Acórdão nº 16093/16.6T8PRT-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 11-02-2020

Data de Julgamento11 Fevereiro 2020
Número Acordão16093/16.6T8PRT-A.P1
Ano2020
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação
Processo n.º 16093/16.6 T8PRT-A.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução do Porto – Juiz 6
Recorrente – B…
Recorrida – C…, SA
Relatora – Anabela Dias da Silva
Adjuntas – Desemb. Ana Lucinda Cabral
Desemb. Maria do Carmo Domingues

Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível)

I – Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que C…, SA, com sede em Paredes intentou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução do Porto contra C… e D… veio aquela deduzir oposição à execução mediante embargos de executado pedindo que a quantia exequenda seja reduzida a €5.475,21.
Alegou, em síntese, que celebrou com a exequente o contrato que junta como doc. n.º1 e entregou-lhe uma letra em branco para ser preenchida de acordo com o que fosse devido.
Que, em 11.12.2014, a exequente resolveu o contrato, levantando o equipamento e considerando pago o café consumido. Pelo que, em consequência dessa resolução, só deve à exequente a quantia de €5.547,21, nada mais devendo em consequência da resolução do contrato.
Mais alegou a alteração anormal das circunstâncias, uma vez que a falta de consumo do café se ficou a dever a um agravamento da doença do seu companheiro que determinou o encerramento do estabelecimento comercial.
Por fim, disse ainda que a exigência de qualquer pagamento por parte da exequente após a resolução do contrato constitui enriquecimento sem causa. Por tudo isto considera que existiu abuso de preenchimento da letra, por a mesma ter sido preenchida fora das circunstâncias da resolução do contrato.
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Em sede de contestação veio a exequente pugnar pela improcedência dos embargos, alegando o direito de exigir da executada a indemnização prevista contratualmente para o incumprimento do contrato, refutando que tal constitua enriquecimento sem causa, e que tenha existido qualquer preenchimento abusivo da letra.
Quanto à alteração anormal das circunstâncias afirma que as mesmas não lhe são imputáveis, sendo que, face aos documentos juntos pela própria executada as mesmas já existiam à data da celebração do contrato.
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Foi proferido despacho saneador, com fixação do valor da causa, definição do objecto do litígio e elencados os temas de prova.
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Realizou-se a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença de onde consta: “Pelo exposto, julgo os presentes embargos não provados e improcedentes.
Custas pela embargante- art.º 527º, nº 1 do CPC.
Notifique e deposite”.
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Inconformado com esta decisão, dela veio a executada/embargante recorrer de apelação pedindo a sua revogação, e a sua substituição por outra que julgue que mantenha apenas a dívida de € 5.475,21.
A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões:
1. O contrato celebrado, relativamente à exigência do consumo mínimo de café é absolutamente nulo por exigência de uma prestação futura e incerta e pagamento de valor de produto não fornecido;
2. A recorrente provou a matéria da base instrutória que foi elaborada para excepcionar o pagamento da indemnização em causa e só poderia ter esse efeito;
3. Assim sendo, como é:
a) Houve resolução por mútuo acordo – encerramento e levantamento do equipamento simultâneos, pago o café consumido;
b) Tal resolução exclui que a denúncia tivesse sido unilateral, assim, a exigência de qualquer valor de indemnização por incumprimento;
4. Por isso, a sentença aborda a indemnização correspondente ao café que não foi consumido e não seria consumido dado o encerramento do estabelecimento e o levantamento do equipamento que possibilitasse o seu consumo;
5. A resolução equivale à anulabilidade com a restituição do prestado, o que ocorreu;
6. Aliás, como se diz, inadvertidamente, na sentença (dizemos inadvertidamente…), o contrato é de fornecimento, logo para pagar o fornecimento e o fornecimento exclusivo, exclusividade temporal para evitar consumos de fornecimentos de outrem;
7. Não se sabe onde foi a Meritíssima Juiz “buscar” o termo “devolução” relativo a qualquer pressuposto de negócio em que o fornecedor tivesse entregue dinheiro que agora tivesse de ser devolvido;
8. A resolução exclui qualquer outra consequência além da restituição do prestado;
9. Mesmo que isso não resultasse da resolução, ocorria enriquecimento sem causa que advém de prestação que excede a resolução e, assim, qualquer outra obrigação;
10. Os embargos deviam de ser declarados procedentes;
11. Consequentemente, só se mantém a dívida pelo valor confessado pela embargante recorrente que decorre da confissão de dívida num contrato anterior.
12. Violaram-se as disposições citadas.
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Não há contra-alegações.

II – Da 1.ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos:
1. Na execução a que estes embargos correm por apenso foi dada à execução a letra, cujo original se encontra junto a fls. 30 daqueles autos, em que consta como sacadora a exequente C…, SA, aceite por B…, com data de emissão de “2012-09-03”, no valor de “€29.635,85”, com data de vencimento de “2016-06-21” – cfr. letra junta aos autos de execução que, no mais, se dá por integralmente reproduzido.
2. Em 3 de Setembro de 2012, a exequente e a executada celebraram o contrato junto de fls. 5 a 10 destes autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido, ao qual foi atribuído o n.º ……../...
3. Nos termos da cláusula Primeira do contrato referido em 2., a exequente obrigou-se a fornecer à executada produtos da sua actividade.
4. Nos termos da cláusula Segunda do mesmo contrato, a executada obrigou-se, a adquirir e revender no seu estabelecimento comercial “E…” sito na …, … Centro Comercial …, Loja ., …, exclusivamente, “Café, Descafeinado e Açúcar”, comercializados pela exequente ou distribuidor por ela designado, durante 60 meses e a quantidade mínima mensal de 22 kgs de Café, Lote …, marca …, perfazendo o total contratual de 1.320 quilogramas.– alíneas a) e c).
5. Nos termos da cláusula Quarta do referido contrato, como contrapartida das obrigações de compra, promoção e venda em regime de exclusividade, a exequente pagou à executada a quantia de €5.475,21- através de compensação com o crédito de igual montante que, nos termos do considerando 6.º deste contrato a exequente detinha sobre a executada.
6. A cláusula Sexta do contrato estabelece que:
1. O presente contrato poderá ser resolvido por qualquer uma das contraentes nos termos gerais de direito, sendo que em caso de incumprimento ou mora no cumprimento de qualquer das obrigações decorrentes deste contrato, deverá a contraente cumpridora dirigir uma comunicação escrita à contraente faltosa, por correio registado, com aviso de recepção, concedendo um prazo de 15 dias, a contar da recepção da comunicação escrita para que a situação seja remediada.
2. Sem prejuízo do previsto no número anterior, no caso de as compras mensais da Segunda Contraente não atingirem a quantidade estipulada na cláusula segunda alínea c), durante 6 meses seguidos ou 12 meses interpolados e ainda nos casos de encerramento do estabelecimento… reserva-se a Primeira Contraente no direito de resolver o presente contrato, com efeitos imediatos, mediante comunicação escrita, remetida à contraparte, por correio registado com aviso de recepção, ficando essa resolução sujeita aos efeitos consignados nos números seguintes.
3. O incumprimento de qualquer das obrigações do presente contrato pela Segunda Contraente dará lugar ao pagamento de uma indemnização que se fixa em dois terços do preço unitário do quilograma de café constante da Tabela de Preço em vigor à data do referido incumprimento, por ca aquilo de café não adquirido, conforme acordado na alínea c) da cláusula segunda.
4. Para além da indemnização prevista no número anterior, a resolução do contrato fundada no incumprimento de qualquer das obrigações do presente contrato por parte da Segunda Contraente dará lugar:
a) À devolução da contrapartida concedida pela Primeira Contraente, nos termos da cláusula quarta, nº 1, deduzida da parte proporcional à quantidade de café já adquirida, face à prevista nº 1, alínea c) da cláusula segunda, acrescida de juros calculados à taxa máxima legal e computados desde a data do pagamento até à data da efectiva devolução.
b) À devolução dos equipamentos…
c) À devolução do valor efectivamente despendido pela primeira Contraente na aquisição das materiais – publicitários e outros- descritos na cláusula quarta, nº 2.…” 7. Para garantia do cumprimento do contrato foi entregue pela executada à exequente uma letra em branco, sem indicação da importância e respectiva data de vencimento, assinada, pela aceitante, aqui executada, constando da cláusula Nona do contrato:
Para titulação e em garantia do bom pagamento de todas as obrigações e responsabilidades emergentes deste contrato, qualquer que seja a sua origem ou natureza e das suas eventuais prorrogações, modificações e/ou renovações, a Segunda Contraente B… entrega nesta data à Primeira Contraente uma letra em branco por si aceite… a qual poderá ser livremente preenchida pela C1…, SA designadamente, no que se refere às datas de emissão e de vencimento, local de pagamento e montante correspondente aos créditos de que ao momento a C1…, SA seja titular por força do incumprimento contratual ou de encargos dele resultantes…” – cláusula Nona do contrato.
8. Em 3 de Setembro de 2012 a executada era quem explorava o estabelecimento de café denominado “E…”.
9. Em 25 de Março de 2014 a exequente enviou à executada, que a recebeu, a carta junta a fls. 45, cujo teor aqui se dá por reproduzido e na qual se refere:
”Foi constatado pelos nossos serviços que V. Exa. não tem adquirido a quantidade
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