Acórdão nº 1667/19.1T8VRL.S2 de Supremo Tribunal de Justiça, 28-09-2022
Data de Julgamento | 28 Setembro 2022 |
Case Outcome | NEGADO PROVIMENTO |
Classe processual | RECURSO PENAL |
Número Acordão | 1667/19.1T8VRL.S2 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
Acordam, na 3ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça
1. RELATÓRIO
1.1. No Juízo Central Criminal de Vila Real – Juiz ... – no processo comum com intervenção do tribunal coletivo nº 1667/19.1T8VRL o arguido AA, divorciado, ..., filho de BB e de CC, natural de ..., ..., nascido em .../.../1971, residente em ..., ..., por acórdão de 21JAN20, foi condenado, em cúmulo jurídico, ao abrigo do disposto nos artigos 77.º, 78.º e 69.º, n.º1, al. a), do Código Penal, das penas principais e acessórias aplicadas nos seguintes processos:
1) No Proc. C. Coletivo n.º1796/17.... do Juízo de Central Criminal de ..., J...,
2) No Proc. C. Singular nº 74/17.... do Juízo Local Criminal ...,
3) No Proc. C. Singular nº 76/18.... do Juízo Local Criminal ...;
4) No Proc. C. Singular nº 85/16.... do Juízo Local Criminal ..., J...,
a) Na pena única de 7 (sete) anos de prisão, e
b) na pena acessória única de 3 (três) anos de proibição de conduzir veículos motorizados.
1.2. Inconformado com o acórdão dele interpôs recurso o arguido que motivou, concluindo nos seguintes termos: (transcrição):
«1º- A pena de prisão imposta, decorrente do cúmulo, ao ora recorrente é excessiva, desproporcional e consequentemente deve ser reformada;
2º- O douto acórdão deverá ser revogado, na parte em que decretou a pena de prisão efetiva de sete anos de prisão, devendo a mesma ser reduzida para o seu limite mínimo legal (4 anos de prisão);
3º- Ou, caso assim não entendam, deverá aquela pena de prisão efetiva ser reduzida para uma pena de prisão abaixo dos seis anos, abaixo do meio da moldura penal abstratamente aplicável.
4º- Foram, assim, as disposições conjugadas dos 70º e 71º do Código Penal.
Nestes termos, concedendo provimento ao presente Recurso deve, em consequência e por tudo o que ficou exposto, ser alterado o Douto Acórdão do Tribunal a quo, sendo a pena efetiva de prisão de 7 anos de prisão seja reduzida para o seu limite mínimo legal
E, se tal não for considerado adequado, sempre se mostrará devida a redução da pena de prisão aplicada pelo Tribunal a quo em pelo menos um ano.
Assim se fazendo inteira e sã JUSTIÇA no caso concreto!!!»
1.3. Na 1ª Instância houve Resposta do Ministério Público, o qual pronunciou-se pela improcedência do recurso, concluindo nos seguintes termos:
1 - «Recorre o arguido do acórdão proferido a 15 e março de 2022 que o condenou em cúmulo jurídico das penas principais e acessórias aplicadas nos processos comuns coletivos n.º1796/17.... do Juízo de Central Criminal de ..., J..., nº 74/17.... do Juízo Local Criminal ..., nº 76/18.... do Juízo Local Criminal ..., J..., nº 85/16.... do Juízo Local Criminal ..., J... e 68/18.... do Juízo Local Criminal ..., J... na pena única de sete anos de prisão e na pena acessória única de 3 anos de proibição de conduzir veículos motorizados considerando-a excessiva e desproporcional;
2 - Pugna, assim, pela sua redução para o seu limite mínimo legal (4 anos de prisão) ou, caso assim não se entenda, ser reduzida pelo menos, para uma pena de prisão abaixo dos seis anos;
3 - Salvo melhor entendimento por opinião diversa, o arguido não tem razão e o presente recurso deve ser julgado improcedente.
4 - Na verdade, o tribunal a quo ponderou criteriosa e prudentemente as circunstâncias que já haviam sido consideradas na fixação das penas parcelares, considerou devidamente as penas parcelares em concurso bem como as restantes condenações das quais o arguido já havia sido alvo e apreciou de forma geral e corretamente a personalidade deste e, por esse via, só podia ter concluído pela condenação do arguido na pena única de pena única de 7 (sete) anos de prisão e na pena acessória única de 3 (três) anos de proibição de conduzir veículos motorizados.
5 - O acórdão recorrido encontra-se devidamente fundamentado, quer de facto quer de direito, e não é possuidor de qualquer vicio que inquine a sua validade substancial ou formal, devendo ser mantida nos seus precisos termos, julgando-se assim o recurso improcedente.,
Termos em que, negando provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida, farão V. Exas. Justiça!
1.4. Neste Tribunal o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso nos seguintes termos: (transcrição)
1. Por douto acórdão proferido, nos autos à margem referenciados, pelo Juízo de Central Criminal de ..., foi decidido condenar o arguido AA, na pena única de 7 anos de prisão e na pena acessória única de 3 anos de proibição de conduzir veículos motorizados.
2. Inconformado, o arguido interpôs recurso circunscrito à matéria de direito, de acordo com o disposto no art.º 432º, nº 1, al. c) do Código de Processo Penal.
Questiona, essencialmente, a excessiva dureza da pena única, que entende dever ser reduzida para quantum inferior a 6 anos de prisão, caso o Tribunal não entenda adequada a pena única – por si sugerida – de 4 anos de prisão.
A tal recurso respondeu, detalhada e fundadamente, a Exma. Magistrada do Ministério Público junto da 1ª Instância, pugnando pela respetiva improcedência.
3. Crendo-se que nada obstará ao conhecimento do recurso por parte do Supremo Tribunal de Justiça, deverá o mesmo ser apreciado em sede de conferência, de acordo com o disposto no art.º 419º, n.º 3, al. c) do Código de Processo Penal.
Dir-se-á, então, que a precisão e exaustividade dos argumentos aduzidos na resposta da Exma. Colega – que se acompanha na íntegra – nos dispensam de maiores considerandos.
4. Atentemos nos seguintes segmentos da apreciação feita pelo Tribunal a quo:
“As exigências de prevenção geral no caso em apreço mostram-se elevadas, tendo em conta a natureza e gravidade dos crimes em questão: a elevada criminalidade rodoviária e as elevadas contraordenações rodoviárias aliadas à elevada sinistralidade rodoviária são uma realidade incontornável de Portugal, com um elevado número de feridos, incapacitados e mortos, o que se tem traduzido em sucessivas alterações legislativas, nomeadamente agravando o regime que acarreta a cassação da carta de condução; em casos como os do arguido têm-se revelado totalmente infrutíferas todas as alterações legislativas e quaisquer campanhas, nomeadamente o slogan “se beber não conduza”, porquanto a condenação por condução em estado de embriaguez e criminalidade conexa repete-se nos crimes em cúmulo, não se podendo também ignorar o extenso passado criminal (antecedentes criminais), muitos deles precisamente por condução em estado de embriaguez - são 6 (seis) os antecedentes criminais por condução de veículo em estado de embriaguez.
Mais grave é o caso se não se ignorar, como não ignoramos, que o arguido ciente das proibições resultantes das referidas condenações continuou a conduzir em períodos em que estava proibido/inibido de conduzir e daí as condenações pelo crime de violação de proibições.
De igual modo, são elevadas as necessidades de pena no caso de um crime de ofensa á integridade física com os contornos de gravidade e perversidade que os factos ilustram uma pancada com uma bomba de direcção no crânio de alguém, convenhamos está muito acima de uma vulgar ofensa pois trata-se de uma ofensa numa parte vital do corpo humano…com as lesões que os factos também ilustram.
Ou seja, é muito elevada a culpa e muito elevada a intensidade criminosa.
(…)
São muito elevadas as necessidades de prevenção especial se tivermos em consideração além das condenações que integram o cúmulo jurídico as outras condenações que constam do facto que transcreveu os antecedentes criminais do arguido.
(…)
Ou seja, o arguido foi por várias vezes condenado pelo crime de condução em estado de embriaguez, por várias vezes condenado em criminalidade conexa de desobediência e violação de proibições e outro tipo de crimes não desprezíveis que nos permitem formar uma melhor imagem global sobre a sua personalidade e que não são toleráveis, por ultrapassar em muito o socialmente aceitável - crime de ofensa à integridade física e crime de detenção ilegal de arma.
De outro passo, tais condenações revelam também que ao arguido foram aplicadas várias vezes a pena de prisão suspensa na sua execução com o resultado posterior que se vê, isto é, fazendo “tábua rasa” de tais oportunidades e cometendo posteriormente mais crimes…
(…)
…não interiorizou ainda o problema de alcoolismo de que padece e da necessidade de tratamento. Ou seja, o quadro de actuação motivacional mantém-se inalterado, independentemente dos deveres associados às penas com vista à sua ressocialização que se pode concluir neste momento que ainda não se alcançou.
(…)
AA cumpre pena acima identificada, pela prática de crime de ofensa à integridade física grave, face ao qual adota discurso de reduzida censura, de minimização da conduta criminal e associação aos consumos etílicos que, à data, registava.
(…)
O passado criminal do arguido é revelador de um grande desprezo pelas anteriores oportunidades que lhe foram sendo exaustivamente concedidas quando não condenado em pena privativa da liberdade; encerram em si um maior desprezo pela comunidade quando violam as penas acessórias de proibição de conduzir.”(destaque nosso)
Ora, como bem resulta da resposta da nossa Exma. Colega, é certo que a pena única se ancorou em quantum acima do ponto médio da diferença entre o limite mínimo e o máximo da moldura penal abstracta, mas a verdade é que o Tribunal não tinha grande margem de manobra, atenta a elevadíssima quantidade de crimes – quer a cumular nestes autos, quer considerando os constantes do CRC do arguido –, e tratando-se, para mais, de ilícitos de consequências potencialmente tão gravosas.
Em tais circunstâncias, parece difícil operar uma redução da pena única, por curta que seja.
Parece-nos, pois, que o aresto fez uma adequada interpretação dos critérios contidos nas disposições conjugadas dos art.ºs 40º, n.º 1 e 71º, n.º 1 e 2, als. a) a c), e) e f) do ...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO