Acórdão nº 17/19.1T8PVL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23-01-2020

Data de Julgamento23 Janeiro 2020
Número Acordão17/19.1T8PVL.G1
Ano2020
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório.

J. F. e R. F. intentaram a presente acção declarativa de condenação no Juízo de Competência Genérica de Póvoa do Lanhoso, Comarca de Braga, contra F. A., pedindo que a presente acção seja julgada procedente, por provada, e consequentemente:

a) Ser reconhecido e declarado o direito de propriedade dos autores sob o prédio supra descrito sob o artigo 1.º, dele fazendo parte um quinteiro e logradouro, com a área descoberta de 292m2, que se estende até às paredes nascente e sul do prédio do réu, supra descrito sob o artigo 12.º;
b) Ser reconhecido e declarado que o prédio do réu, supra descrito sob o artigo 12.º, não tem qualquer área de logradouro ou descoberta;
c) Ser o réu condenado a reconhecer o referido direito de propriedade dos autores e a absterem-se da prática de quaisquer actos que turbem o respectivo exercício;
d) Ser declarada extinta, pelo seu não uso, a servidão supra descrita sob o artigo 17.º, que onerava o prédio supra descrito sob o artigo 1.º a favor do prédio supra descrito sob o artigo 12.º;
e) Ser o réu condenado a fechar as janelas e portas supra descritas sob o artigo 25.º, a demolir as construções supra descritas sob os artigos 26.º a 28.º e a retirar do prédio dos autores as pias supra descritas sob o artigo 29.º, deixando totalmente livre e desimpedido de quaisquer bens que lhe pertençam, o que deve fazer no prazo de 30 dias contados do trânsito em julgado da douta sentença que o condene.
Foi enviada carta registada com aviso de recepção para citação do réu, vindo o AR devolvido, assinado por pessoa não identificada, pois que não foi assinalada qualquer das quadrículas que identificam quem assinou o aviso (se o destinatário, se outra pessoa a quem foi entregue).

A 28 de Março de 2019 foi proferido o seguinte despacho:

1. O(A)(S) RR. devidamente citado(a)(s) não contestou/contestaram.
A falta de contestação determina, nos termos do disposto nos art. 567 nº 1 do CPC, o reconhecimento dos factos alegados pelo(a)(s) AA.
2. Cumpra o disposto no art. 567 nº 2 do CPC”.

Foram apresentadas alegações escritas pelos autores, na sequência das quais, a 23 de Abril de 2019, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:

“III. A decisão
Pelo exposto, julgando a acção procedente:
- Declaro o direito de propriedade dos AA. sob o prédio supra descrito sob o artigo 1.º da p.i., dele fazendo parte um quinteiro e logradouro, com a área descoberta de 292m2, que se estende até às paredes nascente e sul do prédio do Réu, supra descrito sob o artigo 12.º da p.i.
- Declaro que o prédio do Réu, supra descrito sob o artigo 12.º da p.i., não tem qualquer área de logradouro ou descoberta.
- Condeno o R. a reconhecer o referido direito de propriedade dos AA. e a abster-se da prática de quaisquer actos que turbem o respectivo exercício.
- Declaro extinta, pelo seu não uso, a servidão supra descrita sob o artigo 17.º da p.i., que onerava o prédio supra descrito sob o artigo 1.º da p.i. a favor do prédio supra descrito sob o artigo 12.º da p.i..
- Condeno o R. a fechar as janelas e portas supra descritas sob o artigo 25.º da p.i, a demolir as construções supra descritas sob os artigos 26.º a 28.º da p.i. e a retirar do prédio dos AA. as pias supra descritas sob o artigo 29.º da p.i., deixando totalmente livre e desimpedido de quaisquer bens que lhe pertençam, o que deve fazer no prazo de 90 dias contados do trânsito em julgado desta sentença.
*
Custas pelo(a)(s) RR.
Notifique e registe.”
*
Desta sentença foi enviada carta registada com AR para notificação do réu, que foi assinado nos mesmos moldes que o AR da carta enviada para citação (ou seja, assinado por pessoa não identificada, pois que não foi assinalada qualquer das quadrículas que identificam quem assinou o aviso -se o destinatário, se outra pessoa a quem foi entregue).
A 14 de Maio de 2019, via citius, fez o réu juntar aos autos procuração forense a favor da sua mandatária.
A 24 de Maio de 2019, vem o réu arguir a nulidade da sua citação bem como a falta da mesma, terminando pedindo que seja julgado que houve falta de citação do réu, nos termos do art. 188º nº 1 e) do Código de Processo Civil, e assim anulado todo o processado; ou caso assim se não entenda, considerado que houve nulidade da citação nos termos do art. 191º do mesmo diploma legal, sendo concedido ao réu, o respectivo prazo de defesa.
Para o efeito indicou prova testemunhal, documental, e requereu prova pericial.
Responderam os autores, pugnando pela extemporaneidade da arguição.

Após, interpôs o réu recurso da sentença proferida nos autos, terminando as suas alegações, com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

Conclusões:
1 - Os Autores propuseram Ação contra o Réu;
2 - O Tribunal da 1ª Instância declarou procedente a Ação interposta pelos Autores;
3 - Na sua fundamentação a Douta Sentença diz “ 1 - OS FACTOS . A. O (A) (S) RR devidamente citados (a) (s) não contestou / contestaram. A falta de contestação determina, nos termos do disposto no art. 567º nº 1 do CPC, o reconhecimento dos factos alegados pelo (a) AA., que dou por integralmente reproduzidos”.
4 - Acontece que, o Réu aqui Recorrente não foi “devidamente citado”, como fundamenta a Douta Sentença. Houve falta de citação, razão pela qual o Réu não contestou a ação.
5 - Na Douta ação foi indicado que o Réu vive na …, Rue …, de má-fé, com o objetivo de que o Réu jamais fosse citado; E, como tal, a pessoa que recebeu a carta com a P.I. não a entregou ao Réu.
6 - Sabendo, perfeitamente, os Autores que o Réu vive há 8 naos na …, Rue … e,
7 - Conhecendo o seu domicílio profissional, uma vez que o Réu trabalha para o filho dos Autores;
8 - Filho, esse, que foi quem entregou a carta com a Douta Sentença ao Réu. Sendo caricato e, estranho no mínimo!!
9 - Douta Sentença, essa, que deixou o Réu, aqui Recorrente completamente estupefacto !
10-Só passando a ter exata noção do que tinha ocorrido após efetuar a consulta do processo.
11 - Portanto, o Réu não teve conhecimento da citação, por facto que não lhe é imputável. Ao invés, é imputável aos próprios Autores, que agiram de má fé. Com o objetivo do Réu só tomar conhecimento dos factos quando o processo se encontrasse decidido.
12 - Existe, assim, falta de citação nos termos do art,º 188º, nº 1, e) do CPC.
13 - Dando lugar à anulação de todos os atos processuais praticados desde a P.I.
14 - Sendo imperioso, a repetição do ato de citação, dando-se ao Réu a possibilidade de contestar a ação. E, assim, ver cumprido o princípio do acesso ao Direito e aos Tribunais consagrado no art. 20º nº 1 e 4 do C.R.P.
15 - O Réu só teve conhecimento da ação já depois de ter sido proferida sentença nos autos e, no prazo de recurso;
16 - Apesar de já ter sido proferida Sentença, arguiu a nulidade nos autos, após terse inteirado do que se passava.
17- Razão pela qual, teve que interpor o presente recurso.
18 - Devendo ser anulada a presente decisão que ora se interpõe recurso, ordenando à 1ª Instância que aprecie e conheça do “mérito” do vicio arguido pelo Réu no requerimento apresentado em 1ª Instância, no qual indicou prova testemunhal.
Nestes termos, e nos melhores de Direito e com o sempre mui douto suprimento de V.Exª, deve o recurso apresentado ser julgado procedente por provado e, assim ser revogada a Douta Sentença, decidindo:
- Remeter-se o Processo para a 1ª Instância apreciar o mérito da invocada nulidade por falta de citação do Réu.
E assim, se fará, aliás como sempre Justiça.”

Contra-alegaram os autores, terminando com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
“Em Conclusão:

1. Os recursos, como remédios jurídicos que são, não se destinam a conhecer questões novas, não apreciadas pelo tribunal recorrido, mas sim a apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso;
2. A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre a questão da “falta de citação” do R., até porque tal questão só foi suscitada em momento posterior à prolação e notificação da sentença ao R;
3. Pelo que não pode este Tribunal ad quem pronunciar-se sobre a nova questão da pretensa falta de citação do R.;
4. O recorrente não coloca em causa a decisão da matéria de facto e nem a decisão da matéria de direito, isto é, que determinados factos não pudessem ser julgados provados com fundamento no art.º 567.º, n.º 1 do CPC, ou que a subsunção dos factos ao direito deva ser outra da seguida pelo Tribunal a quo;
5. A nulidade da falta de citação deve ser arguida perante o Tribunal que alegadamente a cometeu;
6. A nulidade da falta de citação deve ser arguida com a primeira intervenção no processo, em qualquer estado do mesmo, enquanto não deva considerar-se sanada;
7. No casu, o R. reconhece que tomou conhecimento dos presentes autos e da douta sentença que nestes foi proferida em data anterior à sua primeira intervenção no processo (14/05/2019), por tal douta sentença lhe ter sido entregue – segundo alega – pelo filho dos AA.
8. O R. estava, por isso, em condições de arguir a nulidade da falta de citação imediatamente aquando da primeira intervenção no processo (14/05/2019), o que não fez.
9. Destarte, mostra sanada a alegada e arguida nulidade.
Termos em que, negando provimento ao recurso, deverá ser proferido douto acórdão que confirme integralmente a douta sentença recorrida, com as legais consequências.
Assim decidindo, farão V.as Ex.as, Venerandos Juízes Desembargadores, a habitual, Justiça.”
*
A 15 de Julho de 2019, foi proferido o seguinte despacho:

Falta de citação.
Nulidade da citação
Pressupostos.
A.
I.
A 23 de Abril de 2019 foi proferida sentença nos autos – cf. fls. 35 e ss.
A 14 de Maio de 2019 foi junta procuração pelo R. – cf. fls. 42.
A 24 de Maio de 2019 o R. arguiu a falta de citação ou, assim não se entendendo, a nulidade da citação ao abrigo, respetivamente, do disposto no art.º 188, nº 1, al. e), e...

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