Acórdão nº 163/15.0JELSB.C1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça, 25-10-2017

Data de Julgamento25 Outubro 2017
Case OutcomePROVIDO PARCIALMENTE
Classe processualRECURSO PENAL
Número Acordão163/15.0JELSB.C1.S2
ÓrgãoSupremo Tribunal de Justiça

I. – RELATÓRIO.

Acusado, com outros, da prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico agravado, p. e p. pelos arts. 21º e 24º, alínea c) do D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela I-B anexa, e em concurso real com aquele, da prática de um crime de associações criminosas, p. e p. no art.º 28º, nº 3 do mesmo diploma legal (D.L. nº 15/93, de 22 de Janeiro) bem ainda da prática, como autor material, em concurso efectivo com os demais, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 86º, nº 1, alínea c) da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, na versão introduzida pela Lei n2 50/2013, de 24 de Julho, com referência aos arts. 32º, nº 4 alínea a) e nº 6 alínea a), 6º e 8º da mesma Lei, veio o recorrente a ser condenado, em primeira (1ª) instância, nos termos que a seguir se exaram (sic): “(…) iii) Julgar a pronúncia nesta parte procedente e provada e, consequentemente, condenam os arguidos AA, (…) pela prática, em co-autoria material, e na forma consumada, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. nos arts. 21º nº 1 e 24º al. c) do Dec. Lei nº 15/93, de 22/01, por referência à Tabela Anexa I-B, nas seguintes penas:

1. O arguido AA: na pena de 10 (dez) anos de prisão.

(…) iv) Julgar a acusação nesta parte, procedente e provada e, consequentemente, condenam o arguido AA pela prática, em autoria material, e na forma consumada, e em concurso efectivo com o referido em III-1), de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no artº 86º nº 1 al. c) da Lei nº 5/2006, de 23/02, na versão introduzida pela Lei nº 50/2013, de 24/07, com referência aos artºs. 3º nºs 4 al. a) e nº 6 al. a), 6º e 8º da mesma lei, na pena de 1 (um) ano de prisão.

v) Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares fixadas em iii-1.) e iv) condenam o arguido AA na PENA ÚNICA de dez anos e dois meses de prisão.

vi) Julgar o pedido de liquidação e perda ampliada de bens improcedente e não provado e, consequentemente, absolvem os arguidos AA, BB e CC do mesmo, e, em consequência, determinam o levantamento do arresto efectivado no Apenso C, e incidente sobre os bens imóveis aí identificados e, após trânsito, ordenam o cancelamento dos respectivos averbamentos registais.

vii) Mais condenam todos os arguidos (à excepção da arguida DD) em 4 UCs de taxa de justiça, consequentemente, nas custas.

viii) Nos termos do disposto no artº 109º do Cod. Penal, declaram perdidos a favor do Estado os seguintes bens apreendidos nos autos:

- todos os produtos estupefacientes apreendidos nos autos (o remanescente da cocaína, já destruída, a amostra-cofre de cocaína, e o pedado de haxixe, estes a destruir, lavrando-se o competente auto;

- a embarcação “...” registada na Capitania do Porto de ... sob a matrícula ...;

- o equipamento que constitui o recheio da embarcação “...”, melhor identificado na avaliação de fls. 2853-2873, e mais se determina a afectação provisória (até ao trânsito) e definitiva de tais equipamentos à Polícia Marítima – Capitania do ...;

- os viveres (bens perecíveis) aprendidos na embarcação, e a que já foi dado destino;

- as quantias monetárias apreendidas no interior da embarcação “...”;

- os três telefones satélite e respectivo carregador, e todos os telemóveis apreendidos no interior da embarcação “...” e no interior da residência dos arguidos AA e BB

;

- as armas (a pistola calibre 6,35 e a espingarda) e respectivas munições;

ix) Nos termos do disposto no artº 186º nº 1 do CPP, determina o levantamento da apreensão o e entrega à arguida DD do telemóvel que lhe foi apreendido.

x) Determinam que os arguidos AA, BB, CC, EE, FF, GG, HH e II continuem a aguardar o trânsito em julgado do presente acórdão na situação em que se encontram, de prisão preventiva, dado que não se verificou qualquer diminuição das exigências cautelares que o caso requer, antes pelo contrário, atenta a condenação dos mesmos em pena de prisão efectiva, sem prejuízo do disposto nos artºs. 213º e 215º do CPP.

Apelada a decisão, o tribunal da Relação de Coimbra viria a decidir pela não procedência.

Contravêm com o presente recurso em que dessume a argumentação que alinhava com o sequente epítome conclusivo.

I.a). – QUADRO CONCLUSIVO.
1. Não foi em concreto produzida qualquer prova de que o Recorrente fosse receber “avultada quantia” ou que “tivesse intenção de receber avultada remuneração, não sendo possível presunções judiciárias no sentido de suprir ausência de prova concreta no que à intenção do Recorrente diz respeito.

2. A norma inerente à agravativa patente da alínea c) do artigo 24.º al. c) do Decreto –Lei n.º 15/93, de 22/01 contem norma penal em branco que impõe especial cuidado na aferição do seu preenchimento, não devendo ser possível presunções judiciárias que não tenham correspondência com uma aferição probatória da intenção do Arguido, o que no caso dos presentes autos, não se verificou, não se tendo logrado prova da intenção do mesmo e se efectivamente buscava a obtenção de avultada compensação económica para si.
3. Constata-se aliás a existência de prova derivada de escutas telefónicas de conversas havidas tendo por interveniente a co-Arguida BB, que era a sócia da sociedade JJ, Lda., que por sua vez era a proprietária do barco ..., que quem iria alegadamente receber o valor do transporte seria ela própria e não o arguido ora Recorrente.

Pelo que não pode dar-se como provado de que o Recorrente fosse ou procurasse obter “elevados proventos económicos”.
4. Não deve considerar-se preenchido o tipo de crime de tráfico de estupefacientes na sua forma agravada p.e p. nos artigos 21.º n.º 1 e 24.º al. c) do Decreto –Lei n.º 15/93, de 22/01, por referência à Tabela Anexa I-B, tendo antes o Recorrente cometido crime de tráfico de estupefacientes simples, p. e p. nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 21.º do citado dispositivo legal, por precisamente não se ter provado que o Recorrente obteve ou procurava obter avultada compensação remuneratória.
5. As penas parcelares aplicadas foram exageradas, violando-se o disposto nos artigo 50.º, 70.º, 71.º e 72.º todos do Código Penal.
O Recorrente foi punido com pena de 10 anos de prisão relativamente ao crime de tráfico de estupefacientes agravado e 1 ano de prisão pelo crime de detenção de arma proibida, e em cúmulo jurídicos foi punido em pena de prisão de 10 anos e 2 meses de prisão.
6. Ainda que superiormente se entenda de forma diversa, e que o Recorrente deva ser condenado por crime de detenção de arma proibida, o que apenas se concede por cautela de patrocínio, sempre deveria ter sido punido com pena de multa, por tal impor o disposto no artigo 70.º do Código Penal, em função das circunstâncias pessoais do Recorrente, realizando-se de forma adequada e suficiente as finalidades da punição optando-se por esse tipo de pena, sendo, ao contrário do referido possível um juízo de prognose favorável à reintegração do Arguido.
7. O Arguido passou 81 anos da sua vida sem cometer qualquer crime, pelo que o significado de ser “primário” assume em relação ao Arguido uma consistência superior devendo ter reflexo na medida da pena e que não teve.
8. O Arguido colaborou na descoberta da verdade material dos factos.
9. As penas que lhe foram atribuídas significam, com elevada probabilidade, que terminará os seus dias na prisão.

10. As penas atribuídas foram excessivas e deveriam ter sido fixadas próximas do limiar mínimo da moldura penal a considerar.
11. O Recorrente deveria ter sido condenado apenas por crime de tráfico simples, p. e p. pelo n.º 1 do artigo 21.º do D.L. 153/92, de 22 de Janeiro, em pena não superior a 5 anos de prisão que deveria ser suspensa na sua execução por igual período de tempo e sujeito a regime de prova, nos termos do disposto nos artigos 50.º e ss do CP, normas essas que se entende terem sido violadas.
12. Se assim não se entender, e pugnando-se pela condenação por crime de tráfico de estupefacientes na sua forma agravada, se entende que o Arguido não deveria ser condenado em pena superior a 8 anos de prisão.

13. A pena a que foi condenado é praticamente uma “pena de morte”, tendo sido violadas as normas inerentes aos artigos 70.º, 71.º e 72.º do CP.

Violaram-se as seguintes disposições legais:

Artigos 21.º n.º 1 e 24.º al. c) do Decreto –Lei n.º 15/93, de 22/01;

Artigos 50.º, 70.º, 71.º e 72.º todos do Código Penal.”

Reponta à pretensão do recorrente, o Ministério Público, com a síntese conclusiva que a seguir queda transcrito.

1. Os factos dados por provados preenchem a prática do crime de tráfico agravado de estupefacientes, p. e p. pelos artigos 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea c), do decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, por referência à Tabela Anexa-I-B, pelo qual foi o recorrente condenado em co-autoria material;

2. Na verdade, face à grande quantidade de produto estupefaciente transportado, que foi apreendido, sua natureza e valor do mesmo, segundo as regras da experiência e livre apreciação da prova, implicavam que o arguido recebesse uma avultada quantia;

3. Sendo a co-arguida, BB, sua ex-esposa, pessoa com quem vivia junto e com quem agiu concertadamente em conjugação de esforços, apesar de ser ela que tinha a tarefa de receber o "pagamento" do transporte do produto estupefaciente transportado no barco, do qual a família ... era dona, não iria afastar o recorrente de receber a sua parte dos lucros, na qualidade de armador de pesca que utilizava a embarcação "...", que necessariamente seriam avultados para ambos;

4. Por isso, a qualificação jurídica dos factos encontra-se correctamente feita pelo douto acórdão recorrido que confirmou o douto acórdão da 1ª instância;

5. Também, quer as penas parcelares, quer a pena única, encontram-se correctamente determinadas, em adequação com a culpa e a ilicitude do recorrente, que são ambas muito elevadas, tal como as exigências de prevenção geral, e tendo já em conta a sua idade...

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