Acórdão nº 1575/17.0T8PRT.P1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça, 18-03-2021
Data de Julgamento | 18 Março 2021 |
Case Outcome | NEGADA A REVISTA |
Classe processual | REVISTA |
Número Acordão | 1575/17.0T8PRT.P1.S2 |
Órgão | Supremo Tribunal de Justiça |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
I. — RELATÓRIO
1. Em 25 de Janeiro de 2017, na Instância Central Cível ….., Comarca …, BB, por si e na qualidade de cabeça de casal da herança ilíquida de sua mulher CC, falecida em 06 de Dezembro de 2015, instaurou acção declarativa sob forma comum contra DD, EE e AA pedindo:
I. A) a título principal, que se declare que:
1. O réu EE está obrigado a restituir ao autor e à herança aberta por óbito da mulher deste, CC, as 130.500 ações do capital social na sociedade “R....., SA, em que foi convertida a quota no valor nominal de 4.410.000$00, que lhe foi cedida pelo autor e sua falecida mulher;
2. Os réus DD e AA estão obrigados a indemnizarem o autor e a herança aberta por óbito da mulher deste, CC, por terem celebrado o casamento em 08 de julho de 1998, com prévia convenção antenupcial de comunhão geral de bens, em quantia correspondente ao valor da quota nessa data, que era de € 628.485,35;
B) A título subsidiário, se não procederem os pedidos deduzidos a título principal, que se declare que AA está obrigada a ressarcir o autor e a herança aberta por óbito da mulher deste, CC, na quantia que corresponde ao valor de metade da participação social que o réu DD, na data do casamento, detinha no capital social da identificada sociedade e que é metade de € 628.485,35, ou seja, de € 314.242,67, em virtude da comunicabilidade da dívida ao réu DD, perante seu pai, decorrente da cessão de quota que este lhe fez;
C) Ainda a título subsidiário, improcedendo o pedido deduzido em B), que se declare e reconheça o enriquecimento sem causa de AA à custa do património do autor e de sua falecida mulher CC, e correspondente empobrecimento destes por via da celebração do casamento com o réu DD em regime de comunhão geral de bens.
II. Condenar-se:
a – EE a entregar ao autor e à herança aberta por óbito da mulher deste, CC, as 130.500 ações no capital social da sociedade “R....., SA.
b – DD e AA a pagarem ao autor e à herança aberta por óbito da mulher deste, CC, a quantia de € 628.485,35, acrescida de juros à taxa legal, a contar da citação e até efetivo e integral pagamento.
C – subsidiariamente, AA a pagar ao autor e à herança aberta por óbito da mulher deste, CC, a quantia de € 314.242,67, acrescida de juros à taxa legal, a contar da citação até efetivo e integral pagamento.
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2. Em 02 de Maio de 2017, através de correio eletrónico, a Ré AA requereu a prorrogação do prazo para contestar por trinta dias, atendendo à relação destes autos com os processos nºs 166/…. e 4091/07…….
3. Em 03 de Maio de 2017, foi proferido despacho indeferindo o requerimento de prorrogação do prazo para contestar.
4. Em 04 de Maio de 2017, AA contestou, defendendo-se por impugnação e por excepção, e deduziu reconvenção em que pediu que fosse declarada proprietária de uma quota “no valor mínimo por que foi avaliada pelo autor”
5. Em 27 de setembro de 2018 foi proferida decisão em que:
I. — se absolveu da instância os Réus quanto ao pedido formulado por BB em representação (na qualidade de cabeça de casal) da herança ilíquida de sua mulher CC;
II. — se julgou prejudicado o conhecimento dos demais pedidos formulados na petição inicial;
III. — se rejeitou o pedido reconvencional deduzido pela Ré AA;
IV. — se absolveu as partes dos pedidos de condenação em litigância de má-fé.
6. Inconformados, o Autor BB e a Ré AA interpuseram recurso de apelação.
7. O Autor BB finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:
1. A sentença recorrida na nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, pois não especificou os fundamentos de facto que justificam a decisão, não procedendo à indicação dos factos julgados provados e os não provados.
2. O autor agiu na dúplice qualidade de per si – enquanto pessoa singular – e na qualidade de cabeça de casal da herança de sua falecida mulher.
3. Quem figura como autor na presente acção é o Autor, na dúplice qualidade de titular de um direito próprio e na qualidade de cabeça de casal da herança de sua mulher, é evidente que a referida herança (ilíquida e indivisa) não é parte na acção.
4. A recorrida sentença não interpretou correctamente as normas legais que regulamentam a defesa dos direitos da herança, tal como interpretou incorrectamente os artºs 26º e 12º nº 1 – alínea a) CPC.
5. O artº 26º do CPC atribui aos patrimónios autónomos personalidade judiciária (artº 12º nº 1 – a) CPC, pelo que a herança, enquanto património autónomo possa, mesmo, ter personalidade judiciária.
6. Mas, mesmo que assim se não entendesse, a verdade é que a própria lei estabelece, de modo expresso, uma situação em que esse vício pode ser sanado (cfr. art. 14º do actual CPC a que correspondia o art. 8º do anterior CPC).
7. Mesmo que se entendesse como o faz a recorrida sentença – o que se não concede –, que quem figura como autor na presente acção é a referida herança (ilíquida e indivisa) e não o respectivo cabeça de casal , então deveria ter sido o Autor convidado a aperfeiçoar o esclarecer essa situação processual.
8. Não o tendo feito, a sentença recorrida violou os artigos 6º; 7º e 590º e seguintes do CPC.
9. O cabeça de casal pode intentar a presente acção, desacompanhada dos demais herdeiros, com base no disposto nos arts. 2089º e 2091º do CC, pois existe o perigo de não cobrança da dívida e que tal justificaria a propositura da acção pelo cabeça de casal.
10. Estando em causa nos presentes autos, a cobrança de uma dívida activa da herança, o cabeça de casal tem legitimidade para propor a presente acção contra os demais herdeiros – os Réus EE e DD, pois são estes os devedores da herança.
11. E, em fundamento deste preceito o Autor, na qualidade de cabeça de casal da herança, alegou factos que justificam e demonstram a sua legitimidade para o efeito, que, nos termos da lei, e constituem pressuposto necessário dessa legitimidade.
12. Os factos alegados pelo Autor configuram a existência do perigo a que alude o citado art. 2089º.
13. A lei prevê que a excepção de ilegitimidade da cabeça de casal por preterição de litisconsórcio necessário é sanável por via do incidente de intervenção de terceiros, conforme decorre do art. 316º, nº 1, do actual CPC, impondo-se mesmo ao juiz o dever de providenciar pela sanação dessa excepção, convidando as partes a deduzir o incidente adequado à intervenção dos herdeiros em falta (cfr. art. 6º, nº 2, do CPC).
14. O Autor demanda os restantes dois herdeiros (os réus DD e EE ((1º e 2º réus), para reclamar o direito de crédito pertencente à herança.
15. O que comprova a existência de perigo da não cobrança efectiva da dívida, tal como decorre dos documentos juntos aos autos.
16. O autor está utilizando na presente ação a figura de petição da herança prevista no artº 2075º nº 1 Código Civil.
17. Deverá a sentença proferida pelo Tribunal a quo ser integralmente revogada no que diz respeito à absolvição dos Réus da instância, sendo substituída por uma outra que decrete, outrossim, a legitimidade e personalidade judiciária do autor, com a normal prossecução da instância.
18. A sentença recorrida não fez correta interpretação e aplicação dos artºs 581º, o 671º, nº 1, 496º, alínea a), 577º, i), 576º, nº 2, do CPC.
19. A sentença recorrida padece de nulidade por falta de fundamentação nos termos do artº padece da nulidade a que se refere o artº 615º nº 1 – b) ex vi artº 607º nº 3 e 4 CPC
20. A sentença recorrida não analisou criticamente as provas, não indicou as ilações tiradas dos factos instrumentais nem especificou os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, nem tomou em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, nem compatibilizou toda a matéria de facto adquirida nem extraiu dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.
21. A sentença recorrida não apreciou o pedido formulado pelo Autor contra o Réu EE.
22. Nos artºs 20º a 44º da petição inicial o Autor alegou factos tendentes a provar que o contrato que o 2º Réu consigo celebrara em 13.05.1992 não foi cumprido e peticionou a restituição das acções que este é possuidor (e que são diferentes das acções que a acção nº 166/…. declarou pertencerem ao 1º Réu DD e à 3ª Ré AA.
23. A recorrida sentença não se pronunciou sobre o contrato celebrado entre o A. e a sua falecida mulher e o 2º Réu EE (contrato este diferente e diverso do contrato celebrado com o 1º Réu DD).
24. Esse contrato celebrado com o 2º Réu EE nunca foi apreciado nem decidido nas acções anteriores, pelo que é impossível que possa estar abrangido pelo caso julgado.
25. Neste contexto, ocorreu omissão de pronúncia, incorrendo a sentença recorridas na nulidade prevista no artº artº 615º nº 1 – e d) CPC.
26. Não existe qualquer caso julgado que possa ser invocado e aplicado como sendo causa impeditiva da instauração e prossecução da presente acção.
27. Entre a acção judicial nº 166/…. e a presente acção não existe identidade de sujeitos, de pedidos e de causas de pedir.
28. Entre a acção judicial nº 4091/07…. e a presente acção não existe identidade de sujeitos, de pedidos e de causas de pedir.
29. Assim, não existe caso julgado.
30. Na acção nº 4091/07……, o Autor não foi parte.
31. Em ambas as citadas e anteriores acções, a falecida mulher do Autor, CC nunca foi parte nem nelas teve qualquer intervenção.
32. O autor instaura a presente acção, no pressuposto e mesmo, em cumprimento, do decidido no Acórdão da Relação … de 22.06.2004, proferido nessa acção nº 166/….., que decidiu ser ineficaz a cessão de quota feita por BB, em alegada representação de DD e a EE e que pertenciam a AA e DD, … as 130.500 acções nominativas de R....., S.A..
33. Tendo sido decidido no Acórdão da Relação ….. de 22.06.2004, proferido nessa acção nº 166/…., que os Réus DD...
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