Acórdão nº 164/11.8TACMN.1.G1.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28-03-2019

Data de Julgamento28 Março 2019
Número Acordão164/11.8TACMN.1.G1.G1
Ano2019
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

Por apenso ao processo comum colectivo n.º 164/11.8.TACMN, que correu termos na Instância Central Criminal – J2 – do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, a Freguesia de X (exequente e apelante) instaurou execução para pagamento de quantia certa contra H. V..
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Em 17/01/2018, a agente de execução determinou a venda mediante propostas em carta fechada do bem constante da verba número dois do auto de penhora elaborado em 2017-10-02, correspondente ao quinhão hereditário que o executado possui nas heranças indivisas, abertas por óbito de seus pais, M. M. e P. G., sendo o valor base de venda € 30.000,00, com a indicação de que seriam aceites propostas iguais ou superiores a 85% do valor de base (€25.500,00) - (cfr. Ref.ª/Citius 1793282).
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A Mmª Juíza “a quo” designou o dia 3 de Maio de 2018, pelas 14 horas, para abertura de propostas em carta fechada (cfr. Ref.ª/Citius 42366357).
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Face à inexistência de propostas de aquisição, foi determinada a venda por negociação particular (cfr. Ref.ª/Citius 1933273).
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Em 6/07/2018, a agente de execução juntou aos autos proposta de aquisição do bem penhorado (quinhão hereditário) apresentada por J. C., na qualidade de co-herdeiro das heranças abertas por óbito de M. M. e P. G., no valor de 10.000,00€ (cfr. Ref.ª/Citius 201185).
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Notificada para se pronunciar, a exequente declarou opor-se à venda do quinhão hereditário pelo valor proposto de € 10.000,00, porquanto o mesmo é muito inferior ao valor mínimo (€ 25.500,00).

Mais declarou apresentar proposta de aquisição do indicado quinhão, pelo valor de € 25.000,00, requerendo a dispensa do depósito do preço, nos termos do nº 1 do art. 815º do C.P.Civil, com salvaguarda das custas processuais, nos termos do art. 541º do C.P.C. (cfr. Ref.ª/Citius 2020733).
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Em 17/07/2018, a agente de execução notificou o proponente J. C. dando-lhe conta que a proposta de aquisição por este apresentada foi recusada, mais o notificando de ter sido apresentada pela exequente uma nova proposta de aquisição, pelo montante de € 25.000,00 (cfr. Ref.ª/Citius 2023946).
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Notificado da existência de uma proposta de aquisição pelo valor de 25.000,00€, o J. C., na qualidade de co-herdeiro da herança relativamente à qual está penhorado o quinhão hereditário do executado, apresentou proposta de aquisição do bem penhorado, no valor de 25.000,00€, declarando exercer o direito legal de preferência na compra (cfr. Ref.ª/Citius 2042493).
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Em 5/09/2018, a exequente dirigiu à agente de execução o seguinte requerimento (cfr. Ref.ª/Citius 2058243):

(…) notificada do requerimento junto aos autos pelo Sr. J. C., vem no seguimento da posição assumida pelo mesmo apresentar nova proposta de aquisição do quinhão, a vender, pelo valor de € 37.500,00 (trinta e sete mil e quinhentos euros), requerendo nos termos do artigo 815º nº 2 do C. P. Civil e sem prejuízo das custas processuais, a dispensa do depósito do preço.
(…)”
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Em 27/09/2018, o proponente J. C. requereu a aceitação da declaração de preferência exercida tempestivamente, a fixação do preço para a compra do bem, a indicação do dia e hora, e o modo e forma de pagamento e formalização legal (cfr. Ref.ª/Citius 2085238).
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Datado de 18-10-2018, a Mmª Juíza “a quo” proferiu o seguinte despacho (cfr. Ref.ª/Citius 43075209):

«Nos presentes autos (e prescindido, agora, de mencionar tudo o que se passou antes, porque para a decisão em causa é perfeitamente inócuo) foi designado dia para abertura de propostas em carta fechada, 03 de Maio de 2018, tendo-se verificado que não existia qualquer proposta, pelo que se determinou se prosseguisse com a venda por negociação particular nos termos do disposto no art. 832º al. d) do CPC.
No âmbito dessa venda apareceu uma proposta de compra pelo valor de €10.000,00 que foi rejeitada pela exequente, dizendo que a mesma era muito inferior ao valor mínimo - €25.500,00.
No mesmo requerimento a exequente faz ela própria uma proposta de compra pelo valor de €25.000,00.
A Sr.ª Agente de execução notifica o proponente anterior e este, na qualidade de co-herdeiro da herança relativamente à qual está penhorado o quinhão hereditário do executado, vem exercer o direito de preferência na compra.
Junta documento comprovativo da sua qualidade de herdeiro e requer lhe seja fornecido NIB para depósito de 5% do preço.
A Sr. Agente de execução notifica a exequente que, em resposta, vem dizer que, em face do mesmo, apresenta nova proposta, pelo valor de €37.500,00.
Em face deste novo requerimento veio J. C. requerer que fosse aceite a declaração de preferência tempestivamente apresentada.

Vejamos.

Não compreendemos, sequer, o requerimento apresentado pela exequente, fazendo, agora, uma proposta de €37.500,00.

Imagine-se que o preferente não tinha usado do seu direito nesta execução. O direito era vendido/adjudicado à exequente, pelo valor de €25.000,00, não obstante o direito de preferência não ficar precludido, podendo sempre o seu titular intentar acção de preferência nos termos gerais. Mas aí, como está bom de ver, apenas se substituía o comprador, mantendo-se intacta a venda. Ou seja, nesse caso, o preferente pagaria o preço efectivamente entregue, os €25.000,00.

Tendo a exequente apresentado uma proposta e tendo o ora requerente J. C. vindo exercer o direito de preferência, não há qualquer outra possibilidade de apresentação de novas propostas

Durante muito tempo foi discutida a natureza do direito de preferência, sendo defendido, por uns, tratar-se de um direito, enquanto que outros diziam tratar-se de uma mera expectativa jurídica.

Parece estar assente (e não esquecendo que a própria lei fala em “ direito “), segundo a opinião avalizada de A. Varela, que o direito de preferência é um direito real de aquisição limitada, que está em letargia até que surja o facto que o desperta.

Trata-se de um direito real de aquisição, mas limitado ao surgimento que o faz despertar, isto é, o negócio jurídico de alienação.

A lei consagra duas situações diferentes -- o direito legal de preferência e o convencional (os chamados pactos de preferência).

Ao lado da preferência fundada na estipulação das partes, há os direitos legais de preferência (a preferência resultante da lei), “ destinados em regra a facilitar a extinção de situações jurídicas que não são as mais consentâneas com a boa exploração económica dos bens ou a proporcionar o acesso à propriedade a quem está usando ou fruindo os bens no exercício de um direito pessoal de gozo tendencialmente duradouro “, vide A. Varela “ Das Obrigações em Geral “, pág. 339, citando Lalou.

De facto, quando o obrigado à preferência faz um tipo de comunicação do projecto de venda, o preferente, em bom rigor, não é chamado a preferir, mas a contratar.

Rematando amplas e judiciosas considerações sobre a matéria, escreveu Henriques Mesquita -Parecer publicado na CJ, XVI, tomo 2, pag. 225- -228):

"No regime de um direito legal de preferência (ou de um direito convencional de preferência a que tenha sido atribuída, nos termos do artigo 421, "eficácia real") importa distinguir duas fases - uma das quais se verifica sempre e a outra apenas nos casos em que o vinculado à prelação não cumpre determinadas condições.

Numa primeira fase, que se desencadeia a partir do momento em que o obrigado à preferência decide realizar o negócio... ao preferente assistem sucessivamente, antes que aquele negócio se efective, os seguintes direitos:

- o direito (creditório) a que lhe sejam notificados os termos essenciais do projecto de alienação;
- o direito (potestativo) de, na sequência desta notificação, declarar que pretende preferir - declaração esta que, conjugada com a do notificante, dará origem a uma relação creditória equiparável, pelo seu conteúdo e efeitos, a um contrato-promessa bilateral, ou tornará mesmo perfeito o contrato definitivo, se em ambas as declarações (a do obrigado à preferência, que equivale a uma proposta de contrato, e a do preferente, que se traduz na aceitação dessa proposta) houver sido observada a forma exigida para a celebração deste contrato; (…)

Tudo isto para dizer:

O requerente J. C. tem um direito legal de preferência – cfr. art. 2130º do CC (1. Quando seja vendido ou dado em cumprimento a estranhos um quinhão hereditário, os co-herdeiros gozam do direito de preferência nos termos em que este direito assiste aos comproprietários). Foi-lhe apresentada a proposta de aquisição do direito penhorado pelo valor de €25.000,00. O requerente exerceu o seu direito.

Com a manifestação da vontade de preferir o contrato tornou-se perfeito.

Deste modo, deve a Srª. Agente de execução dar cumprimento ao disposto no art.º. 824º nº 1 do CPC, por remissão do art. 823º nº 3 do CPC, fornecendo ao preferente as indicações para depósito dos 5% do valor da venda fixado em €25.000,00, dando continuidade ao processo.
(…)».
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Em 2-11-2018, a exequente formulou o seguinte requerimento (cfr. Ref.ª/Citius 2131465):

«(…)
Não subsiste qualquer dúvida que o requerente J. C. tem direito de preferência na aquisição do bem penhorado, na qualidade de co-herdeiro em direito de representação de sua mãe na herança de seus avós, e que ao ser–lhe comunicado o projeto de venda, não é chamado a preferir, mas a contratar. Podendo-o fazer ou não.

Contudo, para puder contratar, no caso em concreto entregar o preço e receber o bem (879º alíneas a), b) e c) do C. Civil), como em toda e qualquer compra e venda, é necessário que a proposta apresentada para a sua aquisição tenha sido aceite pela pessoa incumbida/encarregue da sua venda, uma vez que, o escopo visado nos processos de execução para pagamento de quantia certa, é a obtenção de proposta de maior valor, por forma satisfazer o crédito do credor e não de algum preferente e/ou de terceiro.

Ora, salvo o devido...

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