de proferir decisão sem a realização de julgamento, e, em cumprimento desse mesmo despacho, após apresentação pelas partes de alegações de fato e de direito, a apresentação de nova matéria de fato, impediria o cumprimento de tal determinação.
De assinalar que o despacho recorrido foi proferido após a apresentação de alegações, de fato e de direito, conforme determinou o douto Tribunal.
Ainda atento o douto Acórdão do TRP de 21/01/2014, proferido no Proc. nº 12/12.1TXPRT-J.P1 “O despacho de mero expediente tem uma finalidade - prover ao andamento regular do processo - e um pressuposto - sem interferir no conflito de interesses entre as partes.
No caso, o despacho recorrido não cumpre qualquer dos apontados requisitos e pressupostos.
Pois, não só vem contrariar o despacho proferido na audiência prévia, já que impede a “possibilidade de ser proferida decisão sem realização da audiência de julgamento”, perturbando, por isso, o regular e expectável andamento do processo, como vem também “interferir no conflito de interesses das partes”, pois permite/convida a alegação de fatos não alegados em sede própria – o requerimento executivo - e, dessa forma, desrespeitar o princípio dispositivo, pois tais factos, podem constituir “a causa da obrigação subjacente ao documento de reconhecimento de divida” não podendo ser alegados “em momento posterior, sem o acordo do executado…” tudo conforme Acórdão desse Venerando Tribunal de 11/05/2017, no Proc. nº1047/15.5TBABF-A.E1.
Acresce ainda que, a manter-se o despacho recorrido, o processo retrocederia a momento...

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