Acórdão nº 1743/20.8T8BRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça, 17-01-2023
Data de Julgamento | 17 Janeiro 2023 |
Case Outcome | CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 1743/20.8T8BRG.G1.S1 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.
“Baseaff, L.da” instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, pedindo a condenação dos RR. AA e mulher BB, a pagar-lhe a quantia em dívida no montante de 65.053,17 €, acrescida dos juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em súmula, ter celebrado com os RR. um contrato de empreitada para construção de uma habitação familiar térrea, pelo preço total de 168 559,09 Euros, cujo preço deveria ser pago no prazo de 3 [três] dias após os pedidos de vistoria e consequente libertação de tranche de dinheiro por parte da entidade bancária, realizou ainda um conjunto de trabalhos a mais a solicitação dos RR no valor de 13 165,69 Euros.
Sustenta que no dia 03 de março de 2020, e antes de terminada a obra, por carta registada com aviso de receção, a autora resolveu o “contrato de construção” celebrado com os réus, com justa causa e efeitos imediatos, já que até essa data os RR. apenas haviam pago o quantitativo global de 75 000,00 Euros, não obstante estar realizada obra correspondente a 74,83% no valor de 126 140,47 Euros, a que acresce o valor dos trabalhos a mais.
Os RR. contestaram e deduziram pedido reconvencional. Impugnaram os factos alegados pela A., sustentaram que o preço acordado foi no montante de 116.508,00 (+IVA), não tendo sido solicitadas ou executadas quaisquer obras a mais; que a A. resolveu o contrato no período concedido pelos RR à autora, por interpelação expressa, para que a obra fosse cumprida, sob pena do mesmo ser resolvido por incumprimento definitivo, já que a A. havia-se comprometido contratualmente a edificar a dita moradia familiar no prazo máximo de 12 meses e volvidos quase 36 meses a mesma encontrava-se longe do seu termino.
A Autora, agiu da forma descrita consumando de forma clara, expressa e inequívoca a sua manifesta intenção em não cumprir, e antecipando o incumprimento definitivo do contrato de empreitada, abandonou a obra, deixando-a por concluir, e em face do seu incumprimento definitivo, tiveram os reconvintes que adjudicar a outra empresa de construção a sua conclusão por um preço superior.
O incumprimento da autora causou danos, patrimoniais e não patrimoniais.
Concluem pedindo a improcedência da ação e procedência do pedido reconvencional, pedindo que seja declarado o incumprimento definitivo do contrato de empreitada por culpa única e exclusivamente imputável à autora/reconvinda e consequentemente seja esta condenada a pagar aos reconvintes, a quantia de 40.950,32 euros, a que acrescem juros legais de mora contabilizados desde a citação/notificação até integral e efetivo pagamento.
Mais requererem a condenação da A. e sua mandatária como litigantes de má-fé em multa e em indemnização aos RR., nunca inferior a 20.000,00.
Replicou a A., solicitando a retificação de alguns erros de escrita da PI; mais impugnando os factos alegados pelos RR. e sustentando que a autora resolveu o contrato de empreitada nos termos gerais de direito com base nos fundamentos aí invocados, após prévia interpelação; que a obra só foi interrompida, após o dono de obra, ter exigido alterações à execução da mesma e a realização de uma serie de trabalhos extra.
Invoca abuso de direito por parte dos RR e pede a condenação destes como litigantes de má fé em multa e indemnização no valor de 5.000,00 €.
Concluindo como na p.i. [o que, como refere, inclui o reconhecimento judicial da resolução pela autora do contrato de empreitada celebrado com os réus, com justa causa e efeitos imediatos].
Realizada a audiência final, foi proferida sentença, onde se decidiu:
«- julgar parcialmente procedente a presente acção, e em consequência, condenar os RR. A pagar à A. a quantia de € 12.331,87 (doze mil, trezentos e trinta e um euros e oitenta e sete cêntimos), mais IVA, acrescida de juros de mora, à taxa devida para os juros comerciais, até integral pagamento, a contar da citação;
- Julgar parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência, condenar a A. a pagar aos RR. a quantia de 13.416,69 € (treze mil, quatrocentos e dezasseis euros e sessenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal em vigor, até integral pagamento, a contar da notificação da reconvenção.
Custas da acção e da reconvenção por A. e RR., na proporção do respectivo decaimento, e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido aos RR.»
*
Inconformados com a sentença final, dela recorreram a autora e os réus sendo, após deliberação, decidido pelo Tribunal da Relação:
“Pelos fundamentos expostos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação interposta pela autora e, em consequência, altera-se a decisão recorrida, a qual passa a ter o seguinte teor:
- Condena-se os RR. a pagar à A. a quantia de 32.905,43€ (com IVA já incluído), acrescida de juros de mora, à taxa devida para os juros comerciais, até integral pagamento, a contar da citação;
Mais acordam, em julgar parcialmente procedente a apelação interposta pelos RR e, em consequência, condenam ainda a autora/reconvinda a pagar aos réus/reconvintes o montante a apurar em sede de liquidação de sentença, com o limite de 15.341,31€, que resultar do diferencial entre o valor da obra em falta à data da resolução do contrato (já determinado nos termos expostos -35.399,41€-) e o custo que os AA. tiveram que pagar ao novo empreiteiro para finalizar a conclusão da obra, considerando apenas o valor que os RR. terão que despender pela conclusão dos trabalhos que já se mostravam contidos no contrato celebrado com a A. (e no qual não deverá ser considerada a eliminação das patologias a que alude a alínea HH) dos factos provados, em cujo valor a autora já se mostra condenada), a apurar nos termos do disposto pelo artigo art. 609.º, n.2 do CPC.
Custas das apelações pela A. e pelos RR, na proporção de metade para cada um e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário dos RR.
Custas da acção e da reconvenção na proporção do respectivo decaimento e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário dos RR".
*
Novamente inconformada com o decidido pela Relação, interpõe recurso de Revista para este STJ autora/reconvinda e, formula as seguintes conclusões:
“I. Constituem objeto do presente recurso nulidades processuais, erro material e erro do julgamento em matéria de direito.
II. A matéria da realização de obras na cave pela recorrente na moradia objeto do contrato de empreitada em crise nos autos, é facto suscetível de ter relevância jurídica; complementa factos alegados pelas partes; sobre eles foi exercido o contraditório; dos autos resulta que a recorrente realizou essas obras, mas a matéria de facto provada, é omissa quanto à mesma.
III. Pelo que, salvo melhor opinião, o STJ, com os seus poderes de substituição, pode e deve afastar as deficiências, que encontre na decisão proferida pela Relação, reformado o Ac. em recurso dele fazendo constar da matéria de facto provada que: “KK) Durante a execução da empreitada, a autora realizou obras na cave da moradia objeto do contrato de empreitada em crise nos autos.”, sob pena de se deixar de pronunciar sobre questões que devesse apreciar [cfr. 1º parte da al. c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC] e/ou violar o poder-dever previsto na al. c) do n.º 2 do art.º 662º do CPC, cfr. n.º 3 do art.º 682º do CPC, o que se requer.
IV. O teor do caderno de encargos e dos projetos de execução, bem como o plano de pagamentos em anexo ao contrato de construção em crise nos autos. é facto suscetível de ter relevância jurídica; complementa factos alegados pelas partes; sobre eles foi exercido o contraditório; dos autos resulta que a recorrente realizou essas obras, mas a matéria de facto provada, é omissa quanto à mesma.
V. Pelo que, salvo melhor opinião, o STJ, com os seus poderes de substituição, pode e deve afastar as deficiências, que encontre na decisão proferida pela Relação, reformado o Ac. em recurso dele fazendo constar da matéria de facto provada que: “LL) Resulta do caderno de encargos junto aos autos a fls. que “Paramentos e revestimentos interiores – Paredes – […] os acabamentos das paredes da garagem e arrumos da garagem serão em Reboco de Argamassa com acabamento areado uniforme e posteriormente pintados com tinta aquosa para paredes interiores tipo CIN®, ou similar, com primário e tinta de acabamentos mate.[…]
Tetos […] Tetos na zona da garagem e arrumos de garagem será em reboco areado com acabamento uniforme e posteriormente pistados com tinta aquosa para paredes interiores tipo CIN®, com primário e tinta e acabamento mate.[…]
Pavimento […] Pavimento da garagem e arrumos de garagem será em betáo C25/30, sem revestimento, afagado e devidamente impermeabilizada com Weber.dry Iastic.[…]
Serralharias – Portões: O portão de acesso à garagem será portão automático seccionado do tipo Eletrocelos, ou similar, com motor Rosso Evo da Motorline Professional, ou similar.”
E ainda que:
“MM) O Plano de Pagamentos dos Trabalhos corresponde a um valor de construção de:
a) Execução de estrutura em betão armado, alvenarias exteriores em bloco térmico e pavimento térreo em habitação unifamiliar (Cave + Piso + Cobertura), pelo Valor Global de 34.713,00€ (Trinta e Quatro mil, Setecentos e Treze Euros).
b) Execução de acabamentos de fachadas e Cobertura, Vãos em Alumínio e Vidro, Carpintarias, Mobiliários de Cozinha, WC e Roupeiros, Louças Sanitárias, Instalações técnicas, conforme caderno de encargos em anexo. Piso + Cobertura (Exclui-se neste preço arranjos de exteriores, mobiliários de cozinha, estores brisa-solares e muros de vedação). Pelo Valor Global de 91.795,00€ (Oitenta e Um Mil, Setenta e Sete Euros e Cinquenta Cêntimos).
c) Execução de acabamentos de fachadas e Cobertura, Vãos em Alumínio e Vidro, Serralharias, Mobiliários de Cozinha, WC e Roupeiros, Louças Sanitárias,...
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