Acórdão nº 158/08.0TBRMZ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09-12-2009
Data de Julgamento | 09 Dezembro 2009 |
Número Acordão | 158/08.0TBRMZ.E1 |
Ano | 2009 |
Órgão | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA
RELATÓRIO
A Herdade …, prédio misto sito na freguesia e concelho de …, descrito na respectiva Conservatória do Registo Predial sob o nº 02028 e inscrito na matriz a parte rústica sob o art. 002.0001.0000 e a parte urbana sob o art. 994 da mesma freguesia, pertence em propriedade a “A” e é objecto de um estudo de viabilização de um empreendimento turístico-imobiliário.
As expectativas de viabilização de tal empreendimento determinaram a celebração de um intitulado Memorando de Entendimento entre a proprietária, a sociedade “B” - de que aquela é sócia e administradora - e a “C” em 08-03-2005 com vista ao desenvolvimento, em pareceria, de tal empreendimento.
Nesse Memorando de Entendimento previa-se, entre outros, a celebração entre “A” e “C” de um contrato-promessa de compra e venda de 7,5% do referido prédio bem como de um contrato de investimento.
Tal contrato-promessa foi outorgado em 07-11-2005 tendo as partes nessa data acordado ser prematura a celebração do contrato de investimento por não conhecerem ainda a orientação político-administrativa viabilizadora do empreendimento e relegando a assinatura de tal contrato para o momento em que se confirme, de facto, uma tal orientação político-administrativa.
Nos termos de tal contrato-promessa foi convencionado que a escritura de compra e venda seria celebrada decorridos 12 meses a contar da data do contrato-promessa em dia, hora e local a indicar pela promitente compradora à promitente vendedora por carta registada com AR a expedir com uma antecedência não inferior a 15 dias em relação à data marcada e obrigando-se esta a no prazo de 8 dias a contar da recepção de tal carta, a entregar à promitente compradora todos os elementos que lhe digam respeito e que sejam necessários para a outorga da escritura.
Em 16-05-2008, intentou “C” "acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra “A”, pedindo que proferida sentença que substitua e produza os efeitos de declaração negocial da ré, declarando que a ré vendeu à autora, pelo preço de € 318.750,00 (trezentos e dezoito mil, setecentos e cinquenta euros), a quota indivisa de 7,5% do prédio misto denominado "Herdade …", sito na freguesia e concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 2028 e inscrito na matriz rústica sob o art. 002.0001.0000 e na matriz urbana sob o art. 944.0 daquela freguesia.
Alegou a autora, para o efeito, e em síntese, que, por duas vezes, procedeu à marcação da escritura (para o dia 21-01-2008 e para o dia 30-04-2008) no Cartório Notarial do Dr. …, sito na Rua …, n.º …, em …, avisando a Ré com a antecedência devida, não tendo esta comparecido nem disponibilizado a documentação necessária.
Contestou a Ré “A” alegando em síntese que a celebração do contrato prometido estava dependente da outorga do contrato de investimento e que a venda de 7,5% constituiria uma operação de fraccionamento proibida pelo art. 1376.°, n.º 1 do Código Civil e sujeita aos condicionalismos previstos nos Decretos-Lei n.º 384/88, de 25, 555/99, de 16.12 e pela Lei n.º 60/2007, de 04.09; para além disso, sustenta que sempre seria necessário o parecer favorável da Câmara Municipal do local da situação do prédio, de acordo com o estabelecido no art. 54.° da Lei n.º 91/95, na redacção que lhe foi dada pela lei n.º 165/99 e pela Lei n.º 64/2003, de 23.08 e, por fim, que teria caducado a opção de compra por parte da autora, dado esta não a haver exercido até 30-10-2008 conforme fora convencionado.
A Autora replicou.
Encontram-se junto ao autos fotocópia certificada do contrato promessa de compra e venda cuja execução específica a autora requer (fls. 11 a 13 dos autos), certidão do registo predial e da caderneta predial relativa ao prédio em questão nos autos (cfr. fls. 14 a 25 dos autos), cópias de cartas dirigidas pela autora à ré e respectivos registos e avisos de recepção (cfr. fls. 26 a 29 e 33 a 38 dos autos), cartas dirigidas pela autora à ré (cfr. fls. 103 a 105 dos autos), certidões de não comparência em cartório Notarial (cfr. fls. 30 a 32 e 39 a 41 dos autos), "Memorando de entendimento" celebrado entre as partes e respectivo aditamento (cfr. fls. 61 a 73 dos autos), cópia de cartas dirigidas pela ré à autora (cfr. fls. 74 a 83 dos autos) e, por último, fotocópia de parecer emitido pela Câmara Municipal de … (cfr. fls. 107 e seguintes dos autos).
Encontra-se igualmente no processo certidão da Conservatória do Registo Predial relativa ao prédio em causa, da qual se alcança a inscrição da presente acção (Ap. 1 de 2008/05/16) e a inscrição provisória por natureza nos termos do art. 92° nº 2-b) da aquisição de tal prédio por permuta a favor de “D” (Ap. 3 de 2008/07/15).
No despacho saneador, a Mma Juiz conheceu do mérito da causa e julgou a acção procedente, declarando que a ré “A” vendeu à autora “C”, pelo preço de € 318. 75 O, 00 (trezentos e dezoito mil, setecentos e cinquenta euros), a quota indivisa de 7,5% do prédio misto denominado "Herdade …", sito na freguesia e concelho de …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 2028 e inscrito na matriz rústica sob o art. 002.000l.0000 e na matriz urbana sob o art. 944.° daquela freguesia.
Inconformada, apelou a Ré, pugnando pela improcedência da acção em alegação que finaliza com a seguinte síntese conclusiva:
I - A douta sentença recorrida julgou procedente a presente acção e declarou que a Apelante vendeu á Apelada a quota indivisa de 7,5% do prédio misto denominado "Herdade …", sito na freguesia e concelho de …;
II - Tal decisão fundamenta-se em se ter entendido que a ora Apelante não cumpriu o contrato de promessa celebrado com a ora Apelada;
III - O contrato de promessa celebrado consta de escrito particular, ao qual as partes atribuíram a possibilidade de execução específica, o que a Apelada pretende fazer, pela presente acção;
IV - No contrato de promessa celebrado não se consignou prazo para a celebração da escritura notarial, apenas se dizendo que ela seria outorgada depois de decorridos doze meses, nem se indicou quem deveria marcar o local, dia e hora;
V - Em data anterior, Apelante e Apelada celebraram um acordo, que chamaram Memorando de Entendimento, em que previram a celebração do contrato de promessa em simultâneo com a celebração de um Contrato de Investimento.
VI - No mesmo dia em que celebraram o contrato de promessa, Apelante e Apelada assinaram um outro acordo, a que chamaram Aditamento ao Memorando de Investimento, no qual relegaram para momento posterior a celebração do Contrato de Investimento e reafirmaram e mantiveram em vigor tudo o que constava do Memorando de Investimento;
VII - A existência de tal Contrato de Investimento constitui condição essencial da celebração da escritura notarial e consta de documento escrito anterior ao contrato de promessa, e que foi reafirmado no mesmo dia em que este foi assinado;
VIII - A ora apelada interpelou a Apelante para a celebrar a escritura notarial de compra e venda, tendo marcado a mesma, sucessivamente, para 21 de Janeiro e 30 de Abril de 2008.
IX - A ora Apelante não compareceu no local, dia e hora em que esteve marcada a celebração da escritura de compra e venda e, em datas anteriores, comunicou á Apelada que só o faria depois de celebrado o Contrato de Investimento;
X - A Apelada nunca comunicou á Apelante se já tinha obtido qualquer dos documentos indispensáveis, licença camarária de utilização e concordância com o aumento de número de proprietários, para que pudesse ser celebrada a escritura notarial.
XI - No Cartório Notarial para o qual esteve marcada a outorga da escritura também não foi exibida licença de habitação da parte urbana do imóvel prometido vender, nem parecer favorável da Câmara Municipal de … ao aumento do número de comproprietários.
XII - Sem a exibição de tais documentos, não era legalmente possível a celebração da escritura prometida;
XIII - Não sendo possível a celebração da escritura notarial prometida, a Apelante não se constituiu em mora nem em incumprimento perante a Apelada;
XIV - A Apelante apenas estava obrigada a obter e entregar no Cartório, os seus elementos pessoais indispensáveis á celebração da escritura notarial, pelo que qualquer das partes poderia tê-los obtido;
XV - Só em data posterior a 30 de Abril de 2008. é que a Apelada obteve o parecer favorável da Câmara Municipal de …, mas nunca disso deu conhecimento á ora Apelante;
XVI - Nunca foi exibida, nem se encontra junta aos autos, certidão da licença de habitação/utilização da parte urbana do imóvel objecto do contrato de promessa;
XVII - Não estando comprovada a existência de tal licença, não poderia ser proferida sentença substituindo a declaração negocial que só ia ser proferida mediante a apresentação de tal documento;
XVIII - A douta sentença recorrida não se pronuncia sobre a questão de saber se a transmissão de 7,5% da propriedade do prédio identificado nos autos, constitui uma operação de fraccionamento de prédio rústico, proibida pelo disposto no art. 13760 do Código...
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